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12.12.20
Os Beatles e a censura em Portugal
Este livro de Abel Rosa acaba de sair e recomendo-o. O texto é de Nuno Galopim de Carvalho que o apresenta assim na Revista do Expresso de 11.12.2020.
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Com pragmatismo me enganas
«À entrada de mais uma semana decisiva para o futuro da Europa, existia um roteiro composto por três etapas, mais ou menos evidentes. Perante a ameaça de veto da Hungria e da Polónia ao próximo orçamento comunitário e respetivo fundo de recuperação económica, o primeiro passo teria sempre de passar por dividir os dois países.
Os primeiros sinais surgiram de Varsóvia, que tem um governo de coligação entre nacionalistas egocêntricos, numa contenda permanente para saber quem perde menos na frente interna. Como sabemos, este problema não existe na Hungria, dado que o senhor Orbán é dono e senhor do clientelismo do Estado.
A União Europeia (UE) é, para ambos os países, um instrumento de captação de dinheiro rápido que lhes permite distribuir regalias ou subsidiar setores estratégicos, enquanto desmantelam o Estado de direito.
Neste sentido, a segunda etapa do roteiro passou por tornar pública, pela voz da presidente da Comissão Europeia, a hipótese de um caminho de enquadramento orçamental apenas a 25, contornando o veto cruzado de Budapeste e Varsóvia com uma cooperação reforçada, o que fez tremer o chão polaco e, ato contínuo, o húngaro.
Os dois sabem que estão no topo dos mais beneficiados com fundos de emergência ou através do dispositivo orçamental até 2027, o que lhes permite jogar ciclicamente com os vários momentos críticos europeus e, ao mesmo tempo, abdicar de um veto sempre em benefício próprio.
A sua estratégia permanente passa por manter o poder absoluto que construíram com o dinheiro de Bruxelas. Viktor Orbán percebeu ainda que pode esticar tanto a corda e cruzar esta dependência com uma relação especial com Pequim e Moscovo, o que lhe dá uma margem extra para bloquear decisões europeias com o argumento da radial de interesses.
Uma das questões prévias a tudo isto - além da negligência dolosa de tantos setores europeus às violações húngara e polaca aos Tratados - está no facto de se atribuírem generosas fatias do orçamento plurianual a dois Estados membros que põem e dispõem de princípios jurídicos supostamente invioláveis, estruturais a todo o edifício comunitário.
Sabendo de antemão que o quadro sancionatório previsto no artigo 7.º tem tido um alcance absolutamente nulo, e que não tem sido difícil conquistar sistematicamente à mesa mundos e fundos financeiros, mesmo no quadro de uma emergência sanitária que poupou a Hungria e a Polónia como não aconteceu a outros países europeus, esperar que não manipulem decisões por unanimidade é olhar para a política europeia pelo lado da fantasia.
A primeira grande lição a tirar desta história é mesmo esta: continuar a beneficiar o infrator por omissão ou fortuna terá um custo político acumulado, com incidência na coesão europeia, no respeito pelos Tratados e na credibilidade democrática do espaço da União Europeia.
A terceira etapa deste roteiro previsível passaria, evidentemente, por empurrar o problema estrutural com a barriga, uma saída airosa que normalmente mistura em vários parágrafos uma argumentação jurídica, um europês técnico e uma ou outra frase mais orientadora, que "monitoriza violações aos Tratados", "analisa factos com objetividade" e envia tudo para o "Tribunal de Justiça", que depois remete à Comissão para propor uma saída. Por outras palavra, encontrou-se o que era mais expectável tendo em conta a prioridade máxima dos Estados membros: uma declaração capaz de aprovar um pacote financeiro que salve as economias e limite os danos sociais.
Declaração essa que manifestamente dilui o mecanismo de supervisão do Estado de direito da tutela do Conselho, permitindo sobretudo a Orbán obter o que ele sempre quis: tempo para embrulhar processualmente qualquer acusação sobre o seu regime cleptocrático, por forma a poder chegar às legislativas de 2022 com toda a capacidade instalada para manter a maioria absoluta constitucional.
