22.1.11

Meio século é algum tempo


Tinha acabado de ler um texto sobre o papel da blogosfera nos recentes acontecimentos tunisinos, quando o DN me recordou o cinquentenário do assalto ao Santa Maria.

Impossível não tentar imaginar o que podiam ter sido transmissões televisivas em directo de um acto com tal espectacularidade, para além de posts em blogues, Causas no Facebook, horas sem parar no Twitter, milhões de sms’s, etc., etc. Mas nada disso então existia, tudo foi bem diferente e meio século mudou de facto o mundo (e, inevitavelmente, o funcionamento das nossas cabeças).

Sei que pouco ou nada foi conhecido nesse dia em Portugal, por razões óbvias de exercício da censura, mas não resisto a partilhar o meu 22 de Janeiro de 1961. Estudava então em Lovaina, na Bélgica, e a directora da residência universitária onde eu morava veio acordar-me para me dizer que um navio português tinha sido assaltado por piratas, em pleno alto mar.

Entre a perplexidade generalizada e o gozo («ces portugais!…»), passámos horas colados a roufenhos aparelhos de rádio, sem conseguirmos perceber, durante parte do dia, o que estava concretamente em jogo, já que não eram identificados os piratas nem explicados os motivos da aparatosa aventura.

Quando, já bem tarde, foi referido o nome de Henrique Galvão e descrito o carácter político dos factos, pudemos finalmente dar explicações às nossas colegas de residência, das mais variadas nacionalidades (só raparigas, claro, «eles» apenas podiam entrar para as refeições). Houve festa, brindou-se à queda da ditadura em Portugal – para nós iminente a partir daquele momento, sem qualquer espaço para dúvidas – e… mascararam-nos, em jeito de comemoração.

Não fosse esta foto, que fui hoje buscar ao meu baú quase inesgotável, e talvez já nem me lembrasse dessa noite. Um pouco kitch? Certamente: há 50 anos, a vida era, toda ela, bem mais ingénua do que em 2011.

(Na primeira fila, eu e a Maria Belo.)
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Aníbal e Maria, em dia de reflexão (2)

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Nota oficiosa da Comissão Nacional de Eleições - Voto em branco


Tem circulado de forma generalizada na Internet e através de correio electrónico uma mensagem de apelo ao voto em branco. Esta mensagem induz os cidadãos em erro, na medida em que afirma que se for obtida uma percentagem maioritária de votos em branco a eleição do Presidente da República, do próximo dia 23 de Janeiro de 2011, será anulada.

Por essa razão, um número significativo de cidadãos tem vindo a solicitar à Comissão Nacional de Eleições esclarecimentos sobre a veracidade da informação divulgada.

No sentido de promover o esclarecimento objectivo dos cidadãos a este respeito, a Comissão Nacional de Eleições vem informar o seguinte:

- Os votos em branco e os votos nulos não têm influência no apuramento dos resultados;
- Será sempre eleito, à primeira ou segunda volta, o candidato que tiver mais de metade dos votos expressos, qualquer que seja o número de votos brancos ou nulos.

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Aníbal e Maria, em dia de reflexão (1)

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Reflectir em quê, exactamente?


E pronto: regressou o sossego e um silêncio agradável mas incompreensível.

Entendia-se que a propaganda eleitoral fosse proibida no dia das eleições para impedir que bandeiras e fanfarras se instalassem à porta das secções de voto (como no Brasil), mas sempre me escapou a razão de ser desta pausa sabática, no sentido etimológico da palavra.

Favorece a abstenção dos menos empenhados – tantos, cada vez mais – que ligam à terra na sexta-feira à noite e fazem por esquecer que têm uma tarefa desinteressante a cumprir daí a dois dias.

Uma ideia peregrina e paternalista como tantas outras e que perdeu todo o sentido, se é que o tinha, com a generalização da internet, das redes sociais e dos sms’s. Seria interessante ver a CNE interceder junto dos senhores do Facebook, tão misteriosos como os mercados, para eles suspenderem utilizadores ou apagarem posts. Lá chegaremos?

