25.5.19

Espelho meu, espelho meu



…estás a reflectir tão bem como eu.
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José Mário Branco, 77



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Para reflectir melhor



...hoje nem me levanto.
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E porque hoje há final da Taça de Portugal



Nunca tinha ido ao Jamor, mas em 22 de Junho de 1969 lá estive, como muitos milhares de pessoas, não por causa do jogo Benfica-Académica mas em solidariedade com a luta académica de Coimbra, que estava então ao rubro. Cartazes, 35.000 comunicados distribuídos, palavras de ordem.

Pela primeira vez, o desafio não foi transmitido pela RTP, pela primeira vez, também, a taça não foi entregue pelo presidente Américo Tomás. Foi um grande dia de luta.





(Para quem tem acesso ao Expresso, ler na Revista da edição de ontem: Quando Coimbra tocou no céu.)
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24.5.19

Voto (4)


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Mais uma sondagem




Aximage (24.05.2019)

Número de Deputados: PS (8/9) / PSD (6/7) / BE (3) / CDU (2) / CDS (1/2)

(Daqui)
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As tias de Cristas – da vergonha alheia




«Precisamos da ajuda de todos. Peço a todos e a cada um de vos que no domingo não vá apenas votar. Telefone à família, aos amigos, vizinho do lado, ofereça-se para levar as pessoas a votar, aquela tia mais idosa.»
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Eurodeputados? Não conhecem



Optimistas, mesmo sem saberem para o que vão votar. Confere.

(Expresso, 24.05.2019)
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Pedro Marques e a lição portuguesa



«Pedro Marques tem má imprensa. Dizer que alguém tem má imprensa não é criticar o visado, é criticar a comunicação social. Porque não é suposto que alguém tenha má imprensa. Mas esta dinâmica, já se sabe, é imparável. Quando se instala uma caricatura sobre um candidato ela repete-se e alimenta-se a si mesma, com jornalistas e comentadores a seguirem-na, mais por preguiça do que por convicção. Pedro Marques é o cromo desta campanha e já não vai conseguir sair daí.

Claro que António Costa ajudou a construir o cenário para Pedro Marques ser um cromo. Ao propor-se fazer destas eleições um referendo ao seu governo e escolher um ministro que não teve grandes oportunidades para brilhar criou um ambiente propício ao seu apoucamento. Foi Costa que transformou Pedro Marques numa figura secundária. A comunicação limitou-se a tratá-lo com esse estatuto. Talvez tenha sido mais um momento de excesso de confiança do primeiro-ministro.

A ideia do referendo ao Governo resulta de uma opção tática óbvia e de um discurso estratégico enganador. Se a “geringonça” é popular, Costa quer ficar com os louros já nas europeias. Para quê falar de Europa se estar no Governo dá votos? Isto é a tática. A estratégia vive de uma fantasia: a ideia de que este governo provou que é possível compatibilizar as metas europeias com políticas de esquerda. O que quer dizer que descobriu a pólvora e agora a quer exportar para a Europa.

É conveniente mas ignora a extraordinária situação externa, que não confrontou o país com as suas fragilidades e o Governo com todas as suas contradições. É em crise, como se viu em 2011, que o teste se faz. Claro que há diferença entre o que este governo fez e o que fez o anterior e isso teve efeitos na economia. Se o negasse não teria apoiado a “geringonça”. Por escolha própria e por imposição dos seus parceiros, tomaram-se medidas que redistribuíram melhor os ganhos da recuperação e, com isso, a aceleraram. Isto prova que a austeridade é uma escolha errada, infelizmente não prova que é possível manter políticas contra-cíclicas e sociais quanto se está em crise, compatibilizando-as com as metas europeias. Porque elas foram tomadas quando não estávamos em crise.

Qualquer pessoa honesta reconhece que seria impossível ter os brutais superávits primários que Centeno conseguiu com a política de distribuição de rendimentos que tivemos nestes quatro anos num momento de crise económica minimamente comparável ao que se viveu em 2011. E que a única forma de manter os mínimos sociais e travar essa crise sem destruir a economia seria não cumprir as metas de forma tão escrupulosa, renegociar dívida e fazer quase tudo o que a Europa não quis que fizéssemos na altura.

O bom ambiente económico europeu escondeu tudo: a insustentabilidade da dívida, a impraticabilidade destas metas em tempo de crise sem provocar brutais impactos sociais e a incompatibilidade de casar políticas económicas e sociais de esquerda (para os momentos de crise e de crescimento) com as atuais regras do euro. Ainda bem que o escondeu. Ninguém quer sofrimento para provar o seu ponto. Mas é grave que sejam os próprios políticos a ignorar o que ficou escondido. E o pior é que esta tese começa a fazer escola em alguma esquerda europeia, que toma Portugal como a prova de que há futuro dentro destas baias.

Esta narrativa dos socialistas acabará por lhes trazer problemas políticos futuros. Semelhantes aos que viveram em 2011. Lembram-se quando o anterior governo do PS apresentava PEC atrás de PEC, garantindo que medidas internas de austeridade e liberalizadoras teriam efeitos no rating e nos juros e nada acontecia? Como a história veio a provar, nada podia travar a onda que vinha de fora. Mas, com a conversa que foram fazendo, criaram o caldo político que convenceu os portugueses que o problema era solucionável por dentro. Quando as coisas descambaram a direita usou essa mesma mensagem para responsabilizar o PS pela bancarrota. Ao voltar a desprezar o ambiente externo para valorizar o seu papel e ao vender a ilusão da compatibilidade das imposições europeias com um programa de esquerda os socialistas estão a cometer o mesmo erro, que terá, quando a próxima crise vier, as mesmas consequências. Adiam o debate sobre os constrangimentos europeus e preparam a sua responsabilização pelos efeitos do que venha a acontecer na Europa. Querem os louros do sucesso agora, terão também os espinhos do insucesso depois.

