31.12.07

O SIM que salvou o ano

Nas quinhentas e uma revistas de 2007 que vão desfilando, há pouquíssimas referências à vitória do Sim no referendo sobre o aborto. Ainda menos à sua importância (*).

Para mim, 11 de Fevereiro foi o dia mais importante do ano em Portugal. Foi nele que se fez realmente a diferença, porque demos então um passo em frente, ética e civilizacionalmente. Contra ventos e muitas marés, os portugueses (poucos, é certo, mas os suficientes) disseram «Basta!» ao obscurantismo e à hipocrisia. Tiraram manchas cinzentas à História.

Sem passadeiras vermelhas nem canetas de prata, festejámos, no Altis em Lisboa e noutros locais por todo o país. Com alegria genuína, depois de uma campanha difícil, com menos recursos (muito menos) do que as imagens das televisões poderiam fazer crer.

Um mês antes do referendo, fui a uma primeira reunião de «voluntários» de um dos movimentos e quase caí de espanto quando constatei que os dedos de pouco mais de uma mão chegavam para contar as presenças. Arregaçámos as mangas e outros se foram juntando (mais «outras», naturalmente ou nem por isso...), mas nunca fomos muitos. Porque a verdade é que, se havia sempre notáveis disponíveis para serem entrevistados, faltavam mãos para tarefas «menores» e pés para calcorrear ruas, gélidas e chuvosas, em épicas distribuições de muitos milhares de panfletos.

Mas «tout est bien qui finit bien» – e foi o caso. Felizmente.

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(*) Excepção – expectável – para a Shyznogud, em Womenage à Trois.

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Declaração conjunta dos Movimentos pelo Sim, Hotel Altis, 11/2/2007:

De que se ri o governo?

...é o título da crónica de Daniel Sampaio na Pública desta semana (sem link).

Alguns excertos (o realce é meu):

«Acima de tudo, perdeu-se a esperança. Ouve-se na rua o ruído de grandes manifestações, mas sobretudo pressente-se a apatia, o desinteresse pela política, a falta de entusiasmo, a indiferença ou desdém para com os membros do governo (odiados ou apenas tolerados, nunca estimados), que se empertigam ao menor sinal de oposição.»

«...na realidade, ninguém se deveria gabar do fecho de uma escola ou do encerramento de um hospital: é preciso perceber que se está apenas a oferecer um binóculo longínquo a quem acaba de perder os óculos



A última imagem é especialmente feliz. Este governo anda a oferecer binóculos, computadores e Novas Oportunidades a quem precisa de óculos, tabuadas e emprego.

30.12.07

Espanha: a Igreja ao ataque

ACTUALIZADO (*)


Realizou-se hoje, em Madrid, uma grande manifestação convocada pelo arcebispo da capital como «Acto de defesa da família cristã» – um milhão e meio de participantes, segundo os organizadores, quarenta bispos e uma mensagem especial de Bento XVI transmitida por videoconferência.

Na prática, e a três meses das eleições gerais, foi um protesto contra o governo de Zapatero, pelas medidas tomadas em vários domínios como divórcio, casamento de homossexuais, aborto e educação para a cidadania. O sistema foi acusado de defender um «laicismo radical» que, ao atacar a família, «leva à dissolução da democracia».

Os problemas das relações entre a Igreja e o governo socialista manifestaram-se desde que este iniciou o seu mandato, em 2004. O El País de hoje traz um interessante artigo sobre o assunto.

Neste momento, a hierarquia eclesiástica está de tal modo aliada ao PP, na oposição, que alguns sectores da Igreja e uma parte da própria direita se sentem incomodados. E isto apesar de alguns recuos por parte do governo:

«Además de renunciar a ampliar la legislación sobre el aborto y a abordar la eutanasia, el Gobierno ha mantenido la asignatura de religión en la escuela - como oferta obligatoria, aunque sin computar a los efectos de la nota final -, y ha estabilizado laboralmente a cargo de las arcas del Estado a los 15.000 profesores de la asignatura, 8.000 de ellos en la escuela pública, que la jerarquía eclesiástica selecciona y despide a su libre albedrío, guiada por criterios tan extravagantes para la moral civil como "vivir en pecado" o divorciarse.»

Assiste-se ao renascer de uma ideologia neotradicionalista que recupera a velha tentação de impor ao conjunto da sociedade as normas morais da Igreja – de uma forma muito intransigente e relativamente agressiva.


Perante tudo isto, os nossos policarpos parecem, apesar de tudo, mais ou menos meninos de coro – digo eu...

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(*) Aconselho a leitura deste texto de Rui Bebiano, o meu comentário ao mesmo e a sua resposta.

28.12.07

Aos Prezados Accionistas

Numa carta datada de 19 de Dezembro, mas que só hoje, dia 28 (!), chegou a cada «Prezado Accionista», diz Jardim Gonçalves:

«Reflecti profundamente sobre o presente e futuro do Millennium bcp [escreve-se mesmo assim, com minúsculas] e tomei a decisão que considero, no presente, como a mais adequada. Tal como em 2005, cessarei as funções que desempenho a um ano do final do mandato e uma vez encerrado o exercício».

Refere ainda que continuará a ser decisiva para o banco «a existência de uma ampla transparência e convergência de vontades e interesses».

