O texto que se segue foi deixado como comentário a este meu post sobre avaliação de professores e é de Vítor Trigo, meu amigo e ex-colega versado nestes assuntos. Mal-empregado para ficar nas catacumbas, «puxo-o» para aqui.
Pertenço ao grupo de pessoas que acha que as grandes coisas não carecem tanto de indivíduos geniais, mas mais duma boa equipa de genuínos contributos, profundamente comprometidos com o objectivo comum.
Dito isto, a fim de que não infira do que se segue, nem a posição dum teórico distante do mundo real, nem dum prático que pensa que “manda quem pode, obedece quem deve”, aqui vão algumas reflexões que julgo importantes.
Nesta intervenção vou-me cingir à questão Quotas de Atribuição de Classificações da Avaliação do Desempenho.
1. O sucesso e o desastre são consequências do desempenho
Organizações sem objectivos não passam de círculos de interesses. Por outras palavras, quando não se conhecem e assumem metas quantificadas, não existem objectivos, quanto muito desejos. Se não se concretizarem, paciência. Melhores dias virão.
No mundo em que vivemos, planear é crucial. Quem não planeia, assume o caminho mais directo para o desastre. Isto é válido para as organizações, para as pessoas, e para as pessoas nas organizações.
Para as organizações, a escala de desempenho é muito simples – Excedeu, Cumpriu, ou Falhou. É assim que avaliamos a componente formal da organização – a estrutura e os meios físicos disponíveis.
Não podemos ser tão redutores quando pensamos na componente informal – as pessoas. Mas se as organizações não podem viver sem pessoas, e a sua diferenciação depende cada vez mais das pessoas, é óbvio que a actividade e os objectivos das pessoas têm de estar em consonância com a actividade e os objectivos da organização. Pode parecer uma “La Palissada”, mas não é; trata-se da raiz da minha visão sobre o problema, pois daqui decorre que hoje não há lugar para heróis – o que vale, e é sustentável, são as vitórias colectivas. As vitórias individuais são efémeras e, o mais das vezes, sem real substância.
Quer isto dizer que faz todo o sentido que os objectivos que cada um tem sejam: primeiro, o objectivo do grupo ou classe em que colabora; segundo, o peso e importância da sua contribuição enquanto indivíduo.
Questão em aberto: devem estabelecer-se escalas pares ou ímpares na Avaliação do Desempenho?
Pessoalmente, penso que as escalas pares oferecem vantagens, pois não favorecem “zonas de conforto” aos avaliadores. Por exemplo, uma escala de cinco pontos permite a concentração no ponto central, o 3, libertando dois pontos para “acima da média”, e outros dois para “abaixo da média”, utilizados como marginais.
Prefiro a escala de quatro pontos que obriga o avaliador a maior objectividade. A tendência será guardar o 4 para “Não Satisfez”, o 3 para “Cumpriu”, o 2 para “Cumpriu, excedendo nalgumas áreas”, e o 1 para “Excedeu consistentemente”.
No caso dos professores, tal tipo de escala poderia resolver a caricata questão do Bom, Muito Bom, e Excelente. Caramba, que complicação! Ainda por cima, é natural que a tendência seja para acumular classificações na média (que na presente versão será o Bom). Não parece óbvio que, com esta mentalidade, o Razoável e o Insuficiente não sejam utilizados, e que o Muito Bom e o Excelente não correspondam à realidade?
Vou dar a minha opinião – Isto como está não clarifica, não é justo, nem equitativo, mas duvido que a força corporativa dos professores esteja disposta a perder privilégios. Sim, porque isto não estamos a falar de direitos (estes correlacionam-se com deveres), trata-se de retirar vantagens indevidas dum sistema que deve servir a Educação e não de quem se quer dela servir.
Sendo mais claro ainda – prejudica a Educação e todos os seus intervenientes
2. Porque é que o sistema de quotas é justo?
Os gestores das organizações, lucrativas ou não, conhecem a história e as tendências dos mercados e públicos que servem. E quanto melhor conhecimento tiverem, mais probabilidades têm de vencer.
Ao planificarem custos e receitas, eles sabem que objectivos devem traçar e porquê. O mesmo racional se aplica aos gestores de RH, que são todos os managers de pessoas.