A evidência das contradições desta estratégia no discurso duplo do PS, que referi na última sexta-feira: enquanto mantêm uma geringonça de esquerda cá dentro procura construir uma geringonça no centro-direito lá fora. E este desencontro é especialmente evidente em Mário Centeno, que, como presidente do Eurogrupo e ministro das Finanças de um governo de esquerda, conseguiu encarnar todas as contradições do discurso socialista. O conflito entre a retórica e a realidade. Não sou eu que digo que Centeno é, com diferenças de grau, um continuador da lógica de Vítor Gaspar. É ele. Foi ele que disse, numa reportagem do “Financial Times”, que a mudança de trajetória não tinha sido grande. Isto é o balanço que ele próprio faz do seu mandato de ministro das Finanças. Como presidente do Eurogrupo, e apesar das ESPERANÇAS DE RUI TAVARES, também não houve grande mudança. Há pouco mais de um ano, o Centeno em que tantos depositavam as suas esperanças responsabilizou os gregos por não se terem apropriado (estou a citar) do processo de ajustamento mais cedo, atribuindo à austeridade os bons resultados que acha que tiveram.

Costa faz uma avaliação do passado correta, reconhecendo que a moeda que foi quase exclusivamente criada por governos socialistas foi um “bónus” dado aos alemães. Que esta moeda é estruturalmente punitiva para os países periféricos da Europa. Mas não tira daí qualquer conclusão e imagina que, em quatro anos de governação num clima económico favorável, resolveu essa contradição insanável que explica porque Portugal está, há duas décadas, a afundar-se num pântano.

Perante a contradição do seu discurso, é natural que Costa tenha resolvido transformar estas europeias num referendo ao Governo. Porque o governo da “geringonça” é popular (por causa dos três partidos que a compõem) e porque ela alimenta ilusões em relação à Europa. Também é normal que tenha escolhido um ministro pouco conhecido, que não puxa para si o foco e garante que a mensagem não sai daqui. Mas o PS continua em negação. A lição que julga dar à Europa irá a Europa dar-lhe a ele. Mário Centeno já a sabe de cor.»

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23.5.19

Voto (3)


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Jornalistas apelam ao voto




Era bom que as TVs divulgassem isto (se é que não o fizeram ainda), sobretudo no absurdo Dia de Reflexão.
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António Costa : «Je partage les mêmes idées que Macron»



Eu sei que isto é só para francófonos, mas creio que a leitura na íntegra é importante.

Dans un entretien avec «Le Monde», le premier ministre socialiste portugais, associé à la gauche radicale dans son pays, explique pourquoi il veut s’allier avec le président français au niveau européen.

Marie Charrel et Jean-Baptiste Chastand

Le Monde, le 21 mai 2019

«Premier ministre socialiste du Portugal depuis 2015 grâce à une alliance inédite avec la gauche radicale, Antonio Costa est souvent présenté comme l’un des espoirs de la gauche en Europe, parce qu’il a réussi à faire sortir son pays de la cure d’austérité imposée en échange d’un plan d’aide de la zone euro. Il a toutefois récemment soutenu Emmanuel Macron.

Votre vidéo appelant à l’unité «des forces progressistes» avec Emmanuel Macron a suscité beaucoup de critiques des gauches françaises et portugaises. Aux élections européennes, soutenez-vous le président français ou Raphaël Glucksmann, la tête de liste PS-Place publique ?

Les choix de politique intérieure sont les choix des Français. Mais au niveau européen, il faut absolument bâtir une grande alliance progressiste et démocratique au moment où l’extrême droite construit son internationale. J’ai envoyé un message sur une vision européenne qu’on partage avec Emmanuel Macron; de la même façon que j’ai envoyé un message à Alexis Tsipras [le premier ministre grec de gauche]. Il faut bâtir au sein du Conseil européen un grand front pour l’avenir de l’Europe.

Y compris avec La République en Marche, que les socialistes français classent à droite?

Au niveau européen, on siège à vingt-huit. Et à vingt-huit, il faut trouver des points de vue en commun et des alliances. Sur plusieurs sujets, à commencer par la réforme de la zone euro, on partage les même idées avec le président Macron, qui a donné une impulsion supplémentaire aux efforts réformistes pour bâtir une Europe plus proche des citoyens.

Soutiendrez-vous Michel Barnier pour la présidence de la Commission européenne?

Je soutiendrai Frans Timmermans, le candidat des socialistes européens. J’espère qu’Emmanuel Macron le fera aussi.

Quand vous voyez que les socialistes français risquent de ne même pas franchir les 5 %, n’êtes-vous pas inquiet pour la gauche en France et en Europe ?

L’idée de la fragilité de la gauche en Europe est un peu dépassée. Regardez les résultats de la gauche en Espagne, en Finlande, en Suède, et ce que disent les sondages pour les prochaines élections au Danemark. La famille social-démocrate se renforce un peu partout.

Comment le Portugal résiste à la vague anti-immigration qui parcourt l’Europe?

Il y a des raisons historiques. Les Portugais ont toujours été ouverts au monde, en tant qu’explorateurs, colonisateurs et émigrés… Dix millions de Portugais vivent au Portugal et plus de cinq millions ailleurs dans le monde. Par ailleurs, notre immigration vient surtout de pays lusophones, avec une facilité d’intégration. Mais nous avons maintenant une forte immigration du Népal et du Bangladesh qui s’intègre aussi très bien. La situation économique portugaise crée un manque de main-d’œuvre.

Vous avez réussi à allier votre vision d’un Portugal qui respecte les règles budgétaires européennes, très ouvert au libre-échange, et une alliance avec les partis de gauche radicale. Comment est-ce possible?

Lors des élections il y a trois ans, la droite disait que pour rester dans l’UE et dans la zone euro, il fallait maintenir l’austérité ; le Parti communiste et le Bloc de gauche disaient que, pour tourner la page de l’austérité, il fallait sortir de l’UE ou au moins de la zone euro… Nous nous disions qu’une autre politique était possible, basée sur la hausse des revenus des familles, des meilleures conditions d’investissement pour les entreprises, le retour de la crédibilité internationale du Portugal. Tout cela en réduisant le chômage et en tournant la page de l’austérité.

Bien des gens ont douté qu’on y arriverait, mais heureusement on a profité de personnes comme Jean-Claude Juncker [le président de la Commission] et Pierre Moscovici [le commissaire aux affaires économiques et monétaires] qui ont été capables de nous écouter. Les résultats sont là : notre croissance est supérieure à la moyenne européenne, le chômage est passé de plus de 12 % à presque 6 %, notre déficit était de 0,5 % en 2018 et notre dette va diminuer de 121 % à 117 % du produit intérieur brut entre 2018 et 2019.

Comptez-vous prolonger votre alliance avec l’extrême gauche après les élections législatives d’octobre ?

Cela dépendra des résultats, mais la formule politique qu’on a trouvée a eu des résultats. Pourquoi changer?

