15.4.25

Bloco Central: antes o poço da morte que tal sorte

 


«O Bloco Central de que tanto se fala em Portugal aconteceu entre 1983 e 1985, quando uma grande parte dos eleitores ainda não tinha nascido ou era criança.

Na época, foi preciso cumprir um programa doloroso do FMI. O resultado prático desse Bloco Central foi a criação de um novo partido, inspirado na figura do Presidente da República da época, Ramalho Eanes, que fez com que o PS, nas eleições seguintes, ficasse reduzido a 20%.

No Bloco Central 1983-1985, o primeiro-ministro era Mário Soares (que já estava a aquecer os motores para a candidatura presidencial) e o vice-primeiro-ministro Carlos Alberto da Mota Pinto, com quem Soares tinha uma grande relação de amizade e cumplicidade. Depois da morte prematura de Mota Pinto, o novo líder do PSD, Aníbal Cavaco Silva, rompe com o acordo do Bloco Central e faz com que seja o PS — e só o PS — a pagar “as favas” da duríssima crise que atingiu Portugal.

É a partir do momento em que força o PSD a sair do governo do Bloco Central que Cavaco constrói a sua vitoriosa carreira política como primeiro-ministro.

Esta história já não é muito recente mas explica porque é que a expressão “bloco central” se tornou totalmente proibida nos últimos 40 anos. O PS quase que ia sendo “substituído” por outro partido — o Partido Renovador Democrático revelar-se-ia um falhanço mas isso não foi logo previsível em 1985 — e o único partido que “ganhou” com a coligação foi o PSD, já com Cavaco Silva, que não estava comprometido com a solução de Bloco Central e conseguiu fazer com que a impopularidade do Governo recaísse toda sobre o PS.

Meia volta, em Portugal, aparecem uns saudosistas do Bloco Central que consideram que todos os males da República seriam resolvidos com um entendimento governamental entre PS e PSD.

Ferro Rodrigues foi uma das personalidades que esta semana voltou a insistir na possibilidade “numa situação-limite” que pode estar ao virar da esquina: “Há todos os ingredientes negativos do ponto de vista internacional, muito mais graves do que nessa altura [1983]”. Ferro acha que “quando começarem a chegar à mesa dos portugueses” as tarifas de Trump “as pessoas vão começar a perceber que os tempos estão a mudar e que é necessário que os políticos aprendam alguma coisa e que tenham juízo” e “não fomentem crises desnecessárias”. Ferro admite que não será nestas eleições já, mas numa “próxima crise pode haver necessidade de pôr frontalmente a questão em cima da mesa”.

Habitualmente, para defender esta solução, os seus apóstolos dão o exemplo da Alemanha, onde a “grande coligação” entre o equivalente do PSD (CDU) e o equivalente do PS (SPD) tem sido uma constante nos últimos anos. O que somos nós a menos do que os alemães?, perguntam os “blococentralistas”.

O problema é que a Alemanha já nem é a Alemanha de “antigamente”. Uma das notícias da semana foi o facto de, pela primeira vez, no dia em que a CDU e o SPD assinaram o acordo de coligação, o partido de extrema-direita, Alternativa para a Alemanha (AfD), apareceu numa sondagem como o partido com mais intenções de voto.

Numa Alemanha que se está agora a rearmar em força, num processo histórico que é uma das grandes reviravoltas políticas do pós-Segunda Guerra Mundial, o partido que está cheio de neonazis ganhou a liderança nas sondagens.

Agora imagine-se que vem aí uma recessão económica provocada pela loucura de Trump, numa economia que já está debilitada como a alemã? A possibilidade de a AfD crescer nas sondagens e vencer as próximas eleições é uma possibilidade real e assustadora.

Portugal não é a Alemanha e o Chega não é AfD, embora sejam partidos irmãos. O que aconteceria no dia em que PS e PSD decidissem juntar-se, deixando o Chega à solta?»


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