27.7.13

Un concerto déconcertant



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Da União Nacional à Moção de Confiança – dois 30 de Julho, a 83 anos de distância



Quando na próxima terça-feira for discutida na Assembleia da República a Moção de Confiança apresentada pelo governo, «celebrar-se-á» o 83º aniversário da criação da União Nacional, anunciada ao país em 30 de Julho de 1930 por um Manifesto que a definiu e por um importante discurso de Salazar. Porquê «União» e não «Partido»? Porque os partidos tinham dividido os portugueses e era necessário que estes estivessem unidos.

Não me passa pela cabeça que o primeiro-ministro tenha escolhido propositadamente a data de 30 de Julho em jeito de comemoração (por todas as razões e até porque, para tal, tinha de ter um mínimo de referências de memória histórica, que não tem), mas há algo de sinistro na total falta de sensibilidade, ou na ignorância, que ontem revelou ao utilizar a expressão «união nacional» para qualificar a necessidade de «convergência» – a mesma necessidade que o texto da Moção realça falando de «concertação» e de «coesão».


Para Passos Coelho, a oposição só não é um empecilho se deixar de o ser de facto, quando se concertar com a coligação governamental e com ela se tornar num todo coeso, em tudo o que for importante.

Estou certa de que o primeiro-ministro deixaria escapar um suspiro de inveja se lesse esta passagem de um discurso que o seu mais brilhante antecessor proferiu, em 7/2/1942, na véspera da reeleição de Óscar Carmona, candidato único à Presidência da República: «Por felicidade do País, ao desempenhar-se do encargo constitucional da eleição, não tem que escolher – felizes as nações que nos momentos cruciais da sua vida não são obrigadas a escolher, e às quais a Providência com desvelado carinho dispõe os acontecimentos e suscita as pessoas de modo tão natural a-propósito que só uma solução é boa e essa a vêem com nitidez no íntimo da sua consciência todos os homens de boa vontade! Felizes porque não se debatem em dúvidas angustiosas, porque não se arriscam em desmedidas contingências, felizes sobretudo porque não se dividem!» 
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Sejemos realistas, péçamos o impossível




Os cidadões façarão tudo para se verem livres deles.




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Artista entre bombeiros



Até podia dançar. Milos Forman não desdenharia.


O Baile dos Bombeiros

26.7.13

Mais um desempregado



A crónica de Ferreira Fernandes, hoje no DN, é deliciosa. 

«O britânico Jorge Alexandre Luís, que acaba de vir ao mundo com tantas televisões à porta, para um dia arranjar emprego vai ter de esperar na fila onde já estão o seu pai e o seu avô. No dia seguinte ao nascimento, um tabloide londrino, com a sua tendência para dar falsas notícias, mudou o seu habitual nome - The Sun (O Sol) - e intitulou-se "The Son" ("O Filho"). Erro! O bebé não é "filho", coisa nenhuma. Nem, aliás, neto: é bisneto. Essa condição é que ele vai ter de resolver para um dia ser alguma coisa na vida e não só cortar fitas em exposições de crisântemos como o seu já referido avô, que continua, ainda hoje, a não ser mais do que a frase, "It"s a boy!" ("é um rapaz!"), com que agora se recebeu este bebé. Um jornal humorístico, o Private Eye, foi ao essencial e pôs só três palavras na primeira página: "Woman has baby", "Mulher tem bebé". Mais dilatação do colo do útero, menos dilatação, mais peso (8 libras e 6 onças), menos, foi isso o que se passou. Depois, é que o bebé começou a ter condições especiais para se preparar para a vida. Desde logo, teve a sorte de não ser filho da Luciana Abreu e do Djaló e deram-lhe nomes simples, Jorge, Alexandre, Luís, que o unem à sua gente do passado. É muito importante ser de famílias cultas, como a dos Windsor ou a da minha porteira, que pôs ao neto o nome Custódio, em homenagem a um tio querido e desaparecido. Que o Jorge Alexandre Luís seja digno desses cuidados e feliz.»

(Imagem roubada ao Fernando Roque no Facebook)
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A «Nouvelle Vague» vai-se apagando



Desapareceu hoje mais uma protagonista – a bela Bernadette Lafont – que nos faz recordar sobretudo François Truffaut, desde o seu primeiro papel em Les Mistons (1957), e Claude Chabrol: logo a seguir em Le Beau Serge e um pouco mais tarde em Les Bonnes Femmes. Muitos outros filmes se seguiram.