La politique accommodante de la Banque centrale européenne a facilité le redressement de vos comptes publics. Craignez-vous une remontée des taux?

C’est justement pour cela que nous devons poursuivre la même trajectoire. La politique de Mario Draghi a commencé en 2012. Nous sommes arrivés au pouvoir en novembre 2015. La droite a gaspillé les opportunités offertes par ces mesures. Nous en avons profité, en faisant notre travail. Grâce à cela, nous sommes sortis de la procédure de déficit excessif.

Il y a deux ans, nos taux d’emprunt à dix ans dépassaient les 4 %. Aujourd’hui, ils sont moitié moins importants que ceux de l’Italie, et nous avons presque rattrapé l’Espagne. Notre politique très claire, qui a tourné la page de l’austérité tout en maintenant une politique budgétaire responsable, soutient la confiance des marchés.

La précarité reste néanmoins forte au Portugal…

Mais elle a beaucoup baissé. Depuis trois ans, 89 % des nouveaux contrats sont à durée indéterminée. Dans l’administration publique, on a titularisé les précaires. Un projet de loi au Parlement, qui fait l’objet d’un grand consensus entre les partenaires sociaux, vise à limiter la précarité des contrats pour les jeunes. J’espère qu’il sera approuvé avant la fin de la législature.

La forte présence des investisseurs chinois dans votre pays inquiète Bruxelles, qui critique votre système de «visas dorés» octroyant des permis de résidence en échange d’investissements. Comptez-vous arrêter ce programme?

En termes de montants, on est seulement le douzième pays européen à recevoir les investissements chinois, loin derrière le Royaume-Uni, l’Allemagne et la France. Ceux qui posent cette question sont ceux qui aimeraient attirer chez eux les investissements allant au Portugal. Pendant la troïka [quand le Portugal était soumis au plan d’aide du Fonds monétaire international, de la Commission européenne et de la Banque centrale européenne, de 2011 à 2014], les privatisations se sont faites en suivant les règles du marché. Comme Vinci a racheté nos aéroports, des investisseurs chinois ont pris des positions dans des entreprises portugaises.

Y compris dans vos infrastructures stratégiques, tel que le réseau électrique.

Oui, mais cette entreprise [REN] reste portugaise, avec une administration portugaise, dans le respect de notre cadre législatif. Le groupe est coté en Bourse : ceux désirant y investir sont libres de le faire. 

Un investisseur chinois ou français, c’est donc la même chose?

Pour moi, oui, tant qu’ils respectent les lois et la souveraineté de l’Etat portugais. Nous sommes une économie ouverte et sommes fiers de notre attractivité auprès des investisseurs étrangers, dont beaucoup de Français comme BNP Paribas, Natixis, Renault.

Ce qui est drôle, c’est que le cas le plus discuté est celui de Huawei, qui a signé un accord avec une compagnie de télécoms portugaise détenu à 100 % par Altice pour développer la 5G. Je n’ai aucun moyen d’empêcher Altice, qui est une compagnie française, d’acheter une technologie à Huawei. Je ne sais pas si l’Etat français le peut.

Etes-vous favorable au filtrage des investissements étrangers instauré par Bruxelles, pour protéger nos entreprises et start-up stratégiques?

Il ne faudrait pas que la sécurité soit un prétexte pour instaurer le protectionnisme commercial. L’objectif de créer des grands champions européens ne doit pas étouffer la concurrence, au préjudice de l’innovation. La priorité de l’Europe doit être de conclure les grands marchés de l’énergie et du numérique, afin de permettre le développement d’un écosystème de PME innovantes. L’Europe s’est bâtie sur la liberté d’entreprendre. Si elle se replie sur elle-même en fermant ses frontières aux réfugiés, aux investisseurs, à la circulation des idées, elle sera perdante.»
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Marketing do bom



Se eu fizesse parte do marketing do União Europeia, tentava espalhar este cartaz nas redes sociais, por essa Europa fora. Menor abstenção garantida!
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Cuidado com os liberais



Regresso ao tema com a divulgação deste texto, já que não considero a questão trivial e porque as discussões que ontem provocou não me esclareceram. António Costa ainda não se explicou, tem hoje e amanhã para o fazer. 

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«Há alturas em que esta campanha para as europeias anda a um ritmo alucinante, com as caravanas dos partidos a fazerem 500 quilómetros de cima para baixo, da esquerda para a direita, neste país que até parece grande, quando se olha para as estradas percorridas. Em Bragança, diz-se uma coisa para logo em Guimarães acrescentar uma ideia e, horas mais tarde, na Figueira da Foz deixar outro comentário.

Noutras alturas, a campanha parece andar ao ralenti. O encontro entre António Costa e de Emmanuel Macron no Eliseu, por exemplo, aconteceu na segunda-feira à noite. Só 24 horas depois é que o Pedro Nuno Santos se referiu ao assunto num comício nocturno em Aveiro e só hoje, quarta-feira, é que os partidos se dedicaram ao tema, mostrando-se aterrados com o conceito de “aliança progressista” lançado por António Costa em Paris.

O medo que essa aliança possa incluir liberais inquietou tanto Marisa Matias como Paulo Rangel - daí o título provocatório deste artigo. É no mínimo curioso ver dois candidatos de partidos estão diferentes como Bloco de Esquerda e o PSD terem o mesmo discurso sobre o mesmo assunto. Não se pode dizer que Marisa Matias e Paulo Rangel tenham concordado em muitas coisas ao longo desta campanha. Isso viu-se bem, aliás, nos debates. Mas hoje, a bloquista e o social-democrata concordaram na queixa de que António Costa está a aproximar-se demasiado dos liberais.

O primeiro-ministro tem “duas caras", disse Paulo Rangel, e anda a “piscar o olho aos liberais por razões eleitorais”, criticou. “Em que é que ficamos?”, perguntou Marisa Matias a António Costa: “Quer seguir o caminho que seguiu em Portugal, à esquerda, ou quer juntar-se àqueles que fizeram o caminho oposto?”. Num país onde a extrema-direita ainda não entrou - e, a acreditar nas sondagens, ainda não será desta que vai entrar - o medo dos liberais, o medo de que o PS se esteja a aproximar dos liberais é comum aos dois partidos.

Apesar de haver um partido chamado Iniciativa Liberal que concorre às europeias, não foi a reboque este partido que o assunto dos liberais entrou na campanha nacional. Pedro Nuno Santos foi responsável por trazer este tema à discussão ao dizer que a batalha na Europa é dura e é contra “quem quer impor uma resposta liberal, que não diminui o populismo, aumenta a insegurança e o medo, que são o alimento do populismo”.