Aos managers pede-se que apresentem as suas propostas de trabalho e discutam com os seus superiores como irão alcançar os seus objectivos materiais – receitas e custos. Para os atingirem eles precisam do contributo diferenciado dos seus reportees. Estes devem conhecer o que está a ser exigido ao grupo e a cada um deles. Todos devem perceber que se espera que cada um supere aquilo que, em condições normais (de grande tranquilidade e sem verdadeiro empenho pessoal), seria o seu desempenho.
Quando todos entenderem que, naturalmente, uns irão conseguir ter êxito e outros não, o que significa cada uma das classificações possíveis, e os critérios de avaliação, muito progresso terá sido conseguido.
As quotas devem reflectir o que atrás foi dito – quando os gestores planificam recursos – humanos e materiais – balanceiam, de forma consistente, as probabilidades de sucesso e de falha. E eles sabem quantificá-las, para as poderem corrigir, quando aparecerem sinais de desvio.
E é disso que estou a falar, apliquem o mesmo tipo de racional ao grupo que dirigem. Partilhem esta informação com ele, em público, não em privado, e como dizem os americanos “Plan Your Work, Work Your Plan”. O grupo perceberá, posso assegurá-lo por experiência própria, aceitará, e retribuirá. Se tal não acontecer, das duas uma: (1) ou o grupo não existe, será um mero ajuntamento de pessoas; (2) O manager não soube cumprir o seu papel de líder e comunicador. Em ambos os casos, este manager está em sarilhos, arrastará as suas pessoas com ele, e a seguir a própria organização.
Será que o Ministério da Educação conseguirá fazer passar uma mensagem deste tipo? Penso que será muito difícil, mas não impossível. Não sugiro que se ignorem os sindicatos, longe disso, mas há que criar um canal de informação da classe que seja alternativo às mensagens de carácter eminentemente político.
Profissionais com classificação 3, numa escala de 5, terem acesso ao topo da carreira. De que planeta estamos a falar? Júpiter ou Saturno?
Nota: Esclareço que fui sindicalizado durante trinta e seis anos no Sind. do Comércio – CGTP.
É provável que volte a estes dois itens mais depressa do que estou a pensar, pois é possível que estas posições possam gerar alguma polémica.
Por agora, fico por aqui.
Voltarei a outros itens dentro do tema, como p.e., a questão das implicações do que ficou exposto na Gestão de Carreiras e nos Salários.
Pertenço ao grupo de pessoas que acha que as grandes coisas não carecem tanto de indivíduos geniais, mas mais duma boa equipa de genuínos contributos, profundamente comprometidos com o objectivo comum.
Dito isto, a fim de que não infira do que se segue, nem a posição dum teórico distante do mundo real, nem dum prático que pensa que “manda quem pode, obedece quem deve”, aqui vão algumas reflexões que julgo importantes.
Nesta intervenção vou-me cingir à questão Quotas de Atribuição de Classificações da Avaliação do Desempenho.
1. O sucesso e o desastre são consequências do desempenho
Organizações sem objectivos não passam de círculos de interesses. Por outras palavras, quando não se conhecem e assumem metas quantificadas, não existem objectivos, quanto muito desejos. Se não se concretizarem, paciência. Melhores dias virão.
No mundo em que vivemos, planear é crucial. Quem não planeia, assume o caminho mais directo para o desastre. Isto é válido para as organizações, para as pessoas, e para as pessoas nas organizações.
Para as organizações, a escala de desempenho é muito simples – Excedeu, Cumpriu, ou Falhou. É assim que avaliamos a componente formal da organização – a estrutura e os meios físicos disponíveis.
Não podemos ser tão redutores quando pensamos na componente informal – as pessoas. Mas se as organizações não podem viver sem pessoas, e a sua diferenciação depende cada vez mais das pessoas, é óbvio que a actividade e os objectivos das pessoas têm de estar em consonância com a actividade e os objectivos da organização. Pode parecer uma “La Palissada”, mas não é; trata-se da raiz da minha visão sobre o problema, pois daqui decorre que hoje não há lugar para heróis – o que vale, e é sustentável, são as vitórias colectivas. As vitórias individuais são efémeras e, o mais das vezes, sem real substância.
Quer isto dizer que faz todo o sentido que os objectivos que cada um tem sejam: primeiro, o objectivo do grupo ou classe em que colabora; segundo, o peso e importância da sua contribuição enquanto indivíduo.