Estranhamente – e, afinal, nem tanto assim –, quando li esta manhã a notícia da morte de Bernadette Lafont, associei-a imediatamente a Edith Piaf. Não foi fácil identificar o motivo até que cheguei a este excerto de La Maman et la Putain (Jean Esustache, 1973). A memória é um misterioso labirinto.


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Simplesmente ventoinha

Sincronismos na crise



Não sabemos quão longa será a travessia do deserto em que nos arrastamos. Mas em vez de espingardear em todas as direcções contra moinhos de vento, talvez valha a pena tentar compreender onde viemos parar e porquê.

« Há uma estreita relação entre as dinâmicas cíclicas dos negócios, da hegemonia de ideologias, da tendência para o esquecimento da inevitabilidade das crises, da prática de crimes de colarinho branco, de comportamento político face aos "mercados" e das concepções éticas.

É inequívoco o impacto actual da financiarização e desindustrialização dos países capitalistas centrais; da ideologia neoliberal; das teses do fim da história e da superação das crises; das fraudes financeiras, da corrupção, da lavagem de dinheiro e da economia ilegal; da ausência de regulação e fiscalização por parte do Estado; da debilitação da moral e da assunção de que o crime compensa. É inequívoco o sincronismo destes múltiplos aspectos na actual crise estrutural do capitalismo.

O entrelaçamento encoberto e espontâneo das "máfias organizadas" no funcionamento da economia faz parte do nosso presente.

As "elites" não aprendem com a história. A sua incapacidade não é intelectual. É de subserviência política aos que criaram montanhas de nada (crédito fictício) e hoje sugam as populações para refazerem as montanhas imaginadas. Para a economia deles ir bem tem o país de ir mal.»

Vale a pena ler, na íntegra, o texto de Carlos Pimenta. 
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25.7.13

Pesadelo



Santos Pereira, já no Canadá:
«Que raio de sonho mais estúpido que eu tive esta noite. (...) Sonhei que era ministro da Economia.»

(Daqui)

Os anéis já foram

À prova de crise



Ricardo Araújo Pereira, é claro, na Visão de hoje.

«A crise política criada pelo governo resistiu à crise política criada pelo Presidente da República e também por isso o nosso país deveria aproveitar esta encruzilhada para reflectir na sua situação escolar. A Grécia não cumpriu as medidas impostas pela troika e por isso não atingiu as metas previstas. Portugal cumpriu as metas impostas pela troika e mesmo assim não atingiu as metas previstas. Os gregos não têm aproveitamento escolar porque são maus alunos. Portugal é bom aluno e falha na mesma. (...) Portugal é burro. Esta é a triste realidade.»

Na íntegra AQUI.
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Ide e lede




«O facto de a saída da zona euro ser economicamente exequível e até vantajosa não significa nada, visto um país poder escolher ficar na zona euro por questões políticas ou de segurança. Mas quando a saída passa a ser economicamente viável a história muda de figura. Não é o caso da Grécia nem de outros países em crise - por enquanto. Mas perante uma escolha real, o resultado vai ser mais difícil de prever.» 
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Escrito nas estrelas?



No momento que a poeira das últimas semanas começa a assentar, vai sendo possível olhar para o que se passou com um certo recuo e tentar interpretar o guião dos diferentes episódios de uma telenovela a que assistimos mais ou menos atónitos.

No Negócios de hoje (*), Luís Nazaré caracteriza bem, no meu entender, o que fez correr o presidente da República.

«O presidente Cavaco Silva terá pressentido o perigo da situação – um PSD cada vez mais acossado, à esquerda e à direita, perante uma situação económico-financeira preocupante – e viu, também ele, a oportunidade de entrar na História. Fustigado por críticas à sua inacção e complacência para com o Governo, o Presidente quis surpreender. E fê-lo de modo hábil. Fosse qual fosse a vontade da maioria dos portugueses, estava escrito nas estrelas que não haveria acordo com o PS. Cavaco Silva sabia-o bem, tão bem que o seu envolvimento – directo ou por interposta pessoa – no processo negocial foi praticamente nulo. Para a História, ficará a sua tentativa "patriótica" de promover um entendimento a três. Acabará por dar posse, sem reservas, a um governo recauchutado, com presença reforçada do CDS. Missão cumprida.»

