3.3.18

Passos no ISCSP? Há 5 anos foi assim


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O’Neill e Amália


Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.

Que perfeito coração
morreria no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.

Alexandre O'Neill



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Dica (727)



Silicon Valley’s Origin Story (Jacob Silverman) 

«The generational shift that made tech companies a cultural and political force.»
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O combate civilizacional pelos livros e pela leitura



José Pacheco Pereira no Público de hoje:

«Estas últimas semanas passei pelos restos de um mundo que foi o meu, mas que está a acabar. A Livraria Leitura no Porto acabou. Era seu frequentador desde os tempos em que era Divulgação e tinha a loja da esquina da Rua de Ceuta e a outra que depois foi dos Livros do Brasil e o seu livreiro era Fernando Fernandes, juntamente com o editor José Carvalho Branco. Não era difícil perceber, nos últimos anos, a sua agonia para quem, como eu, já viu muitas livrarias moribundas. O stock começa a não ser renovado, as estantes têm quase sempre os mesmos livros, as novidades começam a ser sempre as mesmas de todas as livrarias, até que começam também a desaparecer. Não há dinheiro para diversificar as encomendas ou as compras e isso na Leitura era uma ruptura com a prática de Fernando Fernandes de encomendar sempre dois exemplares dos livros que os professores da Universidade do Porto mandavam vir, um para eles e outro para a livraria. Deixou há muitos anos de haver a Galeria de Arte. Pouco a pouco fechou a secção de livros artísticos, desapareceram muitos livros estrangeiros e sobravam os chamados “monos”, mesmo assim aqueles em que ainda ia descobrindo livros para comprar. Havia uns restos de filosofia, alguns livros de história, e para os professores uma boa secção de pedagogia. As montras pareciam sempre iguais e os esforços dos empregados, e dos clientes fiéis que ficaram até ao fim, não chegavam para dar vida ao espaço. Quem queria apresentar novos livros rumava para outros locais menos fúnebres. E, mesmo no anúncio da sua morte, alguns dos artigos jornalísticos publicados eram tão estereotipados e pobres, que era fácil perceber que havia uma ruptura da memória do papel da Leitura no Porto, desde os tempos da resistência, nessa rua emblemática onde havia tertúlias no Café Ceuta dos oposicionistas do Porto, onde vários destacados membros da oposição à ditadura viviam ou tinham os seus escritórios profissionais. Foi na Leitura (e na Divulgação) que vi muitas exposições, recordo-me de uma de Tapiés, escrevi textos para alguns dos catálogos, conheci Francisco Sá Carneiro e vi pela única vez Aquilino Ribeiro.

Primeiro, chegou um cabeleireiro ocupando a parte “histórica” da livraria e ficou apenas a nova parte na Rua José Falcão, para onde antes se passava por uma espécie de túnel com livros por todo o lado. Nada tenho contra os cabeleireiros, mas aquele ficou-me atravessado, sem culpa nenhuma. E depois veio o estrangeirismo na moda “Leitura Books &Living”, depois veio a doença terminal, e depois veio a Morte.

Nesta mesma semana, fui pela última vez à Pó dos Livros em Lisboa. Consegui a proeza de entrar, ver com algum tempo tudo o que lá havia e não conseguir encontrar nada para comprar. Este para mim é sempre o sinal. Mesmo no mercado dos livros na Estação da Gare do Oriente consigo comprar dezenas de livros de cada vez, fruto de uma outra realidade do mundo dos livros: a caótica e paupérrima distribuição, que deixa dezenas de títulos de pequenas editoras por distribuir e lá, junto dos comboios, estão como “monos” invendáveis. Comprei, na última vez, livros sobre o PREC, sobre Maria Archer, sobre a história fabril de Portugal, sobre história cultural da música popular portuguesa, etc., etc. O mesmo me acontece com os livros dessa empresa que não é uma editora, mas dá o nome de Chiado aos livros que lhes pagam para publicar. O que acontece é que há coisas muito más, mas há também alguns ensaios e estudos muito interessantes. Como de costume não se encontram nas livrarias e só nestes mercados e na Feira do Livro.



2.3.18

O «catedrático» Passos Coelho




«No ISCSP, o ex-presidente do PSD vai dar aulas a alunos de mestrado e doutoramento em Administração Pública, devendo fazê-lo na categoria de professor convidado catedrático.»

