«Para mi asombro, la ciudad sigue igual, casi indiferente y esa vida, frenética e incesante, es en sí misma una batalla ganada contra el horror. No puedo evitar sentirme admirada y orgullosa de esa elegante indiferencia, que no es más que un saber antiguo de una ciudad que se siente eterna.»
. 14.11.15
13.11.15
Despeçam-se da TAP tal como a conhecemos
Preparem-se para assentos deste tipo, é só uma questão de tempo.
«Novos donos da TAP querem concorrer com Easyjet e Ryanair.»
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Onde isto já vai!
Introduzo o cartão num ATM e aparece-me isto (mais nenhuma publicidade se segue)!
Não consta que o Bloco de Esquerda tenha exigido a nacionalização da SIBS.
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O melhor amigo da democracia
«De repente, toda a direita sabia mais sobre a esquerda do que a esquerda sabia sobre si. O JM Tavares explicou a Costa o que era o PS, Nuno Melo garantia que os eleitores do BE foram traídos, Henrique Raposo deu conselhos de como ser comunista ao Jerónimo. Faltou ver Assunção Cristas explicar aos Verdes como é que se faz um charro.
O mundo está ao contrário e tudo indica que assim vai ficar. Repare, o estimado leitor, que o PSD e o CDS garantem que vão chumbar tudo o que venha do XXI Governo. Ou seja, muito provavelmente, vamos ver o PSD e o PP a votar contra a Merkel e a CE. Aníbal Cavaco Silva vai ter de excluir o PSD e o CDS do arco da governação ao segundo chumbo das indicações de Bruxelas - "Votam sempre contra, são meros partidos de protesto, são umas esganiçadas, sempre contra alguém ou contra alguma coisa." Vamos ter Passos de rabo de cavalo e vou acabar a votar na coligação antitratado orçamental: o Pafemos. É esgotante. (...)
Esta revolução não foi um dia fácil para Passos Coelho, mas, no meio da tormenta, o que mais deve ter custado ao PM foi o voto do deputado do PAN. (...) Ninguém quer ser reprovado pelo PAN. Ser chumbado pelo PAN é pior do que ser afastado pelo Sampaio. Um chumbo do deputado do PAN são sete anos de azar com animais. Gatos pretos a passarem-lhe à frente de cinco em cinco minutos.
É bem provável que os cães de Passos lhe rosnem depois de ter sido considerado incapaz pelo PAN. Se o representante dos caniches no Parlamento não confia nele, como é que eles vão confiar? Se calhar, o PM chegou a casa e tinha os chinelos estraçalhados - "Ó Laura, porque é que as minhas pantufas cheiram a xixi?"
Mais que qualquer moção de rejeição de uma frente de esquerda, o chumbo do PAN é a certidão de óbito do Governo do PàF. Se o programa do XX nem para os animais serve, como é que o iam dar às pessoas?»
João Quadros
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12.11.15
Morram certas onomatopeias, pim!
Ricardo Araújo Pereira, na Visão de hoje:
«Há muito tempo que venho defendendo a necessidade de uma profunda reforma das onomatopeias portuguesas. Devo dizer que não conheço um único cão que faça "béu-béu". E tenho vergonha de admitir que a onomatopeia dos ingleses para o som de bater à porta (knock-knock) é bem superior à nossa, na medida em que, de acordo com a minha experiência, nunca um punho fechado batendo numa superfície de madeira faz "truz-truz".»
Na íntegra AQUI.
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Há 40 anos, um cerco à AR – amanhã, não sabemos
Quando vi as imagens das concentrações em frente à Assembleia da República, há dois dias, tive bem presente outras, de 12 de Novembro de 1975. Nos antípodas? Certamente. Mas nada a ver? Gostava de ter a certeza.
O governo foi rejeitado, a crispação está altíssima, o Presidente da República não tem pressa para desatar os nós e decidiu ouvir nem se sabe quantas entidades e que pessoas (tendo começado por algumas que alinham bem com os seus desejos). Estará talvez a tentar ganhar tempo, sem que se conheça exactamente para quê. Mas nem é muito difícil imaginar.