O que Luís Nazaré não diz, e que não estava escrito nas estrelas, é que o PS não devia ter embarcado da forma como embarcou em toda esta história. Mesmo que tivesse ido a uma primeira ronda de conversas, sabia à partida que os dados estavam viciados e tinha obrigação de não acreditar, de domingo a quinta-feira, como afirmou, que um acordo parecia possível. Mas claro que isso só podia ter acontecido com um outro Partido Socialista e com um secretário-geral saído de uma galáxia bem diferente daquela onde vagueia, tristemente, António José Seguro.

(*) O link pode só funcionar mais tarde.
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24.7.13

E por falar em 24 de Julho



Qualquer pretexto é bom para se falar de Machu Picchu e foi num 24 de Julho (de 1911) que o explorador americano Hiram Bingham encontrou duas famílias que o levaram às ruínas da «velha montanha». Até lá, esta «cidade perdida dos Incas», que é o símbolo mais típico do seu império (e hoje também do Peru), construída no século XV a 2.400 metros de altitude, extraordinariamente bem conservada e com uma localização absolutamente excepcional, mantinha-se desconhecida. Tem duas áreas distintas, uma dedicada à agricultura, numa série impressionante de socalcos, e uma outra urbana com templos, casas e sepulturas, dispostos ao longo de ruas e de (terríveis!) escadarias.

Património da Humanidade desde 1983, Machu Picchu é destino inesquecível para quem já lá foi e fortíssima recomendação de viagem para quem puder fazê-la.

Tradicionalmente, parte-se de Cusco (uma cidade absolutamente mágica), segue-se pelo Vale Sagrado, com paragem obrigatória no mercado de Pisac, passa-se pelo Vale de Ollantaytambo e apanha-se o mítico comboio que chega às imediações das ruínas. Então… é ficar primeiro de boca aberta e depois descer, trepar, ouvir explicações, imaginar a vida por aquelas paragens, quando a França e a Inglaterra ainda se batiam na Guerra dos Cem Anos e o nosso Vasco da Gama lutava com o cabo das Tormentas. Um pouco impróprio para cardíacos pela altitude e pelo esforço para calcorrear pedregulhos, mas vale bem o sacrifício. Ou não fossem as viagens uma das melhores coisas que levaremos desta vida.






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Alemães ou japoneses?



Da Europa do Sul não são certamente. 
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Rui Machete: O que faz correr Sammy?



Há 30 anos, Rui Machete tomou posse como vice-primeiro-ministro e ministro da Justiça do IX Governo Constitucional, o chamado «Governo do Bloco Central», formado através de um acordo de incidência parlamentar entre o Partido Socialista e o Partido Social Democrata, e que teve Mário Soares como primeiro-ministro. Hoje, passará a ser membro de um executivo PSD / CDS como ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros. Assinou a adesão de Portugal à CEE em Junho de 1985, recebeu então o FMI como receberá agora.

Para além de tudo o que desde ontem tem sido escrito sobre o que fez e por onde passou durante estas tês décadas e mesmo antes, há uma questão que não me sai da cabeça: o que pode fazer com que uma pessoa de 73 anos, que, manifestamente, não precisa de provar nada a ninguém, nem mesmo a si próprio, aceite o frete de aturar um governo desacreditado de fedelhos irrequietos e incompetentes? O que faz correr Sammy? Um desejo de aproximação entre «Massamá e a burguesia iluminada», como alguém comentou numa SMS que hoje recebi? Sentido do dever e amor à pátria? Onde já vai o Pai Natal... 