Questão em aberto: devem estabelecer-se escalas pares ou ímpares na Avaliação do Desempenho?
Pessoalmente, penso que as escalas pares oferecem vantagens, pois não favorecem “zonas de conforto” aos avaliadores. Por exemplo, uma escala de cinco pontos permite a concentração no ponto central, o 3, libertando dois pontos para “acima da média”, e outros dois para “abaixo da média”, utilizados como marginais.
Prefiro a escala de quatro pontos que obriga o avaliador a maior objectividade. A tendência será guardar o 4 para “Não Satisfez”, o 3 para “Cumpriu”, o 2 para “Cumpriu, excedendo nalgumas áreas”, e o 1 para “Excedeu consistentemente”.
No caso dos professores, tal tipo de escala poderia resolver a caricata questão do Bom, Muito Bom, e Excelente. Caramba, que complicação! Ainda por cima, é natural que a tendência seja para acumular classificações na média (que na presente versão será o Bom). Não parece óbvio que, com esta mentalidade, o Razoável e o Insuficiente não sejam utilizados, e que o Muito Bom e o Excelente não correspondam à realidade?
Vou dar a minha opinião – Isto como está não clarifica, não é justo, nem equitativo, mas duvido que a força corporativa dos professores esteja disposta a perder privilégios. Sim, porque isto não estamos a falar de direitos (estes correlacionam-se com deveres), trata-se de retirar vantagens indevidas dum sistema que deve servir a Educação e não de quem se quer dela servir.
Sendo mais claro ainda – prejudica a Educação e todos os seus intervenientes
2. Porque é que o sistema de quotas é justo?
Os gestores das organizações, lucrativas ou não, conhecem a história e as tendências dos mercados e públicos que servem. E quanto melhor conhecimento tiverem, mais probabilidades têm de vencer.
Ao planificarem custos e receitas, eles sabem que objectivos devem traçar e porquê. O mesmo racional se aplica aos gestores de RH, que são todos os managers de pessoas.
Aos managers pede-se que apresentem as suas propostas de trabalho e discutam com os seus superiores como irão alcançar os seus objectivos materiais – receitas e custos. Para os atingirem eles precisam do contributo diferenciado dos seus reportees. Estes devem conhecer o que está a ser exigido ao grupo e a cada um deles. Todos devem perceber que se espera que cada um supere aquilo que, em condições normais (de grande tranquilidade e sem verdadeiro empenho pessoal), seria o seu desempenho.
Quando todos entenderem que, naturalmente, uns irão conseguir ter êxito e outros não, o que significa cada uma das classificações possíveis, e os critérios de avaliação, muito progresso terá sido conseguido.
As quotas devem reflectir o que atrás foi dito – quando os gestores planificam recursos – humanos e materiais – balanceiam, de forma consistente, as probabilidades de sucesso e de falha. E eles sabem quantificá-las, para as poderem corrigir, quando aparecerem sinais de desvio.
E é disso que estou a falar, apliquem o mesmo tipo de racional ao grupo que dirigem. Partilhem esta informação com ele, em público, não em privado, e como dizem os americanos “Plan Your Work, Work Your Plan”. O grupo perceberá, posso assegurá-lo por experiência própria, aceitará, e retribuirá. Se tal não acontecer, das duas uma: (1) ou o grupo não existe, será um mero ajuntamento de pessoas; (2) O manager não soube cumprir o seu papel de líder e comunicador. Em ambos os casos, este manager está em sarilhos, arrastará as suas pessoas com ele, e a seguir a própria organização.
Será que o Ministério da Educação conseguirá fazer passar uma mensagem deste tipo? Penso que será muito difícil, mas não impossível. Não sugiro que se ignorem os sindicatos, longe disso, mas há que criar um canal de informação da classe que seja alternativo às mensagens de carácter eminentemente político.
Profissionais com classificação 3, numa escala de 5, terem acesso ao topo da carreira. De que planeta estamos a falar? Júpiter ou Saturno?
Nota: Esclareço que fui sindicalizado durante trinta e seis anos no Sind. do Comércio – CGTP.
É provável que volte a estes dois itens mais depressa do que estou a pensar, pois é possível que estas posições possam gerar alguma polémica.
Por agora, fico por aqui.