A PàF começou ontem uma pós-campanha eleitoral pelo país, registei, e guardo para memória futura próxima, que Paulo Portas pediu, em Setúbal, apoio à "maioria silenciosa" e que houve quem sugerisse que a direita descesse à rua. Serão palavras vãs? Não tenho qualquer certeza.
Por tudo isto, e por muito mais, era bom que as «esquerdas» estivessem preparadas para o que pode por aí vir, mais depressa do que possamos hoje pensar e, eventualmente, que antecipassem iniciativas. A rua, não só mas também ela, espera pelos partidos que estão num dos lados da barricada e pelos cidadãos que os suportam neste momento de esperança (e não, não é, nem deve ser, a CGTP a liderar o processo).
P.S. – Para detalhes sobre o cerco de 1975, ver aqui.
. Fernando Mascarenhas
Fernando Mascarenhas morreu há um ano. Continua bem presente o seu papel em vários quadrantes, nomeadamente no apoio à oposição democrática antes do 25 de Abril, como referi aqui.
. Star Wars radical
«Em "Star Wars" o Imperador e Darth Vader dividiram, durante quatro décadas, o domínio da galáxia. Uma espécie de bipartidarismo espacial, sem rebeldes à vista. Contra os extremos, as forças imperiais sempre utilizaram o seu trunfo mediativo favorito: o medo.
Mas o lado obscuro da Força ganhou energia com quatro anos de austeridade sem sensibilidade. O país amedrontou-se ou refugiou-se no estrangeiro. Mas radicalizou-se. O que se assistiu, no Parlamento, com a queda do Executivo minoritário de Passos Coelho, foi o fim de uma era e a transformação do centro político num enorme buraco negro. Aquele local onde todas as conciliações eram possíveis e que, com a destruição da classe média levada a cabo nestes últimos anos, se tornou tão frágil como porcelana.
O centro político era a balança do regime. Mas quando o PSD deixou de ser social-democrata e se converteu ao neoliberalismo e o PS derivou para a esquerda para ser a voz do descontentamento, as pontas quebraram. A radicalização política que levou à queda de Passos Coelho é o reflexo da cisão profunda a que assistimos na sociedade. Os "valores" de ontem deixaram de ser válidos e entrámos num novo tempo.
Demorará muito tempo até que a classe média que deseja o compromisso e a estabilidade renasça das cinzas. E só isso trará novamente a política para o centro. A galáxia portuguesa dividiu-se e, facto curioso, a política ocupou o território do economês apolítico que governou Portugal nos últimos anos. A sociedade saiu do seu pântano letal, mas confortável, e agitou-se. O desaparecido "centro" foi o dano colateral da austeridade.»
Fernando Sobral
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11.11.15
Dica (163)
Quererá o Presidente evitar a balbúrdia em Belém? (Francisco Louçã)
«Agora pode perder tempo ou ganhar tempo. Tinha todos os cenários preparados, sabia tudo, raramente se engana e nunca tem dúvidas. Decerto que sabe o que vai fazer agora, no cenário perfeito.
Pode começar a ouvir associações patronais, banqueiros avulsos, até ranchos folclóricos e os seus amigos todos, para conhecer o ponto de vista da sociedade civil, como se diz, sobre os seus cenários perfeitos. Pode convocar o Conselho de Estado, se for mais expedito. Ou pode simplesmente reconhecer a vontade do Parlamento, a que não se conseguirá opor em nenhum caso.»
. Novos valores republicanos
Ouvido na tabacaria:
- Até assinaram os papéis por cima das cadeiras!
- Pois, já não há respeito pelo povo.
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Birmânia – A vitória da «senhora»
Quando todas as notícias relatam uma vitória estrondosa do partido de Aung San Suu Kyi nas eleições da Birmânia, abre-se uma nova era num dos países mais castigados – e também mais extraordinariamente belos – do Sudeste asiático. O caminho será longo, «a senhora» não poderá ser presidente por ser casada com um estrangeiro e ter filhos de uma outra nacionalidade (!...), mas nada travou uma luta que tantos de nós temos acompanhado ao longo dos últimos anos.