Ainda por cima, nem vai leccionar nada, vai mandar umas horas em cadeiras dadas por outros: «O até há pouco tempo presidente do PSD não terá nenhuma cadeira específica a cargo em qualquer uma das três instituições, podendo as suas aulas serem integradas em diferentes disciplinas mediante o calendário lectivo de cada Universidade». 

Ah, grande universidade pública!
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Rock in Riot - Ocupar as Ruas, Reclamar a Cidade



24.03.2018 – 16:00-23:59
Alameda D. Afonso Henriques, Lisboa

A modernização de Lisboa nas últimas décadas tem vindo a redesenhar o território metropolitano enquanto um gigantesco negócio. Os espaços que outrora eram vividos colectivamente estão agora reconfigurados enquanto mero meio de criar dinheiro e as infraestruturas que visavam organizar a vida colectiva parecem agora apenas organizar a velocidade das interacções económicas.

O preço da habitação disparou, assim como dispararam os despejos. Encontrar casa para viver é difícil e nenhum inquilino se sente seguro. A habitação deixou de ser o local onde vivemos para se tornar num investimento. Por isso há cada vez mais casas não habitadas, casas com janelas emparedadas e cada vez menos sítios para viver.

A cidade é um bem comum, colectivamente produzido por todos os que nela habitam. Um pouco por todo o lado surgem processos de resistência que procuram salvaguardar e organizar os restos de comunidade que sobrevivem por entre a especulação e a comercialização de todos os aspectos da vida. Contra eles, o poder encontra sempre novas formas de sistematizar, separar, atomizar e dividir as populações.

Uma perspectiva alargada da cidade torna claro que o aumento dos preços da habitação é fruto dos negócios partilhados entre banca, fundos imobiliários e o poder autárquico; a expulsão das populações mais pobres do centro; a gestão policial dos bairros das periferias; ou a privatização de ruas, praças, jardins e teatros municipais não são fenómenos separados, mas constituem expressão da forma como o espaço urbano se tornou numa máquina produtora de capital.

Contra esta lógica, vamos estar em festa na rua no dia 24 de março, entre a Alameda e o Intendente. Para mostrar que não concordamos com as políticas e a gestão que os poderes públicos têm feito da cidade e metrópole de Lisboa, nem com o papel que essas políticas nos atribuem. Fazendo uso da rua, afirmamos uma reapropriação da cidade.

Apelamos à participação de todos e todas. Tragam bicicletas, skates, patins. Se queres participar com um sistema de som, com uma carrinha alegórica ou outro tipo de veículo motorizado contacta com a organização: rockinriot2018@gmail.com
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Reviajar é reviver



Há um ano andava eu pelo Uluru, na Austrália, bem melhor do que estou aqui, e com uns belos 39ºC. Reviajar é reviver, sem dúvida!

Voltar a ler e ver aqui.
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Sagrada Eurovisão da Canção



«Diogo Piçarra desistiu do Festival da Canção depois da suspeita de plágio de uma música da IURD (que, afinal, parece que não é bem da IURD). O que me faz confusão é que a IURD teve a oportunidade de pôr um cântico seu no Festival Eurovisão da Canção e ganhar milhares de seguidores e deitou tudo borda fora. Devem estar fartos de crianças.

Por acaso, sempre pensei que o festival seria uma boa oportunidade para, por exemplo, as Testemunhas de Jeová concorrerem com uma canção. Seria uma das poucas hipóteses para poderem passar a mensagem sem que alguém lhes feche a porta na cara.

Para mim, o Festival Eurovisão da Canção sempre foi uma coisa à qual eu teria vergonha de levar os meus filhos. É uma feira dos enchidos da música. O Festival da Eurovisão sempre foi uma bodega, mas oficialmente acabou quando inventaram as cotonetes.

Em minha casa, não se falava de Festival da Canção enquanto os miúdos estavam acordados. E nomes como Capitão Duarte Mendes, "Neste Barco à Vela", dos Nevada, ou Tó Cruz e "Baunilha e Chocolate" eram ditos em código. Respectivamente, o - 28, 39 e o 3100 - a chave do código tinha por base a classificação obtida na Eurovisão.

Foram anos da habitual humilhação: Portugal ficava nos três últimos lugares e só o júri francês votava em nós, demonstrando que, afinal, os nossos emigrantes não estavam em França apenas a trabalhar nas obras e a lavar escadas. Alguns, com menos escolaridade, andavam lá fora como júris do Festival Eurovisão da Canção.