Se é óbvio que a esperança de vida activa com qualidade aumentou muito, o meu receio é que a moda pegue e se continue a recuar, indo buscar senadores mais idosos e que tão apreciados são, até por uma esquerda bem pensante, por um ou por outro motivo. Mais descansada quanto aos mortos. 
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O CDS tomou conta



Um grande texto de Pedro Santos Guerreiro no Jornal de Negócios (*):

«O vice-primeiro-ministro Portas coordena as áreas económicas. E negoceia com a troika. Pires de Lima é ministro da Economia e vice do vice-primeiro-ministro. Paulo Núncio ensanduicha a ministra das Finanças nos Assuntos Fiscais. Lobo Xavier lidera a reforma fiscal. Mota Soares fica na Segurança Social, Cristas na Agricultura. E Nuno Fernandes Thomaz assume a vice-presidência da Caixa. Enquanto esfregávamos os olhos, perplexos com a crise política, o CDS ficou a mandar nisto. Passos Coelho é o primeiro primeiro-ministro a ficar para segundo. (...)

A dupla Paulo Portas e Pires de Lima será muito poderosa. Sim, é uma dupla, são amigos sem mácula desde a escola primária e, sobretudo, equivalem-se. Portas não manda em Pires de Lima, nenhum é criador nem criatura. E Pires de Lima é como Paulo Macedo, deixou muito para estar aqui. Esta é provavelmente a aposta da sua vida. Vai dar tudo. Sabe gerir equipas. Sabe gerir Portas. Tem ideias próprias sobre economia e fiscalidade. Sobre a troika. E sobre a pequena política, que despreza e dinamita. A sua influência será muito superior às paredes do Palácio da Horta Seca. A banca e as grandes empresas estão radiantes. (...)

O CDS fia-se na Europa, nesta mudança que permitirá também flexibilizar metas do défice. Se não for assim, não há nem Orçamento, quanto mais crescimento; se não for assim, as negociações entre o político Paulo Portas e o técnico Abebe Selassie serão diálogos risíveis entre letras e números.

A remodelação fica marcada pelo reequilíbrio de poderes entre CDS e PSD; por uma orgânica menos pesada; e pelo fim do fanatismo pró-troika (o que esvazia em muito o discurso de Seguro). Talvez Passos tenha deixado ao CDS o presente envenenado da economia e da troika. Para já, abdicou. Cedeu para segurar a coligação.

E assim o CDS não tomou posse, tomou conta. Portas titubeou, torpedeou e tripudiou, mas tem cara de pau para hastear a bandeira de aço: "Eu fico. E ganho". Esperemos daqui a nada poder ao menos dizer: ainda bem.»

(*) O link pode só funcionar mais tarde. 
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23.7.13

García Márquez para esquecer Cavaco e o resto



Gostava tanto, mas tanto, de estar agora a léguas desta terra, que me apetecia ser teletransportada para Aracataca-Macondo, onde estive há alguns meses, rever a casa onde nasceu Gabriel García Márquez, sentir os cheiros da pequena praça da igreja, percorrer as pequenas ruas modestas e mais ou menos caóticas.

Para me consolar, peguei na primeira edição esfarrapada de Cien años de soledad, que li em castelhano assim que saiu, em 1967. E deixo aqui um pequeno fragmento da descrição da morte de José Arcadio Buendía. Quem leu não esquece.

«Entonces entraron al cuarto de José Arcadio Buendía, lo sacudieron con todas sus fuerzas, le gritaron al oído, le pusieron un espejo frente a las fosas nasales, pero no pudieron despertarlo.
Poco después, cuando el carpintero le tomaba las medidas para el ataúd, vieron a través de la ventana que estaba cayendo una llovizna de minúsculas flores amarillas. Cayeron toda la noche sobre el pueblo en una tormenta silenciosa, y cubrieron los techos y atascaron las puertas, y sofocaron a los animales que durmieron a la intemperie. Tantas flores cayeron del cielo, que las calles amanecieron tapizadas de una colcha compacta, y tuvieron que despejarías con palas y rastrillos para que pudiera pasar el entierro.» 
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Uma sina traçada na palma da mão?



Isto foi escrito em 1928. Comentários para quê.