Voltarei a outros itens dentro do tema, como p.e., a questão das implicações do que ficou exposto na Gestão de Carreiras e nos Salários.
10 comments:
Tb provenho de uma multinacional e, algumas vezes, junto de professores, tentei explicar esta "filosofia".
Parece que falava para muros.
Em última análise diziam que os professore não podem ser avaliados como os quadros das empresas...
Muito bom! Como leigo na matéria e não sendo propriamente a pessoa mais informada, senti-me bastante esclarecido. Concordo perfeitamente. Pergunto-me se a maioria dos professores pensa nos dias que correm na gestão de uma escola. Como fazê-la prática e funcional. Não digo lucrativa por que falamos de escolas públicas. E já agora quantos realmente pensam nos interesses dos alunos. O que sei por proximidade é que gozam de reformas bastante razoáveis... O interesse comum na sociedade de hoje está um pouco no esquecimento. Acaba por ser o eespelho de quem nos governa.
O sucesso da avaliação por objectivos no ensino não é assim tão pacífico. Segundo Birnbaum (2000)*, a tentativa de transformar as instituições do Ensino Superior em organizações do tipo empresarial leva à adopção de conceitos em voga provenientes do mundo empresarial e governamental que rapidamente desaparecem. A GPO é um exemplo deste fenómeno que, tendo surgido na década de 70, em meados dos anos 80 foi abandonada pela maioria das instituições do ensino superior dos EUA. Aponta uma série de razões que poderão explicar tal evolução:
− A ausência de definições comuns e consensuais sobre a GPO e a existência de governanças duais e de processos pouco estruturados que impermeabilizam os procedimentos pedagógicos dos procedimentos administrativos resulta na adopção de práticas diversas sobre a mesma, embora o seu conceito seja formulado de forma semelhante pelas diversas instituições envolvidas;
− A relutância por parte dos gestores que promovem a sua implementação no reconhecimento do seu falhanço, dadas as consequências negativas que daí poderão advir;
− A necessidade de consumo elevado de recursos e de tempo e da evidência da sua eficácia ser bastante fraca ou inexistir.
− A existência de maiores níveis de burocracia, formalização, hierarquização e estruturação nas empresas e no governo do que nas instituições do ensino superior,
que são organizações de tipo profissional, pouco estruturadas, onde os gestores, com
autoridade limitada, exercem sobretudo uma função de cooperação e de apoio aos especialistas que, por sua vez, detém elevada autonomia. Assim, enquanto nas
empresas o controlo efectivo é mantido através de regulamentos detalhados e a previsibilidade é maior, no meio académico muitos comportamentos são regulados por
regras tácitas ou informais e a incerteza é maior.
− A dificuldade em estabelecer e medir os objectivos principais do ensino superior torna difícil a implementação da GPO, bem como determinar a sua importância.
Também no sector privado algumas das limitações apresentadas são referidas. Segundo
Dahlsten, Styhre e Williander (2005)**, a GPO funciona como uma forma sub-reptícia de controlo
ao fornecer linhas orientadoras que ordenam as diversas unidades organizacionais e os diversos
grupos profissionais. Contudo, este tipo de controlo terá de ser apoiado por uma clara operacionalização dos objectivos e inserido em práticas de gestão que promovam a motivação relativamente a tais objectivos. Por outro lado, de acordo com Burns e Stalker (1961)*** a GPO poderá ser mais apropriada para sistemas mais burocráticos que permitam que o desdobramento hierárquico dos objectivos seja feito com maior facilidade e onde não haja grande diversidade de grupos profissionais que tentem impor diferentes interpretações dos objectivos estabelecidos.
A racionalidade na estruturação dos objectivos a partir dos objectivos organizacionais também não está garantida à partida. Um exemplo disso é o que consta da Circular da DGAEP difundida em http://www.dgap.gov.pt/upload/Legis/2009_despacho_26721_a_10_12.pdf
Nela se prevê a definição de objectivos organizacionais numa fase posterior à definição dos objectivos individuais invocando motivos de atraso de aprovação do OE 2010 por motivos eleitorais. Será mesmo impossível aprovar o orçamento nos 3 meses seguintes às eleições? Será positivo que a Administração Pública fique orfã de objectivos a pretexto de eleições?
Cristiana Tourais
Cristiana Tourais
* Birnbaum, R. (2000). Management Fads in Higher Education – Where They Come From, What They Do, Why They Fail. São Francisco: Jossey – Bass.