Escusava de se ter cansado a reflectir - e quanto a transparência, já sabíamos que foi exemplar...

Homens e lobos

ACTUALIZAÇÃO (*):

No Quarta República (via A Origem das Espécies).

«O Governo, o presente, desmantelou mais uma Unidade de Urgência em Vila Pouca de Aguiar, tendo os doentes que seguir para Vila Real. (...)

Enquanto isto, o Governo, e aí não sei se foi o actual, esbanjou entre 100 e 150 milhões de euros para construir um viaduto exclusivamente destinado a lobos e proceder a alterações no traçado da auto-estrada de Vila Real para Chaves, precisamente nas imediações de Vila Pouca de Aguiar.

Apesar de haver várias passagens subterrâneas destinadas aos bichos em geral, a distinta casta dos lobos exigiu um caminho aéreo, com arranjo paisagístico especial, para não lhes criar stress no atravessamento.

São sete os lobos de tão elevada estirpe, pelo que cada um custou cerca 20 milhões de euros!...De elevada estirpe e de inteligência pelo menos tão fina como a dos promotores do loboduto: parece que ainda nenhum atinou com tal caminho!...»


Embora reconheça que há muita ignorância e/ou muita demagogia nas manifesações contra encerramento de urgências e similares, custar-me-ia a engolir esta «pílula» se vivesse em Vila Pouca de Aguiar...



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(*) Aconselho a leitura dos esclarecimentos deixados pelo leitor Henrique Pereira dos Santos (a quem agradeço) na Caixa de Comentários.

27.12.07

Matai-vos uns aos outros


Tinha acabado de ler a homilia de Natal de D. José Policarpo, quando caiu a notícia do assassinato de Benazir Bhutto.

O cardeal fez um discurso virado para dentro da sua comunidade, em termos estranhos para o comum dos mortais (« Separados pelo pecado, Deus e o homem reencontram-se em Jesus Cristo, podem conhecer-se e amar-se, na verdade profunda dos seus corações»). Tudo bem – a missa era dele e os fiéis também.

Mas, e isso é mais grave, aproveitou para afirmar que «todas as expressões de ateísmo, todas as formas existenciais de negação ou esquecimento de Deus, continuam a ser o maior drama da humanidade».

Ignorou – ou fingiu ignorar – que as religiões e as suas igrejas são também «o maior drama da humanidade», porque estão muito longe (cada vez mais longe?) de serem um elo entre nações e dentro das nações. Porque os homens continuam a matar em nome dos deuses e dos seus representantes na terra. Porque há religião a mais – e não a menos – a determinar os destinos do mundo.

Hoje, a vítima foi Benazir Bhutto – apenas mais uma.

26.12.07

Festivos equívocos


Regressou a calma. Ficaram para trás supostas ou reais alegrias, os gastos e o desgaste.

Há um tempo e uma idade para tudo. Mas parece-me que nunca ouvi, como este ano, tantas pessoas desejarem Boas Festas ao mesmo tempo que confessavam sofrer antecipadamente com a perspectiva da invasão de filhos, netos e sobrinhos, queixando-se (aos outros) do malentendido que se anunciava como de festa e de reencontro.

As crianças agradecem. São atafulhadas de embrulhos sem perceberem muito bem a razão, fingem acreditar que não é o avô que está vestido de Pai Natal e tiram partido da situação. Melhor para elas.

Quanto aos adultos que não acreditam no Menino Jesus, há sobretudo trabalho e comezainas - como se do fim de um ramadão se tratasse. Este ano, vieram à televisão uns fundamentalistas das dietas aconselhar-nos a comer um prato de sopa ou uma fatia de pão escuro antes da ceia para depois termos menos fome. Sera que há pachorra?

Há também as complicações das famílias. No caso de um casal meu amigo, em que ambos têm pais separados e recasados, há tantas refeições a marcar, e com tantos filhos e enteados, que os almoços e ceias começam no dia 24 mas só param lá para 27.

Quase não ouvi notícias, a não ser como fundo de outros barulhos. Mas parece que o Sócrates continua contente, o Cardeal preocupado e o Papa igual a si próprio. Ainda bem.

Não desanimem porque para o ano há mais – a nossa matriz judaico-cristã assim o determina.

22.12.07

Ceia de Natal?

Estou absolutamente boquiaberta.

Alguém é capaz de me explicar qual a razão de ser de um longuíssimo programa de culinária, expressamente promovido por um hipermercado, em horário nobre da RTP1?

Doze personalidades (Mário Soares, António Barreto e outros, incluindo alguns que não sei quem são) serviram de cenário, foram comendo e bebendo e, nos intervalos, vieram falar dos avós, da generosidade, de crianças e dos pobrezinhos – enfim de inevitáveis banalidades. No fim, receberam presentes – cestas com produtos portugueses «da mais alta qualidade», como o representante do Continente teve o cuidado de sublinhar.

Ou me escapou alguma coisa, ou estiveram a preparar um Tesourinho Deprimente para uns quaisquer Gatos Fedorentos.

Os nossos dois provincianos

ACTUALIZADO (*)

Ana Sá Lopes, hoje, no DN:

«O "é verdade, sou um provinciano" (...) marca um novo impulso na identificação entre primeiro-ministro e Presidente da República. (...)