«Podem e devem fazer-se esses sacrifícios? Eu reputo-os imprescindíveis; direi mais, eles têm de fazer-se: a nós só compete escolher a forma de fazê-los. (...)
Mas não tenhamos ilusões; as reduções de serviços e despesas importam restrições na vida privada, sofrimentos, portanto. Teremos de sofrer em vencimentos diminuídos, em aumentos de impostos, em carestia de vida. Sacrifícios, e grandes, temos nós já feito até hoje, e infelizmente perdidos para a nossa salvação; façamo-los agora com finalidade definida, integrados em plano de conjunto, e serão sacrifícios salutares.»
António de Oliveira Salazar, 9/6/1928

85 anos depois o que nós andámos para aqui chegar.
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Devíamos ter vivido muito mais acima das nossas possibilidades


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Submersos na «situação»



«Ouve-se e lê-se e parece que está tudo bem outra vez. Na verdade, está tudo mal outra vez. Talvez o cartoonista italiano Altan tenha feito a síntese perfeita quando desenhou dois porcos engravatados comentando a situação. Diz um: "Esta crise durará anos". Responde o outro: "Finalmente um pouco de estabilidade".

Quando estamos submersos há tantos anos, não estamos mais em crise, estamos "na situação". E está tudo mal outra vez porque a crise política deste estranho mês de Julho se sobrepôs à emergência que vivemos. É um pouco desesperante ver as análises internas e externas dos partidos fixarem-se no quem-ganha-quem-perde das últimas semanas, como se estivéssemos a falar de outra coisa que não a ameaça de um segundo resgate.

A comédia tem mais audiência que a tragédia. Não há moralismo nestas palavras, apenas espanto. Afinal, o mundo parece mais interessado em saber o nome do bebé Middleton do que em compreender a falência de uma cidade, onde metade da iluminação eléctrica não funciona, dois terços das ambulâncias não circulam, há 80 mil edifício vazios, 40 mil em perigo de derrocada, onde os pensionistas estão em risco de perder pensões. Essa cidade não fica no fim do mundo, é Detroit, já viveu a glória e fica nos EUA, que até tem orçamento e política federal.

O "compromisso de salvação nacional" estava fadado ao fracasso por inconveniência dos partidos, mais até que dos seus líderes. É esta inércia militante que impressiona. Há uma espécie de anacronismo intelectual nos partidos, que falam de um país que não soa ao nosso mas ao deles, que falam de dívida como se não existisse e de dinheiro como se houvesse.»

Pedro Santos Guerreiro
O link pode só funcionar mais tarde.
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É isto


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22.7.13

Partidos? Certamente, mas...



Se há que combater a vaga antipartidos que por aí vai crescendo de dia para dia, por motivos óbvios, isso não deve impedir-nos, bem pelo contrário, de reconhecer a triste e preocupante realidade com que estamos confrontados e que se agravou nos últimos tempos. António Guerreiro retrata-a bem, no Ípsilon do passado dia 19:

«A política, naquilo que dela ainda existe, já não são os partidos que a fazem: são os comentadores os magistrados, os jornalistas etc. Veja-se, aliás, como os homens de partido se tornam comentadores para saírem do espaço despolitizado e entrarem no espaço – exíguo, mas o único que resta – da política. Algum governo, nos últimos anos, se formou com base num projecto de sociedade? Os governos são cada vez mais técnicos e cada vez menos políticos. Maiorias políticas parlamentares elegem e apoiam conselhos de administração da empresa-país, que por sua vez nomeiam burocratas (sempre com uma grande aura de "competência", nem sempre confirmada) para gerir a coisa pública.» 
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E como as frases são como as cerejas



Para completar o post anterior, em comentário a uma frase de Cavaco Silva no discurso de ontem:

«E na unidade resultante da sua integração e da concordância profunda dos seus interesses, ainda que às vezes aparentemente contrários, não há que separá-los ou opô-los, mas que subordinar a sua actividade ao interesse colectivo. Nada contra a Nação, tudo pela Nação.»
António de Oliveira Salazar, 21/10/1929 
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O país não ideológico de Cavaco Silva



De tudo o que o presidente da República disse ontem, há uma frase-chave que já vi referida mas não suficientemente sublinhada:
«Mais cedo ou mais tarde, um compromisso interpartidário alargado será imposto pela evolução da realidade política, económica e social do País.» E Cavaco explicita logo a seguir para que não fiquem dúvidas: «Estou igualmente convicto de que os cidadãos se encontram agora mais conscientes da necessidade de um consenso entre os partidos que subscreveram o Memorando de Entendimento.»