O socialista Pedro Marques disse esta quarta-feira que isto não era uma contradição em relação ao que Costa havia dito antes - “é necessário uma aliança progressista contra a internacional da extrema-direita" -, mas é difícil não o entender assim. A mim pareceu-me que o ministro não estava a dizer a mesma coisa que seu primeiro-ministro foi dizer a Paris. Pareceu-me uma espécie de lamento por António Costa estar a aproximar-se perigosamente de uma franja eleitoral que não devia interessar ao PS.

O dia da campanha que gira a uma velocidade estonteante foi marcado por algo que aconteceu há dois dias. Há qualquer coisa estranha nesta campanha.

Nota final: Hoje mesmo, o dia também ficou marcado por uma sondagem revelada pelo PÚBLICO e pela RTP em que o PSD aparece mais uma vez atrás da PS por 11 pontos percentuais, sendo que o cenário são eleições legislativas. Caso as eleições fossem hoje, os socialistas venceriam com 39% dos votos e o PSD ficar-se-ia pelos 28%.»

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22.5.19

Voto (2)


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Macron amigo, o Costa estará contigo



«O partido do Presidente de França, Emmanuel Macron, lançou hoje em Estrasburgo uma aliança de partidos liberais da Europa, por "um novo sopro e uma nova energia" para a União Europeia face ao nacionalismo eurocético que a "ameaça".»
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Chico a atrapalhar o tráfego





Um Prémio Camões a atrapalhar o tráfego dos Bolsonaros deste mundo.
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Chico Buarque ensinou o quê?



«Quando recebi no telemóvel o alerta "Chico Buarque ganha o Prémio Camões" senti-me no direito de comemorar uma vitória: "ganhei eu, caramba, ganhei eu!".

Fui ler a notícia. Os seis membros do júri explicavam a razão desta atribuição do galardão literário pela "contribuição para a formação cultural de diferentes gerações em todos os países onde se fala a língua portuguesa".

E o que é que este português, de 55 anos, que escreve estas linhas, aprendeu com Chico Buarque?

Aos cinco anos de idade o meu corpo saltitava sempre que no rádio grande do meu pai soava "A Banda", a música que, quando passava, diz o verso final do refrão, ia "cantando coisas de amor". Chico Buarque impulsionou-me a dança.

Aos 10 anos de idade percebi como um indivíduo sozinho nada pode contra o cerco violento da indiferença. Bastou-me ouvir a história circular do operário de "Construção", que "morreu na contramão atrapalhando o sábado". Chico Buarque ensinou-me a identificar a injustiça social.

Aos 11 anos de idade percebi a inutilidade da divindade quando o coro masculino MPB4 repetia, em Partido Alto, "Diz que Deus dará/ Não vou duvidar, ô nega/E se Deus não dá?/Como é que vai ficar, ô nega?". Chico Buarque deu-me razões para ser ateu.

Aos 12 anos de idade intui, com os versos de Fado Tropical, como a brutalidade da colonização sangrou a pele dos povos e como as cicatrizes prevalecentes demoram séculos a fechar: "E o rio Amazonas/Que corre Trás-os-montes/E numa pororoca/Desagua no Tejo/Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal/Ainda vai tornar-se um Império Colonial". Chico Buarque ofereceu-me uma identidade, um medo e uma esperança na Lusofonia.

Aos 13 anos de idade percebi, pela letra do pseudónimo Julinho da Adelaide (um autor inventando, usado para ludibriar a censura da ditadura brasileira, que até falsas entrevistas deu aos jornais...), que confiar na polícia pode ser perigoso, como constata "Acorda amor": "Tem gente já no vão de escada/Fazendo confusão, que aflição/São os homens/E eu aqui parado de pijama/Eu não gosto de passar vexame/Chame, chame, chame, chame o ladrão, chame o ladrão". Com Chico Buarque descobri que, às vezes, está tudo certo se se ficar do lado errado.

Aos 14 anos de idade conspirei o sentido da canção "O que será (à flor da pele): "Será, que será?/O que não tem decência nem nunca terá/O que não tem censura nem nunca terá/O que não faz sentido..." Chico Buarque revelou-me o secreto significado da palavra "liberdade".

Aos 15 anos de idade compreendi, ao ouvir "Mulheres de Atenas", que a minha mãe, a minha irmã e a minha namorada viviam num mundo pior do que o meu: "Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas/Geram pro seus maridos os novos filhos de Atenas/Elas não têm gosto ou vontade/Nem defeito nem qualidade/Têm medo apenas". Chico Buarque justificou-me o feminismo.

Aos 16 anos de idade espantei-me com o atrevimento de "O Meu Amor". "Eu sou sua menina, viu?/E ele é o meu rapaz/Meu corpo é testemunha/Do bem que ele me faz". Chico Buarque fez-me entender como o sexo pode, ou não, fazer um par com a palavra afeto.

Aos 17 anos comovi-me com "Geni", a prostituta que salva a cidade mas que a cidade despreza: "Joga pedra na Geni!/Joga bosta na Geni!/Ela é feita pra apanhar!/Ela é boa de cuspir!/Ela dá pra qualquer um/Maldita Geni!". Chico Buarque confrontou-me com a dignidade dos indignos.

Aos 18 anos de idade a história de "O Malandro" exemplificou-me como é sempre o mexilhão que se lixa: um tipo que foge de um tasco sem pagar a cachaça que bebeu provoca uma crise mundial. Mas, no final das crises, há sempre um bode expiatório: "O garçom vê/Um malandro/Sai gritando/Pega ladrão/E o malandro/Autuado/É julgado e condenado culpado/Pela situação". Chico Buarque antecipou-me a globalização e fez de mim um comunista.

Aqueles anos foram os tempos do meu caminho até à chegada à idade adulta, uma época anterior aos romances que Chico Buarque escreveu e que completam, com a verdadeira poesia de muitas das suas canções, um currículo mais do que suficiente para a atribuição do mais importante prémio literário em Língua Portuguesa.

Aqueles anos foram os tempos que moldaram o meu carácter.

Aqueles foram os tempos que moldaram o carácter de tantos outros e tantas outras que, como eu, cresceram a ouvir estas canções mas que entenderam nelas tantas coisas que eu não entendi, que compreenderam nelas tantas coisas que eu não percebi, que tiraram conclusões destes textos muito diferentes das que eu tirei.

