18.7.20

Vidas antes desta Covida (15)



E Machu Picchu ali tão perto, Peru, 2004.
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Não nos podemos dar ao luxo de criar uma geração perdida


«Não deixemos ninguém para trás, em particular os mais necessitados e mais vulneráveis, não só no seio das sociedades mais desenvolvidas, mas também e sobretudo nas sociedades mais frágeis e afectadas por conflitos. A título de exemplo da impressionante escala do desafio que temos pela frente, recorde-se que actualmente apenas 3% dos refugiados estão matriculados no ensino superior, em comparação com 37% no plano global. E, no entanto, sabemos bem o quanto o ensino superior protege, reforça a resiliência e promove a inovação, as competências e a cultura de empreendedorismo que são cruciais para a recuperação económica e a criação de emprego, constituindo uma base mais sólida para a recuperação sustentada a nível global.

Hoje, no dia do aniversário de Nelson Mandela, que nunca deixou de valorizar a aprendizagem, a educação e o conhecimento como forma por excelência de afirmação da liberdade humana, e que enquanto esteve detido em Robben Island completou um curso universitário por correspondência, lembremos as suas inspiradoras palavras para nos guiar na acção e dar força na luta pela construção de um mundo mais próspero, justo, livre e pacífico – “A educação é a arma mais poderosa que se pode usar para mudar o mundo.”»

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Não era mesmo para funcionar



«Com mais de um mês de atraso, está agora anunciado que a app portuguesa de rastreio de contactos com doentes covid será lançada em finais de julho. A Comissão Nacional de Proteção de Dados, não se opondo, apresentou no entanto duas limitações preocupantes: a adoção do sistema da Apple-Google “subtrai uma parte substantiva da operacionalização da aplicação ao controlo dos seus criadores” e, em segundo lugar, há dúvidas sobre se o mecanismo permite a localização dos telemóveis (os criadores prometiam que isso seria informação privada). Mesmo admitindo que a segunda seja acautelada, o panorama das aplicações com que se compara o engenho nacional é devastador. Os sistemas estão a falhar em todo o lado.

Em França, dois milhões de pessoas descarregaram a app em poucos dias. Só houve 14 casos de contacto registados, havendo 170 mil infetados. Na Áustria, um quarto da população descarregou a app; só num em cada quatro casos de contacto com alguém infetado é que o sistema o assinalou. No estado de Vitória, na Austrália, que agora voltou ao confinamento dada a reincidência de casos, os contactos registados foram zero. Na Norue¬a, uma em cada cinco pessoas descarregou a app; em junho, o sistema foi abandonado depois de se terem constatado violações de privacidade. Na Índia, 77 milhões de pessoas usam a aplicação, mas o governo teve que garantir que ia corrigir erros que permitiam o controlo da localização. No Reino Unido, o sistema fracassou e o governo anulou a app. Ou seja, isto não serve.

Repara no que há de comum: em nenhum destes países a cobertura se aproxima sequer remotamente dos 60% necessários para ser estatisticamente eficaz. Como assinala um professor de estatística de Cambridge, se 1% da população tem covid e estiver toda testada e 1% da população descarregar a app, a possibilidade de se cruzarem é uma em dez mil (se a distribuição de umas e outras pessoas for aleatória), muito menor do que a taxa efetiva da doença entre a população. É por isso que é preciso que haja uma taxa muito elevada de participação, o que não se alcança. E, se se alcançasse, ainda era preciso que não se empilhassem problemas que desautorizam o sistema, que não funciona nuns casos ou funciona erradamente noutros. Por isso, percebo que alguns respeitados profissionais de saúde cuidem de todas as hipóteses de controlar a difusão da doença, mas com a app de rastreio estão a perder tempo correndo atrás de uma quimera.»

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17.7.20

Vidas antes desta Covida (14)



«Mulher-Girafa», Birmânia, 2009. 

Tal como na Tailândia, manda/mandava a tradição que as mulheres Padaung usassem anéis de bronze, em espiral, para esticar o pescoço e o tornar mais elegante. Prática que ainda existe com tendência para acabar, mas que «rende» em termos de turismo…
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Bem me parecia e não foi só um



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Depois de alunos sem distâncias, transportes sem limites…


… e eu tenho amigos que continuam a desinfectar cada banana que trazem da mercearia. Good morning and good luck.