Este tempo conquistado poderia indicar que as oposições democráticas e pró-europeias (que terão de se entender numa frente comum e largar a fragmentação pré-eleitoral) estariam a merecer toda a atenção dos seus pares europeus, capacitando-as, estruturando-as, fortalecendo-as, legitimando-as, de maneira a conseguirem apresentar-se a eleições com força para derrotar Orbán.
Poderia, mas nenhum sinal se vê nesse sentido. O mesmo é válido para outras paragens europeias, um tanto ou quanto órfãs de músculo pan-europeu. Parece que a UE e as principais famílias políticas europeias se conformaram com o fatalismo de ter Orbán no Conselho Europeu. Já houve tempos em que as famílias partidárias faziam política a sério e não vestiam a pele do funcionalismo burocrático dos instalados. Esse comportamento fez muita diferença no rumo das transições para a democracia nas décadas de 1970, 1980 e 1990.
Deixaram de fazer, porquê? O custo é assistir no camarote à entrega do ouro ao bandido em troca da erosão dos princípios da pertença comunitária. Em grande medida, a responsabilidade do que tem acontecido na Hungria, na Polónia e noutros Estados membros com um Estado de direito altamente fragilizado é da própria União.
Podemos entrar em 2021 com uma vacina, biliões, a barriga cheia de pragmatismo e um suspiro de alívio em Lisboa. Aceito que não é pouco e admito ser mesmo o que a prioridade política exige. Mas é também este o tempo para, de uma vez por todas, esgrimir todos os argumentos jurídicos e políticos, mobilizar todos os esforços nas instâncias comunitárias, para pôr os Orbáns e os Kaczyńskis que vão minando esta Europa de Lisboa a Helsínquia no seu devido lugar.
Sem aproveitar o momento, podemos chegar ao dia em que não haverá sequer um Conselho Europeu para negociar um mínimo denominador comum entre todos. Nesse dia, porém, já não haverá União Europeia para salvar.»
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11.12.20
Ainda a propósito do caso Ihor Homeniuk
«Este é o Presidente que telefonou em direto a Cristina Ferreira para lhe desejar sorte no novo programa. Também lhe chamam Presidente dos afetos. Só que Oksana Homeniuk não tem petrodólares, não é cleptocrata, nem tem audiências de milhões de potenciais eleitores. Portanto, Marcelo não perdeu tempo com Oksana. Podia ter-lhe telefonado, manifestando algum afeto e porventura prometendo uns euros, a propósito do assassinato do seu marido, às mãos das instituições portuguesas, das quais Marcelo é supostamente o garante último. Pensem nisto no dia 24 de janeiro.»
Susana Peralta no Público de 11.12.2020
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O ódio da viúva e a ironia do ministro
«Percebe-se que o ministro da Administração Interna esteja nervoso. Entende-se que Eduardo Cabrita esteja inquieto com o desenrolar do caso da morte de Ihor Homeniuk nas instalações do SEF e que levou à acusação de três inspetores daquele serviço por homicídio qualificado.
Compreende-se que ataque diretamente a Comunicação Social e os comentadores televisivos que escreveram e opinaram sobre a tragédia do cidadão ucraniano.
Percebe-se porque esta postura do governante não é novidade. Já em julho do ano passado acusou a Imprensa de causar alarmismo, após o "Jornal de Notícias" ter divulgado que as 70 mil golas antifumo entregues pela Proteção Civil no âmbito do programa "Aldeia Segura - Pessoas Seguras" foram fabricadas com material inflamável e sem tratamento anticarbonização.
O que não se entende é o que o Estado português tenha ignorado durante nove meses a família do cidadão ucraniano morto no Aeroporto de Lisboa. Não tenha tido uma palavra de conforto. Que a demissão da diretora do SEF tenha demorado nove meses. E que o ministro da Administração Interna anuncie agora, numa comunicação carregada de dispensável ironia, que vai indemnizar a família, como se não fosse essa a obrigação. Uma indemnização, diga-se, paga por todos os contribuintes portugueses.
São duras as palavras da viúva. "Não era nem criminoso, nem terrorista, nem assassino; era uma pessoa normal", diz, referindo-se ao pai dos seus dois filhos menores. E o "ódio" que confessa sentir pelo nosso país não se apagará certamente com uma conferência de Imprensa durante a qual um ministro tem a pretensão de achar que pode dar lições sobre direitos humanos aos portugueses.