Durante muito tempo, a nossa participação resumia-se a enviar todos os anos um fado, ou semifado, sempre acompanhado de letras com caravelas e mar. Cheguei a pensar que um dia enviariam ao festival a Torre de Belém acompanhada à viola. Percebam uma coisa: ser Património Imaterial da Humanidade em termos musicais não significa muito e não dá votos. Lá porque o Douro Vinhateiro é Património Mundial da Unesco, ninguém se vai lembrar de inscrevê-lo nos ídolos.

De repente, os portugueses começaram a ligar ao Festival Eurovisão da Canção. A culpa é em grande parte, ou toda, do Salvador Sobral que, ao vencer no ano passado, deu cabo do saudável desprezo que tínhamos por aquilo.

No ano passado, aconteceu um milagre e vencemos a Eurovisão. Confesso que nunca imaginei. Até porque, desde a queda do Muro de Berlim, a competição passou a ser mais um jogo do risco do que um festival de música. É só estratégia e os votos são dados em função da letra da música e do equilíbrio geopolítico. Os votos variam entre a xenofobia e o bairrismo. Muitos países votam exactamente da mesma forma que votaram no ano anterior. Tanto faz, são países vizinhos ou alianças estratégicas, e eles votam nesses mesmo que, em vez de música, enviam um papa-formigas a bater chapa em calções.

Percebo que ter vencido a Eurovisão, de certa forma, nos obrigue a ser mais rigorosos nas escolhas das músicas que enviamos: queremos ficar bem vistos, mas não queremos vencer outra vez porque não temos dinheiro para organizar tudo de novo. Temos de escolher entre o sucesso no festival ou o regresso da troika. Pensem nisso.»

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28.2.18

Dica (725)



Tech Vs. Democracy (Guy Verhofstadt) 

«Social-media companies have the power to exert significant influence on our societies, but they do not have the right to set the rules. That authority belongs to our democratic institutions, which are obliged to ensure that social-media companies behave much more responsibly than they are now.»
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Paris, 50 anos depois do Maio de 68


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Ainda bem que não há pena de morte em Portugal




15 chocolates, num valor total de 23,85 euros. Ainda bem que não há pena de morte em Portugal!
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«Stop this madness!»



«Portugal está em vias de se transformar num inferno legislativo. Há uma espécie de obsessão pela feitura desenfreada de leis e regulamentos, como se o princípio da Física do horror ao vazio se devesse aplicar a tudo quanto mexe livremente na sociedade.

Não é um fenómeno novo e, por não o ser, a confusão existente no nosso universo legal agrava-se dia após dia. Como nos armazéns dos velhos colectores, a tralha jurídica amontoa-se desordenadamente sem quaisquer preocupações de limpeza. É urgente a criação de um Ministério da Higiene Legislativa. Ou, para se evitarem novos imbróglios orgânicos, de uma simples direcção-geral com amplos poderes de corte e costura.

São muitas as razões para a avalancha legislativa. Desde logo, a raiz romano-germânica do nosso sistema jurídico - por oposição à common law dos anglo-saxões -, propensa à multiplicação de diplomas legais, com os seus preceitos detalhados de funcionamento normativo da sociedade, reduzindo a discricionariedade no julgamento de causas. É o sistema que nos rege há séculos e do qual dificilmente nos poderemos libertar. Não surpreende, assim, que a crescente complexidade das relações sociais e económicas conduza a um correspondente acréscimo de produção jurídica.

Depois, a União Europeia e a sua veia normalizadora. Só as injunções no sistema jurídico português ditadas por Bruxelas representam, desde a nossa adesão, toneladas de páginas do Diário da República. Propensos como somos ao seguidismo acrítico, à divisão minuciosa dos pêlos púbicos e às redondilhas literárias, conseguimos multiplicar o texto de qualquer directiva por dois ou por três no momento da transposição. Acatamos como meninos a proibição dos galheteiros e só um raro assomo de têmpera beirã impediu, in extremis, que a flor do cardo fosse proibida de entrar na composição do queijo da serra. Noutros temas, mais pesados, como o regime de contratação pública, cometemos a proeza de transformar o rigor num absurdo. É que em Bruxelas tudo é possível, tanto um regulamento idiota de protecção de dados, como a saudável intenção de tributar os gigantes do mundo digital ou de introduzir bloqueadores de velocidade nos automóveis.

