20.10.18

Brasil: os índios e os outros



«Há 30 anos, em plena Assembleia Constituinte, pintou o rosto de negro, declarou guerra aos políticos brasileiros e venceu. Ailton Krenak tem agora 65 anos, já viu muito e o que não viu, recorda-se, numa memória que lhe foi legada pelos antepassados. Líder indígena, assume-se e ao seu povo como sobreviventes de um genocídio. Mas teme pelo futuro dos brancos, aqueles que nunca aprenderam a pisar com leveza a “Mãe Terra” e que por isso poderão acabar “enterrados no próprio vómito”.»


Ler e ouvir mais AQUI.
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Brasil: para entender o que está a acontecer


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A Navalha de Occam aplicada a Tancos não corta nada



José Pacheco Pereira no Público de hoje:

«Eis uma história muito mal contada, muito esquisita, em que nada encaixa com nada, em que, em bom rigor, quem esteja atento aos detalhes não percebe nada. Repare-se no arsenal de acusações: “Crimes de associação criminosa, denegação de justiça, prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder, receptação, detenção de arma proibida e tráfico de armas.” (Isto estava em “acordês” no original e foi corrigido para português.) Ou seja, quase tudo de criminalidade grave que se pode fazer.

Tancos pode ser uma história muito pouco portuguesa, de filme entre a espionagem e o policial, ou demasiado portuguesa, uma soma de corrupção, negligências, amiguismo, de línguas soltas, onde tudo corre, como cá se diz, à balda. Ou pode ser uma mistura das duas, uma operação qualquer que correu mal, criminosa, ou de “interesse nacional”, que a “maldita complacência” dos portugueses, como dizia Fradique Mendes, tornou uma farsa. Para 007 não temos de todo jeito, para Ocean’s, 11, 12 ou 13, muito menos. Uma coisa é certa: seja qual for o enredo, correu mal.

Temos duas maneiras de ver o que se passou em Tancos, ou melhor, aquilo que sabemos e aquilo que pensamos que sabemos. Uma, a mais simples, trata-se de um roubo e o dinheiro é o fio condutor que vai dos ladrões aos receptadores, aos encobridores. Se entendesse alguma coisa do que aconteceu em Tancos, usaria a Navalha de Occam para garantir que a “explicação para qualquer fenómeno deve assumir a menor quantidade de premissas possível”, também chamada a “lei da parcimónia”, a explicação mais simples tende a ser a melhor. Foi de algum modo o que fez Copérnico face a Ptolomeu: era mais simples fazer os cálculos dos movimentos celestiais, se se partisse do pressuposto que o Sol estava no centro do sistema, em vez da Terra. Os complexos cálculos de Ptolomeu também permitiam fazer previsões, mas eram cada vez mais complicados. Com Tancos esta era a solução ideal para a Navalha de Occam, a chave de tudo está no dinheiro.

Mas os chamados “factos incómodos” acumulam-se: só um ladrão para material tão pesado? Como o transportou? Tinha cumplicidades dentro? Tinha de ter. Quem? E como se vai do ladrão singular para a Polícia Judiciária Militar, e depois à GNR de Loulé, e eventualmente ao chefe de gabinete do ministro e ao primeiro-ministro, quiçá ao Presidente? Eram todos “amigos” uns dos outros? Há “amigos” a mais nesta história, dispostos a colocarem a cabeça no cepo apenas porque um “amigo” pediu a outro “amigo”. Que diferentes motivações estão envolvidas numa cadeia tão complexa? Só dinheiro? E se foi só dinheiro foi certamente muito para pagar a tanta gente. E para onde e para quem iam as armas? E como, se não chegaram ao mercado, de onde veio tanto dinheiro? Não pode ter sido da venda. E se era um operação criminosa, destinada apenas a ganhar dinheiro, o que é que explica tanta boa vontade para encobrir envolvendo gente com altas responsabilidades hierárquicas? Subornos? Protecções? E o que é que explica, se foi assim, a suposta revelação do encobrimento pelos encobridores ao ministro? E o ministro, se sabia, como não podia ter deixado de actuar e dizer ao primeiro-ministro? Não, não dá, a Navalha de Occam, que nos diz que foi o dinheiro o fluido de todo este processo, encrava por todo o lado.