Entretanto, estala a polémica:


«Para o governante, “é preciso equacionar” o fim da limitação da lotação no transporte público: “De outra forma, vamos ter problemas sérios de mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa.”
Também outro membro do Governo, Duarte Cordeiro, defendeu que as pessoas se têm de habituar à ideia de “conviver com o risco”, nomeadamente na utilização de transportes públicos.»
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O holandês da discórdia



«A Europa que hoje e amanhã vai tentar decidir como e em que condições se entreajuda financeiramente é a mesma que não conseguiu estabelecer uma política comum para a reabertura das fronteiras, onde cada país fez o que lhe apeteceu, causando a confusão e o caos entre os viajantes.

E a mesma que respondeu em silêncio ao pedido de socorro italiano quando o número de infetados pelo coronavírus triplicava a cada 48 horas.

No final da cimeira de Bruxelas, ficaremos a saber se os líderes políticos estão à altura dos desafios que enfrentam e se ainda podemos falar do tal projeto europeu. Sendo certo que, se nem os próprios estados-membros conseguem amparar-se nas alturas mais difíceis, não se vislumbram tempos fáceis para uma Europa que anda há demasiado tempo em velocidades diferentes, disfarçando a desunião e o egoísmo que as crises internas de cada país ditaram.

Importa recordar que o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, não é só o principal rosto da oposição à proposta do plano de recuperação, que prevê 250 mil milhões de euros de empréstimos e 500 mil milhões em ajudas diretas. É também o líder de um paraíso fiscal dentro da UE que fica com milhões de euros por ano em impostos que deveriam ser pagos noutros países, incluindo Portugal. Que já nos habituou às suas declarações polémicas sobre os países do Sul da Europa e cujo Governo sugeriu uma investigação a Espanha por não ter margem orçamental para enfrentar a pandemia. E que depois de ter reunido com o presidente francês, a chanceler alemã e os primeiros-ministros italiano, espanhol e português, disse que, se não houver acordo, não será o fim do Mundo. Todos nos lembramos do argumento do então presidente do Eurogrupo e ministro das Finanças holandês de que os europeus do Sul gastam todo o dinheiro em copos e mulheres e depois pedem ajuda. Jeroen Dijsselbloem não se vai sentar no Conselho Europeu. E isso é bom. Mas não está mal representado. E isso é mau.»

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16.7.20

Vidas antes desta Covida (13)



Os meninos etíopes também fazem TPCs, Awra Amba, Etiópia, 2013.

Awra Amba é uma comunidade extraordinária de cerca de 460 pessoas (era este o número, em 2013…), que vive segundo normas pouco usuais no país, com destaque para duas: a igualdade entre homens e mulheres, em todos os planos, e o respeito pelos velhos.Com mais de 40 anos de existência, Awra Amba começou por ser ignorada, e mesmo «olhada de esguelha», mas passou a ser seguida atentamente pela UNESCO, e pelo próprio governo etíope, como um modelo a divulgar e expandir. Quem tiver paciência, veja o que escrevi então e muitas fotografias AQUI.
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Mortágua e os banqueiros


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Antes do WhatsApp


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Não é, Galileu Galilei?



«É curioso que, apesar da implosão recente do sistema financeiro a nível mundial, perdure alimentado diariamente urbi et orbi a peregrina ideia de que as privatizações são abençoadas em contraponto com a propriedade pública, que é diabolizada.

O sistema mundial económico colocou no índex qualquer gestão pública. Todo o sistema imunitário da atual globalização se une para diabolizar tentativas de colocar qualquer unidade produtiva sob o domínio do Estado, porque estará escrito algures no Monte Sinai que o Estado existe para encher os bolsos dos privados, mesmo quando a sua gestão é ruinosa. No caso, um dos expoentes do absurdo é o exemplo da EDP: enquanto no setor público português era só desgraça, na mão dos chineses é sublime, deve ser dos Mexia, Pinho, Catroga e de todos os comedores da grandiosa gamela do comunismo chinês. Aqueles comunistas cheiinhos de dinheiro é que são bons, os outros tesos a proclamar a igualdade dos cidadãos estão em contramão.