Entretanto, por cá prossegue a fúria regulamentar. Ora é o alojamento local, ora os incentivos estabelecidos pela banca aos seus funcionários, numa demonstração de total ausência de sentido da realidade. E cresce, cresce o volume de tralha inútil, impraticável, obsoleta e redundante. Numa recente peça no DN, Pedro Tadeu ilustrava com a-propósito o modo como um bom decreto - o da limpeza florestal - se pode transformar numa charada: "O anexo ao DL 124/2006, de 28 de Junho, alterado pelos DL 15/2009, de 14 de Janeiro, 17/2009, de 14 de Janeiro, 114/2011, de 30 de Novembro, e 83/2014, de 23 de Maio, e pela lei 76/2017, de 17 de Agosto, passa a ter a redacção do anexo ao presente decreto-lei [onde não constam as partes inalteradas]." Seria muito difícil produzir um texto novo, completo e escorreito? Falta formação em Word ao "legislador"?»

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27.2.18

Rui Rio estruturante




Eu diria mesmo que isto revela um pensamento especialmente bem estruturado.
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A violência policial e os suspeitos do costume



«Por duas vezes, no espaço de uma semana, Portugal surge destacado pelas piores razões em matéria de direitos humanos e de violência policial. E não só por causa do episódio da Cova da Moura. Relatórios da Amnistia Internacional e do Comité Anti-Tortura do Conselho da Europa são pouco simpáticos com a actividade policial no país. Este último organismo do Conselho da Europa coloca Portugal no topo de países da Europa Ocidental com o maior número de casos de violência policial, sobretudo quando se trata de afrodescendentes portugueses e estrangeiros. É intolerável que a forma como um cidadão é tratado numa esquadra varie em função da cor da pele ou da nacionalidade, nessa manifestação boçal de um racismo subterrâneo que sempre existiu e nunca assumimos. Que esse racismo larvar tenha lugar numa esquadra ainda torna tudo muito mais escabroso.»
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João Varela Gomes e o Presidente que temos



Já fui duas vezes à página da Presidência da República e nada encontro sobre a morte de João Varela Gomes, um dos nossos grandes lutadores e resistentes contra o fascismo.

Tivesse um português vencido um campeonato de matraquilhos na Cochinchina e lá estaria um louvor, morresse um ministro de Salazar, com um cheirinho mínimo a democrata depois do 25 de Abril, e haveria elogios de toda a espécie e presença garantida no funeral.

Por desconhecimento não é: para organizar as comemorações de 5 de outubro de 1974, foi criada uma comissão, presidida por Varela Gomes. Dessa comissão, como representante do PPD, estava Marcelo Rebelo de Sousa.

Registe-se. Não há almoços grátis.
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V de Varoufakis



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O prato do regime



«Quando se dirige uma cadeia de restaurantes que vende galinhas é de todo conveniente que estas não faltem. Foi isso, no entanto, que aconteceu à KFC na passada semana na Grã-Bretanha: dois terços dos seus restaurantes fecharam porque não havia galinhas para fazer a sua "fast-food". Os partidos portugueses da órbita do poder também têm o seu "complexo”, estando viciados no prato do poder, não encontram refeições alternativas. Compreende-se que em Portugal os chamados pactos de regime sejam uma espécie de sino que assinala a hora da refeição. Não é por acaso que o que pode começar por aproximar PS e PSD seja o dinheiro dos fundos europeus para a próxima década e a regionalização. E não uma política de ambiente, numa altura em que a seca continuada vai implicar alterações estruturais no território nacional, de cultura, da educação, do financiamento do SNS, ou mesmo de turismo ou modelo económico. Discute-se, em termos de prato do regime, o que pode ser dividido em termos de dinheiro e de poder regional.

Todos sonham com pactos de regime e com consensos deste tipo. Mesmo o PSD, que por estes dias deveria estar mais preocupado em ser uma alternativa clarividente ao Governo e ao PS, sonha com a divisão do prato do regime. É por causa disto que a classe política portuguesa, se fizesse hoje uma "selfie", veria um rosto cansado e resignado. A política não é só "marketing", mas filosofia. É preciso regenerar as emoções na política e não é com estes pretensos pactos de regime, feitos à volta da divisão de migalhas do bolo, que se consegue que os cidadãos voltem a olhar para o regime com atenção. Porque os cidadãos estão a deixar de encontrar respostas. Sabe-se como são estes pactos de regime: quem decide a divisão das cartas, dos dinheiros e dos favores impõe a agenda política. É uma hegemonia que vai degradando a cultura política e social nacional. Mas a fome de galinhas não as deixa entender porque os restaurantes fecham.»