A segunda hipótese, deixando agora o bom do monge franciscano em paz, é de que existe uma conspiração qualquer que pode conter elementos de crime e de corrupção, mas que no essencial é de outra natureza. Ganha assim um outro relevo a frase já antiga do ministro póstumo da Defesa de que, “no limite, pode não ter havido furto nenhum” — ou seja, o encobrimento pode não estar a encobrir um roubo no sentido comum da palavra mas uma qualquer forma de desvio cujos fins permanecem obscuros. E isso explica que tanta gente ande a encobrir o caso, do topo à base, em nome de qualquer forma de “interesse nacional”, actuando não por dolo, mas por subordinação a ordens vindas de cima reconhecidas como sendo legítimas e com razão, ínvia que seja. Eu não sou de conspirações, mas que as há há.

Como em Portugal há serviços de informações, também é suposto que saibam mais do que os jornalistas, mas o que eles sabem sabia o ministro da Defesa, o primeiro-ministro e o Presidente, todos na cadeia de distribuição das informações mais reservadas. Portanto, há muita gente, cinco é de mais para estas informações, que sabe o que se passou e, como estamos em Portugal, onde nenhum segredo tem vida média, quanto mais longa, vamos acabar por saber o que se passou. Ou não.»
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19.10.18

Dica (820)




«Sweden has significant demand for high skilled labour. With start-ups and high growth enterprises emerging at a fast pace, the existing labour force struggles to provide the resources needed. The temptation for many firms is to consider pastures new, with London and Berlin well-known destinations. The labour shortfall thus poses an existential risk to the Swedish economy, one which politicians on both sides of the political centre are struggling to get to grips with.

Against such a backdrop, immigrants may yet prove to be Sweden’s salvation. For this, significant investment must be made, ensuring that more immigrants receive a university education or technical training. This would require an effort to grow the university sector, increasing the number of taught places available. More online Master’s courses would allow aspirational young immigrants to complete postgraduate education while working to bring in much needed cash. Public schools might concentrate on teaching basic IT and programming, meaning such skills are learnt by all at an early age, before university. Companies too could show more flexibility in who they hire. A Master’s degree is not always better than a Bachelor’s.

Better education of foreigners and more flexible recruitment policies can help solve Sweden’s immigration crisis. Furthermore, immigrants can provide a new impetus for the Swedish economy. Future Swedish governments must communicate these facts to their citizens, or face the slow hollowing out of the much-vaunted Nordic model.»
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Exorcismos


«Estou infiltrado num grupo de apoio ao Bolsonaro no WhatsApp. Em silêncio, para não ser expulso nem ameaçado. Escrutinei tudo o que fui lendo: 99% das notícias partilhadas são absurdamente falsas. O resto é discurso de ódio, apologia da violência, raiva irracional e fanatismo religioso. Há dias, um dos membros publicou uma frase sábia. Não sei onde está a ranhura por onde um outro discurso, uma emoção, ou um pouco de empatia possa entrar. Mas o caminho não passa pela ideologia, muito menos pela teologia e menos ainda pela política. Temos que pensar no significado das palavras deste eleitor do Bolsonaro: “Isto não é uma eleição, é um exorcismo.” E agora?»

José Salavisa

A ler na íntegra AQUI.
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Palmas para o Barça




«A questão que o clube tem visto com preocupação não é posicionar-se e pedir o voto democraticamente, mas dar o voto explícito a posições totalitárias contra a defesa dos direitos humanos, independentemente do que acabará sendo sua ação governamental.

Ronaldinho tem um acordo comercial com o Barça e cobra pela participação em eventos. O papel de Ronaldinho não é diferente do de Rivaldo, que colabora regularmente nos atos do Legends ou Penya. Assim, Rivaldo, que também apóia publicamente Bolsonaro, também perderá sua parte nos eventos do Barça.»
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Brasil. É fazer força para respirar Guerra civil à brasileira



«Em nossos planos a respeito do futuro, não contávamos com a hipótese da emergência de uma ditadura. Ela provavelmente virá.

Não deixa de ser curioso que, na vigência da democracia – mesmo nas menos intensas e mais estropiadas -, nossas expectativas usuais sejam de natureza não-política: cuidar dos filhos, fazer um regime, levar a neta ao infantário.