**Dahlsten, F., Styhre, A. e Williander, M. (2005). The unintended Consequences of Management by Objectives: the volume grow target at Volvo Cars. Leadership and Organization Development Journal, 26(7), 529-541
***Burns, T., Stalker, G.M. (1961), The Management of Innovation. London: Tavistock Publications.
Obrigada pelo seu contributo, Cristina Tourais.
Sem prejuízo do que o Vítor Trigo poderá eventualmente responder, gostaria de focar dois pontos muito resumidamente:
1-O conflito que está em discussão neste momento diz respeito ao ensino não-superior que tem problemas, características estruturais e de gestão diferentes do que se passa nas universidades. Ora é só nessas que concentra a sua atenção.
2-A avaliação por objectivos não é exclusiva de empresas muito hierarquizadas, como parece apontar, embora a sua origem esteja com elas directamente relacionada. Quando, sobretudo a partir dos anos 90, esse carácter hierárquico foi posto em causa e entrou em crise, «salvaram-se» as que foram capazes de se adaptar ao novo paradigma de gestão em rede e isso teve, obviamente, os seus efeitos na definição dos objectivos e nos respectivos modos de avaliação. (Haveria muito para dizer a este respeito, mas não numa C. de Comentários…)
Não concordo portanto quando diz que «a GPO poderá ser mais apropriada para sistemas mais burocráticos que permitam que o desdobramento hierárquico dos objectivos seja feito com maior facilidade e onde não haja grande diversidade de grupos profissionais que tentem impor diferentes interpretações dos objectivos estabelecidos». A definição e «desdobramento» de objectivos evoluiu muito desde os tais anos 70 ou 80 que refere no início do seu comentário, deixou de ser tão hierarquizada pelas razões históricas que já apontei e é uma ilusão pensar que nas empresas, ou outras instituições que não sejam de ensino, não há «grande diversidade de grupos profissionais que tentem impor diferentes interpretações dos objectivos estabelecidos». Há diversidade, há conflitos de interesses, há interpretações diferentes – porque se trata de humanos.
Para acabar, a minha dúvida de fundo: se não houver gestão por objectivos com a respectiva avaliação, há o quê? Qual é a proposta alternativa?
Quando me referi a estruturas mais burocráticas tinha subjacente a configuração da «burocracia mecanicista» de Mintzberg (onde existe uma grande dependência da estrutura hierárquica definida no organigrama, com fluxos altamente regulados e a informação a percorrer a organização sempre de uma maneira formal, partindo do vértice em sentido descendente e efectuando-se entre os elementos imediatamente acima ou abaixo da estrutura hierárquica, com pouco espaço para a inovação, uma vez que os processos são estandardizados, os produtos e os resultados previamente concebidos.) Não se trata de defender ou não este tipo de estrutura ou de considerar que a GPO é mais apropriada para este tipo de estrutura. Trata-se antes de considerar que a sua implementação não é tão complexa nestas organizações (que continuam a existir e são mais frequentes em determinadas áreas e menos frequentes noutras).
Por sua vez, com as devidas diferenças, as escolas e as universidades são organizações que se enquadram mais nas «burocracias profissionais» de Mintzberg. São organizações com um conjunto estável e definido de tarefas a realizar, mas simultaneamente bastante complexas, com uma maior descentralização da autoridade e onde a formação especializada é um elemento essencial para os membros da organização, uma vez que a estandardização de capacidades constitui o principal mecanismo de coordenação. Daqui resulta um ambiente que é simultaneamente complexo e estável: suficientemente complexo para exigir a utilização de extensos programas formais de formação desses profissionais, mas suficientemente estável para permitir a clarificação das competências e capacidades específicas que são exigidas.
Daqui resulta também uma forte interdependência no processo de decisão a que está também associada uma elevada diversidade de tarefas, objectivos e estilos de trabalho e onde coexistem diversos paradigmas de autoridade em resultado dessa mesma diversidade. Existe pois uma grande tolerância relativamente à autonomia individual, sendo necessário perceber os limites dos processos de decisão, motivar e influenciar os que neles intervêm, gerir os resultados de tais processos e ter a capacidade de influenciar a agenda de forma a implementar as mudanças subjacentes à visão da organização. A sua configuração organizacional e os processos de decisão fazem com que os objectivos individuais se possam sobrepor com frequência aos objectivos e planos organizacionais, podendo originar uma ambiguidade de objectivos no interior destas organizações.