Fernando Sobral
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26.2.18

American Schools


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Plágio na Eurovisão: alguma dúvida?



Festival da Canção. Diogo Piçarra acusado de plagiar tema da IURD.

«O alerta foi dado nas redes sociais. A música com que Diogo Piçarra recebeu a pontuação máxima do júri e do público é semelhante a “Abre os Meus Olhos”, inserida no Volume II do álbum “Cânticos do Reino”, da Igreja Universal do Reino de Deus. Compare as duas versões.



Ouvir aqui a versão da IURD.
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Johnny Cash nasceu num 26 de Fevereiro



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A unidade das esquerdas: Como? Porquê? Para quê?



«O governo em funções em Portugal desde o final de 2015 é pioneiro em termos da articulação entre vários partidos de esquerda. É ainda pouco conhecido internacionalmente porque Portugal é um país pequeno, cujos processos políticos raramente fazem parte da actualidade política internacional, e porque representa uma solução política que vai contra os interesses dos dois grandes inimigos globais do aprofundamento da democracia que hoje dominam os media – o neoliberalismo e o capital financeiro global. Convém recapitular. Desde a Revolução de 25 de Abril de 1974, os portugueses votaram frequentemente na sua maioria em partidos de esquerda, mas foram governados por partidos de direita ou pelo Partido Socialista sozinho ou coligado com partidos de direita. Os partidos de direita apresentavam-se a eleições sozinhos ou em coligação enquanto os partidos de esquerda, na lógica de uma longa trajectória histórica, se apresentavam divididos por diferenças aparentemente inultrapassáveis. O mesmo aconteceu em Outubro de 2015. Só que nessa ocasião, num gesto de inovação política que ficará nos anais da democracia europeia, os três partidos de esquerda resolveram entrar em negociações para buscarem uma articulação de incidência parlamentar que viabilizasse um governo de esquerda liderado por um desses partidos, o que teve mais votos, o Partido Socialista. A inovação destes acordos consistiu em várias premissas: os acordos eram limitados e pragmáticos, estavam centrados em menores denominadores comuns com o objectivo de possibilitar uma governação que travasse a continuação das políticas de empobrecimento dos portugueses que os partidos de direita neoliberal tinham vindo a aplicar no país; os partidos mantinham ciosamente a sua identidade programática, as suas bandeiras, e tornavam claro que os acordos não as punham em risco, porque a resposta à conjuntura política não exigia que fossem consideradas, e muito menos abandonadas; o governo deveria ter coerência e, para isso, deveria ser da responsabilidade de um só partido, e o apoio parlamentar garantiria a sua estabilidade; os acordos seriam celebrados de boa-fé e seriam acompanhados e verificados regularmente pelas partes.

Os textos dos acordos constituem modelos de contenção política e detalham até ao pormenor os termos acordados. Basicamente, as medidas acordadas tinham dois grandes objectivos políticos: parar o empobrecimento dos portugueses, repondo rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas na base da escala de rendimentos, e travar as privatizações que, como todas as que ocorrem sobre a égide do neoliberalismo e do capital financeiro global, são actos de privataria. Os acordos foram negociados com êxito e o governo tomou posse num ambiente politicamente hostil, por parte do Presidente da República de então, da Comissão Europeia e das agências financeiras. A pouco e pouco a política executada em cumprimento dos acordos foi dando resultados, para muitos, surpreendentes, e ao fim de algum tempo muitos dos detractores do governo tinham de ser vergar perante os números do crescimento da economia, da descida da taxa de desemprego, da melhoria geral da imagem do país, finalmente ratificada pelas agências de notação de crédito. O significado de tudo isto podia resumir-se no seguinte: realizando políticas opostas às receitas neoliberais obtêm-se os resultados que tais receitas sempre anunciam e nunca conseguem e isso é possível sem aumentar o sofrimento e o empobrecimento dos portugueses. Antes, pelo contrário, reduzindo-os. De uma maneira mais directa, o significado desta inovação política é mostrar que o neoliberalismo é uma mentira, e que o seu único e verdadeiro objectivo é acelerar a todo o custo a concentração da riqueza sob a égide do capital financeiro global.