É que a vida sob o Estado de Direito nos envolve com camadas invisíveis de proteção, perceptíveis apenas quando nos faltam. Tal como o ar que se faz presente, por paradoxo, quando suprimido; quando a busca ativa e agônica substitui o modo automático e irrefletido da respiração. De agora em diante, na ordem natural das nossas expectativas, as de natureza política terão lugar compulsório. É fazer força para respirar.

A ditadura provavelmente virá. Ela, na verdade, já está inscrita na ordem das coisas, assim como na perspectiva de desordem na vida quotidiana: os demônios ativados não voltarão às garrafas; estão soltos nas ruas e pretendem delas se assenhorar, com a vitória provável do Chefe.

A ditadura, se vier, virá pela expressão do voto majoritário: vox populi ou, segundo alguns, Deus vult. Fixar-se-á pela conivência do sistema de Justiça – Judiciário e Ministério Público - que imaginávamos, em 1988, como barreiras aos liberticidas e, até mesmo, como factores de extensão dos direitos do povo brasileiro.

Virá, se vier, pela indiferença das forças da ordem diante da violência esquadrista que já se insinua na experiência quotidiana. Diante da ameaça ou da consumação de agressões, a polícia tenderá a ser um elemento gravoso. Não contemos com ela: é o que sugere a reação do delegado de polícia, no Rio Grande do Sul, ao deparar-se com a suástica talhada a canivete no corpo de uma mulher agredida e dizer que se tratava de um “símbolo budista de paz”.

O provável futuro presidente lamenta não terem sido eliminadas trinta mil pessoas pelo regime militar pregresso. Convoca expressamente à matança de petistas, tal como fez em comício no estado do Acre. Diz que vai acabar com todos os “ativismo sociais”. Ao mesmo tempo em que diz que quer “unir o Brasil”, o que imagina fazer a seguir à devida profilaxia, então não? Este é, na verdade, um ponto que merece melhor inspeção.

Bolsonaro está a ser associado à onda ultradireitista e populista que assola o mundo democrático em geral. A evocação de causa remota, se pertinente, relativiza a maternidade exclusiva dos brasileiros a respeito do fenómeno. No entanto, os resultados serão os mesmos: autóctone ou não, os efeitos da ditadura, caso venha, serão os mesmos. Doerão da mesma forma.

No entanto, creio caber ressalva à dissolução do infortúnio brasileiro no âmbito da onda geral. É que nos países por ela afetados – na verdade, em todos eles - o inimigo a combater é externo. São casos nos quais se aplica o terrível silogismo detectado por Primo Levi, em seu clássico livro “Se isto é um homem”: se todo estrangeiro é um inimigo e todo inimigo deve ser abatido, por maioria de razão todo estrangeiro o deve ser.

Com efeito, o ódio ao imigrante e ao refugiado constituiu-se como matriz de uma filosofia pública que corrói a razão democrática e infecta as formas usuais da vida. Em uma palavra, a abjeção da extrema-direita europeia tem como elemento fulcral o ódio ao estrangeiro ou ao estranho.

A abjeção da extrema-direita brasileira reside no ódio a uma parte dos próprios brasileiros. Não duvido que, caso tivéssemos pressões imigratórias – tal como já se começa a ter com a crise venezuelana – tais demônios seriam igualmente desarrolhados. Isto a despeito de nossa tradição na matéria: o segundo governo de Lula, por exemplo, legalizou cerca de 30.000 estrangeiros no país.

Volto ao ponto: trata-se aqui e agora de ojeriza a uma fração dos próprios nativos; a opositores políticos e sociais em vias de se tornarem dissidentes. Contra tais dissidentes, a linguagem empregada é a da guerra e do extermínio, já que não há como os expulsar. Não parece haver para eles lugar na comunidade nacional, facto que exige depuração.

Sustento que esse quadro define a premissa maior para a deflagração de uma guerra civil. Não estou a fazer profecia; aponto tão somente os termos gerais postos pela força que desaba sobre nós. Símbolos e palavras, julgo, produzem efeitos sobre a manufatura do mundo. Mas, para além de símbolos e palavras, importa dizer que os operadores iniciais da guerra proliferam, a gerar um quadro de ameaças e desordem.

