29.7.25

O isolacionismo da CDU

 


«CDU foi desafiada a liderar coligação de esquerda em Loures, mas comunistas não mostram disponibilidade. “Estarmos juntos contra esta deriva autoritária era muito importante”, defendem partidos.»


29.07.1890 – O dia em que Van Gogh morreu

 


Tudo se sabe sobre este extraordinário pintor nascido nos Países Baixos, mas prefiro recordar a sua estadia em Arles porque voltei a passar por lá há poucos anos.

Foi em Arles que o pintor se exaltou com a luz do Sul e pintou muitos dos quadros que tão bem conhecemos, desde os famosos girassóis aos ciprestes, à casa amarela onde viveu, ao célebre quarto, ao autoretrato com a ligadura depois de ter cortado a orelha por causa de uma forte zanga com Gauguin – 185 quadros entre Fevereiro de 1888 e Maio de 1889.

Depois do corte da orelha, a população considerou-o cada vez mais louco e exigiu o seu internamento definitivo no Hotel de Deus da cidade, misto de asilo e hospital. O claustro está hoje intacto (foto no topo deste post), tal como ele o pintou. Pediu depois para ser transferido para um hospital psiquiátrico perto de Saint-Rémy-de-Provence e regressou mais tarde aos arredores de Paris.

Se não o tratou bem em vida, Arles tira hoje todo o partido possível da estadia de Van Gogh nas suas terras.




 .

Pedro Tamen

 


Deixou-nos há quatro anos. Faz-me falta.

Educação sem corpo

 


«Há um estranho consolo em discutir programas escolares em julho. A sala está vazia, os quadros limpos, os corredores silenciosos. E é nesse silêncio que surgem as polémicas mais ruidosas: mudanças no currículo, ameaças ao futuro da juventude, fantasmas ideológicos escondidos em parágrafos. Desta vez, o que se discute é o lugar da sexualidade na disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Ou, mais exatamente, o seu apagamento.

Diz o Governo que não se trata de censura, que é só uma pequena reorganização. A sexualidade passará a integrar a área da saúde, dissolvida num domínio mais amplo, mais técnico, mais asséptico.

A reação foi previsível: gritos de alerta, colunas inflamadas, indignação moral de um lado e do outro. Como se a escola estivesse prestes a tornar-se campo de reeducação progressista ou, inversamente, reduto do puritanismo restaurado. Como se uma aula de quarenta e cinco minutos por semana — quando existe — fosse o campo de batalha final da nossa consciência cívica.

É que o problema é esse: a aula muitas vezes não existe. A Fenprof estimou que, no último ano letivo, mais de um milhão de alunos ficaram sem professores em pelo menos uma disciplina. O Ministério não conseguiu desmentir, mesmo depois de ter encomendado um estudo à KPMG queterminou em incógnita. Não sabemos quantos alunos têm professores, mas sabemos que as aulas de Cidadania vão ser reformuladas. Reformuladas, ainda que para muitos não sejam sequer leccionadas.

Discutimos um subgrupo de uma disciplina que estatisticamente não chega à sala. É um debate na torre de marfim, onde se discute com seriedade algo que não existe com regularidade. Não é reforma nenhuma. É distração.

A eliminação da sexualidade deste programa não é um acidente técnico, nem um simples erro de formulação. É um gesto. Um piscar de olho. Uma forma de dizer à extrema-direita que estão estamos atentos aos receios que os atormentam. O Governo, neste caso, prefere evitar o alarme das famílias do que enfrentar o analfabetismo emocional. Prefere agradar a quem se ofende com a palavra “sexo” do que ensinar a diferença entre toque e violência, entre desejo e coação, entre intimidade e vergonha.

Dizer que a educação sexual nas escolas é doutrinação ideológica não é só falso; é perigoso. A sexualidade, enquanto tema educativo, não nasce da agenda woke, dos anti-cristo, nem da militância progressista. Está consagrada, como bem lembrou a Susana Peralta, em tratados internacionais, normas da OMS, estratégias europeias sobre saúde reprodutiva. Desde 1990 que a Convenção sobre os Direitos da Criança exige que os Estados protejam os mais novos através de educação sexual. A Unesco atualizou em 2018 os seus standards, lembrando que ensinar sexualidade não é ensinar comportamento, é ensinar consciência cognitiva, emocional, física, social.