Além disso, ao desenvolverem uma actividade ligada ao Conhecimento, as escolas produzem bens com um elevado grau de intangibilidade e de difícil mensurabilidade e o contexto onde se inserem condiciona os seus resultados e os dos seus profissionais. A ausência de objectivos formalmente definidos, a diversidade e muitas vezes conflitualidade de objectivos no curto e no longo prazo e no interior da escola faz com que o conceito de eficácia organizacional, expresso na capacidade desta atingir os seus objectivos, seja difícil de avaliar, requerendo elevada documentação, a mobilização de recursos para tarefas de carácter administrativo para as quais os professores estão pouco vocacionados e restringindo o tempo necessário para a execução de tarefas de gestão intermédia ou de ensino. Tais dificuldades estendem-se também à avaliação do desempenho individual, em especial dos docentes, onde a avaliação baseada em resultados e indicadores pode levar a que a avaliação do seu trabalho seja restringida às actividades que mais facilmente podem ser medidas e documentadas, deixando para segundo plano questões como a qualidade, a reflexão e o estudo, o que contribui para que o trabalho académico deixe de ser reconhecido como tal.
A implementação de um método de avaliação por objectivos é, neste contexto, um processo muito mais complexo. E não é o único método possível. A avaliação por competências, a avaliação curricular ou a utilização de métodos mistos podem ser possibilidades que sirvam para atenuar as dificuldades da sua implementação.
CT
Obrigado aviador, Jakk, Cristiana Tourais, e Joana pelos vossos contributos ao que pretendi transmitir. Registo, com agrado, que todos perceberam onde quis chegar, o que me deixa muito satisfeito – atingi o meu objectivo principal. E tive a recompensa que mais desejava – a vosso sentir.
Para aviador
Era mesmo isto que queria transmitir. No meu entendimento, a Avaliação do Desempenho, não se resume a uma metodologia, mas sim um “conjunto de práticas sistemáticas e estruturadas” que se insere no “processo” de Gestão do Desempenho. Concordo plenamente consigo, estamos perante uma “filosofia” de Gestão de Recursos Humanos, como refere no seu comentário.
Creio que concordará comigo que não só os professores que acham que não podem avaliados como os outros profissionais (uso aqui este termo extraído do léxico organizacional - professionals, ou seja, indivíduos responsáveis pelas tarefas que lhe estão atribuídas). Também pensam de forma idêntica os médicos, os arquitectos, os engenheiros, os advogados, os polícias, os padres, etc.
Para Jakk
Partilho da sua preocupação acerca da competência dos professores para gerirem as escolas. Sinto, contudo, necessidade de esclarecer que: (1) todos os professores devem saber liderar os seus alunos (liderança aqui aplicada na perspectiva de fornecer saberes, partilhar experiências, e criar espaços de criatividade e inovação para que os seus formandos se desenvolvam como indivíduos e não como clones, papagueando matérias, por vezes obsoletas).
Quanto à sua referência ao “interesse comum na sociedade”, deixe-me que esclareça o que penso sobre o assunto: (1) sociedades solidárias são sociedades humanas e, como tal, sociais; (2) sociedades onde a solidariedade está ausente, estão condenadas ao declínio e à extinção a prazo. Mas isto não pode ser tomado à letra, pois, em última instância, uma leitura abusiva poderia concluir que “se todos pensássemos que deveríamos conduzir o nosso pensamento e a nossa luta a pensar somente nos interesses dos outros, então as regras da vivência em democracia teriam de ser revistas – todos estaríamos a representar interesses que não seriam os nossos”. Porque chamo isto à colação? Para me distanciar da ideia que os que nos governam não defende os interesses gerais. Se, e quando tal é verdade, então devemos é lutar por os derrubar. Mas esta conversa diverge de mais do tema.
(resposta a Cristina Tourais, a seguir)
(continuação das respostas)
Para Cristiana Tourais
Gostei muito do que disse. Não vou, neste espaço, ter oportunidade para comentar tudo o que disse de interesse. Por isso irei cingir-me ao que discordo e ao que não vejo da mesma forma.