Há em Sócrates – como, de resto, em Cavaco – qualquer coisa parecida com uma comovente ingenuidade. Eles pesam o que dizem, não dão ponto sem nó, treinam o discurso e mantêm-se sempre na permanente tensão dos genuínos provincianos no Palácio. De Poço de Boliqueime para Lisboa, de Vilar de Maçada para o mundo, há um percurso socrático-cavaquista comum. (...)

Vá lá, provincianos somos todos. O canto não é propriamente cosmopolita e não existe sequer uma cidade a sério. Lisboa é uma avenida e três teatros, onde vão três escritores que têm quadros de três pintores.»

Ler o artigo na íntegra aqui.


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(*) Ler comentário a este post em A Barbearia do Senhor Luís.

20.12.07

Escritores da Liberdade

Ao Raimundo Narciso, do PUXAPALAVRA, os meus agradecimentos pela nomeação, especialmente significativa porque vem de alguém que, muito mais do que «Escritor da Liberdade», lutou e sofreu por ela como poucos. Os seus dez anos na clandestinidade falam por si.

«Passo a bola» aos cinco que se seguem.

Em primeiro lugar, escolho um blogue colectivo, o Não Apaguem a Memória!, na pessoa da Paula Cabeçadas, porque é quem mais o tem «alimentado» nos últimos tempos. Que isto sirva para chamar a atenção de alguns para o Movimento com o mesmo nome.

Rui Bebiano, de A Terceira Noite, foi uma das pessoas que gostei muito de conhecer em 2007. Excelente escritor é certamente, livre sem qualquer espécie de dúvida. E tem o espaço de que mais gosto na blogosfera.

O Fernando Redondo, do Dotecome, é um velho amigo e companheiro, de várias décadas e de muitas andanças, antes e depois de termos chegado juntos à liberdade.

Nelson de Matos, que tantos escritores ajudou, meu editor (e também do Raimundo Narciso), tem um blogue mais ou menos escondido, o Textos de Contracapa,2. Bem ganhávamos se se juntasse mais a estas lides.

Na pessoa do Samuel, de “O Cantigueiro”, leitor assíduo do «Brumas», honro os que usaram a cantiga como uma arma quando era ainda muito difícil fazê-lo.

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P:S. – Não arrolei alguns, porque vi que já tinham sido nomeados por outros. Dois exemplos apenas: o João Tunes e o Eduardo Graça.

19.12.07

A suspensão do PASSADO / PRESENTE

Uma notícia triste, porque se tratava de um excelente blogue, único no seu género.

Habituara-me a esperar que por lá aparecesse a crítica ao livro X ou a notícia sobre a efeméride Y.

Mas percebo que é difícil manter vivo o passado, quando o presente invade todos os espaços e ocupa todos os tempos.

Para o Rui Bebiano e para o Miguel Cardina, um obrigada e até breve – tentem voltar.

Carla e Nicolau


Em Womenagetrois:

«...A França poderá ser o primeiro país do mundo a ter uma primeira-dama que o mundo já viu nua. (..,)

Está mais que provado que, em política como no amor, os fins justificam os seios.»

18.12.07

No reino da Belgoslávia

Ensino a peso


Não foi preciso Bruxelas decretar porque nós somos bons alunos e já aprendemos a filosofia.

«Todos os manuais do 1.º Ciclo que ultrapassem os 550 gramas ficam automaticamente excluídos da lista de manuais que as escolas podem adoptar. Para os 2.º e 3.º Ciclos o peso aumenta um pouco, estando o limite máximo situado nos 750 gramas.»

Esquecem-se de que os portugueses são hábeis: um livro dará lugar a dois, tiram-se «bonecos», diminui-se o tipo de letra. Melhor ainda, imprime-se em papel Bíblia – ou de mortalha que os jovens conhecem bem.

17.12.07

Amar a pátria até ao sacrifício


Volto ao livro sobre a Mocidade Portuguesa Feminina.

Andam por aí muitas tentativas de branqueamento do passado e frequentes declarações de inocência de pessoas e de instituições. É por isso bom trazer à luz do dia textos que falam por si.

A MPF, definia-se como apolítica e é evidente que nunca o foi. Basta ler os seus Objectivos da Formação Nacionalista, definidos em 1942 (*):

Dar a conhecer o passado de Portugal e a riqueza do “património lusitano, latino e cristão”;

• Preparar as gerações futuras para amarem a pátria “até ao sacrifício”;

• Transmitir os “princípios morais e patrióticos” que enformavam o “equilibrado nacionalismo do Estado Novo”;

• Apontar Salazar como o “realizador da Restauração económica e política do país, mas também, e sobretudo, da Reforma Moral tão necessária na nossa Pátria e que é base de toda a reconstrução nacional”;

• E dar como exemplo os “valores femininos da nossa História”, para formar raparigas “conscientes dos seus deveres de Cristãs e Portuguesas e convictas da necessidade de cooperarem, pelas suas virtudes, pelo seu aperfeiçoamento moral, na conquista dum Portugal Maior”.

Foram várias as gerações onde tudo isto ficou gravado, mesmo que mais ou menos inconscientemente. Os comportamentos foram condicionados, o medo assimilado, um orgulho nacional bacoco (que talvez ainda hoje condicone muitas coisas) imprimiu carácter.