Inércia, conservadorismo bacoco, saudades da máquina a vapor.

P.S. - Ler: Ferreira Fernandes, O irreflectido dia de reflexão
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Até Domingo?


Isso é que era bom! Eu já reflecti e vou andar por aqui.


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21.1.11

Analfalbetismos

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Conselhos de (antepen)última hora


Quem pensava votar em Cavaco no Domingo está dispensado de o fazer, já que todas as sondagens lhe dão vitória logo à primeira volta.

Aos outros, vale a pena recordar que, nas vésperas das eleições de 2006, as mesmas sondagens lhe davam percentagens mais elevadas do que aquelas que prevêem este ano e que só não existiu segunda volta por uma curta margem de 30.000 votos. Para bom entendedor…
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Uma carta de Cesare Battisti


No seguimento do último texto que aqui publiquei, reproduzo uma carta divulgada hoje pelo Passa Palavra.

Caros companheiros(as), há meia hora, nesta terça, antes da visita dos companheiros decidi escrever um recado para todos vocês que participam dessa luta em meu favor. Resultado: pouco tempo para escrever algo vigoroso; cabeça cheia de insultos grifados de uma cela a outra; e o espírito fica longe: palavras que não se deixam prender e, enfim, o recado é para já.

Tem-se dito e escrito tanto sobre esse “Caso Battisti” que já não sei mais distinguir direitinho o eu do outro. Aquele Battisti surgido do nada e jogado pela mídia como pasto para gado. Mas essas são só palavras, vazias como as cabeças desses mercenários que costumam facilmente trocar a pistola com a caneta e até uma cadeira no Congresso. No entanto, os companheiros/as de luta, assim, todos/as aqueles que ainda sabem ler atrás da “notícia”, vocês sabem quem é quem, qual a minha história e também a manipulação descarada que está servido a interesses políticos e pessoais, de carreira e de mercado: em 2004, depois de 14 anos de asilo, a França de Sarkozi me vendeu à Itália de Berlusconi em troca do trem-bala [comboio de grande velocidade] de Lyon-Turin. Desde o ano 2000 estamos assistindo à impiedosa tentativa do estado italiano enterrar definitivamente a tragédia dos anos de chumbo, jogando na prisão e levando à morte o bode expiatório Cesare Battisti.

Entre centenas de refugiados dos anos 70 que se encontram em vários países do mundo, não fui escolhido eu por acaso nem pela importância do papel de militante, mas pela imagem pública que eu tinha enquanto escritor, o que me dava o acesso à grande mídia para denunciar os crimes de Estado naquela época e os atuais…


«O Quinto Cavaleiro»


«Quem o garante é economista e professor de Economia, ex-catedrático e tudo e, se ele o garante, quem é o povo para duvidar?

Ora o que ele garante é que, se o povo não o eleger já no domingo, como é "essencial", abrir-se-ão os mares e desabará o céu. E pior acontecerá em terra: a sua não eleição à primeira volta provocará imediatamente, avisa ele, "uma contracção do crédito e uma subida das taxas de juros", com consequências apocalípticas para "empresas e famílias".

"Imaginem o que seria de Portugal, na situação económica e financeira complexa em que se encontra, se prolongássemos por mais algumas semanas esta campanha eleitoral", avisa de novo. O povo imagina e o que vê deixa-o petrificado de terror: ao lado da Morte, da Fome, da Peste e da Guerra, cavalga agora o Quinto Cavaleiro, o terrífico Mercado, e todos juntos precipitam-se a galope sobre "empresas e famílias".

Por isso o povo correrá a eleger o ex-catedrático no domingo. Ou no sábado, se lhe permitirem. Elegê-lo-ia até sem eleições (por exemplo, suspendendo-se a democracia por seis meses, assim se poupando milhões porque a democracia é cara). Só o ex-catedrático pouparia os 2,1 milhões de euros (um recorde absoluto) que gastou na campanha. E se, depois, na Presidência, poupasse ainda aos contribuintes uma parte dos 17,4 milhões que gastou em 2010 (outro recorde absoluto), talvez, quem sabe?, o crédito se descontraísse um poucochinho.»

