8.1.22

E António Costa o que é que prefere?

 

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08.01.1969 – Primeira «Conversa em Família» de Marcelo Caetano

 


Há 53 anos, Marcelo Caetano dirigiu a primeira das dezasseis «Conversas» ao país.

Não tenho a imagem e o som da primeira, mas deixo aqui o vídeo da última: em 28 de Março de 1974, já depois do golpe falhado das Caldas, ele não sabia – e nós também não – que nunca mais teríamos aqueles cinzentos e sinistros serões na sua companhia.


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O que revelam os debates

 


«Numa campanha eleitoral que se passa quase exclusivamente na comunicação social, os debates televisivos, mais de 30, acabam por ter mais importância do que se fossem mitigados por eventos de campanha, que a pandemia hoje não permite. (*) Já escrevi e repito, apesar da fúria de alguns jornalistas e gente de agências de comunicação que precisa de os bajular: uma campanha eleitoral totalmente dependente da comunicação social abre caminho a perversidades. Não se trata de mediação, que é suposto ser uma função fundamental da comunicação social, trata-se de opinião, de manipulação, de parti-pris, simpatias e antipatias escondidos sob a intangibilidade da condição profissional. Não é preciso ir mais longe do que a recente campanha interna no PSD em que a maioria dos jornalistas e órgãos de comunicação social fez campanha por Paulo Rangel e contra Rio. A coisa foi tão evidente que não é preciso dar exemplos, mas, se for preciso, abundam.

Os debates, quando não têm um interlocutor suplementar que interfere de forma agressiva no debate, prejudicando-o (como se passou em debates da SIC em que parecia que havia um terceiro participante na campanha), na parte em que há um genuíno frente-a-frente são reveladores e podem ter um papel na opinião traduzida no voto. Eles revelam, em primeiro lugar, as qualidades e defeitos pessoais dos antagonistas, traços de carácter por detrás da encenação, o que sabem ou não sabem, a inteligência, a capacidade de clareza, a riqueza vocabular, a cultura política ou a sua ausência, a experiência e aquilo a que os sociólogos chamam background assumptions, as ideias, preconceitos, gostos, que estão por detrás do discurso público. Nisto os debates são razoavelmente eficazes, e a logomaquia dos comentários posteriores pode ser útil na sua revelação e escrutínio.

É, no entanto, verdade que essa torrente de comentários, mesmo os melhores - porque muitos não têm pés nem cabeça e resultam em “notas” absurdas para mostrar como são originais os “professores” ou são exercícios de La Palisse –, se tornam em grande parte desnecessários porque os espectadores apreendem com facilidade este aspecto da comunicação, que é empático e por isso imediatamente transmissível. Por exemplo, a frieza de Catarina Martins e Rui Tavares, o cansaço de Jerónimo, a habilidade de Costa, os labirintos em que se enreda Rio, a agressividade monocórdica de Ventura, tudo isto se percebe de imediato, seja quais forem as simpatias que se tenha por cada um deles.

Depois, há um outro nível, que é o da racionalidade, normalmente num exercício de “revelação” do outro, em que o grande e o único exemplo foi o de Rui Tavares face a Ventura. Mas a racionalidade não abunda, porque coreografias e encenações, com truques habituais para gerar atrapalhação no outro e sound bites na comunicação social, são a matéria-prima dos debates. Quando Cotrim de Figueiredo disse que o Bloco de Esquerda era o “Bloqueio de Esquerda”, designação trazida no bolso de casa, acabou por conseguir que ela fosse repetida nos títulos comunicacionais – porque era para isso que tinha sido preparada –, mas por outro lado mostrava que nada mais do que dissera valia a pena repetir.

Ventura, que foi a personagem-chave nos primeiros debates pelo estilo agressivo, pareceu dominar, mas esse aparente domínio revelou algo que lhe é prejudicial, a repetição de acusações, invectivas, afirmações de peito cheio, mas de cabeça vazia, vai perdendo eficácia à medida que os debates com ele são sempre a mesma coisa. O seu único sucesso foi com Rio, que ele enredou em directo, com todos os outros ficou a falar sozinho, sem ter nada para dizer. Também aqui o debate mais conseguido foi o de Rui Tavares.