25.2.18

Catalunha: Beija-mão? Não, obrigada




«"Ayer [por el sábado] expliqué que no participaré en la recepción protocolaria del rey, lo que coloquialmente se conoce como el besamanos. Sí que participaré en la cena y en la inauguración del Mobile World Congress, donde coincidiré con el rey y otras instituciones. Allí nos relacionaremos con respeto entre representantes de diferentes instituciones que hemos trabajado intensamente para que esta edición del Mobile sea un éxito. Pero una cosa es el respeto institucional y otra la pleitesía. Más en los tiempos que corren", afirma la alcaldesa en su post.

Colau se reafirma en su crítica a Felipe VI por su reacción tras las cargas policiales del 1 de octubre ("en Barcelona ciudad hubo cargas en 27 escuelas", afirma). "El rey no ha tenido un mínimo gesto de empatía hacia la gente que sufrió esas cargas e hizo un discurso durísimo avalando la línea represiva en lugar de intentar apaciguar el conflicto y aportar serenidad, que era lo que en principio se esperaría de un jefe de Estado", denuncia.»
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Dica (723)




«The collapse of the social democratic vote across the continent calls for radical solutions – including a decisive break with the centre-right.»
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Num restaurante perto de si


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Inovação – entre a Lucidez e a Moda



«Seria difícil subestimar o valor central da Inovação em qualquer sociedade, economia, instituição ou empresa do séc. XXI. Trata-se de algo absolutamente crucial para manter a liderança, a competitividade e a eficiência. É mesmo essencial para assegurar a sobrevivência de modelos de negócio, tecnologias, nações, produtos ou sistemas políticos. Contudo, o empolgado reconhecimento dessa relevância tem transformado a palavra Inovação numa moda retórica, algo que “fica bem” em qualquer discurso de um político, um académico ou um empresário. Induz um ar de frescura e modernidade. Todavia, a ritualização do conceito de Inovação enquanto moda, marketing de imagem ou exercício pseudo-intelectual, frequentemente parece contaminá-la com abordagens excessivamente simplistas, fáceis, amadoras e redundantes. Talvez a genuína Inovação seja prejudicada pela ligeireza com que é invocada.

Mencionar a Inovação 1 milhão de vezes não transforma ninguém num inovador. Frequentar mediaticamente eventos como a Web Summit ou cerimónias de apresentação de “programas” sem fim, “fundos” e dinheiro, muito dinheiro, pode capitalizar visibilidade simpática. Mas talvez o que sobra em fácil imagem possa faltar em substância.

Como noutros domínios, retenho a recorrente a sensação de que em Portugal, tal como na Europa, proliferam os elegantes teóricos da inovação que nunca inovaram nada. E erra-se sistematicamente ao interpretar a Inovação como um conceito essencialmente tecnológico. Logicamente, a inovação tecnológica é estruturalmente importante em toda a evolução da humanidade. Ao longo dos séculos fomos gerando vagas de inovação tecnológica, no seguimento de novas técnicas de construção naval, da revolução industrial, do motor de combustão, da eletricidade, do avião, das telecomunicações, do computador, da Internet ou do telemóvel. Já passaram múltiplas gerações desde a descoberta da eletricidade e, no entanto, continuamos em cada dia a desenvolver com ela novas aplicações.

Mas seria redutor da Inovação concebê-la apenas como descoberta de novas tecnologias. Inclusive, a quase totalidade da inovação tecnológica consiste não em inventar novas tecnologias mas, isso sim, em ter a imaginação criativa para, com as tecnologias existentes, criar novas formas de as aplicar.

Inovação consiste também em criar novas abordagens, novos métodos, novas ideias, novas visões estratégicas, por exemplo. E Portugal é um excelente exemplo para esta questão, por exemplo no que se refere à nossa competitividade. Na verdade, Portugal está relativamente modernizado no plano tecnológico. As nossas principais disfunções são outras. Temos boas telecomunicações, uma malha de autoestradas absurdamente luxuosa, uma ampla utilização de tecnologias da informação, uma Internet que considero mais eficiente que a média da Alemanha, terminais Multibanco omnipresentes para um grande número de aplicações como em poucos países se verifica. O que limita a competitividade da economia portuguesa não é um atraso tecnológico mas um atraso de mentalidades, uma cultura de trapalhice, uma fraca gestão, uma compulsiva regulamentação tão exagerada que se torna terceiro-mundista e que gera uma burocracia que asfixia os cidadãos, as empresas e os verdadeiros inovadores. E, lamentavelmente, talvez nada em Portugal necessite de mais inovação do que a decrépita política.