6.6.24

São precisos dois para dançar o tango, mas chegam três para parar o baile

 


«As sondagens mais recentes mostram a AD e o PS tão próximos entre si, quanto distantes das percentagens dos outros tempos, o Chega cada vez mais consolidado como a terceira força que nutre a ambição de suplantar a direita tradicional, e os restantes partidos envolvidos numa árdua luta para virem a ter, pelo menos, um deputado no Parlamento Europeu.

A confirmarem-se as indicações das sondagens, por muito que quem ficar à frente se vá esforçar por enquadrar o próximo domingo como a confirmação ou a desforra do resultado das Legislativas, as Europeias serão apenas mais um sinal do impasse e da ingovernabilidade que caracterizam o 2024 de Portugal.

O primeiro sinal veio dos Açores, onde o social-democrata José Manuel Bolieiro não conseguiu elevar a AD à maioria absoluta - muito dificultada pelo Círculo de Compensação, embora a sua existência seja mais do que defensável enquanto instrumento que limita a quantidade de votos desperdiçados -, onde o PS de Vasco Cordeiro ficou aquém da Vitória de Pirro que em 2020 fez de si o Passos Coelho do arquipélago, e o Chega elegeu cinco deputados.

Seguiram-se as Legislativas, nas quais o PS perdeu 42 dos 120 mandatos que deram maioria absoluta ao mais instável dos três Governos de António Costa e a AD só tem dois deputados a mais, graças à dupla do retornado CDS, incrustada no canto do hemiciclo onde passaram a sentar-se cinco dezenas de deputados do Chega.

Mais recente é o desfecho das Eleições Regionais da Madeira, antecipadas devido ao impacto de investigações judiciais que abalaram os frágeis equilíbrios que sustentavam o Executivo de Miguel Albuquerque. Salvo in extremis por um acordo com o desavindo CDS, que subiu para 21 o seu insuficiente respaldo parlamentar, mais não conseguiu do que ficar um mandato acima da soma de deputados do PS e do Juntos Pelo Povo. Mas para garantir a maioria absoluta, mais uma vez, precisaria dos quatro eleitos do Chega.

Em comum nos três Parlamentos Nacionais, condicionados por outros tantos triângulos nos antípodas de serem amorosos, encontra-se a impossibilidade prática de acordo estável. O “não é não” de Luís Montenegro a André Ventura, ainda mais compreensível quando o líder do Chega alimenta uma ambição assaz anunciada de promover uma “grande substituição” no quadro partidário português, trava qualquer política de alianças suficientemente forte à direita.

Só que, em simultâneo, o PS de Pedro Nuno Santos não pode ignorar o risco de poder ser visto como aliado de facto do partido que rotula como sendo de extrema-direita, mesmo que isso ocorra por o Chega aprovar iniciativas legislativas socialistas em detrimento do que consta do Programa do Governo.

Diz a sabedoria popular de inspiração argentina que são precisos dois para dançar o tango, mas numa conjuntura em que faltam pares dispostos a conduzir ou a serem conduzidos, resulta ainda mais claro que chegam três para parar o baile. E que momentos decisivos, como os processos orçamentais, podem conduzir a sucessivas idas às urnas até os eleitores encontrarem pares compatíveis. Basta ver o que se está a passar noutros países europeus, com a Espanha e a Holanda a servirem de exemplo, à esquerda e à direita, para ter noção de como isso poderá ser difícil ou até traumático.»


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