A ação dispersa, generalizada de intimidações aos dissidentes poderá gerar um efeito de contenção. Em caso contrário, se no lugar da contenção houver revolta, temo que os profissionais entrem em cena, no lugar dos grupos de assalto e cercados das devidas prerrogativas legais. Para isso temos o sistema de justiça instalado no país.

O medo político passa a fazer parte da economia de nossas paixões. Assim, damo-nos conta do quanto a interação entre os humanos pode dar passagem a experimentos potencialmente letais.»

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18.10.18

Dica (819)




«Brazil has struggled for a generation to contain police violence, protect the rights of minorities, and eliminate enslavement in the agrarian sector. Its progress has been halting and setbacks have been demoralizing. But in every sphere, there have been improvements since the end of the dictatorship in 1985. A Bolsonaro presidency would put all these gains—and democracy itself—at risk.»
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18.10.1936 - A primeira viagem para o Tarrafal



É a primeira vez que se recorda esta data sem nenhum sobrevivente do primeiro grupo que construiu e viveu no campo de concentração do Tarrafal, já que Edmundo Pedro nos deixou no início deste ano. Motivo reforçado para não deixar esquecer o dia de hoje.

Foi há 82 anos que os primeiros presos saíram de Lisboa, no paquete Luanda, com destino ao que viria a ser o «Campo da Morte Lenta», na ilha de Santiago, em Cabo Verde. O Luanda era normalmente usado para transporte de gado proveniente das colónias e os porões habitualmente utilizados para esse efeito foram transformados em camaratas.

Depois de uma escala no Funchal e de uma outra em Angra do Heroísmo, para recolher mais alguns detidos e / ou largar os menos perigosos, e no fim de uma viagem em condições degradantes, foram 152 os que desembarcaram, no dia 29, em fila indiana, antes de percorrerem os 2,5 quilómetros que os separavam do destino final.

No primeiro volume das suas Memórias, Edmundo Pedro dedica longas páginas à descrição do que foi essa terrível viagem que durou onze dias. (*) O início e o fim:
«E na noite de 18 de Outubro, de madrugada, reuniram-nos em camionetes da GNR. Estas dirigiram-se para o cais de embarque, em Alcântara... No caminho, apesar das ameaças dos soldados, demos largas ao nosso protesto. O nosso vibrante grito de revolta ecoou, ao longo de todo o percurso, nas ruas, desertas, daquela madrugada lisboeta. Cantámos, a plenos pulmões, todas as canções do nosso vasto cancioneiro revolucionário... (...)
A 29 de Outubro de 1936, onze dias depois de termos partido de Lisboa, o velho Luanda fundeou, ao princípio da tarde, na pequena e aprazível baía do Tarrafal. Pouco depois, começou a descarregar a "mercadoria" que transportava nos seus porões... Alguns prisioneiros tinham chegado a um tal estado de fraqueza que só puderam abandonar o barco apoiados nos seus camaradas...»
Depois, foi o que se sabe: histórias de terror, 32 pessoas por lá morreram e o Campo durou até 1954. Foi reactivado em 1961, como «Campo de Trabalho do Chão Bom», para receber prisioneiros oriundos das colónias portuguesas (o ministro do Ultramar era então Adriano Moreira e foi ele que assinou a respectiva portaria) e durou até 1974.

(*) Edmundo Pedro, Memórias, Um Combate pela Liberdade, Âncora Editora, 2007, pp. 350-359.
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O quilómetro zero de Costa



«O grande debate nacional acerca deste OE para 2019 é sobre se é "eleitoralista" ou não. Trata-se, como sempre, de uma discussão ociosa. O Governo renega que as suas contas de somar e subtrair tenham que ver com as eleições.