Aquilo para que os debates pouco servem é para discutir propostas ou programas de governação, com o tempo curto de mais para pensar e discutir a sério. Numa atitude hipócrita, a comunicação social está sempre a queixar-se de que não se discutem os “problemas dos portugueses”, porém aceita um modelo que impede qualquer discussão, mas que é bastante para o espectáculo, para os truques e armadilhas preparados. A rigidez da legislação eleitoral tem também um papel, ao multiplicar de forma absurda o número de debates para assegurar artificialmente a igualdade das candidaturas.

Há também um outro aspecto que é negativo nos debates tal como estes se têm desenvolvido. A obsessão de os transformar em combates, que é comunicacionalmente mais atractivo, impede que se tracem as “linhas vermelhas” com propostas antidemocráticas que o crescendo populista está a colocar em cima da mesa. Ora o populismo é a grande novidade na vida política portuguesa.

Não adianta chamar fascista a Ventura, que não o é, mas sim um extremista de direita, que já basta como epíteto e é mais correcto, mas já se ganhava alguma coisa se ele fosse confrontado com as suas propostas antidemocráticas que ele debita como se fossem “normais”. Um exemplo é a de “cortar” os lugares de “políticos” pela metade, ou a de cortar os salários dos deputados para metade, que parecem populares, mas que são intrinsecamente antidemocráticas. Alguém lhe explica que nos milhares de lugares “políticos”, nas autarquias, por exemplo, a esmagadora maioria não são remunerados, mas o sinal de uma dedicação à causa pública, ou uma democratização da participação popular? Ou que a demagogia sobre os salários dos políticos, conduz a que haja apenas candidatos desqualificados para quem qualquer salário é bom, ou lobistas ricos com rendimentos que não precisam de ganhar um tostão para beneficiar do acesso ao poder? Ou pura e simplesmente dizer-lhe que numa democracia há o primado da lei, e que as garantias de defesa e do ónus da prova são para todos, assassinos e corruptos incluídos. E que penalizar os “crimes de colarinho branco” com o dobro das penas dos assassinos é uma perversão da justiça, por muito que os seus apoiantes salivem com os “casos” de corrupção e se revelem indiferentes aos crimes de ódio. Em tudo isto e muito mais, tem havido falta de coragem para confrontá-lo, porque estas posições só são populares quando não se combatem com a intransigência da democracia.

Vamos ver como os debates continuam e como condicionam a ecologia da campanha.

(*) Não vi, à data em que escrevo este artigo, os debates com participação do CDS e do PAN, pelo que os julgamentos feitos não se lhes aplicam.»

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7.1.22

Os calceteiros

 


Calceteiros de Lisboa, 1907. 
Fotografia de Joshua Benoliel, AML.
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06.01.2022 – Debate Catarina Martins / João Cotrim Figueiredo

 


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Um tesourinho dos bons

 


O Facebook recorda-me que isto aconteceu há três anos. E cá vamos continuando com a cabeça entre as orelhas.
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António Costa: “uma noite mal dormida” ou insónias diárias?

 

«Em 2019, a “geringonça” tinha triunfado e mostrado ao país que sabia dar-lhe estabilidade. Com os cacos da “geringonça” agora espalhados pelo chão e por culpa de todos (não vale a pena Costa insistir em apontar o dedo a PCP e a BE), os primeiros debates televisivos já mostraram como os ânimos estão acirrados. Costa atirou-se ao ex-parceiro Jerónimo de Sousa com uma agressividade que deixou espantado o próprio líder comunista. Garantiu que não queria reerguer os muros que derrubou em 2015 ao mesmo tempo que dizia não confiar no PCP para novos acordos. Fez um vídeo inédito para criticar a prestação de Rui Rio no debate com André Ventura, no qual aquele admitiu uma prisão perpétua “mitigada”. Poupou descaradamente Rui Tavares, com quem o PS fez um acordo pré-eleitoral para a Câmara de Lisboa e que não esconde a vontade em estender a mão ao PS no dia 30 de Janeiro.

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Patins de rodas num pavilhão de gelo

 


«Harry Potter não foi convidado para um dos milhares de debates televisivos que vão, para alegria nacional, substituir as telenovelas no horário nobre televisivo. É pena, mas compreende-se. As magias que poderiam sair dos seus dedos são infinitamente menores que aquelas que os líderes partidários prometem aos crentes. A ilusão é tal que, segundo parece, Portugal pode transformar-se no paraíso. Ou no Dubai europeu.