Reavivar a memória afasta fantasmas. Liberta para o futuro - pelo menos assim o espero.

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(*) Fonte: Irene Pimentel, Mocidade Portuguesa Feminina, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2007, 240 p.
Foto: p.15. Texto: pp.88-89.

16.12.07

China condena Alemanha por contrafacção

A China evangeliza o mundo


Mao Tsé-Tung deverá ter dado algumas voltas no seu mausoléu da Praça Tienamen, quando saíram da tipografia do Exército de Libertação (onde era impresso o seu Livro Vermelho) as primeiras bíblias fabricadas na China. Estava-se então no início da década de 80.

Mas o negócio só explodiu nos últimos vinte anos, já com sede própria em Nanjing, depois da criação de uma joint-venture entre uma empresa chinesa, a Amity Printing, e outra inglesa. Cinquenta milhões é o número de exemplares já impressos - em noventa línguas e exportados para mais de sessenta países. Estima-se que, em 2009, um quarto da «produção mundial de bíblias» (!...) seja chinesa.

Aliás, a religião está na moda na China. O próprio presidente Hu Jintao terá reconhecido a importância do seu papel para conseguir a harmonia da sociedade.
Ele lá sabe.

Fonte

14.12.07

Irene Pimentel – Prémio Pessoa 2007

Hoje, sim, senti orgulho por viver neste país. Porque um júri como o do Prémio Pessoa decidiu atribuí-lo a Irene Pimentel. Porque escolheu alguém que se tem dedicado a estudar, objectiva mas comprometidamente, as manchas negras da história do nosso século XX, ajudando assim a preservar a memória dos que não se resignaram a aceitá-las.

Da historiadora, muitos já falaram, muitos mais falarão nos próximos dias.

Da pessoa, quem a conhece conta sempre com uma presença especialmente calorosa e com uma desarmante simplicidade.

Por razões várias, temo-nos encontrado e cruzado muitas vezes nos últimos meses. Privilégio para mim. Porque a considero, eu também, «minha amiga e companheira de ideais» – como ela me disse (me escreveu) há dois dias.

Goodnight, Irene e parabéns.

13.12.07

«Mocidade, Luta e Canta!»

PRÉMIO PESSOA 2007
PARA IRENE PIMENTEL

(14/12/2007, 12:15)


ACTUALIZADO (**)


Foi ontem lançado mais um livro de Irene Pimentel: «Mocidade Portuguesa Feminina» (*).

É um belíssimo álbum que, para além do texto, contém muitas dezenas de fotografias da época, de pessoas e de páginas de revistas da organização – um riquíssimo conjunto de documentos que falam por si, mais um importante contributo da autora para a memória do século XX português.

A obra percorre e caracteriza detalhadamente a história desta instituição, desde a sua fundação, em 1937, até à extinção oficial já depois do 25 de Abril.

Há na capa uma frase que funciona como uma espécie de subtítulo – «Educada para ser boa esposa, boa mãe, católica e obediente» – e que nos revela o mais importante do que vamos ler e ver: o retrato da mulher portuguesa moldada por décadas de uma ditadura, através de uma instituição com características próprias – diferente das suas congéneres europeias em muitos aspectos, nomeadamente pelo facto de ter uma organização autónoma e independente do ramo masculino, o que provocou por vezes conflitos, mas também algumas vantagens. Lá chegarei.

É impossível resumir o que já li e vou reler, parando nas imagens com textos extraordinários que parecem chegar-nos de uma outra galáxia. Mas não: vêm desta e são «de ontem». Retratam realidades que se passaram, ao vivo e a cores, no próprio edifício onde teve lugar o lançamento do livro – o Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho, em Lisboa, de que era reitora Maria Guardiola, também comissária nacional da MPF, desde a sua fundação e até 1968. Aquelas paredes, que tanto ouviram, ainda «falam».

Preparavam-se boas esposas e boas mães evocando heroínas femininas: D.Leonor, D.Filipa de Lencastre, D.Maria e, obviamente, a Virgem Maria – que chegou mesmo a ser eleita «dirigente máxima da Mocidade Portuguesa Feminina».

Fomentava-se a acção social e caritativa das associadas, promovendo, por exemplo, campanhas de dádivas de enxovais e de berços. Mas lembrava-se que estes, porque «se destinam a pobrezinhos, não devem ser forrados com tecidos ricos».

Houve controvérsias em torno da promoção do desporto e da educação física porque, para certos sectores da Igreja e do Estado, eles masculinizavam as raparigas e constituíam uma arma do comunismo e do feminismo.

Os conselhos para as férias e os perigos a evitar são inenarráveis.

Etc., etc., etc. Voltarei talvez, noutros posts, com alguns temas específicos.

Só mais uma observação que me parece importante. O facto de a MPF ser independente do ramo masculino acabou por ter como consequência a formação de uma elite de dirigentes quase profissionalizada, que tirou partido da experiência adquirida para mais tarde actuar em palcos e linhas de orientações bem diferentes. Há no livro vários exemplos e testemunhos. Deixo aqui apenas um caso, bem significativo: Mª de Lourdes Pintassilgo declarou que ficou a dever à MPF o «clima de entusiasmo e de generosidade, de gosto pelos grandes ideais e de pronto espírito de serviço», bem como a certeza «de uma vocação própria da Mulher no mundo».