A oposição sente-se insultada na sua inocência, porque quando esteve no Governo "nunca" fez qualquer OE "eleitoralista". A discussão está inquinada e é uma comédia de horrores. Sabe-se que qualquer Governo utiliza todos os meios disponíveis para ganhar eleições: e o OE é um míssil terra-ar. Passa-se a mão pelo pêlo da Função Pública (700 mil eleitores) e dos reformados. Até Cavaco Silva, na sua bondosa austeridade financeira, fez o mesmo. Nenhum OE em tempos eleitorais é inocente. Quem acredita nisso ainda crê que o Pai Natal traz presentes e as cegonhas, bebés. O resto é folclore, como a impagável escolha de João Galamba para dirigir a estratégia governamental na Energia. Enquanto os olhares críticos se vão centrar sobre as suas actividades, como um saco de pancada frente a Cassius Clay, folgam as outras costas.

O fundamental é outra coisa: a vitória eleitoral do PS e, sobretudo, de António Costa. Em muitos países existe um quilómetro zero. A mais famosa dessas localizações é o Milliarium Aureum, em Roma. Considerava-se que todos os caminhos começavam ali e todas as distâncias do Império Romano mediam-se em relação a esse ponto. Por isso se diziam: "Todos os caminhos conduzem a Roma." No Governo, e no PS, todos os caminhos conduzem a António Costa. Ele é o centro do círculo. Costa tem a última palavra, mesmo fazendo "outsourcing" das batalhas corpo a corpo. Ele define a estratégia contra os que desafiam a ilusão de esperança que o fez triunfar nos últimos três anos. Costa acredita que, contra a "tristeza" do discurso do PSD (e do CDS), o que é importante é a flexibilidade táctica. Segue um conceito vencedor: a competência no futuro não será entre grandes e pequenos, mas entre rápidos e lentos. Na política portuguesa também é. E começa no quilómetro zero.»

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17.10.18

Isso é que era!


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Pobreza em Portugal? É (também) isto



(Expresso, 17.10.2018)
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Solidariedade com a democracia e com os democratas do Brasil

Como noticiado em vários jornais, mais de setenta pessoas subscreveram um manifesto em solidariedade com a democracia e democratas no Brasil. Fui uma dessas pessoas.

Texto e assinaturas:

«Dentro de dias realiza-se no Brasil a segunda volta das eleições presidenciais, em que se apresenta um candidato, Jair Bolsonaro, que promove o elogio da tortura e da ditadura, que propõe a discriminação das mulheres e o desprezo pelos pobres, representando uma cultura de ódio.
Contra ele, quem assina este apelo manifesta a sua solidariedade com a democracia e com os direitos sociais do povo brasileiro. Temos consciência de que vivemos tempos de ameaças sinistras e riscos de regressões civilizacionais. É por isso mesmo que valorizamos o campo da liberdade e da igualdade e apelamos à derrota de Bolsonaro.»

Subscrevem o documento:

Na área da cultura:
Afonso Reis Cabral / Andrea Zamorano / Ana Bárbara Pedrosa / Ana Luísa Amaral / Anabela Mota Ribeiro / Alfredo Barroso / António Pedro Vasconcelos / Bárbara Bulhosa / Daniel Oliveira / Eduardo Lourenço / Filomena Oliveira / Francisco Pinto Balsemão / Helder Costa / José António Pinto Ribeiro / José Carlos Vasconcelos / José Luís Peixoto / José Pacheco Pereira / Inês Pedrosa / Lídia Jorge / Luís Cília / Manuel Alberto Valente / Manuel Alegre / Maria do Céu Guerra / Maria de Medeiros / Maria do Rosário Pedreira / Miguel Gonçalves Mendes / Miguel Real / Paulo Sucena / Pepetela / Pilar del Rio / Ricardo Araújo Pereira / Richard Zimmler / Rita Lello / Sérgio Godinho / Tatiana Salem Levy / Teresa Salgueiro / Valter Hugo Mãe

Deputados e eurodeputados e deputadas:
Ana Catarina Mendes / Ana Gomes / António Filipe / Carlos Coelho / Francisco Assis / Isabel Moreira / Isabel Pires / Joana Mortágua / José Manuel Pureza / Marisa Matias / Pedro Bacelar de Vasconcelos / Teresa Leal Coelho

Outras intervenções, movimentos sociais e profissionais:
Andrea Peniche / Carlos Matos Gomes / Cipriano Justo / Domingos Lopes / Joana Lopes / João Cravinho / Maria do Rosário Gama / Martins Guerreiro / Patrícia Martins / Vasco Lourenço