Quando se fala de sexualidade nas escolas, fala-se de prevenir abusos. De ensinar o que é consentimento. De nomear o corpo para que o corpo não se torne tabu. Fala-se de proteger. De informar. De cuidar.

A educação sexual não serve para inculcar ideologia. Serve para impedir silêncio. Onde não se ensina, perpetua-se o risco de ignorância, de violência, de culpa mal dirigida. O risco de crescer sem saber o que é, sem conseguir nomear, sem amparo.

Por isso, o verdadeiro escândalo não é o que está escrito nos novos documentos. É o que não está. Não há professores, não há aulas, não há garantias. Mas há zelo na escolha dos temas de uma disciplina para agradar aos pais de Famalicão e a ideólogos radicais da direita radical. Há prudência calculada. Há medo de desagradar a quem grita mais alto.

A escola pública é, por definição, plural. E essa pluralidade exige coragem de se ensinar o que custa, de nomear o que incomoda, de incluir o que se prefere esquecer.

Apagar a sexualidade das aulas de cidadania, é mais do que uma opção pedagógica, um gesto simbólico que retira o corpo da formação do cidadão. Como se a cidadania pudesse ser ensinada sem desejo, sem limite, sem toque e os alunos fossem espíritos puros a flutuar acima do corpo que habitam.

É sempre mais fácil falar de polémicas que não se concretizam do que resolver os problemas reais que já estão em curso. E é por isso que discutimos o conteúdo de uma aula que ninguém tem. Enquanto isso, no mundo real, os alunos esperam por professores que não chegam. E os seus corpos, esses, não esperam por ninguém.»


Pacheco Pereira e este Governo

 


28.7.25

Uma bela escadaria

 


Escadaria do Observatório do Castelo de Abbadie, em estilo neogótico, Hendaia (Pirenéus), França. 1864-1879.
Construído por Eugene Viollet-le-Duc e Edmond Duthoit.


Admirável Timor-Leste

 


«Numa altura em que se debate o retrocesso do número de países no mundo a serem democracias, pela primeira vez em 30 anos menor do que o de autocracias, Timor-Leste destaca-se pela positiva como um dos 88 países que passaram no crivo do Instituto V-Dem, com sede na Universidade de Gotemburgo. No relatório publicado agora pelo instituto sueco, o pequeno país lusófono destaca-se no contexto do Sudeste Asiático, e está no mesmo patamar democrático que países como a Polónia, o Brasil, a Argentina ou Cabo Verde.

Com 23 anos de independência, a contar a partir de 2002, quando terminou a administração pelas Nações Unidas que se seguiu ao referendo que libertou a antiga colónia portuguesa da ocupação pela Indonésia, Timor-Leste serve também para desmentir a ideia que por vezes existe de que as autocracias são mais eficazes do que as democracias, pois há dias foi anunciado um extraordinário êxito do jovem país: a eliminação da malária. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), que constatou que “a cadeia de transmissão autóctone foi interrompida em todo o território nacional, por três anos consecutivos”, tudo resultou de um esforço nacional que vem do primeiro momento pós-independência, apoiado por esforços internacionais. Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, uma das agências das Nações Unidas, destacou, num comunicado publicado no dia 24, “forte vontade política, intervenções inteligentes, investimentos nacionais e externos e profissionais de saúde dedicados”.»

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Loures soma e segue

 


«O gabinete criado pela da Junta de Freguesia de Portela e Moscavide funciona como canal de denúncias para casos como “espaços comerciais transformados ilegalmente em habitação”. Oposição acusa autarca do PS de promover “sentimento de insegurança que não existe”.»


“Não sirvas a quem serviu”

 


«Nos trinta anos depois da II Guerra, França viveu um boom económico que levou a uma forte necessidade de mão-de-obra. Como sempre aconteceu e acontecerá, esta necessidade resultou em imigração em massa para o território. O que, associado a uma crise habitacional e à falta de planeamento urbanístico, levou ao surgimento de bairros de lata que, em França, ganharam o nome de bidonville. Construídos com material precário, sem água potável, saneamento ou eletricidade, eram bairros informais que se multiplicaram nas periferias de Paris. O bidonville de Champigny era onde havia mais portugueses. Mas não era o único.