É legítimo que vários partidos peçam "consequências políticas" para o caso de um cidadão espancado até à morte e que defendam que a demissão da diretora do SEF não é suficiente.
Por muito menos, já se demitiram ministros. Por muito menos.»
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10.12.20
Vergonha alheia
… é o único sentimento possível de quem ouviu o ministro de Administração Interna, Eduardo Cabrita, na conferência de imprensa de hoje. Para além de tudo o resto, como é possível ele afirmar isto, depois de tudo o que se passou – e se escreveu – nos últimos nove meses!
«Congratulo-me pelo facto de ter estado quase sozinho, perante o desinteresse de todos os comentadores, generalidade da Comunicação Social. Tantos que não ligaram nada ao que disse em Março ou Abril. Agora estão preocupados com esta situação. Bem vindos ao combate pela defesa do Direitos Humanos».
Esperemos para ver se Marcelo não vai dar o «empurrão» que falta para que Cabrita ceda a cadeira: as afirmações desta tarde parecem um remake do que aconteceu com a ministra Constança em 2017.
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10.12.1948 – Declaração dos Direitos Humanos
Em 10 de Dezembro de 1948, os países-membros da ONU aprovaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos, com 48 votos a favor e 8 abstenções (União Soviética, Bielorússia, Ucrânia, Polónia, Checoslováquia, Jugoslávia, Arábia Saudita, e África do Sul). A iniciativa surgiu como uma reacção às atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra.
A Declaração lida por Eleanor Roosevelt.
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Presidenciais 2021
«Francisco Ramos, coordenador do plano nacional de vacinação para a Covid-19, apoia a candidatura Marisa Matias à presidência da República.
O antigo presidente do Instituto Português de Oncologia (2012 a 2018) tem ainda no currículo o facto de ter sido secretário de estado da Saúde em cinco governos socialistas. Começou com Maria de Belém Roseira, depois com Manuela Arcanjo, Correia de Campos, Ana Jorge e, a última vez, entre Outubro de 2018 e Outubro de 2019, na equipa de Marta Temido.»
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Os cidadãos da Polónia e da Hungria acreditam no Estado de direito. Será que a UE os apoiará?
«Ao mesmo tempo que os líderes europeus se reúnem, esta semana, em Bruxelas para tentar desbloquear 1,8 biliões de euros de financiamento da UE, edifícios municipais em Varsóvia e a Estátua da Liberdade em Budapeste serão iluminados de azul. Esta acção, organizada por grupos de campanha e pelos presidentes de câmara destas cidades, é um poderoso lembrete da trajectória sombria que a UE tem pela frente se se colocar à margem enquanto o Estado de direito se extingue na Polónia e na Hungria. É um apelo à solidariedade com os milhões de cidadãos de ambos os países que defendem que o financiamento da UE deve depender da defesa destes direitos fundamentais por parte dos seus governos.
A distribuição de fundos da UE relacionada com o combate à covid-19 e com o orçamento 2021-2027 tem sido, até ao momento, vetada pelo húngaro Viktor Orbán e pelo polaco Mateusz Morawiecki, espelhando a relutância destes em aceitar que a adesão à UE depende da defesa de tais valores.
Não se trata, naturalmente, de uma nova luta para estes dois líderes. Há anos que nós, na Polónia e na Hungria, temos vindo a lutar contra os nossos governos nacionais que minam os valores fundamentais da Europa: democracia e direitos humanos. Centenas de milhar de nós têm saído à rua, ano após ano, para lutar contra as suas tentativas de controlar os meios de comunicação social, o poder judicial e os sistemas democráticos do nosso país.
A lista de violações do Estado de direito, da sociedade civil, da independência judicial e da liberdade de imprensa nos nossos países é longa. É bem conhecida a história de o governo húngaro ter espezinhado a liberdade académica ao tornar impossível o funcionamento da Universidade Centro-Europeia em Budapeste – a primeira vez que uma universidade foi forçada ao exílio desde a Segunda Guerra Mundial. Na Polónia, o partido do governo, Lei e Justiça (Pis), assumiu o controlo do anteriormente independente Conselho Nacional da Magistratura – ao assegurar que a nomeação, promoção e disciplina dos juízes da nação é decidida por pessoas leais ao partido.