Mas, tenho a certeza, apesar de pensarmos e sentirmos de maneiras tão diferentes, tenho a certeza que, ontem, milhões de nós, ao saber da notícia do Prémio Camões atribuído a Chico Buarque, tiveram o mesmo impulso que eu e comemoram: "ganhei eu, caramba, ganhei eu!"»

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21.5.19

Diz que é uma espécie de “frente progressista”



«Se procurar na comunicação social portuguesa, dificilmente encontrará uma referência à “frente progressista” que Costa terá proposto a Macron para o próximo Parlamento Europeu. Não deixa de ser surpreendente. Os arautos do “nós somos Europa” escondem meticulosamente este imbróglio de alianças com que dividem a sua própria família política e que os parece levar para terra incógnita. As eleições devem ser um “referendo” ao Governo, resume Carlos César, mas apresentar aos crédulos eleitores um plano para a União Europeia, isso já parece estar fora de cogitação pelos seus mais ardentes defensores. Mas olhe que merecia.

Uma recente insinuação pública sobre esta “frente” terá sido a mensagem que o primeiro-ministro português enviou a um comício eleitoral do partido de Macron, em que sugere que “as forças progressistas (se) devem unir para permitir a mudança necessária”. Qual mudança, isso logo se verá. A fórmula até poderia ser interpretada como um rendilhado diplomático mas, interrogado sobre o assunto, Costa enviou à Lusa uma nota em que explica que, no seu entender, “a Europa precisa de uma grande frente progressista” e está “empenhado em ajudar a construir as pontes necessárias”. O encontro desta segunda-feira entre Macron e Costa em Paris confirma este vaivém para uma prometida convergência. Tudo desejos e boas intenções?

Ao contrário da discrição com que o assunto é tratado neste cantinho à beira-mar plantado, a imprensa francesa diz que a preparação do casamento já vai em juras solenes e aliança no dedo. Garance Pineau, um dos chefes do empreendimento de Macron, diplomata e responsável pelas consultas com outros partidos, veio a Lisboa e registou que o PS está “muito interessado” na “frente”. As mensagens emitidas do Largo do Rato confirmam-no. O Partido Socialista Europeu esclareceu seraficamente que “não está incomodado” com esta iniciativa. Ela parece ambiciosa, pretendendo juntar alguns dos socialistas (que tinham 185 deputados, mas estão em perda) com os eleitos de Macron e dos partidos seus aliados (ninguém sabe quantos serão), que por sua vez prometeram integrar uma aliança com os liberais (atualmente 69 deputados) para enfrentar a direita europeia do PPE (que tem agora 216 deputados, mas divididos entre os merkelianos e a extrema-direita do Grupo de Visegrado).

Ora, o projeto é duvidoso pelo menos por três razões. A primeira é que se trata em todo o caso de uma inversão de rumo, pois implicaria que Macron e Costa procurassem vencer o PPE de Merkel e deixassem de buscar a sua complacência para entendimentos do dia a dia. Havendo uma coligação governamental na Alemanha entre a CDU e os social-democratas, esse putativo afastamento parece atrevimento. A segunda é que chamar a isto “frente progressista” é uma bizarria. Os liberais, que já assinaram com Macron um protocolo que curiosamente declarava que pretende “romper com o bipartidismo” europeu entre os socialistas e a direita merkeliana, são conduzidos por Mark Rutte, o primeiro-ministro, e representam o tradicional programa neoliberal da direita. Seria mais fácil vê-los numa associação com Passos Coelho do que com Costa, pelo que chamar a isto “progressista” é em qualquer caso um floreado extravagante. A terceira razão é que esta frente divide os socialistas. Estes já foram destroçados em França pelo sucesso inicial de Macron e pode até admitir-se que Costa despreze os seus camaradas locais. Mas em Espanha isto é um problema, porque Macron se aliou ao Ciudadanos, e não vejo como possa haver um grupo europeu que tenha simultaneamente o PSOE, que está no Governo, e esse partido de direita, na oposição, sendo, por sua vez, aliado da extrema-direita na Andaluzia. É uma salganhada impossível, o que significa que, se Macron leva os seus, o PSOE fica de fora.

Assim, a “frente progressista” pode vir a ser uma frente (juntando partidos tão diferentes mas afastando uma parte dos socialistas), mas duvido que seja progressista (os liberais defenderam arduamente sanções contra Portugal e é de esperar que voltem a fazer o mesmo na primeira oportunidade) e, sobretudo, que configure uma alternativa razoável para a União Europeia. A não ser que o programa neoliberal à Rutte e Macron seja o novo oásis. Só que isso não se pode dizer em Portugal, pois não? Alguém se poderia lembrar de perguntar se esta aliança em Bruxelas não é o contrário do que promete o Governo em Lisboa, que por isso mesmo quer ser plebiscitado no meio da santa ignorância sobre estas aventuras casamenteiras. Entretanto, em Portugal o PS continua a repetir a promessa de um “novo contrato social europeu”. Mas isso vai ser com os liberais? Será que houve milagre da reconfiguração das almas e Macron deixou de ser o presidente dos milionários, Renzi o homem do ataque à segurança social, Rivera o nacionalista espanholista e Rutte o arauto dos mercados?

Como dizia Tyrion Lannister no último episódio do “Game of Thrones”, “não há nada no mundo mais poderoso do que uma boa história. Nada a pode travar. Nenhum inimigo a pode vencer”. A questão é que, neste caso, a história da “frente progressista” não é boa, não é nova e nem sequer sei se chega a ser uma história, pois já aterra com um cadastro demasiado pesado. Talvez seja simplesmente a prova da incoerência dos seus inventores, reduzidos à manobra por falta de um projeto apresentável. Por alguma razão a escondem meticulosamente dos eleitores.»

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João Bénard da Costa



João Bénard deixou-nos há 10 anos. O tempo passa depressa.
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Marisa vs. Blackrock



«Em junho de 2015 o vice-presidente da Comissão Europeia, Vladis Dombrovskis, veio a Portugal exigir "ajustamentos" no sistema de pensões antes de serem necessárias ações "mais dramáticas" no futuro.

Na mesma conferência de Imprensa, Maria Luís Albuquerque, ministra das Finanças do PSD, fazia segredo sobre as medidas planeadas para obter uma "poupança" de 600 milhões de euros nas pensões em 2016. A pressão era tanta que, também em 2015, o PS concorreu às eleições prometendo o congelamento das reformas de velhice durante a legislatura.