Estive lá em 2009, quando Aung San Suu Kyi vivia em prisão domiciliária, ao fundo de uma rua com acesso vedado ao público. E quanto não daria para festejar agora tudo isto, de novo a bordo de um balão como estes, que pudesse sobrevoar os festejos populares e a esperança.
Está mais do que abalada uma ditadura nem sequer ditada por ideologia, mas por um poder férreo de militares sobre 56 milhões de pessoas, tendo como único objectivo o seu próprio enriquecimento e o luxo em que vivem as famílias e os respectivos amigos – à custa de uma corrupção generalizada e sem vergonha, enquanto a esmagadora maioria do povo vive num estado de pobreza extrema, visível em todos os detalhes, sem empregos, em cidades mais do que degradadas e desordenadas. Tudo isto num país riquíssimo em recursos naturais (gás, madeiras de várias espécies, pedras preciosas de primeira qualidade, etc., etc.) que são vendidos para todo o mundo porque é evidente que o boicote dos Estados não atinge as algibeiras dos comerciantes.
É verdade que alguns aspectos foram melhorando nos últimos tempos, mas tudo mudará mais depressa a partir de agora.
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O ex-Governo líquido
«Passos Coelho entrou no Parlamento como líder do Governo e saiu como chefe da oposição. Midas trocou-lhe as voltas: transformou ouro em chumbo. Não é fácil mudar de estatuto em poucas horas, como se se tivesse sentado num cadafalso à espera do momento fatídico. (...)
Vivemos tempos políticos empolgantes. O sociólogo Zygmunt Bauman definia-os como "modernidade líquida", onde os valores são flexíveis e volúveis. Por isso apelar à "tradição" como defesa moral para o que assistimos é pedir o regresso da Idade Média antes do Iluminismo. (...)
A "destruição criativa" não se aplica apenas à economia: infiltrou-se na sociedade. Nada é seguro: nem os salários, nem as pensões, nem os compromissos políticos do passado ou as alianças e as cumplicidades feitas à sombra do Estado. É por isso que o Governo de Passos Coelho passou do estado gasoso ao líquido, sem passar pelo sólido: foi uma ilusão. Resta saber o que nasce deste rio selvagem. Porque vai ser difícil equilibrar sensatez com criatividade, sensibilidade social com o valor do dinheiro que não há. É um caminho minado onde António Costa terá de saber saltitar elegantemente, guiado pela burocracia de Bruxelas. Mário Centeno está lá para isso: a ruptura será na continuidade.»
Fernando Sobral
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10.11.15
Bem a propósito
Mário Viegas faria hoje 67 anos.
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Esperança
«Sabemos que os tempos que se avizinham serão difíceis. Um governo que defenda estes princípios será atacado por todos os interesses.
Tomemos um exemplo. Apenas um exemplo. “Proibição das execuções fiscais sobre a casa de morada de família relativamente a dívidas de valor inferior ao valor do bem executado e suspensão da penhora da casa de morada de família nos restantes casos”.
É uma das 70 medidas sobre as quais PS, PCP, BE e PEV chegaram a acordo.
Será uma medida justa? É justa. Haverá algo mais elogioso que se possa dizer de uma medida política? Haverá alguma etiqueta mais nobre no dicionário? Penso que não. Haverá algo que seja melhor para a sociedade, para a economia, para o desenvolvimento, do que uma medida justa? Penso que não. Porque as pessoas tratam os outros como são tratadas e nada pode ser melhor para uma sociedade onde todos tentam ser justos, onde todos tentam fazer o bem. (...)
Se houvesse apenas esta medida no acordo, isso seria suficiente para marcar o dia da sua assinatura com uma pedra branca. Mas não há. Como esta há muitas outras, que têm em comum algumas preocupações centrais: a protecção dos mais frágeis, a inclusão dos mais sacrificados, o reforço dos serviços públicos essenciais, a sustentabilidade ambiental.
Sabemos que isto é apenas o início, mas é um início auspicioso. Um programa que protege os cidadãos acima de tudo, em vez do dinheiro. Um programa que olha para os cidadãos como tendo todos a mesma dignidade.