No momento que escrevo, a PKN Orlen, empresa petrolífera estatal polaca, acaba de comprar a Polska Press, um meio de comunicação social privado que chega a 11 milhões de polacos todos os dias. Os críticos estão a expressar preocupação e têm motivos para isso, dado o padrão de acontecimentos na Hungria de Orbán. Aqui, os meios de comunicação social independentes têm caído, um após outro, nas mãos de figuras ligadas ao Governo – ao ponto que, neste momento, quase não existe no país qualquer meio de comunicação governamental independente ou crítico.
Não é exagero dizer que, na Polónia e na Hungria, a democracia está ameaçada. Numa grande sondagem feita aos cidadãos, no ano passado, dois terços dos polacos (64%) revelaram ser da opinião de que o Estado de direito estava a ser minado no seu país. Já na Hungria, 58% dos inquiridos mostraram sentir que o seu sistema político estava “fracturado”.
Ainda me lembro das celebrações na minha cidade natal quando a Hungria aderiu à União Europeia, em 2004. Para aqueles que tinham crescido atrás da Cortina de Ferro, foi um momento em que soubemos que estaríamos a salvo da tirania e que seríamos parte de um colectivo, com os nossos amigos europeus.
Com a nossa adesão à UE, pudemos passar por reformas que solidificaram e reforçaram o Estado de direito, que nos garantiram liberdades e que nos permitiram viver e prosperar como europeus. E esta é uma posição que se reflecte sondagem após sondagem – recentemente foi revelado que 73% dos polacos e 65% dos húngaros acreditam que a adesão à UE tem sido benéfica para a prosperidade do seu país.
Colectivamente, nos grupos aHang e Akcja Demokracja, temos apoiado centenas de milhares de cidadãos na Hungria e na Polónia que acreditam num mecanismo do Estado de direito para o financiamento da UE. Temos recebido mensagens como “estar em corpo e espírito na Europa era o meu sonho de juventude”, “a adesão da Polónia à UE foi um dia muito especial para mim” e “as actuais acções do Governo polaco são um crime contra os seus cidadãos”. Estes sentimentos estão a ser amplamente difundidos e são ignorados por Orbán e Morawiecki.
Esta semana, os líderes da UE têm uma opção a tomar. Podem apaziguar Orbán e Morawiecki e, com isso, desapontar os cidadãos da Hungria e da Polónia que se preocupam com o Estado de direito e as liberdades essenciais. Isto encorajaria os dois líderes e mostraria a outros líderes nacionalistas que as tácticas de chantagem podem ser eficazes. Além disso, isto fomentaria uma nova mudança para o autoritarismo, não apenas na Hungria e na Polónia, mas em toda a Europa, o que causaria uma fractura desnecessária da UE-27. Uma alternativa seria enfrentar estes “tigres de papel” e colocar-se ao lado dos cidadãos destes dois países para defesa dos nossos valores, como europeus.
Nós, bem como centenas de milhares de cidadãos da Hungria e da Polónia, exortamo-los a manterem-se firmes perante as tácticas de intimidação de Orbán e Morawiecki e a darem um exemplo de como a Europa lida com autocratas. Os líderes europeus deveriam seguir o exemplo dado pelas centenas de milhares de cidadãos da Polónia e da Hungria: não deveriam comprometer a democracia nem o Estado de direito – deveriam defendê-la a todo o custo. Só isso tornará a Europa mais forte.»
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9.12.20
SEF e vergonha alheia
«O director nacional adjunto, José Luís do Rosário Barão, vai assumir a direcção “em regime de suplência”. Com o também director adjunto Fernando Parreiral da Silva irá coordenar um processo de reestruturação do SEF.»
Será que a reestruturação do SEF, assegurada pela velha prata da casa vai continuar a prever o inqualificável BOTÂO DE PÂNICO recentemente anunciado?
Entretanto: «Até segunda-feira, ninguém do Estado — presidente da República, primeiro-ministro, ministro da Administração Interna, a própria directora nacional — tinha contactado a família de Ihor Homenyuk, que deixou uma viúva e dois filhos menores.»