Ou seja: para o presidente da República, está à vista o fim da democracia parlamentar tal como a conhecemos, esta deve reduzir-se à acção concertada de um bloco central que a domine sem sobressaltos. Tudo o resto é lixo irrelevante que só serve para empatar. Para já, interessa a defesa consensual de um Memorando, amanhã de um outro texto ou tratado qualquer.
Deve ficar garantida a neutralização de divergências significativas quanto à «evolução da realidade política, económica e social do País», o que implica, pura e simplesmente, o fim de devaneios ideológicos, a convergência para uma ideologia única. Quando se fala do futuro de um país nestes termos, é de ideologia que se trata e não apenas de folhas Excel.

O cidadão Cavaco Silva teria mais jeito e sentir-se-ia mais à vontade como presidente do Conselho de Ministros em tempos antigos. Não hesitaria em assinar uma versão mais modernaça de uma outra frase que ficou célebre e de que me lembrei ontem imediatamente: «A União Nacional nunca será um partido, porque tem uma aspiração mais alta : organizar a Nação!» Descubra as diferenças. 


(Também aqui.) 
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Medalha de bronze



Um terceiro lugar neste terrível pódio, que bem dispensávamos.

(Daqui)
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Não há milagres grátis



Depois do serão de ontem, estamos todos em clima de uma espécie de ressaca e, para já, é impossível largar o tema:

«Os partidos do Governo julgavam que, dando eleições ao PS, este absolveria dois anos de austeridade cruel que destruiu a economia real do país. O PS acreditava que PSD e CDS sairiam como cordeiros do redil montado pela troika.

Os portugueses, como os peixes que escutaram o sermão de Santo António, viveram embalados na ilusão de que o país era mais importante do que as facções partidárias. Há milagres que não existem. Agora assistimos, perante um acordo impossível de alcançar, à transmissão da culpa. (...)

Só alguém que acredita em tudo poderia supor que este acordo de "salvação nacional" lavasse a roupa suja e tornasse tudo mais branco. Ninguém sai bem deste falso milagre, até mesmo António José Seguro que pareceu disposto a fornecer oxigénio a um Governo exangue. Desfeito o equívoco, num cozinhado onde os portugueses nunca foram informados dos ingredientes, já não há mais milagres grátis e disponíveis. Até porque se destruiu o resto da esperança.» (O realce é meu.)

Fernando Sobral
O link pode só funcionar mais tarde.
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21.7.13

A festa é no Caldas ou na Lapa?



Duas semanas depois, Cavaco reforçou a coligação, essa é que é essa! Neste momento, Passos e Portas estão a decidir se são obrigados a convidar Seguro para o Moët & Chandon.

Nação valente!
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Para memória presente


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Se isto fosse outro país



... já haveria uma corrida a uma Casa de Apostas, com muito dinheiro posto em cada uma das diferentes hipóteses possíveis para logo, às 20:30. Eu escolheria esta: «em solidariedade com o rei dos belgas, abdico hoje». 
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Brincadeiras perigosas



«Sob o alto patrocínio do Presidente da República os partidos estiveram toda a semana a brincar com os portugueses.

Basta uma breve leitura dos documentos que o PS e o PSD publicaram nos seus sites para perceber que, das duas uma: ou aqueles documentos não são os que levaram às negociações e estão a mentir aos portugueses ao dizer que foram ou, de facto, aquelas propostas são mesmo as que levaram e não se justificava nem um minuto de conversações... quanto mais uma semana. (...)

O Presidente da República meteu-se, e meteu-nos, num jogo muito perigoso ao mandar-nos julgar os políticos em função do resultado dum acordo que sabia ser impossível. Será que queria provar que é ele o único político digno de credibilidade? (...)

Cavaco Silva podia até colaborar com a fantochada em curso, a que tenta fazer esquecer que a crise politica é da exclusiva responsabilidade de Passos e Portas. (...) Não pode é deixar em funções alguém que acha que somos um bando de preguiçosos e que temos vivido à custa dos "sacrificados" do Norte. Quem não percebe a origem dos problemas nunca será capaz de os resolver.

Seguro, em vez de anunciar simplesmente as razões da falta de entendimento, fez uma série de promessas que, na actual conjuntura e num futuro próximo, não vai poder cumprir se for para o Governo. Foi assim que Passos Coelho começou a perder toda a credibilidade. Foi assim que os políticos perderam a confiança dos portugueses.»

Pedro Marques Lopes