Pura ilusão de óptica. Portugal é o sítio onde se praticam magias defeituosas, se contratam bruxos incapazes e, no fim, o prémio sai sempre aos mesmos. Estamos a um mês do Congresso da Magia para Crédulos, vulgarmente conhecido como eleições legislativas, onde os pretendentes ao grande prémio prometem transformar coelhos em elefantes, ovelhas em unicórnios e objetos inanimados em tartarugas. E, mesmo, como magia suprema, transformar os pobres e remediados em classe média. Aos espectadores apenas se pede que coloquem uns papéis dobrados na cartola.

E zás! A magia realizar-se-á! O mês de janeiro vai ser de patinagem artística com os desportistas da política a usarem patins de rodas num pavilhão de gelo. Haverá escorregadelas para todos os gostos.

O doutor António Costa quer a eternidade e o discurso único: “o que é a maioria absoluta? É metade mais um”. Pede pouco ao extenuado povo português, entre a pandemia e o regresso da “salvadora” austeridade que começa com a consoada da inflação. E que vai demolir o resto dos equilíbrios deste Estado social que os mais à Direita querem transformar numa “meritocracia” de alguns, sempre os mesmos. O que é propôr uma única taxa de IRS como clama orgulhoso o doutor Ventura, dizendo alto o que outros, mais selectos, pensam? Entre a situação e a oposição há mesmo um Harry Potter que faça a diferença nos truques e nas magias?

O professor Marcelo Rebelo de Sousa, olhando para este pântano quase tropical, pede “previsibilidade”. Da mesma forma que se pede chuva no Inverno e sol no Verão. Não é “previsibilidade” o que nos tem sido oferecido até agora? Não era previsível que a doutora Edite Estrela, depois de ter passado anos incógnita no Parlamento, possa ser recompensada com a presidência do mesmo? O doutor Medina, como já dissémos aqui há algumas semanas, é o grande sonho do doutor Costa para as Finanças. Depois do estado em que deixou Lisboa, hoje uma imensa catástrofe habitacional, quem melhor para lidar com as cativações deste antigo condado?

O que é que não era previsível no estranho caso do almirante Gouveia e Melo? É fruto de uma planta enxertada: a sonhada governamentalização das Forças Armadas (concretizada pela nova lei de Bases), objetivo há muito acalentado pelo PS e que também tem a benção de parte substancial do PSD. O vice-almirante, seduzido pelo sabor da maçã do poder, serve assim os objetivos: o poder político livra-se de uma voz incómoda (a do almirante demitido ao pontapé que se permitiu discordar da nova lei de Bases) e sossegam-se os anseios políticos do vice-almirante até à próxima jogada de xadrez. Mas estará dentro do sistema e, por isso, controlável. O dinheirito para reconverter o reabastecedor Bérrio já deve estar coberto pelo PRR. A próxima sucessão para um cargo superior nas Forças Armadas terá já a forma de nomeação de um administrador hospitalar feita pelo ministério competente. Previsivelmente, o doutor Cravinho também há-se ser presidente da AR ou de um grupo folclórico por serviços relevantes ao país.

A situação política nacional é um enorme episódio dos “Simpsons”. Onde o tempo passa mas os personagens continuam iguais. Desde o primeiro episódio da série, em 1989, até hoje, Homer trabalha na mesma central nuclear e Bart e Maggie não mudaram. No mundo sucedem-se os acontecimentos, mas os personagens são como o Dorian Gray criado por Oscar Wilde: nunca envelhecem. Da mesma forma os candidatos que se remexem ao sabor do vento nestas legislativas nem sequer arriscam. Lembremos que em 1997 foi colocado à venda o primeiro livro da série de Harry Potter, um mês antes de Tony Blair entrar no nº10 de Downing Street. Blair e Potter tinham semelhanças: tinham ganho reconhecimento pelo charme e novidade. Contra todos os bruxos do mundo (Voldemort, no caso de Potter, Bin Laden no caso de Blair), eles queriam pôr em causa a busca da imortalidade dos seus inimigos. Blair herdava a nação de Thatcher e quando ganhou o poder no Labour em 1994 era considerado um inocente. Ganhou a alcunha de Bambi. Mas depressa foi considerado um Estaline. “Da Disneylândia à ditadura em apenas 12 meses. Não sei qual prefiro”, diria mais tarde o então primeiro-ministro.