O negócio correu tão bem a meia dúzia de mequetrefes que o MP teve de agir para fazer mesmo au ralenti funcionar as instituições inquinadas pelos donos desta coisa…

O caso da TAP é também paradigmático: nacionalizada à última hora, entregue ao desbarato pelo governo do PPD/CDS, a gestão dos senhores Neeleman e Pedrosa foi um vê-se-te-avias quer com Passos, quer com Costa.

Afinal, a tão apurada e tecnocrática gestão privada da TAP foi ruinosa. A empresa, no início de 2020, estava nas lonas. E não foi o Estado, foram gestores de elite do setor privado que aproveitaram o negócio para levarem a TAP para o descalabro, certamente dando milhões a uns tantos, através das negociatas só ao alcance de gente capaz de vender alma e o resto da vergonha.

A TAP comprou rotas e aviões como se fosse uma das maiores companhias do mundo, quando é a companhia de bandeira de um pequeno país europeu… mas isso era obra dos tais profissionais privadíssimos e de grande reputação.

Algures estaria alguém a contar com os despojos a custo zero da TAP? Algures na Europa, quem estaria a esfregar as mãos de contentamento por obrigar os portugueses a ter que viajar para Madrid para irem para África ou para a América do Norte e do Sul? Quem?

Claro que a TAP, enquanto companhia de bandeira, tem de melhorar muito e mostrar que é capaz de ser competitiva e não apenas continuar a ser mais um entreposto de negociatas como as que caracterizam o nosso sistema político-financeiro.

Veja-se o que sucede com o Novo Banco e as novas e escandalosas negociatas da venda de imóveis por meia dúzia de patacos. Byron Haines liderou um banco detido pelo fundo Cerberus. Por 200 imóveis do Novo Banco, o fundo que detinha o banco e que Haines liderou comprou-os por 159 milhões, sendo o seu valor bruto contabilístico 478 milhões, uma perda de 328,80 milhões. A gestão sem mácula é esta, tirar de um banco resgatado para encher os bolsos do Cerberus, fundo muito fundo onde foram parar riquezas de um banco que está a ser pago por todos os portugueses.

Entretanto, parece que finalmente a mais fina figura do regime vai a julgamento. Haja Deus. Homem sério, condecorado, sempre bem acompanhado das mais altas figuras do reino, de boas famílias, o dono disto tudo era realmente um homem capaz de mil e um negócios… ele e os outros, do BPN ao Banif e ao BCP… Vamos ver.

As últimas notícias da distribuição da riqueza no mundo são também bastante esclarecedoras: o número de grandes fortunas e de milionários cresceu 8,8% em 2019, face a 2018. São fortunas que tornam ainda mais dolorosas as situações que dizem respeito a mais de metade da Humanidade que vive com cerca de dois ou três dólares por dia. Não está em causa, nem devia estar, a maior capacidade de certas pessoas de conseguirem obter e fazer prosperar negócios de um modo extraordinário. O que está em causa é a total incapacidade do sistema para deixar na mais completa miséria mais de um quarto da Humanidade.

Se o sistema cria desequilíbrios desta grandeza, tal mostra a sua incapacidade para dar resposta a uma questão tão simples como esta: é ou não possível haver uma vida decente para todos? O que se tem visto é que a atual globalização não tem respondido a este desígnio, apesar do índex e da poluição de gente a dizer que estes são os bons gestores. O que conta não são os resultados; é a tal realidade dolorosa que é preciso continuar a negar, não é, Galileu?»

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15.7.20

Vidas antes desta Covida (12)



Nas margens do Rio Li, Guilin, China, 2004.

Vai um copo de vinho de cobra?
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Algo não bate certo


Naquele dia em que o primeiro-ministro responde a um texto de opinião publicado num jornal sobre uma questão tão importante como as conversações que teve na Hungria, eu sinto-me num país em que algo não bate certo.


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A Europa a esvazaiar-se…




É bom que Fernando Medina vá pensando nas cores com que pintará Lisboa em 2100, quando estiver a tentar substituir Costa como primeiro-ministro. Será que os turistas africanos vão gostar mais do azul bebé ou do verde bandeira?