Sabemos que isto é apenas o início e que tudo o que segue, daqui para a frente, será muito difícil. Mas todas as dificuldades são bem-vindas quando se trata de construir um futuro solidário, sem excluídos, sem escorraçados, sem párias. Um futuro como sonhámos depois do 25 de Abril e que depois, sem que se tenha percebido bem porquê, se perdeu em labirintos, intrigas e areias movediças. (...)
Sabemos que os tempos que se avizinham serão difíceis. Um governo que defenda estes princípios será atacado por todos os interesses, por todos os privilegiados de todos os privilégios, por todos os preconceitos, por todos os rancores. (...) Sabemos que muito pouco está garantido e muito está em jogo. Mas também sabemos que temos muito aliados dentro e fora das fronteiras, em todos os homens e mulheres de boa vontade. Sabemos que a honra é mais forte que a ignomínia. Que a dignidade é mais forte que a subserviência. Que a liberdade é mais forte que a submissão. E sabemos, enfim, que podemos ter esperança.»
José Vítor Malheiros
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9.11.15
Dica (162)
«Cette alliance n'a, en réalité, été possible que parce que, pendant que les observateurs internationaux et les ministres de l'Eurogroupe tressaient les louanges de la politique du gouvernement du premier ministre sortant Pedro Passos Coelho, les Portugais rejetaient profondément sa politique.»
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A faca e o garfo
«Na mesa de refeições, a faca e o garfo deslocam-se sobre o prato ritmadamente. O garfo espeta; a faca corta. A faca empurra; o garfo transporta. Trata-se de uma dança imponente, cujo objectivo é retardar a deselegante mastigação.
Tanto os americanos como os ingleses, por exemplo, acham que a forma de os outros usarem o garfo é extremamente vulgar: os britânicos consideram-se educados por nunca pousarem as suas facas e os americanos por o fazerem. São duas nações divididas por um talher comum. Tal como Portugal é uma nação dividida pela forma de olhar para a dívida e o método de equilibrar as contas públicas. E, nesses momentos, a faca e o garfo conseguem entrar em conflito.
Na política, a arte de usar a faca e o garfo obedece a princípios não muito diferentes. Os partidos espetam, o Governo corta. E os cidadãos esperam que o seu futuro possa ser melhor. Nenhuma das propostas de governação parece conseguir ultrapassar a táctica das "medidas extraordinárias" para acalmar o Adamastor da dívida. E nenhuma consegue mostrar uma estratégia, um modelo sólido para o futuro de Portugal.
Se à esquerda podemos vislumbrar com desconfiança como será possível equilibrar, com os acordos políticos, o programa de Mário Centeno, à direita a receita é a continuação da excepcionalidade. Olhe-se para o menu saído do Conselho de Ministros: o temporário tornou-se eterno. Seja a sobretaxa, as múltiplas contribuições extraordinárias ou cortes salariais. O primórdio da faca sobre o garfo não tem descanso. E, por isso, a única diferença que se vislumbra a médio prazo é a da sensibilidade para a pobreza que se tornou a forma de vida em Portugal.»
Fernando Sobral
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Se comeram criancinhas, já não comem
«Seria prudente, perante a lição tão recente, que acalmássemos a nossa vontade em falar de cátedra. Por exemplo, os comunistas comem crianças ao pequeno-almoço... Pelo menos o tempo verbal está errado, não comem. Talvez ontem comessem, dou de barato. Mas, hoje, com as escutas haveria de se saber. A dieta alimentar de Jerónimo está escrutinada.»
Ferreira Fernandes, no DN.
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Um 9 de Novembro muito menos calmo que hoje
Foi há 40 anos, a pouco mais de duas semanas do 25 de Novembro, os ânimos estavam bem mais exaltados do que neste belo Outono de 2015 e as forças partidárias diferentemente alinhadas.