De como o feitiço se vira, às vezes, contra o feiticeiro.

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(*) Irene Flunser Pimentel, Mocidade Portuguesa Feminina, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2007, 240 p.

(**) Indispensável ver este slide show, recebido agora por mail. Obrigada, X.

12.12.07

A «vida política» de Sócrates

Será notícia em todos os telejornais que hoje, em Estrasburgo, durante a cerimónia de proclamação solene da Carta dos Direitos Fundamentais dos Cidadãos Europeus, Sócrates foi interrompido por eurodeputados do Grupo de Esquerda Unitária, que exigiam a realização de referendos para ratificar o Tratado Reformador.

Mas talvez escape que ele classificou a cerimónia «como "a mais importante" da sua vida política».

Se estivesse no seu lugar, teria vergonha, pudor, eu sei lá o quê, que me impediriam de dizer uma frase fatal como esta.

A quem é que interessa a sua vida política senão a ele próprio, provavelmente aos pais, talvez aos filhos, certamente que não ao cão?

Parece irrelevante mas não é. Cada um corre pelas suas causas e acaba por se trair ao virar da esquina.

Fonte.

MalTratado


Para a imagem dos actuais líderes europeus, começa agora um jogo de «perde-perde»:

- Se não convocarem referendos, serão acusados de desrespeitar compromissos anteriores – invocando diferenças entre documentos, que não passam de maquilhagens grosseiras e apressadas.
- Se convocarem, apresentarão aos seus cidadãos um texto inenarrável, cifrado, quase ilegível, impróprio para ser referendado – e correm ainda o risco de o ver rejeitado.

Assim o quiseram.


Terá Portugal o seu referendo?

Parece que Cavaco não quer. Tendo a acreditar.

Não se sabe o que Sócrates pensa, mas tenho para mim que é capaz de achar que lhe dava jeito:
- Porque nos mantinha entretidos durante umas semanas.
- Porque teria certamente consigo, na campanha pelo Sim, Paulo Portas, Luís Filipe Menezes, Santana Lopes e quase toda a comunicação social.
- Porque deve pensar que o PC, o BE, alguns opinion makers e muitos irrequietos da blogosfera não chegariam para estragar a festa, mesmo que defendessem o Não.

Poderia imaginar-se, de passadeira em passadeira, até à vitória final – porque a abstenção ganharia mas o Sim também.

Ou talvez não...

11.12.07

Foi-se a Cimeira, vem aí o Tratado

(*)


Recomendo a leitura de um artigo de Bernard Cassen, publicado na edição portuguesa de Le Monde Diplomatique de Dezembro de 2007 (p. 5):

«Ressurreição da “Constituição” Europeia»

Alguns excertos:

«A Europa e a participação popular nunca se deram bem. Optando pela ratificação parlamentar de um tratado praticamente idêntico ao que foi rejeitado pelos referendos de 2005, alarga-se a fractura entre os cidadãos e o aparelho institucional da União Europeia. Um aparelho que produz constantemente políticas neoliberais, que os governos imputam alegremente a uma “Europa” cuja legitimidade eles próprios se preparam para minar.»

«Se a construção europeia só pode “avançar” à revelia dos povos – quando não é contra eles –, são os seus próprios fundamentos democráticos, constantemente invocados por todos os tratados, que estão em causa.»

«Se esta Europa é efectivamente e por natureza liberal, e se para continuar a sê-lo aferrolhou a sete chaves as suas instituições, a questão, durante muito tempo tabu, consiste agora em saber como havemos de libertar-nos desta canga.»

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(*) Título do Tratado: tão ilegível em Webdings como em Arial.


9.12.07

Doris Lessing – O Sonho e o Nobel


Acabei de ler O Sonho mais Doce (*) no dia em que Doris Lessing deveria ter ido a Estocolmo para proferir o seu discurso de aceitação do Nobel da Literatura, o que não aconteceu por motivos de saúde. Mas deixou-nos um belíssimo texto que alguém leu por ela (**).

Falou de livros, do sonho de saber nos países pobres, da falta de interesse da juventude no mundo dos ricos.

Falou sobretudo de África, do Zimbabwe que ela tão bem conhece – a Zimlia de O Sonho mais Doce, onde nos faz mergulhar, em termos ficcionais, no que neste discurso explica frontalmente.

Em Estocolmo, recordou uma «aldeia onde a população não comia há três dias, mas onde se falava de livros e dos meios para conseguir obtê-los». Um autor negro, seu amigo, que «aprendeu a ler sozinho, nas etiquetas dos frascos de compota e das latas de conservas de frutos». Uma localidade perdida no mapa, onde dois jovens resolveram escrever romances na língua nativa (tonga). Um jovem de dezoito anos que, ao receber uma caixa com livros oferecidos por um americano, os embrulhou cuidadosamente num plástico – com receio de que se estragassem e sabendo que dificilmente poderia voltar a receber outros.

Lamentou que nós, os «ricos», sejamos «blasés», apesar da televisão, da internet e de tudo o resto, «empanturrados de comida, com armários cheios de roupa e abafados pelo supérfluo». «Campeões da ironia e do cinismo».