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Um negócio multimilionário
«Chama-se Margaret, tem 90 anos, foi a primeira pessoa no Mundo a receber a vacina da Pfizer/BioNTech. A mesma que, esperamos todos, chegará aos portugueses nos primeiros dias de janeiro.
Foi às 6.45 horas de ontem, em Coventry, no Reino Unido, país onde se prevê que sejam administradas quatro milhões de vacinas só até ao final deste mês.
É um momento simbólico e de esperança. Mas é também um momento em que se confirma que a pandemia não atinge todos por igual. A vacinação começa por um dos países mais ricos do Mundo, como foram os países mais ricos do Mundo (Estados Unidos e União Europeia) a arrebanhar a maior parte do número limitado de primeiras doses desta e de outras vacinas (a da Moderna é a segunda na fila).
O alerta é de Sidney Wong, dos Médicos Sem Fronteiras, que não terá nunca o impacto mediático de Margaret. Um alerta e um apelo, porque, como acrescenta, é urgente que multinacionais farmacêuticas como a Pfizer e a Moderna partilhem com outros a propriedade intelectual e a tecnologia que permita a produção massiva de vacinas à escala global.
Por outras palavras, as vacinas que permitem salvar vidas e retirar a humanidade de uma crise sanitária, económica e social sem precedentes, não podem ser apenas mais um negócio multimilionário. Sucede que o simples facto de o alerta estar a ser feito nesta altura é a melhor prova de que assim será.
Há alguns dados dispersos sobre quanto estarão a cobrar as farmacêuticas por cada cidadão vacinado (40 euros a Pfizer, 60 euros a Moderna, tendo em conta que são necessárias duas doses), mas nada sabemos sobre qual é a sua margem de lucro. Como não sabemos até que ponto estão as farmacêuticas a incorporar nos seus proveitos os milhares de milhões de fundos públicos canalizados para as diferentes investigações. Ou o conhecimento científico que é património comum e público.
Ao contrário, sabemos que, entre março e dezembro, a BioNTech, parceira da Pfizer, valorizou 258% em bolsa (de 28 para 99 euros por ação), e que cada ação da Moderna passou, no mesmo período, de 25 para 125 euros. Vale uma aposta que nas próximas listas de bilionários globais algumas fortunas vão engordar substancialmente?»
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8.12.20
40 anos sem John Lennon
John Lennon morreu em 08.12.1980, baleado à porta do edifício onde morava – o Dakota Building –, situado numa das esquinas do Central Park de Nova Iorque.
Primeiro um entre quatro, mais tarde a solo, «the smart Beatle», deixou uma marca que quatro décadas passadas sobre o dia em que foi estupidamente assassinado não apagaram.
Músico por excelência mas não só, activista também, ele que devolveu a medalha de Membro do Império Britânico à Rainha Isabel II, como forma de protesto pelo apoio do Reino Unido à guerra do Vietname e o envolvimento no conflito de Biafra. Já com Yoko, na década de 70, continuou a envolver-se numa série de iniciativas de luta pela paz, sobretudo e ainda por causa do Vietname. Tudo isto e o apoio explícito a organizações da extrema-esquerda, como os Panteras Negras, estiveram na origem de uma perseguição por parte do governo de Nixon com abertura de um processo para tentativa de extradição.
«Give peace a chance» (1969) e «Power to the people» (1971), entre outras, inscrevem-se expressamente nesta linha de actuação:
E «Imagine», sempre:
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Zona Franca da Madeira: licença para abusar
«Todos os anos, Portugal perde 850 milhões de euros devido ao abuso fiscal proporcionado por offshores e jurisdições semelhantes, dados da Tax Justice Network (TJN). É o equivalente ao salário anual de quase 50 000 enfermeiros.
Nem é preciso falar aqui do branqueamento de capitais. A simples evasão fiscal já é uma corrida para o fundo. Não se trata de eficiência económica, mas de concorrência desleal por parte de algumas empresas e indivíduos, com a consequente delapidação das receitas fiscais globais, com particular incidência nos países mais pobres.