Manuel António Pina, no JN

Está na hora!

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20.1.11

Não lembra ao careca


Mas a nada, nada mesmo, resiste o populismo de Cavaco Silva.

«Nós não podemos prolongar esta campanha por mais três semanas. Os custos seriam muito elevados para o país e seriam sentidos pelas empresas, pelas famílias, pelos trabalhadores, desde logo, pela via da contenção do crédito e pela subida das taxas de juro.»

Está nervoso, Presidente?
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A Internacional Socialista e o caso tunisino


Sobre "valores e princípios"

Tudo indica que as coisas, na Internacional Socialista (IS), funcionam assim: um partido que imponha uma feroz ditadura no seu país, que ocupe todos os escalões da Administração Pública com "boys" e homens de mão tornando-se um verdadeiro Partido-Estado, que pilhe os recursos colectivos e seja a cúpula política de uma gigantesca rede organizada de corrupção e nepotismo, "reflecte os valores e princípios que definem o nosso movimento" desde que vá mantendo o poder, nem que seja à custa de repressão e da violação sistemática dos direitos humanos.

Logo, porém, que se deixe apear e não ressuscite ao terceiro dia, passa imediatamente a não "reflectir os valores e princípios que definem o nosso movimento" e a IS já não o quer como membro.

Foi o que aconteceu ao RCD, partido do deposto ditador tunisino Ben Ali, que, três dias depois de este e família se terem metido no seu avião privado (acompanhados, segundo os media, de 1 500 barras de ouro do Banco Central) e fugido para a Arábia Saudita, foi expulso da IS por ter deixado de "reflectir os valores e princípios que definem o nosso movimento".

Isto é, durante os 23 anos em que esteve no poder, o RCD de Ben Ali prendeu, torturou, roubou e submeteu o povo tunisino sem que isso incomodasse a IS. Quando já não pode fazê-lo, é que os "os valores e princípios" da IS se ofendam.

O MPLA e o FPI de Laurent Gbagbo (entre vários outros) que ponham as barbas de molho.

Manuel António Pina, no JN.
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Outras presidências

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Há 50 anos, em 20 de Janeiro de 1961, Kennedy tomou posse como 35º presidente dos Estados Unidos, depois de ter vencido Nikon nas eleições que tiveram lugar em 8 de Novembro de 1960. Foi assassinado, em Dallas, menos de três anos depois.


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Só o meu Zé é que marcha direito


… terá dito a mulher do único soldado que tropeçava nos seus próprios pés, num batalhão inteiro de passo acertado. É o que me faz lembrar Vasco Graça Moura:

«Com esses contactos desmultiplicados e com as ideias claras que vai deixando um pouco por toda a parte, Cavaco Silva foi a única personalidade directamente envolvida nas eleições que não disse coisas estúpidas.»
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19.1.11

Aceleração da História


O sistema tunisino caiu porque deixou de meter medo, porque o protesto dos cidadãos ganhou uma dimensão e um poder extraordinários e porque o exército deixou cair Ben Ali.

A revolução foi feita por uma classe média culta e largamente laicizada, num processo de índole radicalmente diferente do que se passou na vizinha Argélia, onde imperaram motivos económicos. Na Tunísia, assistiu-se a uma revolta eminentemente política contra um regime opressor.

A ler, na íntegra, um artigo de Jorge Almeida Fernandes no Público de hoje: Uma revolução vinda de baixo e das classes médias.

Entretanto, no Parlamento Europeu:


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E eu que nunca geri o orçamento da minha família, dr. Cavaco!...


Ou da insuportável concepção que este ser tem das mulheres, como se todas fôssemos ainda membros da Obra das Mães!