Académicos:
André Freire / António Carlos Santos / Boaventura Sousa Santos / Carlos Bastien / Diogo Freitas do Amaral / Eduardo Paz Ferreira / JM Nobre Correia / Fernando Rosas / Fernando Nunes da Silva / Francisco Louçã / João Teixeira Lopes / Manuel Carvalho da Silva / Manuel Loff / Maria Eduarda Gonçalves / Pedro Hespanha / Ricardo Paes Mamede / Santana Castilho
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A teoria dos gansos



«Mário Centeno não é um cobrador do fraque sorridente. É um moderno Jean-Baptiste Colbert, o ministro das Finanças do gastador Luís XIV. O OE de 2019 é a prova de que leu, com rigor, o ensinamento maior de Colbert: "A arte da tributação consiste em depenar um ganso para conseguir o maior número de penas com a menor quantidade possível de assobios." Os gansos, no caso, são os portugueses. Como já eram antes deste OE e como vão continuar a ser depois dele. No mundo de Centeno não há almoços grátis, nem jantares à borla. O que dá retirará em forma de cativações. A União Europeia quer gansos amestrados e Centeno cumpre, com rigor, essas instruções. Neste país não são só os ministros que são Centeno: todos os portugueses foram convidados a sê-lo. Por isso, este OE parece ser o melhor de dois mundos: uma distribuição de férias gratuitas na República Dominicana e um controlo austero dos gastos como desejam as forretas Bruxelas e Berlim. Para um OE em ano eleitoral é uma espécie de milagre das rosas. Mas era isso mesmo que António Costa desejava para a sua carga da brigada pesada para o ano de todas as eleições. Depois de uma remodelação governamental que transforma o Executivo numa legião romana, a diversão táctica chega com este OE. Sun Tzu não faria melhor.

A teoria dos gansos está publicada neste OE, com requinte literário. Está lá tudo o que tornará os gansos mudos: aumentos para a Função Pública, aumento extra para os pensionistas, descidas das propinas universitárias e os preços "populares" dos passes sociais (estes chegarão bem nas vésperas das legislativas de 2019, para que ninguém se esqueça). Tudo o que o manual do bom OE eleitoral ensina. Há folgas e serão controladas a conta-gotas, com mais uns impostos indirectos e cativações, arte em que Centeno é mestre. Os gansos continuarão a ser depenados, porque Portugal é um país onde os impostos reinam sobre tudo há séculos, mas terão ração reforçada. Depois só se espera que sigam em marcha ordeira para as urnas eleitorais.»

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16.10.18

Dica (818)




«A estratégia que vem sendo usada por perfis falsos no Brasil e no mundo para influenciar a opinião pública nas redes sociais se aproveita de uma característica psicológica conhecida como "comportamento de manada".
O conceito faz referência ao comportamento de animais que se juntam para se proteger ou fugir de um predador. Aplicado aos seres humanos, refere-se à tendência das pessoas de seguirem um grande influenciador ou mesmo um determinado grupo, sem que a decisão passe, necessariamente, por uma reflexão individual.»
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Brasil – Sondagem de ontem, 15.10.2018


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Nick Cave – #EleNão




Ao vivo em São Paulo.
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O populismo fascista só está a começar



«A banalização do termo “populista” atrapalha mais do que ajuda à clareza de análise. É uma bagunça: Jimmy Carter diz-se populista, Salvini também. Em todo o caso, populista passou a ser uma designação adversarial, identificando alguns estilos mais do que a política (Mussolini, Ghandi, Perón, Samora, Sanders ou Trump fariam todos parte desta categoria). Assim, é uma mistificação, aliás intencional, apresentando o centro e a direita como o único lugar do respeito, o do liberalismo. Nessa narrativa, o que fica de fora da fronteira institucional é populista. Por mais deficiente que seja esta fábula (os populistas europeus nasceram na solene direita clássica de ontem; Orbán era o protegido de Kohl; a Liga de Salvini esteve no Governo com Berlusconi; Merkel e Macron pagam a Erdogan para prender imigrantes), ela é uma arma de confusão maciça.