Esta constatação não impediu Portugal de criar o seu próprio offshore, disfarçado de apoio económico à região ultraperiférica da Madeira. Em 2011, ano de crise e austeridade, foi publicado o livro "Suite 605". Nele, João Pedro Martins relata as histórias de fraude e evasão que levaram centenas de empresas a registarem-se na mesma suite 605, no Funchal. Alguns desses casos são bem conhecidos: Isabel dos Santos, apanhada no escândalo Luanda Leaks, a filha do ditador da Guiné Equatorial ou futebolistas famosos em fuga ao fisco. Outros casos, menos mediáticos, passam pela criação de empresas falsas para onde rendimentos de grupos económicos são canalizados, aproveitando as isenções e reduções de taxa, sendo depois distribuídos das formas mais criativas. Neste sistema, perdem os países de origem mas também a Madeira, que viu o seu PIB falsamente inflacionado, com redução de acesso a apoios comunitários.
Dirão que o offshore da Madeira já não tem a agressividade de outros tempos. É certo, mas nem por isso deixa de ocupar lugares respeitáveis nos índices que medem os graus de sigilo financeiro e facilitação fiscal em todo o Mundo. O prejuízo global causado pelo regime deverá rondar os 450 milhões de euros.
Os defensores da Zona Franca da Madeira argumentam com os benefícios para a criação de emprego e riqueza na região. Mas era há muito evidente que estes critérios não eram cumpridos. Os postos de trabalho eram falsos, assim como as empresas e, por isso, logo em 2016, o Bloco quis criar regras de cumprimento e verificação desses critérios. Essa proposta foi rejeitada por PS, PSD e CDS, os mesmos partidos que juravam que o regime servia para... criar emprego e riqueza na Madeira. Também a Comissão Europeia decidiu investigar e acaba de confirmar que houve fraude às regras, tal como há anos denunciamos.
Veremos se é desta que a hipocrisia do PS acerca do abuso na Madeira é abalada. Refere a imprensa que, na confusão das votações orçamentais sobre a medida do Novo Banco, quando a publicação destas conclusões estava iminente, o Governo terá tentado alterar o voto dos deputados do PSD Madeira com promessas sobre a Zona Franca, não se sabe bem quais. É um mau prenúncio num tema em que tanta transparência e rigor têm faltado.»
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7.12.20
O excepcionalismo das gerações do presente…
«Atendendo ao progresso tecnológico e humano que se observa no presente parece difícil não acreditar nas gerações actuais.
Focando a atenção na área das tecnologias de informação note-se que os primeiros computadores pessoais da IBM surgem somente em 1981. Posteriormente, o processador de texto da Word Perfect e a folha de cálculo Lotus 123, aplicações que contribuíram para o sucesso desses computadores, são engolidas no turbilhão da História pelo Word e Excel da Microsoft. Não será um caso em que a economia imita a biologia e a teoria de Darwin da selecção natural (ou da tese da sobrevivência do mais apto, de Herbert Spencer). Parece mais um caso de uma jogada de xadrez, em que a Microsoft deliberadamente aproveitou a sua vantagem nos sistemas operativos para entrar em novos mercados e varrer do mapa a antiga concorrência (a Lotus antes tinha feito algo similar à VisiCalc), i.e., utilizando a analogia biológica, exterminar espécies que nem sequer eram inicialmente concorrentes, num episódio de “genocídio tecnológico”. E o que dizer dos omnipresentes “browsers” (navegadores) da internet, que surgiram 12 anos depois (1993) e que nos abriram as enciclopédias, as bibliotecas, as palavras de pessoas e os mercados do mundo. A revolução nas telecomunicações móveis iniciou-se pouco depois, com o telemóvel (e, a partir de 2007, do iPhone da Apple, os “smartphones”) a tornar-se na primeira tecnologia global com cinco mil milhões de subscritores únicos (i.e., cerca de dois terços da população mundial) e 7,7 mil milhões de números (subscrições) móveis, em 2017.
Essa revolução tecnológica continua e até parece acelerar em interacção com a dinâmica da economia mundial.
Parece assim existir fundamento para a convicção da tese da excepcionalidade do presente, a tese tão bem resumida por Reinhart e Rogoff (em relação às dívidas soberanas) com o título do livro “Desta vez é diferente”.