PS e PPD, secundados por CDS, PPM e PCP de P-ML, convocaram uma manifestação de apoio ao VI Governo Provisório e ao primeiro-ministro, com o lema: «Pinheiro, em frente, tens aqui a tua gente!». O Terreiro do Paço encheu-se mas ninguém recordaria hoje o facto (todos os espaços se enchiam, dia sim dia sim…) sem as granadas de fumo e de gás lacrimogéneo (mais alguns tiros) que deflagraram durante o discurso de Pinheiro de Azevedo contra as forças à esquerda do PS. Iniciativa de autoria não muito clara e objecto de acusações cruzadas, mas que foi um enorme susto para muitos e gáudio para a esquerda da esquerda que viu a cena em casa, em directo televisivo (as paredes da sala em que estou ainda devem guardar o eco das gargalhadas).
«O povo é sereno, é apenas fumaça!», gritou o então primeiro-ministro, numa tirada que ficou para a pequena história dos últimos dias do PREC.
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8.11.15
Edmundo Pedro, 97
Edmundo Pedro nasceu em 8 de Novembro de 1918. Com pena minha, não me foi possível estar hoje no grupo de amigos que terão almoçado com ele para comemorar o seu 97º aniversário. Mas os 100 vêm a caminho!
Para quem conheça pouco ou nada do que foi a sua vida, retomo um resumido «percurso existencial», escrito na primeira pessoa, há alguns anos.
«Comecei a trabalhar aos doze anos numa oficina de serralharia. Daí em diante, interrompi o curso diurno da Escola Industrial Machado de Castro e passei a estudar à noite. Aos treze, entrei para o Arsenal da Marinha. Aí conheci dois vultos cimeiros do movimento operário de então, meus colegas de trabalho na oficina de máquinas do Arsenal: António Bento Gonçalves e Francisco Paula de Oliveira. Este último viria a celebrizar-se sob o pseudónimo de “Pavel”.
O primeiro era então Secretário-geral do PCP, o segundo Secretário-geral da Federação da Juventude Comunista. Ambos exerceram no meu espírito uma influência determinante.
Filiei-me na Juventude Comunista aos treze anos, pouco depois de ser admitido naquela empresa do Estado.
Fui detido pela primeira vez pela polícia política no dia 17 de Janeiro de 1934, pouco depois de ter completado os 15 anos de idade, por estar envolvido na preparação da tentativa de greve geral que deflagraria no dia seguinte. A minha primeira detenção está, pois, estreitamente ligada ao movimento de protesto contra a liquidação do sindicalismo livre. Esse movimento ficaria conhecido na história das lutas operárias como o «18 de Janeiro». Pela minha acção na preparação desse evento, fui condenado pelo Tribunal Militar Especial, acabado de criar por Salazar, à pena de um ano de prisão e à perda dos «direitos políticos» durante cinco anos…
Logo que fui libertado, retomei a oposição à ditadura como militante da Juventude Comunista. Em Abril de 1935 fui eleito, com Álvaro Cunhal, entre outros, para a direcção da Juventude Comunista.
Preso, uma vez mais, em Fevereiro de 1936, sob a acusação de ser dirigente da JC, acabaria, em Outubro desse ano, por ser deportado para Cabo Verde, onde fui estrear o tristemente célebre Campo de Concentração do Tarrafal. Ao fim de nove anos, regressei a Lisboa para ser, de novo, julgado no Tribunal Militar Especial. Depois de ter aguardado julgamento, ao todo, durante dez anos, fui condenado, por aquele tribunal de excepção, à pena de vinte e dois meses de prisão correccional, acrescida da perda dos «direitos políticos» pelo período de dez anos!
Ao longo de todo tempo que mediou entre o fim de 1945 e o 25 de Abril de 1974, conspirei sempre contra a ditadura. De forma especialmente activa, a partir da campanha para a Presidência da República do general Humberto Delgado, durante a qual comecei a preparar, com Piteira Santos, Varela Gomes e outros, um movimento insurreccional que pusesse fim à ditadura.
Estive envolvido, com o grupo inspirado por Fernando Piteira Santos, no «12 de Março» de 1959. Mas, dessa vez, não fui referenciado na polícia política.
Dois anos depois, no dia 1 de Janeiro de 1962, tomei uma parte muito activa no chamado «golpe de Beja», ocorrido na madrugada daquele dia, no Quartel de Infantaria Três, aquartelado na cidade de Beja. Depois daquele movimento ter abortado, fugi para o Algarve onde fui detido, em Tavira, na manhã desse mesmo dia, junto com Manuel Serra e o então capitão Eugénio de Oliveira. Pela minha intervenção nesse movimento fui condenado, em 1964, a três anos e oito meses de prisão maior e à perda do «direitos políticos» pelo período de quinze anos. Cumpri quatro anos de cadeia. Fui libertado no fim de 1965.