«Portugal está entre mais de duas dezenas de nações cuja população poderá descer para menos de metade em 2100, que inclui Espanha (de 46 para 23 milhões), Itália (61 para 31 milhões), Japão (128 milhões para 60 milhões) ou Tailândia (71 para 35 milhões). (…)

Por outro lado, várias nações mais do que duplicarão a sua população no fim do século face a 2017: a República Democrática do Congo poderá aumentar de 81 milhões para 246 milhões de habitantes, tornando-se o sexto país mais populoso do Mundo, a Etiópia poderá aumentar de 103 para 223 milhões de pessoas e tornar-se o oitavo mais populoso, seguido do Egito, que poderá aumentar de 96 para 199 milhões, e da Tanzânia, que poderá subir de 54 para 186 milhões.»
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Eles bem suplicam...


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Presidenciais: clivagem errada



«Pedro Nuno Santos disse uma coisa escandalosa das várias coisas aparentemente escandalosas que tem dito: que sendo uma pessoa de esquerda não vai votar num candidato de direita para a Presidência da República. A mim isto parece-me evidente, tendo como exceção um qualquer momento em que a democracia estivesse em perigo e isso obrigasse ao voto para evitar, do seu ponto de vista, o mal menor. Não é o caso.

Imagino que António Costa ainda não aderiu à classificação política que reduz as escolhas de políticos a pessoas competentes e incompetentes. Esse simplismo, além de ser especialmente absurdo no cargo de Presidente da República, despolitiza a política e transforma as eleições em concursos públicos para recrutamento de pessoal. Se pensasse dessa forma, teria de se desfiliar do PS, por não ser essa a lógica da agregação partidária. Nós juntamo-nos a outros em partidos pelo que temos em comum política e ideologicamente com essas pessoas. Competentes e incompetentes, sabemos bem, existem em todos os lados. Assim sendo, tem de ser outro o critério que levará Costa, Carlos César, Fernando Medina ou Ferro Rodrigues a escolherem o voto em Marcelo Rebelo de Sousa.

O que move Costa, antes de tudo, é saber que Marcelo já ganhou as eleições. Não quer estar associado a uma derrota num momento que se adivinha difícil. E prefere ter o Presidente agarrado a si até lá. Por mais que este pragmatismo seja apreciado nos meios mediáticos, é bom recordar que o cemitério da política está cheio de pragmáticos que tropeçaram nos seus próprios cálculos. O longo prazo exige sempre um pouco mais do que isso.

Há, em muitos dos que rodeiam Costa e não fazem apenas contas ao próximo ano, um racional ideológico na escolha de Marcelo Rebelo de Sousa como candidato. Tem a ver com o lugar onde acham que hoje se faz a clivagem política. Uma corrente do PS, de que Augusto Santos Silva é o ideólogo mas não o operacional, acha que ela se faz entre cosmopolitas moderados e populistas radicais. Isso implica uma aliança entre tudo o que está dentro daquilo a que muitos chamam “sistema”.

Foi esta clivagem que Emmanuel Macron explorou em França, sorvendo socialistas e direita republicana em simultâneo e deixando de fora esquerda radical e extrema-direita. Com isto, Macron desestruturou todo o sistema partidário e preparou o caminho do futuro para a senhora Le Pen. É verdade que as autárquicas foram um revés para os dois, mas elas esclarecem pouco.

Quando alguém determina que a prioridade é combater a extrema-direita não enfraquece a extrema-direita. Reforça-a. Sempre que colocamos a clivagem fundamental (não quero dizer a mais acentuada, mas a mais relevante) entre nós e um adversário não o enfraquecemos, reforçamo-lo. Porque essa clivagem lhe oferece o estatuto de alternativa. E é por isso que desistir da clivagem entre a esquerda e a direita, que apesar dos repetidos anúncios de morte ainda é a mais mobilizadora e clara, é desistir do combate entre alternativas dentro do sistema democrático e entregar de bandeja à extrema-direita o lugar de alternativa dos descontentes. Fazer isto quando esse espaço ainda é incipiente em Portugal mas desbrava caminho sem resistência é um hino à estupidez.