Sabemos hoje que estavam errados. O descongelamento das pensões a partir de 2016 - uma das condições do Bloco para viabilizar um Governo do PS - permitiu aumentos anuais pelo menos ao nível da inflação, acrescidos de aumentos extraordinários para as pensões mais baixas. Cerca de metade dos pensionistas da Segurança Social conseguiram mesmo recuperar o poder de compra perdido com a troika. E tudo isto sem colocar em causa a sustentabilidade da Segurança Social, que está hoje mais robusta graças ao crescimento do emprego.

Mas, para além dos maus pressupostos económicos, o tempo também nos revelou outros interesses que se têm movido por uma transformação radical do nosso sistema de pensões. Em fevereiro de 2015, a Blackrock - a maior gestora de fundos do Mundo - propôs à União Europeia a criação de um fundo de pensões privado. Em 2017, Vladis Dombrovskis apresentava a proposta de um fundo europeu privado de pensões.

A ideia, que já foi defendida por PSD e CDS, consiste em atribuir a fundos privados uma parte (ou a totalidade) dos descontos para a Segurança Social. Passaríamos assim de um modelo de solidariedade, em que os descontos atuais suportam as reformas atuais (para além de um fundo de capitalização de reserva) para um modelo misto, ou inteiramente baseado em contas individuais.

É fácil perceber o apetite de empresas como a Blackrock por este maná. A sua esperança é somá-lo aos 159 mil milhões de dólares que já gere, deixando as pensões à mercê dos mercados financeiros. Para isso conta com o apoio da União Europeia, e espera também o acolhimento dos parlamentos nacionais.

O impacto da crise de 2008 em fundos de pensões em todo o Mundo não foi suficiente para afastar o espetro da privatização da Segurança Social. Este é por isso um dos temas essenciais nestas eleições europeias e não pode haver lugar a hesitações. Defender as pensões da predação dos gigantes da finança será uma das tarefas dos eurodeputados eleitos. E para o fazer, não consigo pensar em ninguém melhor que Marisa Matias.»

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Voto (1)


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20.5.19

Futebóis



Não sei se Lisboa só tem reformados e gente no desemprego, mas a Praça do Município já está cheia de adeptos do Benfica para umas festividades na CML, que terão lugar às 18:30 e oiço que alguns estão lá desde a 1:00 da tarde. Para verem o quê, exactamente? Cada jogador com mais um Santo António pintado de vermelho na mão? A taça? Ou a águia desce à baixa? Note-se que nada tive contra os festejos, a quente, no Sábado à noite no Marquês. Mas mais? Hoje?
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A CML não quer uma rua com os nomes dos assassinados pela PIDE em 25 de Abril de 1974?


Há cerca de um ano, 446 cidadãos puseram «à consideração da Câmara Municipal de Lisboa, e respectiva comissão de toponímia. a proposta de atribuir os nomes de João Arruda, Fernando Gesteiro, Fernando dos Reis e José Barnetto a um arruamento ou lugar da capital. Por dever de memória para com aqueles que viveram a liberdade durante apenas algumas horas e que podem ajudar-nos a dar a essa palavra um significado maior. São eles os heróis improváveis da revolução. Não permitamos que se lhes junte o adjectivo "esquecidos"».

A iniciativa foi bem acolhida a nível da Assembleia Municipal, em reunião de duas comissões na qual estive presente juntamente com Pedro Vieira que encabeçou o abaixo-assinado e a pedido deste. O tempo passou e foi hoje recebida uma comunicação do gabinete da vereadora da cultura da CML, em que é anunciada a recusa. É avançado como motivo principal que «os Cidadãos em causa já se encontram devidamente homenageados» numa placa com os nomes pretendidos numa parede do agora condomínio de luxo que foi sede daquela organização, na R. António Maria Cardoso, em Lisboa. Como se esta iniciativa que tanta luta deu a muitos de nós, e que NÃO foi iniciativa da CML, devesse ser motivo para o alheamento desta, num concelho onde se abrem novas ruas e becos por tudo quando é sítio!

Quando for recebido o texto do «Ofício do Núcleo de Toponímia» (hoje, chegou apenas um mail a anunciá-lo), serão decididas as acções a tomar.

(Pode ser lido AQUI o texto do abaixo-assinado enviado em Maio de 2018, bem como os nomes de todos os subscritores.)
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Descoberto plano para manipular a democracia em Portugal



«Ao fazer compras online ou ao pôr um “like” no Facebook, expomos a nossa identidade e privacidade a uma reserva gigantesca de dados. Sim, há aí um enorme potencial para a humanidade. Mas há também uma série de ameaças para as quais temos de estar atentos. Oitavo de uma série de dez textos sobre os riscos da “revolução digital”.

Este título podia remeter para uma notícia verdadeira, mas não é o caso. Foi fabricado apenas para demonstrar como se pode facilmente manipular a informação com o objectivo de conseguir mais visualizações e reacções (as minhas desculpas aos leitores!). A manipulação pode ser feita com base em factos verdadeiros ou pode ser totalmente fabricada, mas, uma vez lançados nas redes sociais, os conteúdos ganham vida própria e influenciam percepções e contextos offline.

Os novos media digitais simbolizam abertura, permitem aproximar e mobilizar pessoas, divulgar ideias e promover pluralidade nos debates. Mas existe também a outra face da moeda e, se dúvidas ainda persistissem sobre o seu impacto negativo na democracia, os mais recentes acontecimentos contribuiriam certamente para as dissipar. O ambiente online, que é amplamente definido por algoritmos criados por empresas como o Facebook e Google, está a transformar os comportamentos sociais e políticos. Apesar de não terem sido eleitos, Mark Zuckerberg (Facebook) e Larry Page (Google, Alphabet) estão actualmente entre as pessoas que mais poder têm no mundo. E entre o que mais tem proliferado com a utilização dos novos meios de comunicação está o extremismo. Os media online têm estado no centro do debate sobre eleições de populistas, campanhas de ódio ou ataques terroristas, levando a cada vez mais pressão para controlar (e censurar) o conteúdo na Internet.

São vários os “novos” desafios à democracia, entre eles: a criação de “bolhas”, que isolam os cidadãos numa realidade em que só lhes é dito aquilo que querem ouvir, a partilha de notícias falsas, e os problemas que isto coloca à liberdade de expressão.