«As mulheres portuguesas que gerem os orçamentos das famílias são as mais bem preparadas para identificar onde está o rumo certo, aqueles que as podem ajudar para melhorar o bem-estar dos seus maridos e dos seus filhos.»

Mas ouvido é outra coisa (minuto 1:10):


P.S. - Um leitor deixou a seguinte frase como comentário a este post, no Alegro Pianisimo: «As mulheres que desempenham um papel fundamental, um pilar na família, na protecção das crianças e fazem milagres com o orçamento limitado da casa» - António de Oliveira Salazar
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E que tal se o PS olhasse para o seu próprio saco de gatos?


PS prepara-se para acusar BE se Alegre for derrotado.
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18.1.11

O 18 de Janeiro de 1934


Texto de Diana Andringa, publicado em 18/1/2010 nos Caminhos da Memória.

Chegado ao poder em 5 de Julho de 1932, Salazar cuidou de preparar a base constitucional e legislativa do Estado Novo. A Constituição de 1933 incluía, no artigo 39º, a proibição da greve e do lock-out – já constante do Decreto-Lei nº 13.138 de 15 de Fevereiro de 1927 e reafirmada no artigo 9º do Estatuto do Trabalho Nacional (Decreto-Lei nº 23.048 de 23 de Setembro de 1933). O Decreto-Lei nº 23.050 de 23 de Setembro de 33 vai por sua vez instituir o princípio do Sindicato único.

E é contra este edifício legislativo, contra a “fascização” dos sindicatos e a ilegalização das organizações existentes, que se prepara, para o dia 18 de Janeiro do ano seguinte (1934), uma “greve geral revolucionária”.

Na véspera, no entanto, a PVDE prende alguns dos principais dirigentes sindicalistas e outros activistas ligados ao movimento. Ainda assim, em Lisboa, na noite de 17, explode uma bomba no Poço do Bispo e o caminho de ferro é cortado em Xabregas, enquanto que, em Coimbra, explodem duas bombas na central eléctrica. Há ainda movimentações em diversos outros pontos do país, como Leiria, Barreiro, Almada, Sines e Silves, sendo a mais forte na Marinha Grande, onde grupos de operários ocupam o posto da GNR e os edifícios da Câmara Municipal e dos CTT.

A repressão não se faz esperar. Diversos participantes do 18 de Janeiros estão entre os prisioneiros que inaugurarão, dois anos depois, a colónia penal do Tarrafal, onde vêm a morrer Pedro Matos Filipe, Augusto Costa, Arnaldo Simões Januário, Casimiro Ferreira, Ernesto José Ribeiro, Joaquim Montes, Mário Castelhano, Manuel Augusto da Costa e António Guerra.

Aproveitamos para divulgar hoje algumas páginas do Diário de Lisboa, que relatam os acontecimentos e as reacções oficiais à tentativa insurreccional ocorrida há 75 anos.
DL, 18/1/1934 - (1), (2) e (3)
DL, 19/1/1934 - (1) e (2)
(Documentos da Fundação Mário Soares)

A Nota Oficiosa emitida pelo Ministério do Interior é bem reveladora da gravidade dos factos:
«Pelos relatos dos jornais viu o país os sucessos das últimas vinte e quatro horas. Por eles poderá facilmente supor os que haveria, se o governo, conhecendo bem os preparativos da acção, não tivesse tomado as medidas requeridas pelas circunstâncias. Cessação do trabalho nas fábricas, paralisação de serviços de interesse colectivo e vitais para a população, atentados pessoais e manifestações de terror estavam previstos por parte de elementos que supunham poder arrastar para a projectada revolução social as massas trabalhadoras.
A apreensão de armamento, a oportuna prisão dos principais dirigentes e instigadores, a apertada vigilância exercida por todos os elementos e forças de segurança pública, do Exército e da Armada, a consciência cívica do País e o magnífico espírito de ordem dos trabalhadores em geral fizeram fracassar por toda a parte os planos extremistas em condições de não ser já possível a sua repetição. Não foi perturbada a tranquilidade pública nem a vida normal da população. Seguem-se agora naturalmente as sanções.