Sobre a Gestão Por Objectivos (GPO) ter sido “abandonada pela maioria das instituições do ensino superior dos EUA”, julgo que não se pode concluir que os conceitos básicos não possam continuar válidos. A GPO foi uma das obras-primas de Peter Drucker, nos anos 50, como se sabe. Como todas as boas teorias mereceu enorme atenção de investigadores e gestores, tendo sido alvo de inúmeros melhoramentos Foi por isso que no início dos anos 90 Norton e kaplan apresentaram o BSC – Business Score Card – que mais não é do que a extensão dos conceitos de Drucker, limitados à vertente Financeira – Valor, Custos, Rentabilidade, às áreas de Clientes – Benefícios, Satisfação, Fidelização, de Aprendizagem e Desenvolvimento – Formação, Crescimento, Sustentabilidade, e de Processos Internos – Optimização, Operacionalidade, Qualidade. Todos estes domínios são enquadrados pelas proposições de Missão Organizacional e Estratégia. Tanto quanto sei, todas estas disciplinas são actualmente profundamente estudadas nas Escolas de Gestão e aplicadas na generalidade das outras organizações.
Que os “gestores” não gostam destas abordagens, confirmo por experiência própria. Mas isso só significa que eles não querem perder o poder que as informações de gestão tratadas (melhor escondidas) a nível sectorial ou departamental lhes conferem. Quando os dados estratégicos e operacionais passam a ser do domínio comum, arriscam perder “importância” na organização. E é por isso que evitam estas filosofias que, entre outras coisas, revelam o real desempenho (eficiência e eficácia) laboral.
Concordo plenamente que é um contra-senso existirem objectivos individuais quando os organizacionais não existem. Parece até anedótico que se invoque atrasos burocráticos para justificar tal aberração. Não quero comentar a alegada relação desta anomalia com o calendário eleitoral, basta-me olhar para esta situação na filosofia BSC, que atrás referi, para não a conseguir compreender.
Para Joana Lopes
Não tendo divergências de fundo que mereçam comentários, agradeço a intervenção que me permitiu poupar alguns cliques.
Vitor Trigo vitor.trigo@gmail.com
Reacção ao comentário de Anónimo - CT (8 de Janeiro de 2010 00:33)
Muito obrigado pelo seu comentário.
Em primeiro lugar, ele alertou-me para o facto de, com o entusiamo que partilhamos por este tema, nos estarmos a afastar da ideia inicial.
Este seu comentário remete para uma vertente que não quero explorar neste enquadramento por recear poder afastar outros intervenientes.
Contudo, não posso deixar de acrescentar alguma coisa à sua exposição.
1. Pessoalmente, não conheço nenhum trabalho de fundo de Mintzberg na área da Gestão do Desempenho. Tudo o que li dele orienta-se para a Gestão das Organizações e Liderança.
Recomendo a leitura de Henry Mintzberg - Gestores, não MBAs (2007), da Dom Quixote,muito bem traduzido pelo meu amigo, também ex-IBMer, Guilherme Fonseca-Statter
2. Julgo que é preciso ter cuidado em estabelecer a fronteira entre Avaliação de Desempenho Organizacional de Avaliação de Desempnho Pessoal. Para mim, deve-se GERIR as Organizações e LIDERAR as Pessoas (como dizia o saudoso Drucker).
3. Também comungo das suas apreensões no que se refere à aplicabilidade dos modelos de Mintzberg quando estamos a falar de Escolas.
4. Talvez que a estrutura Mintzberg para a Educação tenha se ser mista. MECANICISTA, NÃO. Mas talvez, e transitoriamente, sob o ponto de vista estratégico - ESTRUTURA DIVISIONADA, e nos aspectos operacionais - BUROCRACIA PROFISSIONAL.
Por falta de espaço, e para evitar aspectos demasiadamente académicos, sugiro a leitura dum artigo dum mestrando em Ciências da Educção - Rui de Lima e Silva - publicamente disponível em: http://www.rieoei.org/deloslectores/1024Lima.PDF, que considero muito bem escrito.
Vitor Trigo
Caros Victor Trigo e Joana Lopes
Obrigado pelas sugestões de leitura e pela tão enriquecedora oportunidade para a troca de ideias.
Cristiana Tourais (CT)
Nós é que agradecemos, Cristina Tourais (desculpa lá o «nós», Vítor, mas não é majestático...)
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