Significativamente, intitulou o seu discurso: «Como não ganhar um prémio Nobel»«a escrita e os escritores não saem de casas onde não há livros».

Uma grande senhora, um grande livro, um belo discurso – um grito de revolta e um olhar magoado sobre uma África diferente da que nos tem entrado pela casa dentro nos últimos dias.

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(*) Doris Lessing, O Sonho mais Doce, Editorial Presença, Lisboa, 2007, 2ª ed. 434 p.

(**) Na íntegra: em inglês, aqui; em francês, aqui.

8.12.07

Se o ridículo matasse

... já não estaríamos a falar de Mugabe. Dele que já tem 83 anos, num país em que a esperança de vida não chega aos quarenta.

Vive num palácio grotesco que incarna o pior que os colonizadores deixaram no imaginário dos colonizados. Salões, veludos, mármores e rendilhados, em plena África, numa terra que já viu partir seis milhões dos seus.

Desvario em que a realidade ultrapassa a ficção e o decoro – vá lá saber-se até quando.

Claro que Mugabe não é, infelizmente, um caso isolado. Mas serve como símbolo.













Welcome to Zimbabwe

Estive aqui em Junho. Tirei a fotografia, mas não entrei.


Durante todo o dia, filas intermináveis de pessoas esperavam por um carimbo que as deixasse entrar na Zâmbia.

6.12.07

Ser amigos, estar protegidos, ser católicos

... é o título do livro infantil para colorir, editado pela arquidiocese de Nova Iorque e a que já me referi aqui. Deixo hoje mais uma página.

A «anja-da-guarda» (um tanto Lolita, by the way) dá conselhos quanto a partes do corpo. Cliquem na imagem para a aumentar e leiam o texto porque vale a pena (*).



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(*) Na versão espanhola, já que hoje foi impossível aceder à inglesa, por excesso de pesquisas. (Ambas alojadas aqui.)

Colóquio «Dever da Memória»


O movimento NÃO APAGUEM A MEMÓRIA! realizou ontem, 5 de Dezembro, um Colóquio cujo resumo pode ser lido aqui.

5.12.07

A pedofilia explicada às criancinhas

... num livro para colorir publicado pela diocese de Nova Iorque (*).

Um adulto e uma criança sozinhos (mesmo numa igreja ou sacristia)? Só de porta aberta ou se houver uma grande janela – explica o anjo-da-guarda.



(*) Descoberto aqui.

???

Quando eu for grande, hei-de tentar perceber quem é o Tiago Mendes e o que é que lhe aconteceu.

Parece que houve uns problemas lá pela Atlântico. Devem ter sido grandes, porque anda meia blogosfera a falar deles.

Ainda bem - porque o Chávez já deu o que tinha a dar e o Mugabe ainda não chegou.

4.12.07

Lugares da História - Convento do Carmo

Foto: Centro de Documentação 25 de Abril


5 de Outubro de 1910 – Machado dos Santos aceita a rendição do Estado-Maior das forças fiéis à Monarquia.

14 de Maio de 1915 – Refúgio e demissão do general Pimenta de Castro.

18 de Abril de 1925 – Teixeira Gomes e o seu ministério dialogam com o general Sinel de Cordes, delegado dos revoltosos.

19 d Julho de 1925 – Refúgio de Teixeira Gomes e de António Maria da Silva durante a intentona de Mendes Cabeçadas.

25 de Abril de 1974 – Refúgio e rendição de Marcelo Caetano.

11 de Março de 1975 – Rendição da GNR que apoiara a tentativa de golpe do general Spínola.

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Fonte:
Fernando Rosas, Lisboa Revolucionária. Roteiro dos Confrontos Armados no Século XX, Tinta-da-China, Lisboa, 2007, 322 p. (pp. 134-136)

Darfur? Zimbabwe? Não conhecemos

Depois da cimeira UE/China sem direitos humanos, UE/África sem Darfur nem Zimbabwe.

«Dois dos dossiers mais quentes em África - o drama humanitário do Darfur e a questão do Zimbabwe - serão mantidos à margem da agenda oficial da cimeira UE-África. (...)

Escritores europeus e africanos, incluindo cinco prémios Nobel, acusam os líderes dos dois continentes de "cobardia" por evitarem abordar na cimeira as crises no Zimbabwe e no Darfur.
"Porque devemos ouvir os poderosos quando estes não ouvem os gritos dos que sofrem? Milhões de africanos e europeus esperariam que o Zimbabwe e o Darfur estivessem no topo da agenda", afirmam os 17 subscritores da carta, enviada a todos os chefes de Estado e de Governo que irão estar presentes na cimeira. "Ainda não é demasiado tarde" para incluir as duas crises na agenda.
Entre os subscritores constam cinco prémios Nobel da Literatura: os europeus Günter Grass e Dario Fo, e, do lado africano, Nadine Gordimer, John Coetzee e Wole Soyinka. José Gil é o único português signatário, num rol em que aparece também o moçambicano Mia Couto. "Que podemos dizer desta cobardia política?", interrogam».

3.12.07

Vitórias e derrotas

Actualizado (*):



A preocupação com a sólida vitória de Putin não deve ser maior do que o regozijo pela derrota tangencial de Chávez?