(Continuação nesta página do Diário de Lisboa.)
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Associações inevitáveis


... entre as imagens de Tunes e… as de Lisboa há quase 37 anos.


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Ide e lede

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Retrato de um malandro a caminho do socialismo
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E agora, Europa?


Quando se vivem na Tunísia dias decisivos para o sucesso da primeira revolução no mundo árabe, e se contesta nas ruas a anunciada formação de um governo de transição do qual farão parte vários ministros do executivo de Ben Ali, a França acorda para o erro de ter escolhido Ben Ali como parceiro de eleição. E, no entanto, «o facto de a Tunísia, entalada entre a efervescente Argélia e uma Líbia governada de modo errático, ter conseguido exibir uma relativa prosperidade e ser poupada pelo islamismo, não era suficiente para justificar uma tal recompensa». Mas Paris só encorajou os manifestantes de Tunes depois da fuga de Ben Ali…

Quanto à Europa, mantém-se em ziguezagues por não ter percebido a tempo a ingenuidade de querer resolver todas as questões de vizinhança com o Norte de África e com o Médio Oriente no figurino único da União Mediterrânica.

«O povo tunisino pode vangloriar-se por ter conseguido sozinho o que a Europa mal conseguia sonhar. Esperemos agora, neste momento decisivo, que o apoio da Europa não chegue demasiado tarde.»

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Serviço público


Há quem se interrogue sobre o impacto, ou mesmo sobre a legitimidade, da utilização de acontecimentos do passado dos candidatos em tempo de campanhas eleitorais.

Antes de mais, o facto de a respectiva divulgação ser feita preferencialmente nestes períodos deriva de um interesse especial da comunicação social por razões de puro marketing e é uma constante no mundo e no sistema político em que vivemos – para o bem e para o mal. O que talvez seja de lamentar é que não se trate de uma prática regular, ao longo da vida democrática das sociedades.

Indo directamente ao assunto, é importante, sim, que os portugueses tenham conhecimento, em Fevereiro de 2011 ou em Maio de 2009 ou de 2007, das tramóias que rodearam a aquisição da casa de férias do seu presidente da República. A ser verdade tudo aquilo que a mais do que insuspeita revista Visão revelou, na passada 5ª feira, há muitas explicações a serem dadas e uma democracia sólida e madura não toleraria que fossem esquivadas.

Nesse sentido, e correspondendo a vários pedidos de quem não conseguiu comprar um exemplar da Visão, divulgo o respectivo dossier num pdf que uma alma caridosa me fez chegar e que pus agora online.

Dar a conhecer os bastidores do mundo em que se move o nosso PR, no mínimo financeiramente tortuoso, não é coscuvilhice ou conversa de alcova. É serviço público, nada mais.
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17.1.11

Ação - ou os encantos do Acordo Ortográfico


O texto de Manuel Halpern já tem uns meses, mas só hoje o recebi por mail. E não pode exprimir melhor os meus engulhos com o dito Acordo…

Um cê a mais

Quando eu escrevo a palavra ação, por magia ou pirraça, o computador retira automaticamente o c na pretensão de me ensinar a nova grafia. De forma que, aos poucos, sem precisar de ajuda, eu próprio vou tirando as consoantes que, ao que parece, estavam a mais na língua portuguesa. Custa-me despedir-me daquelas letras que tanto fizeram por mim. São muitos anos de convívio. Lembro-me da forma discreta e silenciosa como todos estes cês e pês me acompanharam em tantos textos e livros desde a infância. Na primária, por vezes gritavam ofendidos na caneta vermelha da professora: não te esqueças de mim! Com o tempo, fui-me habituando à sua existência muda, como quem diz, sei que não falas, mas ainda bem que estás aí. E agora as palavras já nem parecem as mesmas. O que é ser proativo? Custa-me admitir que, de um dia para o outro, passei a trabalhar numa redação, que há espetadores nos espetáculos e alguns também nos frangos, que os atores atuam e que, ao segundo ato, eu ato os meus sapatos.

