Tinha acabado de ler um texto sobre o papel da blogosfera nos recentes acontecimentos tunisinos, quando o DN me recordou o cinquentenário do assalto ao Santa Maria.
Impossível não tentar imaginar o que podiam ter sido transmissões televisivas em directo de um acto com tal espectacularidade, para além de posts em blogues, Causas no Facebook, horas sem parar no Twitter, milhões de sms’s, etc., etc. Mas nada disso então existia, tudo foi bem diferente e meio século mudou de facto o mundo (e, inevitavelmente, o funcionamento das nossas cabeças).
Sei que pouco ou nada foi conhecido nesse dia em Portugal, por razões óbvias de exercício da censura, mas não resisto a partilhar o meu 22 de Janeiro de 1961. Estudava então em Lovaina, na Bélgica, e a directora da residência universitária onde eu morava veio acordar-me para me dizer que um navio português tinha sido assaltado por piratas, em pleno alto mar.
Entre a perplexidade generalizada e o gozo («ces portugais!…»), passámos horas colados a roufenhos aparelhos de rádio, sem conseguirmos perceber, durante parte do dia, o que estava concretamente em jogo, já que não eram identificados os piratas nem explicados os motivos da aparatosa aventura.
Entre a perplexidade generalizada e o gozo («ces portugais!…»), passámos horas colados a roufenhos aparelhos de rádio, sem conseguirmos perceber, durante parte do dia, o que estava concretamente em jogo, já que não eram identificados os piratas nem explicados os motivos da aparatosa aventura.
Quando, já bem tarde, foi referido o nome de Henrique Galvão e descrito o carácter político dos factos, pudemos finalmente dar explicações às nossas colegas de residência, das mais variadas nacionalidades (só raparigas, claro, «eles» apenas podiam entrar para as refeições). Houve festa, brindou-se à queda da ditadura em Portugal – para nós iminente a partir daquele momento, sem qualquer espaço para dúvidas – e… mascararam-nos, em jeito de comemoração.
Não fosse esta foto, que fui hoje buscar ao meu baú quase inesgotável, e talvez já nem me lembrasse dessa noite. Um pouco kitch? Certamente: há 50 anos, a vida era, toda ela, bem mais ingénua do que em 2011.
(Na primeira fila, eu e a Maria Belo.)
...
...
6 comments:
O Henrique Galvão quase se antecipou à imagem revolucionária de Ché Guevara, até já usava uma boina igual à que usou o argentino.
Foi uma pena não ter havido uma naior projecção mediática internacional, e um pouco mais romântica.
Mas a nossa imagem de marca será sempre em português suave, sem guernicas nem baias dos porcos!
Paciência!
Enfim, caro septuagenário, com muito boa vontade...
Hoje tentamos organizar revolucoes do lugar cómodo do sofá ou da secretária. Emocoes que nao se equiparam...
Rita, os tunisinos estão a fazê-la na rua...
Que tempos...!:-)
Lamento Informar, cara Joana, mas os Portugueses foram bem informados, A Censura nesses tempos era bastante incompetente.
Tenho guardadas as Paris-Match (2) que foram publicadas sobre o desvio do Santa Maria e que o meu pai comprou num quiosque no Porto sem qualquer problema.
Parece que os censores não entendiam o Francês!
Pode ler aqui a reportagem que os Portugueses de 1961 leram:
http://novafloresta.blogspot.com/2008/08/no-apaguem-memria-os-censores.html
Enviar um comentário