No entanto, como nos alerta Viriato Soromenho-Marques tão incansavelmente, esta é também uma era de profunda arrogância e ignorância intelectual que esquece a fragilidade que é habitar o equivalente a uma estreita margem de uma casca de maçã sem preocupações de monta pela saúde da mesma. Em particular, se se olhar para os problemas da Humanidade, das tremendas desigualdades aos problemas ambientais, é impossível não sentir insatisfação pelo actual estado de coisas e imensa responsabilidade perante as gerações que nos seguem.
Assim, temos este confronto entre as provas das nossas capacidades colectivas e esse precipício para onde parecemos caminhar convencidos da nossa própria invencibilidade.
6.12.20
Directora do SEF, um escândalo inaceitável!
«Afirma que lhe "esconderam a verdade". Mas pelo menos desde 19 de março que Cristina Gatões sabia que havia suspeita de homicídio e que a PJ estava a investigar. Até 30 de março, porém, nada fez - e segundo o ministro da tutela nem a ele informou.»
E continua a exercer o cargo!
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Natal em Agosto?
Os portugueses adaptam-se a tudo. Hoje, o restaurante onde almocei às 12h, estava bem mais «composto» do que nas semanas passadas e, em breve, teremos horários de europeus do Norte – benefícios colaterais de emergências.
Pena é que o governo não tivesse proposto festejos do Natal em Agosto, quando as autoridades nos aconselharam a dar a volta em Portugal como turistas. A segunda vaga não teria sido pior do que foi por esse motivo, tinha-se evitado a complicação ontem anunciada e os respectivos riscos, até estavam cá os emigrantes que escusavam de gastar dinheiro agora, Marcelo tinha-nos desejado Boas Festas em calções e eu tinha recordado a minha infância em Moçambique, com árvores de Natal ao ar livre, luzinhas, flocos de neve e 40 graus no termómetro. Fica a sugestão para 2021, se necessário for.
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Com a vacina à vista, é estúpido morrer na praia
«Estamos a entrar numa nova fase que muda radicalmente a nossa perspectiva sobre a pandemia da covid-19. Não eliminará os constrangimentos que fomos forçados a adoptar para nossa defesa. Mas Dezembro de 2020 é uma linha divisória. Há um antes e um depois que, embora parecidos, têm um significado desigual. Saímos de uma fase defensiva, e algo cega, para entrar numa outra, em que passa a haver uma perspectiva. Será um tempo mais exigente, para os cidadãos, para a política e para os governantes.
A questão chave é que a chegada das vacinas não é o fim da pandemia, nem da recessão económica, nem das restrições a que estamos submetidos. A vacina é apenas um primeiro passo. O que é relevante é que desencadeia um novo processo.
O desafio político é agora prevenir o cepticismo ou a frustração dos que esperam uma imediata vitória sobre a pandemia. O cansaço das restrições vai acentuar-se, como efeito indirecto das expectativas criadas pela notícia das vacinas. Avisam os cientistas: não podemos baixar a guarda. Este Natal vai ser um teste. Agora, que há uma sólida esperança, seria estúpido morrer na praia.
Em 31 de Dezembro de 2019, a China comunicou à Organização Mundial da Saúde a existência de uma pneumonia de causas não identificadas. Seguiu-se uma devastadora pandemia. Onze meses depois, num espantoso salto em frente da ciência e da tecnologia biológica, o coronavírus foi identificado, estudado e surgiram vacinas que se prevêem eficazes. Vacinas produzidas e testadas em menos de um ano e não nos cinco ou dez habituais. É uma prodigiosa aventura da investigação e da indústria.
A confiança
Governos e responsáveis da saúde terão de explicar aos cidadãos que se inicia um combate de longo fôlego. Muitos esperam que, iniciada a vacinação, sejam levantadas as restrições – recolher obrigatório, condicionamento de viagens, normalização dos horários comerciais ou da vida nocturna.
Mas a máscara e a distância social continuarão a limitar a nossa “vida social”. Suportaremos, por tempo ainda indefinido, a privação do contacto físico e a mutilação das nossas redes de relações. A limitação à conversa electrónica continuará a empobrecer-nos. A vida cultural está profundamente ferida.