O apoio explícito ou implícito do PSD e do PS a Marcelo tem vários problemas imediatos. O excesso de poder que um Presidente com mais de 70% dos votos acumulará perante um governo minoritário. Se Costa espera lealdades não conhece o seu parceiro circunstancial. E devia conhecer, porque são parecidos.

Acima de tudo, este apoio transforma o "sistema" numa ilha cercada por descontentes sem alternativas viáveis. E esse "sistema" tende a ser percecionado como "a democracia". O renascimento do bloco central institucional consegue fazer o infeliz pleno de deixar a esquerda órfã de representação política e atirar, por deslocamento oportunista do candidato muito para fora do seu espaço natural, franjas da direita para Ventura. E isso não é contraditório com votações esmagadoras em Marcelo. Porque a política não se esgota na aritmética eleitoral. Ela tem o dia seguinte, como se verá quando o balão de Macron rebentar e sobrarem escombros e a extrema-direita intacta para os ocupar.

Quando Pedro Nuno Santos diz que se não houver candidato do PS ele votará no do BE ou no do PCP, não está a afastar-se do PS. É o oposto. Está a dizer que o PS está a desistir de liderar o seu espaço. E que é nesse espaço que ele continua. As identidades de pertença, em política, contam muito. Como se vê pela vida fugaz de projetos que não as têm – PAN, MPT, PDR, PNS, PRD... Contam tanto que até podem exigir derrotas.»

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14.7.20

Vidas antes desta Covida (11)



Seul, Coreia do Sul, 2018.

Duas meninas coreanas com belos trajes regionais, como muitas outras que se passeiam assim pelas ruas, o que lhes dá direito a entradas gratuitas em museus e instituições equivalentes.
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14.07.1918 - Ingmar Bergman



Ingmar Bergman já nos deixou há quase treze anos. Foi durante alguns anos o meu cineasta de eleição e criou-me um fascínio tal pelos seus filmes, e pelo ambiente em que se passavam, que me fez gastar os primeiros tostões que consegui poupar: fui a um balcão da TAP, comprei um bilhete e pus-me a caminho de Estocolmo, sem nada  planeado. E não me arrependi.

Pretexto para recordar duas obras «eternas», dos anos 50, entre muitas outras magníficas!






E Saraband, o filme tardio de 2003 – de cortar a respiração.


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Que vergonha, Diário de Notícias!



O título principal do DN de hoje (online, em papel já sai apenas ao Sábado…) é este. Trata-se de uma escolha propositadamente enganadora, já que a própria notícia considera as ausências de deputados durante toda a legislatura, incluindo o período de pandemia. Ora a Assembleia da República, em linha com as recomendações da DGS, limitou o número de deputados presentes durante este período.

Aliás, no próprio artigo do DN é dito que “muitas faltas foram, na verdade, forçadas, por razões sanitárias (a lotação do plenário foi limitada por poder haver distância física entre os deputados).” E acrescenta-se ainda, em referência à sessão solene do 25 de Abril, que os deputados “não foram porque não puderam ir”.»

Vão longe com estas práticas. Depois, queixem-se…
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O secretário de Estado dos Louvores



«Segundo a Anacom (entidade reguladora das telecomunicações), entre o final de 2009 e abril de 2020, os preços das telecomunicações em Portugal aumentaram 7,7%, enquanto na Europa diminuíram 10,4%. Estes aumentos colocam as telecomunicações no nosso país entre as mais caras da UE.

Mas não são apenas os preços que dão má fama ao setor. Como tantas pessoas já tiveram oportunidade de experienciar, nomeadamente quando se viram enredadas em contratos de fidelização muito caros, pouco claros e impossíveis de cancelar, a qualidade dos serviços destas empresas é lamentável. Só numa semana, entre 25 de abril e 1 de maio, foram apresentadas 1825 reclamações sobre serviços de comunicações. Dessas, 64% dizem respeito a comunicações eletrónicas e, em particular, à gestão dos contratos e cancelamento de serviços a clientes. Entre janeiro e abril, a Anacom apresentou coimas no valor 1,3 milhões de euros associadas a 57 processos de contraordenação, que se juntam a várias condenações passadas, muitas delas contestadas pelas maiores operadoras do mercado.