Harry Potter queria servir o mundo dos mágicos contra o dos tenebrosos bruxos. Blair tentava seduzir: “nós somos os servos, eles – os eleitores – são agora os mestres”. Mas Blair mostrou quão ténue era (e é) a linha divisória entre os conservadores e os trabalhistas, numa época em que as ideologias eram dinamitadas pela economia de mercado e pela globalização. Mas, no início, Potter e Blair queriam derrubar as estátuas da previsibilidade. Mas hoje o que propõem os nossos políticos? A previsibilidade do costume.»

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6.1.22

05.01.2022 – Debate Catarina Martins / Rui Rio

 


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Carta à República

 



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Perguntas que precisam de resposta

 


«Da conjuntura nacional de incerteza económica e sanitária dos dias em que vivemos, e de instabilidade política pelo aparente esgotamento da solução de 2015 com o chumbo do Orçamento do Estado, resulta uma dupla preocupação na generalidade da população portuguesa.

Primeiro: Um regresso às maiorias absolutas ou a permanência de soluções maioritárias através de coligações ou de acordos de incidência parlamentar? E qual o tempo de estabilidade política que a solução proposta pode oferecer?

Segundo: Quais são as medidas políticas e as ideias concretas para que o eleitorado possa percecionar com objetividade que respostas tem face ao clima de incerteza que se vive? O que vão fazer os partidos para combater a inflação, as taxas de juro (habitação), a degradação de serviços públicos, ou, na área económica, a execução dos milhões da Europa do Plano de Recuperação e Resiliência, a famosa bazuca?

Quando não há respostas, somam-se as perguntas. Quais são as soluções concretas para fazer face aos crescentes custos de energia, que impactam diretamente na vida das empresas e das famílias? E face à subida dos preços de bens essenciais num país onde cerca de dois milhões vivem no limite do aceitável? Para quando uma rede de creches que satisfaça as necessidades das famílias que moram em ambiente urbano? E quanto à escola pública, que precisa de ganhar competitividade face à crescente importância do ensino privado, que afunila a função de elevador social que só a Educação pode promover? E como é que se lida daqui para a frente com a pandemia, o maior fator de incerteza destes dias, sem que a economia fique bloqueada e protegendo um Serviço Nacional de Saúde estafado?

Na campanha, a começar pelos debates, poucas ideias concretas se têm visto. Pouco mais do que a exploração das inseguranças do eleitorado face ao quadro parlamentar que se adivinha poder sair das eleições do próximo dia 30. E essa sensação de fadiga instalada, sem respostas aparentes para os problemas com que se confrontam os portugueses, tem como consequência evidente a fragilização da Democracia. Saímos todos a perder.»

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Entretanto no Cazaquistão

 





Estive em Almaty há cerca de cinco anos. Tem quase dois milhões de habitantes, nela convivem cerca de 130 nacionalidades, foi capital política do Cazaquistão de 1929 a 1997, continua a sê-lo no plano cultural e no comercial. Não fico nada admirada que seja agora o principal grande centro dos recentes protestos pelo que então vi: apesar do sistema presidencialista «musculado» que domina o país, sentia-se uma revolta latente até no fervilhar nas ruas, num consumismo ausente em países vizinhos onde eu já estivera (e não havia islamismo ou tradições populares que «vestissem» as mulheres...)

Estoirou agora e não vai ser fácil. A seguir com atenção, até porque a Ásia Central é um barril de pólvora em potência.
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5.1.22

Da comunicação humana

 


Póvoa do Varzim, anos 50/60.
Fotografia de Artur Pastor.
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2019 – 2023(?)

 


No dia 11.10.2019, escrevi o que se segue neste blogue. Não me regozijo de todo por ter acertado, mas só não o previu quem não quis – estava escrito nos céus.

«Desde ontem à noite, há um partido com um governo minoritário que tem o país nas mãos e outros nove à volta. Haverá discussões caso a caso com a esquerda, com o PAN, mas também com o PSD, etc., etc.
Que venha a existir maior convergência com quem está à esquerda é previsível, mas sejamos claros: todos estão agora libertos, não há compromissos de ninguém. Não sei se vai ser bonito de ver, duvido que seja bom para o país.
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04.01.2022 – Debate Catarina Martins / Rui Tavares

 


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António Costa e maiorias absolutas



 

28.08.2019 - «Eu não tenho dúvida nenhuma de que os portugueses não gostam de maiorias absolutas e têm más memórias de maiorias de absolutas, sejam do PS ou do PSD»

Ver AQUI.