(*) Citando (e «linkando») o Abrupto:
«Putin é muito mais perigoso do que Chávez, mas Chávez é muito mais folclórico e engraçado, Putin é sinistro e não tem humor. Chávez dá para se "ser" da "esquerda" e da "direita", Putin não. Chávez é muito da cultura blogue, Putin não.»

2.12.07

A Esperança de Bento XVI


Os dois textos mais rebarbativos com que deparei nos últimos tempos foram o chamado Tratado Reformador da União Europeia e a recentíssima encíclica de Bento XVI Spe Salvis. Nada têm em comum a não ser o facto de serem produtos tipicamente europeus, no mau sentido, pela sua inútil dimensão e complexidade (*).

Este texto do papa sobre a virtude da Esperança dirige-se a todos os católicos, mas permito-me duvidar que tenha muitos leitores entre o comum dos mortais. Primeiro porque é muito longo – tem 77 páginas. Segundo porque não creio que os jovens do século XXI, os chineses, os africanos e muitos outros, mesmo que entusiasticamente crentes e seguidores da Igreja católica, parem muito tempo para penetrar em parágrafos como este:

«Para compreender mais profundamente esta reflexão sobre as duas espécies de substâncias – hypostasis e hyparchonta – e sobre as duas maneiras de viver que com elas se exprimem, devemos reflectir ainda brevemente sobre duas palavras referentes ao assunto, que se encontram no décimo capítulo da Carta aos Hebreus. Trata-se das palavras hypomone (10,36) e hypostole.»(10,39).»

Deixando de lado todo o conteúdo propriamente religioso, limito-me a chamar a atenção para as reflexões que Ratzinger faz sobre o marxismo e os seus erros (que já foram ironicamente consideradas por alguns como um elogio) – estas sim numa linguagem simples, talvez mesmo simplista, demasiado Readers Digest.

Prefiro citá-lo (poupando aos leitores o trabalho de localizarem esta passagem no emaranhado das setenta e sete páginas):

«Depois da revolução burguesa de 1789, tinha chegado a hora para uma nova revolução: a proletária. O progresso não podia limitar-se a avançar de forma linear e com pequenos passos. Urgia o salto revolucionário. Karl Marx recolheu este apelo do momento e, com vigor de linguagem e de pensamento, procurou iniciar este novo passo grande e, como supunha, definitivo da história rumo à salvação, rumo àquilo que Kant tinha qualificado como o «reino de Deus». Tendo-se diluída a verdade do além, tratar-se-ia agora de estabelecer a verdade de aquém. A crítica do céu transforma-se na crítica da terra, a crítica da teologia na crítica da política. O progresso rumo ao melhor, rumo ao mundo definitivamente bom, já não vem simplesmente da ciência, mas da política – de uma política pensada cientificamente, que sabe reconhecer a estrutura da história e da sociedade, indicando assim a estrada da revolução, da mudança de todas as coisas. Com pontual precisão, embora de forma unilateralmente parcial, Marx descreveu a situação do seu tempo e ilustrou, com grande capacidade analítica, as vias para a revolução. E não só teoricamente, pois com o partido comunista, nascido do manifesto comunista de 1848, também a iniciou concretamente. A sua promessa, graças à agudeza das análises e à clara indicação dos instrumentos para a mudança radical, fascinou e não cessa de fascinar ainda hoje. E a revolução deu-se, depois, na forma mais radical na Rússia.

Com a sua vitória, porém, tornou-se evidente também o erro fundamental de Marx. Ele indicou com exactidão o modo como realizar o derrubamento. Mas, não nos disse, como as coisas deveriam proceder depois. Ele supunha simplesmente que, com a expropriação da classe dominante, a queda do poder político e a socialização dos meios de produção, ter-se-ia realizado a Nova Jerusalém. Com efeito, então ficariam anuladas todas as contradições; o homem e o mundo haveriam finalmente de ver claro em si próprios. Então tudo poderia proceder espontaneamente pelo recto caminho, porque tudo pertenceria a todos e todos haviam de querer o melhor um para o outro. Assim, depois de cumprida a revolução, Lenin deu-se conta de que, nos escritos do mestre, não se achava qualquer indicação sobre o modo como proceder. É verdade que ele tinha falado da fase intermédia da ditadura do proletariado como de uma necessidade que, porém, num segundo momento ela mesma se demonstraria caduca. Esta «fase intermédia» conhecemo-la muito bem e sabemos também como depois evoluiu, não dando à luz o mundo sadio, mas deixando atrás de si uma destruição desoladora. Marx não falhou só ao deixar de idealizar os ordenamentos necessários para o mundo novo; com efeito, já não deveria haver mais necessidade deles. O facto de não dizer nada sobre isso é lógica consequência da sua perspectiva. O seu erro situa-se numa profundidade maior. Ele esqueceu que o homem permanece sempre homem. Esqueceu o homem e a sua liberdade. Esqueceu que a liberdade permanece sempre liberdade, inclusive para o mal. Pensava que, uma vez colocada em ordem a economia, tudo se arranjaria. O seu verdadeiro erro é o materialismo: de facto, o homem não é só o produto de condições económicas nem se pode curá-lo apenas do exterior criando condições económicas favoráveis.
(...)