As novas tecnologias vieram aperfeiçoar os instrumentos que permitem segmentar os utilizadores/eleitores e direccionar-lhes mensagens específicas. E se a lógica destas técnicas não é nova, uma vez que a aplicação de técnicas de mercado à democracia já é feita pelo menos desde a década 1930, a rapidez e precisão aumentaram exponencialmente. Algoritmos permitem agora recolher e analisar quantidades imensas de dados pessoais que cada utilizador produz através das suas pesquisas na Internet, das suas compras online, dos seus telemóveis e dos seus perfis nas redes sociais.

Pensemos numa qualquer campanha política. O seu sucesso passa pela capacidade que os candidatos têm de interagir com os eleitores e para isso sempre precisaram de informação. Mas se antes as mensagens eram mais genéricas, para agradar a “gregos e a troianos”, agora é possível agrupar os eleitores de acordo com critérios específicos (localização, sexo, interesses e comportamentos, etc.), o que permite enviar mensagens altamente personalizadas com base nos seus perfis. Estes programas de inteligência artificial conseguem mesmo prever características mais sensíveis, como a religião, e ajudar a desenhar mensagens que podem ser diferentes para si e para a pessoa que está ao seu lado, sem que ninguém se aperceba. Naturalmente, estes dados pessoais dos utilizadores podem ser utilizados para vários fins, incluindo para influenciar as suas percepções políticas, com efeitos nos resultados das eleições.

E se, idealmente, a informação sobre os factos seria uma base neutra, fundamental para resolver debates políticos, algo que permitiria sustentar acordos, agora é, mais que nunca, uma mercadoria, sujeita às regras de mercado, cuja livre manipulação é considerada ”normal” na disputa pelo poder. Organizações com menos escrúpulos podem criar informação falsa (as chamadas “fake news”) e enviá-las apenas aos eleitores mais susceptíveis. Isto não faz parte de um futuro distante, é o presente.

O que nos coloca perante outra questão fundamental: a dos limites à liberdade de expressão. As redes sociais e sua utilização foram apresentadas como uma ferramenta com enorme potencial de democratização e de participação política (recordemos os eventos que ficaram conhecidos como a Primavera Árabe) e têm certamente permitido que mais pessoas comuniquem em países totalitários ou com regimes muito controladores. No entanto, a utilização que tem sido feita dos meios online em eventos recentes, como os ataques terroristas em Christchurch, Nova Zelândia, em Março de 2019, ou no Sri Lanka cerca de um mês depois, levaram a pedidos de censura da informação e de limites à circulação de informação, práticas até agora próprias de governos autoritários. O Governo do Sri Lanka justificou o bloqueio das redes sociais após os ataques terroristas para evitar a propagação de notícias falsas que pudessem causar o pânico entre a população ou incitar ao ódio contra grupos específicos de uma sociedade, que é multicultural. E após o ataque em Christchurch que foi transmitido em directo, a primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, tornou-se uma das mais fervorosas defensoras da censura nas redes sociais, com o objectivo de eliminar os conteúdos relacionados com extremismos e terrorismo que circulam nestas redes.

A decisão do Facebook de apagar páginas e perfis de extrema-direita antes das eleições de Espanha (Abril de 2019) e das eleições europeias (já no próximo domingo) e a do Twitter de fornecer uma ferramenta para os utilizadores poderem denunciar informação falsa relacionada com as eleições demonstram não só como estas estratégias estão a ser postas em prática, como são, em muitos casos, bem-sucedidas. Ainda assim, o Facebook, cujas políticas têm motivado muitas críticas ultimamente, anunciou que não fechava estas páginas devido ao seu conteúdo, mas sim pelos indícios de se tratar de violações da política de autenticidade (ou seja, de serem páginas e contas falsas eventualmente actualizadas por software automático, bots, e não por utilizadores reais). Falsidade e extremismos parecem caminhar lado a lado nas redes sociais.

Deve então a manutenção do princípio de uma Internet completamente livre e aberta sobrepor-se à prevenção de extremismo e falsidade? O debate que tem de ser feito não se deve centrar apenas nos limites à liberdade de expressão, mas deve incluir também a responsabilidade das plataformas online e redes sociais na partilha de conteúdo falso ou de natureza extremista. As redes sociais não são os media tradicionais, que podem ser responsabilizados pelo que publicam, nem operadores neutros, como as redes de telecomunicações. Têm como modelo de negócio a monetização dos dados dos seus utilizadores e essa informação está a ser utilizada em campanhas com fins diversos, para influenciar comportamentos, incluindo eleitorais.

Se historicamente os media tradicionais têm operado na distinção entre o interesse do público (para aumentar as audiências e, logo, as receitas) e o interesse público, que inclui a defesa dos valores democráticos, para as empresas da Internet esta visão dos conteúdos a publicar está completamente ultrapassada: o seu modelo de negócio assenta em promover o que provoca mais receitas, geradas por mais visitas e clicks, promovidas por mais reacções. Isto cria uma espiral de afastamento, um efeito centrífugo nas opiniões, afastando-as do centro para os extremos, porque é precisamente aí que estão as emoções.

A sociedade pode exigir a responsabilização destas plataformas mas, para isso, é fundamental que os cidadãos e eleitores estejam informados e que assumam a sua responsabilidade na divulgação de conteúdos falsos. Para além das contas falsas e bots, os cidadãos também partilham “fake news”, logo cada um de nós tem de se perguntar se pensa na veracidade e no impacto daquilo que decide partilhar online. Existem cada vez mais serviços de identificação de notícias falsas, como o snopes.com e, mais recentemente em Portugal, o Polígrafo. Mas campanhas como a “Pro-Truth Pledge” alertam que só uma sociedade mais atenta, informada e comprometida com a verdade pode colocar travões à epidemia de notícias falsas. Plataformas que promovem o debate aberto e inclusivo podem ajudar a contrariar a radicalização e a polarização. Estes espaços virtuais também podem facilitar a identificação de notícias falsas, reforçando o combate à desinformação nas eleições futuras. Fora dos ciclos eleitorais, a participação democrática dos cidadãos pode ser potenciada pela dinâmica das redes sociais. Precisamos, contudo, de legislação adaptada à nova realidade que proteja a democracia. Mas também passa por nós: não nos deixemos manipular, nem manipular a nossa democracia.»

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19.5.19

António Barreto 3.0?