E continuam a não gostar segundo sondagens actuais.
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Este modelo de debates não serve a democracia

 


«Começou a ronda de debates que põe frente a frente os diversos líderes partidários que concorrem às próximas eleições legislativas marcadas para 30 de Janeiro.

Muito se fala e se escreve sobre as causas da fraca participação dos cidadãos nas eleições e do seu afastamento da política que resulta em elevadas taxas de abstenção. Quase metade dos eleitores não exerce este tão importante direito cívico.

Todas as forças partidárias apelam agora ao voto e dirigem-se especialmente aos mais jovens. Ao contrário daquilo que muitos possam pensar, os mais novos estão cada vez atentos à política porque sabem que é dela que depende em grande parte o seu futuro. Da direita à esquerda as listas de candidatos a deputados à Assembleia da República incluem cada vez mais jovens. Mas de que forma o modelo de debates que temos vindo a assistir ajudará à aproximação dos cidadãos à política?

O tempo destinado à troca de ideias é sensivelmente de 25 minutos, tendo cada interveniente cerca de 12 minutos em média para esclarecer os eleitores sobre o que pretende para o país. Entre interrupções e “larachas” a meio, o tempo vai ficando cada vez mais curto e o debate mais pobre. A verdade é esta: não se debate nada, não se apresenta ideia nenhuma e nós ficamos sem perceber o projecto que cada candidato terá para melhorar o país - remetem-nos assim para a leitura dos programas.

Ora, a ideia dos debates é também clarificar os eleitores e o frente a frente servirá para que cada um deles defenda o seu programa eleitoral e apresente os seus argumentos. Pela importância destas eleições e tudo o que elas podem representar para o futuro da nação, sem dúvida alguma que merecemos mais que 25 minutos. Merecemos saber o que cada um deles quer implementar para a educação, para a saúde, justiça e por aí adiante.

O papel dos canais de televisão, mormente do serviço público, tem nesta matéria grandes responsabilidades, devendo, a bem da democracia, repensar-se o modelo que agora se apresenta. E não. Não nos estão a fazer favor nenhum, estariam isso a sim a cumprir com o seu papel e com a sua função.

Acabando o debate, vêm de seguida as emissões especiais onde os comentadores habituais e totalmente “isentos” tecem durante quase uma hora os mais diversos considerandos de um debate que durou 25 minutos, mas que verdadeiramente não existiu.

Tudo isto afasta os cidadãos que são no fim quem decide o desenho do quadro parlamentar e, por essa razão, é necessário e urgente que seja respeitado o poder que cada um de nós tem, até porque a democracia também é esclarecimento. Mas neste modelo de debate parece continuar-se a optar por um caminho perigoso onde a abstenção ganha cada vez mais protagonismo.

Se há quem tenha alguma culpa no afastamento dos cidadãos na participação cívica, a forma como se fazem estes debates não ajuda em coisa nenhuma. A essência do frente a frente é exactamente o contrário daquilo a que assistimos e assim não vamos mesmo a lado nenhum.»

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4.1.22

Talvez apareça...

 

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Para ironia (também) não tem jeito

 

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A “ponderação” do facilitismo

 

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O "killer" Ventura e a normalização da mentira

 


«E a "questão da mentira", como deve ser valorizada? A pergunta é do pivot que dirigiu, na SIC-N, a roda de comentadores que se seguiu ao confronto entre Catarina Martins e o líder do Chega deste domingo à noite. Ninguém de entre os três - Ângela Silva, Ricardo Costa e Pedro Marques Lopes - respondeu à primeira, pelo que o pivot insistiu. Aí, o diretor da SIC afirmou: "A mentira existe sempre na política".

Depois de um debate em que Ventura falara de "polícias com reformas de 290 euros", de "Mercedes à porta de quem recebe o RSI" e restante habitual chorrilho de aldrabices odientas, e de termos visto a jornalista do Expresso Ângela Silva decretar que o deputado do Chega é "um killer" e "ganhou" a uma Catarina Martins "quase frágil", o encolher de ombros normalizador de Ricardo Costa garantiu-nos aquilo que só não sabíamos se muito distraídos nos últimos tempos: a maioria dos jornalistas e comentadores decidiu tratar Ventura como se fosse "um político igual aos outros", analisando as suas "performances" sem se deterem sequer a contradizer as falsidades que constituem toda a sua retórica. E até, como se constata pela opinião de Ângela Silva, elogiando a sua "técnica" - como um júri de boxe que dá mais pontos a quem leva uma marreta para o ringue.