Foi já em plena pandemia que o presidente de uma destas operadoras respondeu ao plano do Governo de criar uma tarifa social da internet (semelhante à tarifa social da energia suportada pela EDP) destinada a pessoas com menores rendimentos: "Se concordamos que seja imposto algo sobre os nossos ativos, construídos com o nosso investimento? Claro que não". Trata-se do presidente da Altice, que ficou com os ativos da Portugal Telecom: uma empresa que já foi pública e se tornou dona de rentáveis concessões do Estado, antes de ter sido destruída nas jogadas dos seus acionistas privados. Já depois da operação de compra da Portugal Telecom, a Altice foi acusada pela Anacom de se aproveitar, através da sua subsidiária Fibroglobal, da exploração das redes de fibra construídas nas zonas rurais... pagas com fundos públicos.

Haveria mais a dizer sobre estas empresas de telecomunicações que insistem em provar, uma e outra vez, que a privatização de setores estratégicos e infraestruturas monopolistas foi prejudicial aos interesses dos consumidores. Outras, como a Amazon, a Google ou o Facebook já encheram páginas e páginas de notícias sobre abusos laborais, fuga ao Fisco e venda de dados pessoais.

O que junta todas estas empresas neste artigo? O facto de todas terem sido objeto de um louvor formal, publicado em "Diário da República", por parte do Secretário de Estado para a Transição Digital, André de Azevedo, em reconhecimento pelo seu enorme contributo no combate à pandemia, pelo seu "excecional sentido do dever e permanente disponibilidade para o serviço público".»

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13.7.20

Vidas antes desta Covida (10)



Um almoço inesperadamente gourmet no restaurante do simpático CHEFE SILVA que faz questão de vir conversar com todos os comensais. Roça S.João dos Angolares, S. Tomé, 2019.
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Apanhada a beber uma cerveja depois das 20h



83 milionários pedem subida de impostos sobre mais ricos para ajudar na recuperação





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Presidenciais nos EUA?


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A natureza da “besta” que é a União Europeia?



«No final de Junho, Angela Merkel deu uma interessante entrevista a seis jornais europeus que revela o profundo domínio dos temas europeus, bem como o à vontade – quase descontracção – com que encara a crise causada pelo vírus SARS-CoV-2, a enésima crise da sua carreira como chanceler da Alemanha.

Na entrevista, Merkel deixa transparecer que está confiante que a União Europeia e a Zona Euro serão capazes, como no passado, de responder de forma satisfatória a mais esta crise. Reconhece de modo pragmático e correcto que esta é uma enorme crise e que são necessárias medidas extraordinárias de solidariedade. Por isso, argumenta, propôs em conjunto com o presidente Macron um fundo de recuperação europeu de 500 mil milhões de euros de transferências (e não empréstimos), que seria financiado pelo Orçamento da União Europeia.

Essa proposta está na génese do Fundo de Recuperação Europeu de 750 mil milhões de euros que, no entanto, viu a componente de transferências diminuída e a componente de empréstimos aumentada. E, mesmo assim, a Holanda quer atrasar uma decisão sobre esse fundo de recuperação europeu.

No entanto, a experiência de Merkel na gestão de crises e o facto que essas crises foram, de forma mais ou menos satisfatória, ultrapassadas, poderá levá-la a subestimar a gravidade da crise actual.

Ainda no âmbito dessa entrevista, referindo-se ao problema suscitado pela decisão do Tribunal Constitucional da Alemanha (TCA) – ao deliberar que se o BCE não provar satisfatoriamente, até 5 de Agosto, que os respectivos programas de expansão quantitativa cumprem o teste de proporcionalidade económica, o Bundesbank se deve retirar desse programa –, nota que os Estados-membros nunca aceitaram transferir todas as competências e poderes para a União Europeia. O Tribunal Europeu apenas é a última instância judicial para as competências e poderes que foram explicitamente transferidos dos Estados-membros para a União Europeia. Nas restantes matérias, o Tribunal Europeu – eu diria, felizmente – não é o tribunal superior mas sim os tribunais constitucionais de cada Estado-membro.

