«A antecipação nesta terça-feira, através do Diário de Notícias, dos dados da criminalidade reportados em 2024 à PSP em Lisboa, dando conta de uma descida significativa da mesma, é uma excelente notícia para a cidade, uma capital europeia que atrai milhões de turistas todos os anos.
O facto de a direção nacional ter decidido divulgar estes números, sabendo que os mesmos iriam contraria perceções que têm sido, e continuam a ser, insistentemente reafirmadas é uma excelente notícia para a saúde da nossa democracia.
No passado dia 17, o desassombro do diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, na conferência dos 160º aniversário do DN, tornou-se viral.
A sua desconstrução solene das perceções de insegurança, as memórias que partilhou da violência dos anos 80 e 90 em comparação com a atualidade, o alerta que deu sobre a desinformação e a polarização da discussão em torno do tema, arrancou aplausos, não só da plateia da Fundação Calouste Gulbenkian, como de milhares de pessoas que partilharam o vídeo da sua intervenção durante vários dias.
Luís Neves sabia bem que as suas palavras não iriam saciar os insaciáveis do medo, os que procuram o caos e fomentam o ódio. Mesmo assim proferiu-as.
Também o diretor nacional da PSP, Luís Carrilho, ao autorizar a divulgação daqueles dados, não só desconstruiu narrativas políticas como as destruiu.
Embora não precisasse, demonstrou que, ao contrário de algumas críticas, a propósito das operações policiais no Martim Moniz, não se deixa instrumentalizar.
Na mesma semana em que a PSP protagonizou a investigação ao furto de malas pelo deputado do Chega (agora não-inscrito) – logo o partido que mais instrumentaliza politicamente as polícias - ambos, Neves e Carrilho, mostram independência, sentido de Estado e respeito por todos os que têm de servir em primeiro lugar: os portugueses.
Como cidadão do mundo e certamente conhecedor das dinâmicas extremistas, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Moedas, vai acabar por compreender que não só os números, ainda provisórios, da PSP “são uma boa notícia para a cidade”, como reconheceu, mas também que não se combate a insegurança promovendo o sentimento de insegurança.
Moedas persiste nas perceções, nas queixas que lhe chegam (mas não chegarão à polícia, segundo sublinhou), invoca as violações, o triplo homicídio e assaltos à mão armada na cidade. São factos. Mas não são padrão.
Sobre o “Sentimento de Insegurança e a Vitimação em Lisboa”, o próprio Carlos Moedas apresentou um estudo em 2022, fruto de uma parceria entre a CML e a Universidade Nova.
Quem revelou mais propensão para se sentir inseguro, embora não tenha sido vítima de nenhum crime, foram inquiridos pertencentes ao “sexo masculino e ao grupo etário mais velho, terem baixa escolaridade e a situação ocupacional de reformado”.
Esse perfil, regista o estudo, “destaca-se particularmente em freguesias como a Ajuda, Santa Maria Maior (que abrange o Martim Moniz) ou São Vicente, ou seja, freguesias situadas na área histórica da cidade, onde a população idosa tem um peso significativo”.
Há outro dado interessante, que mostra como a crítica de Luís Neves ao facto de haver “vários canais de televisão que passam uma e outra vez aquilo que é notícia de um crime”, tem base científica.
Este inquérito concluiu que as respostas os lisboetas “evidenciam um maior sentimento de insegurança por parte daqueles que preferem a CMTV (25%)”.
Aqueles que veem mais televisão surgem como “mais propensos a sentir-se inseguros, independentemente da ocorrência de situações de vitimação, e essa relação reveste-se de grande importância pela forte dependência da televisão como veículo de informação, após a significativa quebra do recurso aos jornais já evidente noutros trabalhos e confirmada por este estudo”.
Moedas não se enquadra em nenhuma destas características. Mas tem poder para revisitar e atualizar este inquérito. É a única forma de medir com rigor as ditas perceções.»
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