Confesso que não sei bem interpretar esta posição, sobretudo quando assistimos simultaneamente à profusão de "fact-checking" nos media. Será que é por esse motivo, porque há "espaços para fazer a destrinça entre o verdadeiro e o falso", que os comentadores e jornalistas se acham desobrigados de sublinhar - ou sequer valorizar - mentiras quando as ouvem? Será que acham tão óbvio que Ventura mente que já nem vale a pena assinalar, porque toda a gente percebe? Será que, por ignorância ou desatenção, não reparam que mente? Ou será que, como indicia a resposta de Ricardo Costa, acham que não mente mais que "os outros políticos", ou que a política implica mentir e portanto quanto mais mentir mais "killer" é?

É tanto mais perplexizante esta atitude quando na mesma ocasião Pedro Marques Lopes sublinhou a importância de desmontar as mentiras de Ventura e lamentou que Catarina Martins o não tivesse feito - sendo óbvio que num modelo de debate de 25 minutos como é (incrivelmente) o escolhido pelas TV se favorece quem manda bocas e se impossibilita qualquer demonstração sistemática de falsidade.

Entendamo-nos: se debater com um demagogo que se especializa em dizer agora uma coisa e daqui a bocado o seu contrário (é ver as cambalhotas que o programa do partido tem dado nos últimos meses), em acusações torpes, em chistes, em interrupções e em invenções é sempre muito difícil, em 25 minutos é um tormento. A meu ver, Catarina Martins escolheu a postura mais eficaz: ignorar serenamente a maioria das mentiras e ataques, não entrar em diálogo e escolher um ou dois momentos e temas fulcrais para expor a demagogia e a mentira e sublinhar a sua diferença face ao oponente - fê-lo, e muito bem, com o racismo e com o Rendimento Social de Inserção. Ao contrário do que sustentou Ângela Silva, a postura da coordenadora do Bloco não foi "frágil"; foi tão forte e superior que, como bem assinalou Anabela Neves na CNN - corroborada por Sebastião Bugalho -, deixou Ventura nervoso, aflito até. O líder do Chega não está habituado a não conseguir irritar os adversários e precisa da lama para se sentir à vontade; assim ficou a rebolar sozinho.

Mas, admitindo naturalmente que haja diferentes opiniões sobre como melhor enfrentar Ventura num debate deste tipo (sobretudo quando se disputa eleitorado, o que não é o caso de Catarina Martins), a questão é que a tarefa de o combater e àquilo que representa não compete apenas aos adversários políticos - é antes de mais até, defendo, do jornalismo. É aos jornalistas que compete contextualizar, expor falsidades, repor a verdade - e perante alguém que se especializa em ódio e mentira e na destruição da democracia, chame-se Trump ou André Ventura, não dá para entrar na desculpa da falsa "objetividade", muito menos para namoros a "killers".

Nos EUA, há um ano - a 6 de janeiro - viu-se no que pode resultar a sistemática efabulação odienta, com uma multidão de hooligans trumpistas a invadir o parlamento. No mesmo exato dia, em Portugal, Ventura, no debate televisivo com Marcelo, mostrava a foto de sete pessoas negras com o Presidente e acusava-o de, naquela imagem, estar com a "bandidagem". Nem Marcelo nem a jornalista em estúdio - Clara de Sousa - reagiram ao ataque racista. O mesmo sucedeu nos comentários que se seguiram nas TV e nas notícias sobre o debate: não dei conta de alguém sublinhar a gravidade e a natureza do que ali se passara.

Não há duas interpretações possíveis para esse facto. A verdade é que ninguém, entre políticos, comentadores e jornalistas, achou assim tão grave que Ventura tivesse usado a imagem daquelas pessoas, por serem negras e pobres, como símbolo daquilo que diz combater e como arma contra o adversário. Ninguém se deu sequer ao trabalho de saber se alguma coisa do que ali afirmou (acusou aquelas pessoas de "terem vindo para Portugal para beneficiar do Estado Social", de terem "atacado uma esquadra da polícia" - tudo falsidades absolutas) correspondia à verdade: o que terá interessado é se "foi eficaz", se conseguiu o seu intento de embaraçar Marcelo, se foi ou não "killer".