E Merkel remata a sua avaliação do conflito legal que resulta da decisão do TCA dizendo “é essa a natureza da besta”, isto é, é essa a natureza da União Europeia tal como foi construída pelos Tratados Europeus.

MEGA (idiotas)?

A Wikipedia em português descreve a liga hanseática como “uma aliança de cidades mercantis — alemãs ou de influência alemã — que estabeleceu e manteve um monopólio comercial sobre quase todo o norte da Europa e Báltico, em fins da Idade Média e começo da Idade Moderna (entre os séculos XII e XVII). Abrangeu cerca de 100 cidades, com Lübeck como centro. De início com carácter essencialmente económico, desdobrou-se posteriormente numa aliança política”.

A nova liga hanseática é uma aliança de Estados-membros da Zona Euro e da União Europeia (Holanda, Bélgica, Irlanda, Dinamarca, Suécia, Finlândia, Letónia, Lituânia e Estónia), que inclui os países ditos frugais (leia-se, sovinas), com representação formal em Bruxelas.

A nova liga hanseática conseguiu uma enorme (mas pírrica) vitória ao eleger para a presidência do Eurogrupo o irlandês Paschal Donohoe, vencendo a candidata espanhola, Nadia Calviño, que parecia inicialmente a favorita e que contava com o apoio dos maiores países da Zona Euro (Alemanha, França, Itália, Espanha), bem como de Portugal, da Grécia, da Finlândia e de Malta. Um dos dez países que tinha prometido o voto a Nadia Calviño não votou nela na primeira ronda de votos, tendo esta perdido na ronda final contra Paschal Donohoe, que recebeu o apoio da maioria dos países (pequenos) daquela nova liga.

No dia 7 de Julho, de forma inacreditável, um tweet dessa nova liga hanseática (NLH) advoga uma escolha sábia na eleição da presidência do Eurogrupo. Parafraseando a sigla dos apoiantes do Presidente Trump (“Make America Great Again”, ou MAGA), símbolo da profunda divisão em que os EUA estão mergulhados, coloca uma fotografia de um boné com a sigla MEGA (Make Eurogroup Great Again), e as escolhas que essa presidência irá defender: défices públicos de 3%; empréstimos com condicionalidade estilo troika através do Mecanismo Europeu de Estabilidade; o pacto de estabilidade (e crescimento) europeu (SGP) – leia-se continuação do espartilho orçamental e regras orçamentais arbitrárias a la carte duramente aplicadas aos Estados-membros devedores da Zona Euro – ; “Asset Quality Review”, i.e., uma análise aos activos do sector bancário (dos Estados-membros do sul); uma reforma das cláusulas de acção colectiva para garantir que os Estados-membros credores controlam a reestruturação de dívida dos Estados-membros devedores e para aumentar a pressão sobre o mercado de dívida soberana destes últimos; mais reformas ditas estruturais; e resiliência, seja lá o que isso quer dizer.

Os acrónimos tecnocráticos herméticos e incompreensíveis para a generalidade da população (“3%”, “ESM”, “SGP”, “AQR”, CAC”, “Reform”, “Resilience”), i.e., as causas advogadas pela NLH, no detalhe, têm profundas implicações. Na realidade, afiguram-se quase racistas, revelando ignorância, indiferença pelo sofrimento causado, e desconfiança de tudo quanto provém dos Estados-membros do sul da Zona Euro, o grupo de países que foram no passado designados “PIGS” (porcos). Quase parece que se pretende levar os PIGS para o matadouro.

A Zona Euro e a União Europeia estão num diálogo de surdos e assusta porque as prioridades da NLH sinalizam muito: a NLH não parece ter a noção de quão duras e retrógradas são as medidas que advogam, nem a insensibilidade que é utilizar o chapéu MEGA para defender a eleição do seu representante para a presidência do Eurogrupo (a Suécia e a Dinamarca não fazem parte da Zona Euro). Não parecem compreender que retiram mais benefícios da Zona Euro e da União Europeia do que os Estados-membros do sul.