Torna-se evidente que o homem necessita de uma esperança que vá mais além. Vê-se que só algo de infinito lhe pode bastar, algo que será sempre mais do que aquilo que ele alguma vez possa alcançar. Neste sentido, a época moderna desenvolveu a esperança da instauração de um mundo perfeito que, graças aos conhecimentos da ciência e a uma política cientificamente fundada, parecia tornar-se realizável. Assim, a esperança bíblica do reino de Deus foi substituída pela esperança do reino do homem, pela esperança de um mundo melhor que seria o verdadeiro «reino de Deus».

Estilo diferente de um papa diferente – sem dúvida.
Sinceramente, nem estou muito interessada em saber se mudará ou não qualquer coisa no interior da Igreja. Mas continuo a não acreditar que esteja a ser um agente mobilizador para que os povos vivam melhor e avancem com esperança. Antes estivesse.

(*) Texto integral aqui.

1.12.07

Uma árvore no Limpopo

O meu último post despertou solidariedades moçambicanas, como, por exemplo, a de um amigo que me enviou dezanove espantosas fotografias de «uma árvore no Limpopo».

Deixo aqui algumas. Não sei mais nada - agradecem-se informações adicionais.







30.11.07

As Marchas Populares de Lourenço Marques

ACTUALIZADO (*)


Quando vi, no último episódio de A Guerra, de Joaquim Furtado, os bailaricos dos colonos portugueses, importados para Moçambique, lembrei-me que devia ter cá por casa, num pequeníssimo espólio deixado pela minha mãe, estas «Marchas Populares» – com letras e partituras. Ela trauteava-as e eu ainda tenho algumas no ouvido (bem gostaria de saber porquê...).

Resistiram a mais de sessenta anos de andanças por gavetas, casas, cidades e continentes.

Em 1945, quando o mundo punha termo à Segunda Guerra, os portugueses de Lourenço Marques (os brancos, evidentemente) desfilavam pelas ruas em representação dos «seus» sete bairros (*)


Mas atenção: no cortejo, havia também «uma marcha sobre um motivo indígena». Trocado por miúdos, uma marcha de «pretos» e para «pretos», na língua nativa (shironga).

Tudo isto na paz do Senhor.

Outros desfiles viriam, duas décadas mais tarde. Para grande espanto dos que pensavam que tinham a História na mão e que continuaraiam a resolver tudo com arquinhos e com balões.

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(*) Para os laurentinos tresmalhados, como eu, aqui fica a lista dos bairros: Alto Maé, Baixa, Carreira do Tiro, Malhangalene, Maxaquene, S. José de Lhanguene e Polana.

(*) Este post deu origem a um pedido de Machado da Graça: que oferecesse estas Marchas ao Museu da Rádio de Moçambique, que está em organização. Para lá seguirão imdediatamente.

29.11.07

«O dom celibatário»





Clicar no texto para o ler melhor.

Arquivos nazistas – Acesso a 47 milhões de documentos

Foto Le Soir

«Os arquivos nazistas de Bad Arolsen, documentos que recordam os trágicos destinos das 17,5 milhões de vítimas do regime de Adolf Hitler, podem ser consultados pelo público desde esta quarta-feira, depois de 60 anos de confidencialidade.

Estes 47 milhões de documentos, escrupulosamente ordenados pelo Estado nazista e arquivados em Bad Arolsen (centro da Alemanha), só podiam ser consultados com fins humanitários, ou seja, de forma individual e por ordem de uma ex-vítima ou de seus parentes.»

Ler mais aqui.

28.11.07

«Dever da Memória»


O Movimento Cívico Não Apaguem a Memória! (NAM!) apresentou à Assembleia da República uma Petição reclamando o respeito pelo "Dever da Memória" por parte do Estado, tendo a mesma sido discutida em sessão plenária no passado 30 de Março e recebido acolhimento positivo de todas as bancadas.
A votação devia realizar-se pouco depois, mas aguarda-se ainda o seu agendamento.

Por isso, o NAM! decidiu desencadear um processo de sensibilização da opinião pública, através de uma Carta Aberta aos Deputados (que foi entregue na Assembleia da República no dia 22 de Novembro) e da realização de um Colóquio. O texto da carta pode ser lido aqui.

O Colóquio terá lugar no próximo dia 5 de Dezembro, às 18h, na R. Fialho de Almeida nº3 (Bairro Azul – Metro de S. Sebastião da Pedreira), em Lisboa.

«Dever da Memória»

Joana Lopes: Os católicos e a imprensa clandestina
José Augusto Rocha: Os “tribunais plenários”
Fernando Rosas: Os arquivos e os juízes dos “tribunais plenários”
Irene Pimentel será a moderadora do debate.

Cimeira UE/China: Direitos humanos? Não houve tempo

Foto do «Sol»


O Público de hoje lembra que, segundo a Amnistia Internacional, a situação dos direitos humanos na China piorou nos dois últimos anos.

A discussão do tema era um dos pontos da agenda da reunião União Europeia-China, realizada hoje em Pequim. A reunião acabou e, segundo as primeiras informações, a questão não foi abordada «POR FALTA DE TEMPO».

Continuamos a assistir a isto impavidamente? E a ouvir dizer que nos orgulhamos por termos dois portugueses como principais portagonistas de mais este escândalo?