Não tivesse existido um processo vitorioso em tribunal contra Ventura e o Chega e este episódio repugnante, que define o partido e o seu líder, mas também o jornalismo e o comentariado nacional, teria sido esquecido por quase todos. Uma democracia em que isto sucede, em que a mentira, a calúnia e o ódio passam como normalidade, sem indignação nem refutação, e quem os usa como "vencedor", uma democracia que não grita ao racismo mais gritante e na qual não entrar no jogo do demagogo é ser "frágil", é uma democracia a precisar de cuidados intensivos

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3.1.22

O mar

 


Sesimbra, 1943/1945.
Fotografia de Artur Pastor.
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Legislativas 2022 - Debates

 


1 – Começaram ontem, coragem porque só faltam 28.

2 – Não foram só nem sobretudo entre 2x2 candidatos, mas entre dezenas de comentadores nas TVs (e jornais), durante horas, que declararam vencedores e vencidos, deram notas e até decidiram o que os líderes dos partidos deviam ter dito e não o fizeram e porquê – deve ser isso o bom jornalismo, eu é que não sabia.

3 – Hoje, nas redes sociais, é tal o «entusiasmo» de alguns direitolas com o vigor do homem que participou no segundo debate, que estão a difundir memes apatetados da mulher que com ele debateu – «agradeço» a propaganda que a esta fazem, enquanto revelam muito sobre a matéria cinzenta com que foram contemplados.

4 – Mistério: quase ninguém fala do primeiro frente a frente em que esteve um primeiro ministro. Porque será?
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02.01.2022 – Debate Catarina Martins / André Ventura

 


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O mundo não é redondo e o Atlântico (já) não é o centro

 



Convirá deixar claro que a descrição anterior reflete a dificuldade de se projetar uma esfera (o mundo) num plano (uma folha de papel) e não qualquer adesão às fantasias que sobrevivem na internet sobre a forma da Terra. Mas reflete também a transição do centro estratégico, político e económico do século XX para o século XXI.

Durante séculos, várias civilizações surgiram e entre a Mesopotâmia, a Grécia e Roma, o Egito, a China, o Japão, a Índia, a Etiópia ou as civilizações da América Central e do Sul, o mundo tinha vários centros, nenhum verdadeiramente dominante. Os Descobrimentos Marítimos estabeleceram ou reforçaram elos de ligação e conhecimento e as globalizações que se seguiram foram aproximando os vários mundos, estabelecendo um centro e várias periferias. E até há pouco tempo, a centralidade atlântica aparecia relativamente bem representada nos mapas que conhecemos melhor.

No entanto, o mundo está a mudar. A atenção dos Estados Unidos voltou-se para a costa oeste ainda durante a Administração Obama e a União Europeia apresentou recentemente a sua nova Estratégia para o Indo-Pacífico. Londres, Washington e Camberra estabeleceram uma nova parceria de segurança no Pacífico. Na Europa, o Brexit e o ressurgimento da Rússia marcam a continentalização da União Europeia e, finalmente, segundo o Fórum Económico Mundial, das 29 megarregiões económicas do mundo, 12 estão no Pacífico e as restantes espalhadas pelo resto do planeta, sendo que das cinco que estão na Europa só Londres-Manchester que, como se sabe, já não faz parte da União Europeia, está no Atlântico. Nada disto é inesperado mas não são boas notícias.

Neste quadro, Portugal será tanto mais relevante quanto mais mobilizarmos e coordenarmos as diferentes constantes da nossa presença externa, que o atual ministro dos Negócios Estrangeiros definiu como um hexágono composto pelas dimensões atlântica, europeia, da língua portuguesa, da diáspora, da internacionalização e do multilateralismo. De entre estas, há uma que Ernâni Lopes repetia incansavelmente: Portugal será maior na Europa se for maior na língua portuguesa e será maior na língua portuguesa se for maior na Europa.

Há, de facto, um potencial de colaboração política entre a União Europeia e a Comunidade dos Países da Língua Portuguesa que está largamente por identificar e por explorar, sem prejuízo para o programa de cooperação entre a UE, os PALOP e Timor-Leste. Portugal é o único país que é simultaneamente membro da UE e da CPLP e poderá contribuir para identificar os interesses comuns e explorar as suas oportunidades, reforçando o nosso papel numa nova centralidade entre a Europa, África, a América do Sul e a Ásia.