Depois há os intrusos, sobretudo o erre, que tornou algumas palavras arrevesadas e arranhadas, como neorrealismo ou autorretrato. Caíram hifenes e entraram erres que andavam errantes. É uma união de facto, para não errar tenho a obrigação de os acolher como se fossem família. Em 'há de' há um divórcio, não vale a pena criar uma linha entre eles, porque já não se entendem. Em veem e leem, por uma questão de fraternidade, os és passaram a ser gémeos, nenhum usa chapéu. E os meses perderam importância e dignidade, não havia motivo para terem privilégios, janeiro, fevereiro, março são tão importantes como peixe, flor, avião. Não sei se estou a ser suscetível, mas sem p algumas palavras são uma autêntica deceção, mas por outro lado é ótimo que já não tenham.

As palavras transformam-nos. Como um menino que muda de escola, sei que vou ter saudades, mas é tempo de crescer e encontrar novos amigos. Sei que tudo vai correr bem, espero que a ausência do cê não me faça perder a direção, nem me fracione, nem quero tropeçar em algum objeto abjeto. Porque, verdade seja dita, hoje em dia, não se pode ser atual nem atuante com um cê a atrapalhar.
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Vale tudo?


Vem explicado no Diário Notícias de hoje: «O acordo que os ministros da Administração Interna e da Justiça assinaram com os Estados Unidos da América (EUA) para a cedência de dados pessoais de portugueses não exclui a possibilidade de essa informação contribuir para uma condenação à morte, violando a nossa Constituição.»

O acordo em questão data de Julho de 2009, é público nos EUA mas não em Portugal (porquê?), e Rui Pereira garantiu recentemente que estava salvaguardado o respeito pelas leis nacionais.

Leiam-se as opiniões de penalistas, que o DN cita, e talvez não valha a pena vir argumentar que outros dirão o contrário. Porque, até para os leigos na matéria, o que é no essencial óbvio impõe-se e a pergunta só pode portanto ser uma: O que se segue? Vai haver esclarecimentos oficiais? Vale tudo porque se trata dos EUA e de antiterrorismo e nem é necessário explicar mais nada?

Talvez seja bom recordar que ninguém encontrou armas de destruição em massa no Iraque e o preço que foi pago por isso.
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16.1.11

A esperança em Tunes


Passei uma parte da tarde de hoje a tentar compreender o alcance dos recentes acontecimentos na Tunísia. Li dezenas de textos e deixo aqui, de um modo mais ou menos descosido (e multilingue…), o principal do que retive.

Os factos são conhecidos, o que está para vir ainda é naturalmente problemático, mas sublinho o que escreveu ontem Laurent Joffrin, director do Libération:
«Avant les prudences d’usage - va-t-on vers la démocratie, l’anarchie ou bien une autre dictature ? -, il est permis, ne serait-ce qu’une heure, de laisser éclater sa joie. Privé de ses sicaires, le tyran s’est dissous comme une statue de sable. Ce régime était en toc, et tous ceux qui l’ont tenu à bout de bras au nom d’une realpolitik des imbéciles doivent maintenant expliquer pourquoi celui qu’ils tenaient pour un rempart solide contre les islamistes est tombé comme un château de cartes.»
E entre esses que respaldaram Bem Ali até ao fim esteve o antigo colono, a diplomacia francesa ultrapassada pelos acontecimentos sem mostrar o menor sinal de apoio às reivindicações de democratização, que as manifestações iam demonstrando desde há semanas.

