30.5.11

O voto em branco é um voto de protesto, o voto em branco é (apenas) um voto de protesto


São numerosas e longas as discussões sobre a opção de votar em branco, talvez mais que nunca nestes dias em que muitos não se revêem em nenhuma das candidaturas às eleições do próximo Domingo, sem no entanto pretenderem juntar-se ao batalhão dos abstencionistas.

Porque tenho participado em algumas das ditas discussões, e para assentar as minhas próprias ideias, aqui ficam, esquematicamente, alguns apontamentos.

1 – Antes de mais, recorde-se que é a própria Constituição Portuguesa que, no Artº 149, estabelece que é pelo método de Hondt que os votos são convertidos em números de mandatos.

2 – Quem quiser ver, ou rever, o funcionamento do referido método pode recorrer a muita informação disponível na net (Wikipedia incluída), mas no portal da DGAI (Direcção Geral da Administração Interna) encontra-se uma explicação muito resumida e até uns exemplos muito simples que ajudam a compreender.

3 – Para a atribuição de mandatos, não são considerados os votos brancos e nulos, como está claramente explicado num esclarecimento da CNE: eles apenas contribuem para reduzir a abstenção.

4 – Há uma contestação recorrente deste procedimento, concretizada neste momento numa Petição pública, na qual se defende, para o caso das legislativas, a «junção dos votos em branco aos votos que irão ser convertidos em mandatos pelo método de Hondt». Não se faz nenhuma proposta de concretização e eu continuo sem entender o que se pretende na prática.

5 – Circula na net um vídeo, que é enganador porque não se aplica ao caso português, mas que ilustra um outro método, que não o de Hondt, para distribuição de mandatos. A ser utilizado, mostra claramente que os votos em branco favorecem os grandes partidos em detrimento dos mais pequenos. Não sei se é para uma solução deste tipo que os subscritores da Petição implicitamente apontam (sem método de Hondt).

6 – Faz caminho a ideia de defesa de cadeiras vazias na AR, ou seja de mandatos não atribuídos, correspondentes à soma de brancos, nulos e abstenção.

Descendo à terra e falando só de votos brancos. Por mais voltas que dê, não consigo deixar de considerar que eles são uma mais do que legítima forma de protesto e que como tal devem continuar. Quem não se revê em nenhuma das 17 candidaturas apresentadas, e já não vai a tempo de propor uma 18ª, pode manifestá-lo dando-se ao trabalho de sair de casa. E os futuros deputados eleitos devem ter consciência do significado político desse acto. Mas... ponto final, na minha opinião e por vários motivos:

1 - Faz algum sentido querer «distribuir» votos brancos, de uma maneira ou de outra, por deputados em que não se quis votar?

2 – Em alternativa: cadeiras vazias com consequente diminuição do número de deputados (que num limite teórico de boicote nacional poderia significar esvaziamento da AR) e que, praticamente, prejudicaria os partidos mais pequenos?

3 – Quanto menos votos forem contabilizados para a atribuição de mandatos, mais se favorece os grandes partidos em detrimentos dos pequenos. É isso que se pretende?

4 - Last but not the least: até prova em contrário, tudo leva a crer que, neste momento, a direita está mais motivada e que são os eleitores de esquerda os mais desiludidos e, portanto, com maior tendência para votar em branco. Para bom entendedor não basta meia palavra? Creio que sim. Não é mesmo tempo para estados de alma… Que o voto em branco fique guardado para épocas menos turbulentas…

P.S. 1 – A ler: O voto em branco não é como o algodão - engana.

P.S. 2 – O meu último ponto 2. Não está correcto: na hipótese de se decidir considerar o conjunto de votos brancos (e também os nulos e a abstenção) como um «partido» adicional – o das cadeiras vazias… -, daí não resultariam normalmente danos para os partidos mais pequenos.

Para quem se interesse especialmente por estas questões (vai longa a discussão sobre as mesmas, pelo menos no Facebook), aconselho a leitura de A Votação e a Matemática

(Imagem de Kate MacDowel)
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5 comments:

Jorge Conceição disse...

Mas que a discussão seja retomada, a sério, depois das eleições e com outro processo eleitoral a uma distância confortável para permitir o discernimento! É que, embora dê muito jeito à "estabilidade política" o método de Hondt, acho que ele desvirtua o sentir democrático expresso nas urnas. O método proporcional seria o que melhor traduziria as diferentes opções. Aproximar-se-ia, também, do espectro político nacional o círculo uninominal, mesmo com o método de Hondt, embora por defeito também para os pequenos partidos.

Quanto à representatividade dos votos em branco (não dos nulos, nem da abstenção, que são coisas diferentes), do que, por exemplo, Jorge Miranda é defensor, resultaria apenas uma diminuição dos lugares dos deputados, nunca acontecendo (por contraditória) a situação extrema apontada de não haver preenchimento de lugares de deputados, prejudicando mais os pequenos partidos. Na verdade, nessa hipotética situação extrema em que não haveria deputados, não existiriam nem pequenos, nem, grandes partidos a representar ou, por outras palavras, todos se teriam tornado ultraminoritários e sem representação parlamentar...

Joana Lopes disse...

Falas de método proporcional puro e simples? Sei pouco dos sistemas usados neste domínio. Tenho de me informar.

Jorge Conceição disse...

Sim, Joana. Aliás o link que puseste há pouco tempo (no Brumas ou no FB, não me lembro) de Carlos Calado, "A matemática do voto" faz, com os resultados das últimas eleições legislativas, uma boa comparação entre estas três distribuições: o método de Hondt pelos círculos actualmente existentes, a distribuição proporcional directa e o método de Hondt com um único círculo nacional. As duas últimas aproximam-se nos lugares conseguidos por cada partido. E os dois partidos mais votados (PS e PSD) diminuíam o número de deputados, enquanto que os outros três subiriam, sendo que no método proporcional directo o MRPP e o PND conseguiam dois lugares e o PH 1 lugar. Quer dizer, para uns as opiniões políticas ampliavam-se, enquanto que para outros era a confusão que aumentava... Mas é a democracia, não é?

Joana Lopes disse...

Vou repescar esse link e ler com cuidado. Nesse dia, até disse que estava com sono para esmiuçar, pu-lo só para o M. Vilarinho ler.

Anónimo disse...

Tenho uma opinião bastante crítica do voto em branco ou de qualquer outra forma de voto de protesto. Creio que no contexto atual isso servirá para o afastamento entre políticos e eleitores e, por esse motivo, para libertar os políticos do pouco controlo que ainda é feito pelos cidadãos. É difícil explicar porquê em poucas palavras. Por isso mesmo partilho este documento: http://pt.scribd.com/doc/56616035/Apelo-Ao-Voto-Informado