No século XXI estamos a substituir o mapa que conhecemos por outro onde Portugal está na periferia. O Atlântico não voltará a ser o centro e o nosso interesse nacional está em contribuirmos para que o mundo seja mais um globo e menos um planisfério.

Bom Ano Novo!»

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2.1.22

Imagine

 

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Mia Couto

 

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Optimismo

 

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Marcelo quer “previsibilidade”, mas o berbicacho mora ao lado

 


«Marcelo gostava que das eleições saísse alguma “previsibilidade” – uma outra maneira de dizer “estabilidade política”. No fundo, a mensagem de Ano Novo apenas repetiu aquilo que o Presidente já disse: não gostaria de ser apanhado a gerir um “berbicacho”, um Parlamento fragmentado e sem maiorias claras.

O tudo ou nada de António Costa tornou essa “previsibilidade” mais complexa. Ao apostar tudo numa maioria absoluta em que nem o mais crente dos socialistas julga no seu íntimo ser possível – deitando praticamente ao lixo a fórmula de aliança à esquerda que lhe permitiu chegar ao poder em 2015 –, Costa tornou as eleições de Janeiro totalmente imprevisíveis. Se Rui Rio afirmou múltiplas vezes que está disposto a viabilizar um Governo PS minoritário, António Costa já disse que “sim” e já disse que “nim”. Sabemos que se vai embora se perder as eleições, sendo que em 2022 o verbo “perder” conjuga-se de modo diferente do que em 2015: a “maioria de esquerda” já não conta para o primeiro-ministro. É um evidente “berbicacho” – ou seja, para já, menos uma opção na lista das eventuais “previsibilidades”.

É verdade que não há razão nenhuma para dar já como adquirida a vitória do PSD nas legislativas – não há uma sondagem que ponha o cenário sobre a mesa, ainda que indiciem uma maior aproximação entre PS e PSD. Mas a dinâmica das autárquicas, em que o PS foi o partido mais votado mas perdeu grandes centros urbanos, onde se concentra o eleitorado, de que Lisboa foi o exemplo inesperado, deveria pôr os socialistas em estado de alerta. E, no entanto, apenas se vê cansaço. Entre o cansaço de seis anos de Governo e a covid – e nem sabemos quantos eleitores vão poder votar a 30 de Janeiro –, o PS tem fundadas razões para temer o eleitorado. A conversa da maioria absoluta torna-se, neste contexto, extraterrestre e contraproducente.

Esta semana, foi aberta a página de campanha do PS pelo círculo de Aveiro, que é um monumento à semiótica da sucessão. Não se chama simplesmente PS-Aveiro ou “candidatos socialistas do distrito de Aveiro” ou qualquer coisa do género. De uma forma nunca antes vista, chama-se “Pedro Nuno Santos – Legislativas 2022”. O candidato a sucessor faz a sua agenda própria, ainda que (ainda) não tenha saído do mantra do PS para estas eleições decidido pelas altas instâncias: maioria reforçada e “só nós temos António Costa”.

Mas, tal como demonstrou nas autárquicas, Pedro Nuno Santos tem o seu roteiro próprio, com olhos postos no dia da sucessão. Na entrevista à TVI, Costa demonstrou mais ou menos claramente que não desejava que fosse Pedro Nuno Santos o seu sucessor. Claro que disse que podia ser – era o que mais faltava dizer que o ministro das Infra-estruturas estava incapacitado. Mas não deixou de colocar “ses” e “mas” à possibilidade e foi talvez longe demais porque, de caminho, acabou a excluir Ana Catarina Mendes da lista de possíveis secretários-gerais ao sugerir que ninguém sem experiência governativa poderia liderar o PS.

O ano não acaba em Janeiro, mas clarifica os berbicachos do futuro. Vamos ter Governo PS minoritário com Costa e apoio do PSD? O PSD consegue formar Governo com o apoio da direita e excluindo o apoio parlamentar do Chega, que tem nos Açores? Há socialistas que defendem que, para evitar um cenário destes, o PS devia “deixar” o PSD governar. Mas isso não se faz sob a liderança de Pedro Nuno Santos – ou então a lógica é uma batata.

O ano político que arranca hoje é, provavelmente, um dos mais interessantes de observar – mas talvez nada que se compare a 2015, quando aquilo que era impossível, a “geringonça”, aconteceu.»

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