Mas o mais importante é provavelmente não esquecer que a sociedade tunisina tinha condições específicas propícias para o que agora aconteceu, bem diferentes das existentes nos seus vizinhos árabes, como João Tunes já sublinhou. Nunca estive na Tunísia mas, do que sei sobre este país e do mês (muito pouco turista…) que passei em Argel, ficou-me a certeza de estarmos em presença de realidades profundamente diferentes. Como o texto de El País, que João Tunes transcreve, resume muito bem:
«No se puede pedir lo que se ignora. La democracia exige un conocimiento previo de los valores laicos que la alimentan. Y dicho conocimiento no existe en ningún país árabe con la profundidad y arraigo que tienen en Túnez. El Gobierno de Burguiba desde la independencia hasta los años ochenta sentó las bases de un Estado laico y democrático. Un sistema educativo abierto a los principios y valores del mundo moderno, el estatus de la mujer incomparablemente superior al de los países vecinos y un nivel de vida aceptable en comparación con estos, pese a la carencia del maná del petróleo, formaron una ciudadanía consciente de sus derechos. En ello estriba la diferencia existente entre Túnez y los demás Estados árabes de la orilla sur del Mediterráneo.»
Finalmente, se tudo é ainda incerto, ninguém apagará este desabafo comovido de Jean Daniel, um dos fundadores do Nouvel Observateur, a poucos meses de chegar aos 90:
«Je suis un homme âgé. Mais il y a deux choses qui me rajeunissent et dont je suis reconnaissant au sort qui m'a permis de les vivre : la première a été, avec Obama, l'arrivée d'un noir à la Maison Blanche, la seconde de voir mes amis fraternels inaugurer la première révolution du monde arabe.»
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Um filme de animação de Fahem Med Ali: uma homenagem «aos mártires mortos pela liberdade»:


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Santos e ditadores


A propósito da beatificação de João Paulo II, Carlos Esperança recordou a sua intervenção a favor da libertação de Pinochet quando este foi detido em Londres, o que refrescou em mim outras memórias relacionadas com o Chile e com a actuação daquele papa.

Num silêncio pesado como chumbo, e apesar de protestos de católicos de vários países, o Vaticano nada denunciou, durante os doze anos em que o papado de JP II coincidiu com a ditadura de Pinochet.

Mas a América Latina não esqueceu:

«El mundo católico no para de llorar por la muerte de Juan Pablo II. El lamento por su desaparición ha resonado en todo el orbe al punto que ya se alzan voces proponiendo se santifique a Karol Wojtyla por su obra mundial. Pero una cosa es estar triste y otra cosa es cerrar los ojos a hechos no tan santos como cuando dio su respaldo a los dictadores de turno de América Latina y le volteó la espalda a hombres como Monseñor Oscar Arnulfo Romero que denunciaba la matanza de los desposeídos de su pueblo.

Quién no se acuerda de sus fotos hablando amenamente con Augusto Pinochet y bendiciéndolo en abril de 1987 y posteriormente saliendo con el dictador al balcón del Palacio de la Moneda donde murió trágicamente Salvador Allende. También los archivos guardan la felicitación personal del papa a Pinochet con motivo de su boda de oro. En 1999 abogó por la liberación de Pinochet cuando fue detenido en Londres. Mientras que sus relaciones con el jefe de la junta militar de Argentina, general Jorge Videla eran cordiales, jamás quiso recibir a las Madres de la Plaza de Mayo que anhelaban pedirle ayuda para saber sobre sus hijos y nietos, según se quejaron siempre ellas. (…)

Las Madres de la Plaza de Mayo, los familiares de los desaparecidos en Chile, El Salvador etc., no estarán de acuerdo en que Juan Pablo II sea santificado.»

Ou seja: vai-se buscar a cura de uma freira que, alegadamente, deixou de ter Parkinson por intervenção de um ser humano, para justificar uma «beatitude», e não se tem em conta o lado da barricada – neste caso a de um ditador, brutal como foi Pinochet - em que o mesmo ser escolheu colocar-se durante todo o seu longuíssimo pontificado. Peanuts, para os salões de S.Pedro…
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Duas versões, algumas décadas pelo meio

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(Via Cristina Gomes da Silva no Facebook)



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Finalmente, começo a estar de acordo com Cavaco




Mas: É preciso não ter mesmo vergonha na cara, coluna vertebral e várias outras coisas que em abstenho de elencar!
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