Primeiro foram os imigrantes vindos das ex-colónias francesas, sobretudo da Argélia saída da guerra, depois, em fuga da miséria e da guerra colonial, os portugueses. Entre 1957 e 1974, cerca de 900 mil portugueses foram para França. Mais de meio milhão ilegalmente. Os homens trabalhavam na construção civil e nas fábricas, as mulheres limpavam casas. Na altura, como hoje, foram alguns setores da Igreja, ativistas de esquerda e intelectuais, os que recorrentemente são acusados de não conhecerem o “País real”, que prestaram atenção à vida miserável nos bidonvilles.

Em meados da década de 70, o governo francês lançou um programa de demolição dos bidonvilles, incluindo o de Champigny, deslocando os imigrantes para zonas segregadas, o que veio a marcar o péssimo modelo urbano e de integração que, duas décadas depois, Portugal viria a imitar.

Houve protestos contra as demolições, liderados por movimentos sociais (que também terão sido tratados como criminosos), por organizações religiosas e por intelectuais. Aconteceram porque eram desfeitas relações de vizinhança, porque não eram oferecidas alternativas imediatas ou porque as alternativas eram péssimas. Os moradores, que contribuíam, com o seu trabalho, para a prosperidade de França, não achavam que ali estivessem por favor. Achavam que, trabalhando para a riqueza francesa, mereciam respeito e direitos. Os protestos atingiram níveis bem mais vocais do que os liderados pela “Vida Justa”, um movimento que um tristemente célebre autarca “socialista” a Loures tratou, copiando também aqui os tiques da extrema-direita, de tentar criminalizar.

Na CNN, Filipe Santos Costa foi buscar “Allez Paris”, trabalho de António Pedro Ferreira (uma das fotos acompanha este texto). Está no Arquivo Municipal de Lisboa, até setembro, e serve de lembrete para não nos esquecermos de onde viemos.

Hoje, somos “europeus”. Queixamo-nos da invasão de imigrantes que aqui vêm contribuir, fazendo o trabalho que já não queremos, para a prosperidade nacional. Os que aqui chegam sem papéis são criminosos. As barracas que erguem, porque não nos preparámos para o facto indesmentível de precisarmos de mais pessoas, são a prova da sua criminalidade. Os autarcas prometem mão forte. Como estamos mudados, esquecendo o lugar onde já estivemos.

Olhamos de cima para os que nos limpam as casas e os escritórios, tratam dos velhos, erguem os prédios, pavimentam as estradas, colhem os alimentos. Somos, finalmente, “civilizados”. E como quase todos os que subiram há pouco tempo, mas preferem esquecer de onde vieram, somos especialmente cruéis na nossa superioridade. Diz o povo, na sua infinita sabedoria, “não peças a quem pediu, nem sirvas a quem serviu”. O povo é que sabe.»


27.7.25

Nuno Portas

 


Conheci-o bem, comecei por encontrá-lo no atelier de Nuno Teotónio Pereira no início dos anos 60, seguiram-se tempos em que navgámos em águas de antifascismo semelhantes, fizemos mesmo parte de uma direção épica do Centro Nacional de Cultura.

Tinha 90 anos, vai-se fechando uma geração que tanto marcou este país.

E o chavascal continua

 


As cinzas de um povo

 


«Pela manhã, acordamos sufocados com os números obscenos dos mortos em Gaza, trazidos pelas notícias. À noite, adormecemos angustiados com a actualização da desumana destruição deste território. Crianças que morrem de fome, que se esvaem nos braços dos pais por falta de água, comida, remédios, socorro humanitário. Estima-se que morram em média 28 crianças por dia, diz-nos o vice-porta-voz da UNICEF. As imagens televisivas reportam-nos o desespero, os escombros, a morte de um povo. É este o dia-a-dia dos palestinianos que choram os seus estropiados, os seus mortos; o desespero de não terem nem comida nem bebida para os seus, que correm risco de vida quando vão em busca de pão ou de água, nos centros de distribuição. Têm de escolher entre morrer de fome, de sede ou de um tiro, um míssil ou uma bomba direccionados à multidão que geme e grita por um precário auxilio alimentar. Gaza é um cemitério ao ar livre com sangue e cinzas dos seus filhos... Entretanto o responsável por esta situação apocalíptica, o primeiro-ministro israelita tenta convencer (se) da justeza, contenção e racionalidade da sua guerra fratricida contra o povo palestiniano, acusando a ONU, centenas de ONG, jornalistas e organizações internacionais, que trabalham heroicamente no terreno, de serem antissemitas. É a defesa de um fraco que sabe que não tem razão, que a verdade cruel e horrenda chegou já à casa de toda a comunidade internacional.»

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