E, inesperadamente, lê-se isto que António Barreto escreve no Público de hoje, 19.05.2019:

«O que também enfraqueceu o Estado democrático foram as privatizações e as reprivatizações que moldaram a política e a economia das duas últimas décadas. Feitas aparentemente pelas boas razões, por espíritos liberais, concebidas para libertar a sociedade e a economia, levadas a cabo com as melhores intenções expressas, acabaram por ser o leilão histórico de empresas, a destruição de algumas, a alienação irreflectida de outras e a entrega de poderes a grupos de predadores nacionais e estrangeiros. Assim se liquidaram, alienaram ou miniaturizaram empresas e sectores como os telefones, os cimentos, a electricidade, os petróleos, a rede eléctrica, o gás, os correios e outras.

Catervas de políticos à solta, bandos de capitalistas (nem todos empresários…) e de traficantes de influência (nem todos ilegais…), associados a advogados e seus escritórios, ligaram-se ao poder político com mais profundidade e mais intimidade do que o Estado Novo salazarista ou o comunismo de Cunhal e Gonçalves e estreitaram o seu conúbio com dois partidos, o PS e o PSD. Governam a sociedade e a política. E até agora não encontram diante de si instituições livres, independentes e eficazes que lhes ponham travão. É o que faz um país vulnerável.»
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Agora os pandas



Nem com um grande esforço de imaginação, pensei alguma vez que a guerra entre grandes potências mundiais passasse pelo destino de dois desgraçados pandas e fizesse com que tivessem de cruzar oceanos e sofrer quarentenas.

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10 de Junho?


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A hostilidade aos professores



«A hostilidade aos professores é evidente em muitos sectores da sociedade portuguesa. Manifestou-se mais uma vez no último conflito gerado pelas votações dos partidos na Assembleia atribuindo aos professores a contagem integral do tempo de serviço. Antes, durante e depois deste processo, a vaga de hostilidade aos professores atingiu níveis elevados, com a comunicação social a escavar fundo a ferida, com sondagens orientadas e uma miríade de artigos de opinião e editoriais.

Valia a pena parar para pensar, porque este movimento de hostilidade é mais anómalo do que se pensa, e acompanha outros, como o ataque aos velhos como sendo um “fardo” dos novos. Mostram que estamos a entrar numa cosmovisão social que implica um retrocesso enorme naquilo a que chamamos precariamente “civilização”. É preciso recuar muito para encontrar ataques aos professores, o último dos quais teve expressão quando a escola laica, em países como a França, foi um alvo importante da igreja, que tinha o monopólio do ensino.

Mas eu seria muito cuidadoso sobre as razões dessa actual hostilidade, porque ela incorpora aspectos muito negativos da evolução da nossa sociedade. É um caminho que muita gente está a trilhar, sem perceber que ele vai dar a um profundo retrocesso. E isso acontece muitas vezes na história: anda-se para trás quase sem se dar por ela, contando com a inacção, a apatia, ou a acédia, de quem deveria reagir. Como a democracia é uma fina película contra a barbárie e é apenas defendida pela vontade dos homens e não por nenhuma lei da natureza, mais vale prevenir com todos os megafones possíveis.

Há vários aspectos na actual hostilidade. Há uma agravante no caso português que tem a ver com a vitória muito significativa da ideologia da troika, que está longe de ter desaparecido e, nalguns casos, migrou para sectores que lhe deveriam ser alheios e não são: os socialistas, por exemplo. Disfarçada de “economia”, essa ideologia assenta numa visão pseudo-cíentifica, muito rudimentar e simplista, cheia de variantes neo-malthusianas, que se apresentou como não tendo alternativa, a nefasta TINA. Isto encheu-nos as cabeças e não saiu delas.

Essa ideologia centra-se na crítica do Estado, em particular do Estado social, e transforma os funcionários públicos em cúmplices de uma rede de privilégio, sendo descritos apenas como “despesa” excessiva. Vale a pena ensinar-lhes um pouco de história europeia e lembrar-lhes o papel do Estado desde Bismarck como instrumento para impedir sociedades bipolares de “proletários” e ricos, com a consequente conflitualidade social extrema. Acresce que esse processo criou à volta do Estado uma classe média, os tais desdenhados funcionários públicos, que não só funcionou como tampão como arrastou muita gente que vinha da pobreza e acedeu à mediania. A economia privada e o dinamismo das empresas, quando existiu ou existe, teve e tem igualmente esse papel, mas não chegou para criar este elevador social.

Portanto, gritem contra a função pública e os malefícios do Estado, que também existem como é óbvio, mas percebam que o pacote de não ter professores, enfermeiros, médicos, jardineiros, funcionário das repartições, leva atrás de si o ensino e a saúde pública, que são componentes essenciais do elevador social, o único meio de retirar as pessoas da pobreza, quer no privado, quer no público. Pais lavradores, que conheceram a verdadeira pobreza, filha professora primária ou funcionária pública, neto estudante universitário – sendo que o papel da educação é um elemento fundamental para esta ascensão.

Depois, há outros ingredientes. Os professores protestam, fazem greves, boicotam exames, fecham escolas, e hoje há uma forte penalização para as lutas sociais. Quem defende os seus interesses é penalizado e de imediato tem contra si muita comunicação social, o bas-fond das redes sociais e a maioria da opinião pública. São os enfermeiros, os camionistas, os professores, os trabalhadores dos transportes – manifestam-se, são logo classificados de privilegiados e egoístas. Os mansos que recebem migalhas no fundo do seu ressentimento invejam quem se mexe. Sem mediações, a sociedade esconde os que não precisam, e pune os que lutam. As greves hoje são solitárias.

Por fim, e o mais importante, há uma desvalorização do papel do professor, de ensinar, de transmitir um saber. Vem num pacote sinistro que inclui o falso igualitarismo nas redes sociais, o ataque à hierarquia do saber, o desprezo pelo conhecimento profissional resultado de muito trabalho a favor de frases avulsas, com erros e asneiras, sem sequer se conhecer aquilo de que se fala. É o que leva Trump a dizer que se combatia o incêndio de Notre Dame com aviões tanques atirando toneladas de água, cujo resultado seria derrubar o que veio a escapar, paredes, vitrais, obras de arte. É destas “bocas” que pululam nas redes sociais que nasce também a hostilidade aos professores. É o ascenso da nova ignorância arrogante, um sinal muito preocupante para o nosso futuro.»

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