Antes de Dezembro, isto tinha um sentido deprimente, era o último e frágil recurso de defesa perante a “peste”. Hoje, com a vacina, ganha outro sentido: é a janela por onde poderemos vislumbrar a saída da crise. Há, enfim, uma meta à vista.
Muitos dos novos hábitos vieram para ficar. O comércio digital está a expandir-se e o teletrabalho vai em grande medida permanecer. Surgirão graves problemas na criação de empregos ou na requalificação dos trabalhadores. A pandemia desencadeou um processo de destruição criadora. Mas, primeiro, destrói.
Não haverá regresso automático à “normalidade” de 2019. A simples descoberta deste facto, de que hoje há uma consciência muito ambígua, criará frustração e tensões sociais. Caberá ao poder político falar com rigor e seriedade aos cidadãos, enquanto dos media se espera realismo perante as expectativas. A questão da confiança é agora mais importante que na fase anterior.
Exasperação
Os cientistas ainda não conhecem todas as virtualidades e limites das vacinas. Não sabemos por quanto tempo garantem a imunização, nem a medida em que anularão os riscos de contágio. As campanhas de vacinação serão longas. Mesmo começando em Janeiro, os europeus terão de esperar meses, talvez muitos meses. Haverá conflito sobre as prioridades. A vacinação tenderá a ser desigual, em termos sociais e geográficos. A logística de uma vacinação em massa é um gigantesco empreendimento, que exige extrema competência. Ninguém perdoará os erros.
Num artigo recente, dois investigadores da universidade Johns Hopkins, Josh Michaud e Jen Kates, fazem o balanço dos muitos obstáculos a vencer e tiram algumas conclusões. “Como resultado, o risco de surtos continuará depois de ser posta em marcha a primeira geração de vacinas. As medidas de distância social, o controlo das fronteiras e outras formas de intervenção pública deverão permanecer por muitos meses. É possível que se siga uma desilusão, especialmente em relação às desigualdades na saúde, que se tornarão mais visíveis entre países e dentro do mesmo país” (Foreign Affairs, 2 de Dezembro).
Acrescentam: “Estas frustrações populares podem agravar o cepticismo sobre as vacinas e fomentar uma ainda mais perigosa desinformação, complicando os desafios dos programas globais de imunização.”
Europa
Ao contrário da maioria dos asiáticos, os ocidentais, europeus ou americanos, não souberam prevenir a segunda vaga da pandemia. Após um êxito inicial foram tentados a baixar a guarda. As populações estariam saturadas. A economia não devia permanecer parada. O relaxamento no Verão foi fatal.
No entanto, a literatura científica era clara: o regresso precipitado a uma relativa “normalidade” antes de haver uma vacina provocaria o retorno da pandemia numa forma mais agressiva.
O escritor italiano Daniele Rielli contesta o argumento da economia: “A escolha entre saúde e economia é um dilema mal formulado porque uma gestão prudente da economia, sem as loucuras e o laxismo estivais, talvez com um breve confinamento de duas semanas em Outubro, teria sido muito melhor para a economia.”
Ao contrário do que alguns anteciparam, a China não ganhou a “batalha das vacinas”. Pode ter muitos clientes e marcar pontos. É possível que as vacinas chinesas e russas venham a mostrar-se eficazes. Mas a falta de transparência e o desrespeito das regras de certificação feriram a sua credibilidade científica. Neste terreno, ganharam americanos e europeus.
O que a China e a Ásia estão a ganhar é a batalha da recuperação económica. A retoma do crescimento acelera-se no Extremo Oriente, em parte arrastado pela China. A América está a meio caminho. Na cauda, está a Europa. A Alemanha e França fecharão o ano com números negativos. Um factor decisivo será a capacidade europeia de lançar uma vacinação em massa. A eclosão de uma terceira vaga ser-nos-ia fatal.
Os governos têm pela frente tremendas tarefas com as campanhas de vacinação e um duro Inverno em perspectiva. Os próximos meses podem ser terríveis. A única forma de responder à exasperação popular é uma relação de confiança.
Aos cidadãos cabe perceber que, agora, é a vez de assumirem um papel activo no combate à covid. Repito: seria estúpido morrer na praia.»
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