13.5.22

Finlândia, a nova fronteira da NATO

 


«“O nono alargamento da NATO desde a sua fundação, em 1949, vai ficar na História como o alargamento de Putin”, escreveu o antigo primeiro-ministro finlandês, Alexander Stubb, poucos dias antes de o Presidente e a primeira-ministra do seu país terem assinado uma declaração conjunta a defender o pedido de adesão à organização de defesa “numa questão de dias”. “A adesão à NATO fortalecerá a segurança da Finlândia; enquanto membro da NATO, a Finlândia fortalecerá toda a Aliança”, lê-se no comunicado.

A decisão oficial será tomada pelo Parlamento já na próxima semana. A maioria dos partidos com assento parlamentar votará a favor. Num texto de opinião publicado no Financial Times, Stubb acrescenta o óbvio: “Sem o ataque da Rússia à Ucrânia, isto nunca teria acontecido”.

A neutralidade finlandesa era uma marca tão forte da sua política do pós-guerra que deu origem à palavra “finlandização” para definir os países que, pelas suas particulares circunstâncias geopolíticas, não estavam em condições de exercer totalmente a sua soberania. Em 1939, a Finlândia foi invadida pela URSS. A sua resistência heróica acabou por impor ao grande vizinho de Leste o reconhecimento da sua independência. No final da II Guerra, Moscovo impôs-lhe um estatuto de neutralidade, que se manteve para lá do fim da Guerra Fria e da implosão da União Soviética. Helsínquia preferiu encontrar na União Europeia o seu espaço estratégico preferencial, quando aderiu, em 1995. A questão da adesão à NATO nunca se colocou e era essa a preferência de grande maioria dos finlandeses.

Na quarta-feira, o Presidente finlandês, Sauli Niinistro, respondendo directamente às crescentes ameaças de Moscovo, limitou-se a dizer: “Olhem-se ao espelho”. Para a Finlândia, com uma fronteira de 1340 km com a Rússia, já não chegam as garantias de solidariedade e de segurança que a União Europeu dá aos seus membros. Quer formalizar o pedido de adesão à NATO o mais depressa possível, até porque durante as negociações de adesão, o país candidato ainda não está ao abrigo do Artigo 5.º do Tratado do Atlântico Norte, que garante o seu princípio fundador: um ataque a um dos seus membros é um ataque a todos os seus membros.

É também este desfasamento entre o pedido formal e a adesão que explica os acordos de segurança assinados na quarta-feira, em Estocolmo e em Helsínquia, pelo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson. O Reino Unido, membro fundador da NATO e o aliado europeu com maior capacidade militar, incluindo nuclear, compromete-se a ir em auxílio da Finlândia e da Suécia, no caso de serem alvo de uma agressão militar. Os três países já tinham criado uma “força expedicionária conjunta” para reforçar a sua cooperação militar. Mantém-se a expectativa de que os EUA venham a dar um passo semelhante e, eventualmente, outros países da Aliança

A adesão tem de ser aprovada por unanimidade no Conselho do Atlântico Norte, o órgão político supremo da NATO, e os analistas prevêem um processo relativamente rápido. Esperam-se ainda algumas escaramuças políticas, sobretudo da parte da Turquia, mas nada com que Washington não possa lidar. Também no domínio da coesão da Aliança e da sua missão estratégica, a guerra de Putin foi um contributo inestimável.

As autoridades suecas devem tomar a mesma decisão na próxima semana. Em Estocolmo, embora a questão levante mais problemas do que na vizinha Finlândia, ninguém quer considerar a hipótese de ser o único país nórdico que fica fora das fronteiras da NATO. A coordenação entre as primeiras-ministras dos dois países tem sido visível. A previsão dos analistas é que o pedido seja feito em simultâneo.

Os dois países não constituem um fardo para a capacidade de defesa da NATO, mesmo alargando o seu território até à fronteira europeia da Rússia. Ser neutral equivale, normalmente, a dispor de uma forte capacidade militar. A Finlândia, devido à sua proximidade da Rússia (e, antes, da URSS), dispõe de um exército de quase 300 mil homens e de uma força de reservistas da ordem dos 900 mil. “Preparamos a nossa sociedade e treinamo-nos para esta situação desde a II Guerra”, disse ao Financial Times a ministro finlandesa dos Assuntos Europeus, Tytti Tuppurainen.

A Suécia tem uma história diferente. O estatuto de neutralidade data de há mais de 200 anos, o que lhe permitiu não se envolver na II Guerra. Durante os anos da Guerra Fria, procurou manter uma política externa de não-alinhamento. Dispõe de uma forte capacidade militar, construída graças à sua poderosa indústria de armamento, mas também a uma estreita cooperação com os EUA.

A guerra na Ucrânia veio alterar radicalmente as condições de segurança na Europa. Entrar na NATO pode ser um risco, mas ficar de fora é, na avaliação dos dois países, um risco muito maior. Em meia dúzia de meses, a Aliança Atlântica passará a incluir 32 países. Putin enganou-se, mais uma vez, nos cálculos.»

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