Donohue defenderá taxas de impostos baixas para as empresas, será contra a taxação de multinacionais dos sectores digitais (que têm as suas sedes para efeitos fiscais na União Europeia precisamente na Irlanda) e tenderá a defender alguns pequenos países que constituem paraísos fiscais no seio da Zona Euro: Irlanda, Luxemburgo e Holanda. Um mau princípio de uma presidência do Eurogrupo que se afigura será muito atribulada e que se arrisca a ser a última?»

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12.7.20

Vidas antes desta Covida (9)



Oração numa das onze igrejas escavadas na rocha no século XII, Lalibela, Etiópia, 2013.

[Não há palavras que possam dar uma ideia do que são esses onze templos, escavados na rocha e em muitos casos ligadas por túneis. O Templo de S. Jorge foi o último a ser construído e é o mais espectacular, com a forma em cruz, enterrado e com quinze metros de altura. (Ver foto mais abaixo .) As escavações começaram em pleno século XII e todo o conjunto foi construído em apenas vinte e quatro anos! Terão estado implicados nas obras 40.000 homens, com recurso a instrumentos mais do que rudimentares, e conta a lenda que trabalhavam enquanto havia Sol e que os anjos faziam o turno da noite...]

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Paulo Pedroso na «mouche»





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A direita no labirinto


A direita, perdida num labirinto, procura uma saída. Não é fácil. O sr. António Costa ocupou o centro político, convertendo o que resta da classe média. O sr. André Ventura galopa a raiva dos descontentes de todos os quadrantes. O sr. Rui Rio, de tanto esperar, parece que se contentará com um bloco central Frankenstein e em ser vice-primeiro-ministro. O CDS não sabe se há-de ser doce ou dar bengaladas. Ou seja, a oposição de direita procura um ideal, um espaço e também um homem providencial. O problema é que se contorce com um pesadelo: o sr. Ventura. Vive obcecada pela figura e funciona em reacção ao que esta diz ou faz. É o chamado erro fatal. Foi assim que o sr. Donald Trump tornou refém o Partido Republicano. Bem dizia Paul Valéry: “O futuro já não é o que era.” 

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Estrangeiro rico, estrangeiro pobre



«O turismo valeu, em 2018, 14,6% da economia nacional. Portugal é, na Europa, o quinto país mais dependente deste setor e a pandemia tem efeitos devastadores, bastando olhar para a taxa de desemprego no Algarve para perceber a dimensão do tombo.

Por mais receios sanitários que a movimentação de pessoas provoque, a economia precisa de turistas como de pão para a boca. Literalmente.

Como estamos dependentes do mercado externo, queremos que os estrangeiros venham. Incluindo de países que viveram, ou ainda vivem, cenários epidemiológicos com elevadas taxas de prevalência de covid-19. Os estrangeiros podem entrar, desde que tenham dinheiro para ajudar a reanimar a atividade económica. O caso muda de figura quando se trata dos estrangeiros residentes no país e associados a comunidades desfavorecidas.

Os indicadores apresentados esta semana na reunião de especialistas e responsáveis políticos, no Infarmed, mostram que um quarto dos novos infetados em Lisboa é imigrante. Um certo discurso alimentado nas últimas semanas em torno das medidas restritivas e das ações de policiamento nas freguesias mais afetadas contribui, contudo, para estigmatizar estes cidadãos. O estrangeiro pobre, quando adoece, não é vítima, é responsabilizado pelo comportamento que o levou a adoecer.

Acicatados pelo medo, muitos dos sentimentos de discriminação e de desconfiança em relação ao outro agravaram-se nos últimos meses. O pior é quando as próprias autoridades e entidades que deveriam proteger os valores essenciais em democracia contribuem para alimentar preconceitos. Como o Ministério Público de Faro que, ao divulgar a detenção de um jovem que tinha violado o confinamento obrigatório e foi acusado de desobediência agravada - a primeira acusação do género conhecida publicamente -, fez questão de escrever no comunicado que se trata de um homem de "nacionalidade estrangeira".

Os estigmas não ajudam no combate à doença. Nem os perigos se dominam fechando portas a cadeado. Teremos de aprender a conviver com a doença, sem deixar que outros vírus de intolerância e medo ganhem igualmente tamanho.»

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