Aderi ao Partido Socialista, por intermédio de Mário Soares, em Setembro de 1973. Sou, portanto, um dos fundadores daquele partido.
No primeiro congresso realizado na legalidade, em Dezembro de 1974, fui eleito para a sua Comissão Nacional e, em seguida, para a sua Comissão Política. Fui integrado no seu Secretariado Nacional em 1975. Em 25 de Abril de 1976, nas primeiras eleições legislativas, fui eleito Deputado pelo PS. Exerci esse cargo durante onze anos. Em 1977/78, fui designado Presidente da RTP. Actualmente continuo no PS, mas como militante de base.
Ninguém na minha família escapou à repressão salazarista. O meu pai estreou comigo o Campo de Concentração do Tarrafal. Esteve ali, tal como eu, cerca de nove anos. Foi, reconhecidamente, o mais perseguido de todos os presos daquele presídio de má memória. É considerado o mártir do Tarrafal. Morreu no exílio, em França, dois anos antes do 25 de Abril. A minha mãe esteve detida durante longo tempo por ser militante do PCP. A minha irmã Gabriela, que fugira de Portugal para evitar ser detida pela sua actividade no âmbito do movimento estudantil, morreu em Paris, aos vinte anos, na emigração política. Um irmão meu, o João Ervedoso, foi assassinado no âmbito de uma manifestação estudantil, por um provocador ao serviço da polícia política, quando tinha acabado de completar catorze anos. O meu irmão Germano, o mais novo dos três, entretanto falecido, esteve detido durante três anos por envolvimento na preparação da tentativa insurreccional de Beja. A minha própria mulher, para não fugir à sina da família, também experimentou os cárceres da polícia política.»
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Dica (161)
«Candidato-me em nome da esperança de um país novo e justo.» (Marisa Matias)
«É possível chegar à presidência sem a protecção do Espírito Santo. Nunca fui avençada do dito, em claro conflito de interesses com funções públicas na mesma área, e nunca festejei a passagem de ano no iate do Ricardo Salgado.»
. Entregues a Deus?
«Cavaco Silva atribuía a Nossa Senhora os sucessos nas avaliações da troika, Cristas pedia aos agricultores para rezarem por chuva, Passos andava de crucifixo em campanha e, agora, o novo ministro da Administração Interna culpa o diabo pelas cheias em Albufeira. Portugal é uma reunião da IURD com um dízimo ao cubo. Não é por acaso que o principal candidato a Presidente da República fazia homilias ao domingo e que até os comunistas apostam no padre para PR.
A partir do momento em que um ministro da Administração Interna vem atribuir a culpa dos estragos de umas cheias ao demónio, tudo é possível, incluindo o exorcismo da Constituição. O ministro da Administração Interna vai propor presentes a Deus para dominar o temporal. Calvão acha que um presente de 14 milhões de euros é natural e que uma cheia é obra do demónio. (...)
O que já me parece mais estranho é que o ministro da Administração Interna encomende a Deus as vítimas das cheias. É verdade que este Governo misturou o Ministério da Cultura com a Igualdade e a Cidadania, mas não acredito que este seja um Ministério da Administração Interna das Almas. Ver um ministro encomendar o paraíso para alguém é um passo em frente para este ministério que, com o antecessor, apenas metia cunhas para vistos Gold de residência.
Quando o ministro Calvão da Silva afirma que o senhor de "oitentaianos", que morreu em Boliqueime, "entregou-se a Deus, com certeza que lhe reserva um lugar adequado", no fundo está a dizer que o senhor fez o que fez a malta que aceitou o convite de Passos para este Governo de quinze dias. De certa forma, é impossível não ter a certeza que Deus nos reserva um lugar adequado, quando o Sérgio Monteiro vai liderar a venda do Novo Banco. Aleluia!»
João Quadros
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