Acrescento que entendo que o populismo mesmo é uma máquina social ao serviço da direita. E, em concreto, que o único populismo realmente triunfante foi o fascismo. Teve base de massas, uma ideia de liderança, um inimigo social, uma linguagem e uma forma de política. Já a conhecemos e é agora o risco brasileiro.


Bolsonaro, um fascista ainda sem fascismo

Bolsonaro pode ganhar a segunda volta das eleições presidenciais se ampliar um pouco que seja a base do ódio – e os partidos e arautos do centro vão favorecê-lo, depois do colapso histórico que os marginalizou.

Mas Bolsonaro tem dois problemas maiores se triunfar. Primeiro, é um fascista numa sociedade que só se fascistiza desde há pouco. Ainda pode lá chegar, o turbilhão do ódio cavalga depressa. Pessoas ameaçadas na rua por milicianos, deputados eleitos por terem destruído uma homenagem a Marielle, assassinada há poucos meses, violência religiosa como norma política, tudo isso é fascismo a espreitar. Mas falta muito, falta o poder absoluto, a censura da imprensa, a proibição dos partidos, a marreta antioperária, a repressão das universidades, o endeusamento do chefe. Bolsonaro quer tudo isso, mas só o pode conseguir com a força dos militares. E se pensa que os generais aceitam o poder de um capitão de quermesse, que em trinta anos de paisano como deputado só assinou duas leis, está enganado. Querem dele o mandato constitucional, mas se o poder precisar dos militares os militares mandarão. Golpe dentro do golpe ou simples jogo de poder, serão os militares e não os rufias a comandar o regime bolsonarista se ele ganhar.

Um governo deste jaez tem ainda outra implicação. Precisa de precipitar uma comoção. Um governo populista-fascista precisa de inimigos e de cheiro a pólvora. Um ataque à Venezuela passaria a ser possível numa estratégia da coligação militar-bolsonarista. Seria o alvo óbvio, com a vantagem de criar um laço com Washington. Num regime em desagregação, como o brasileiro, um fascista só se impõe com golpes de teatro e de canhão.


O populismo pode ser vencido?

Só que a segunda volta está em disputa e, se Haddad fosse capaz do mais difícil, mobilizar os milhões de pobres que não foram votar, ainda poderia virar a mesa. Do outro lado tem uma tremenda força social: a burguesia brasileira é patrimonialista, oligárquica e escravocrata, não hesitando entre a democracia e qualquer forma de autoritarismo, se entender que assim protege a desigualdade tão extremada e por isso perigosamente evidente. Para os donos do Brasil, pobre na universidade é sacrilégio, empregada doméstica com salário mínimo é afronta, respeito pelas pessoas é atrevimento. O alinhamento desta ‘elite’ é uma lei da natureza, e os que ainda se espantam com a vitória eleitoral de Hitler na pátria de Beethoven e Bach não perceberam a realidade da vida: em tempos de crise os que mandam recorrem sempre à força bruta para impor o silêncio.

Há ainda mais no mundo populista. Os tempos brasileiros, e não é só por lá, têm promovido uma classe de conselheiros Acácios, videirinhos que singram nos favores, e que aprenderam que o poder se alcança com o medo. A forma ideal da sua campanha é o fervor, a intriga, a corrupção do debate eleitoral, é a política suja nas redes sociais. Como eles estão a inventar à nossa frente, a política mudou com Modi, Duterte, Trump e Salvini, agora continua a mudar com Bolsonaro.

Nessa tecnologia, a democracia vai perder sempre. As redes da modernidade eram os sindicatos, o partido e a conversa, ou a mediação da comunicação social, agora as redes alimentam-se de pavor e são fluxos irremediáveis, portadores de novas formas de poluição. Não se volta atrás, mais vale que a esquerda se prepare, mas não será hoje. Só há por isso uma alternativa para contrariar o fascismo bolsonarista: trazer a alegria para a rua. Só se pode ganhar-lhe com a alegria e a cor do povo, é aí que mora a confiança que falta. Como é preciso abrir uma página nova, mais vale então romper com o passado e buscar essa confiança. Ainda pode chegar esse cheirinho de alecrim que tanta falta faz ao Brasil.»

Francisco Louçã
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15.10.18

Haddad: “Me estranha que quem lutou pela democracia fique neutro diante de alguém que apoia a ditadura”




(Daqui)
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Dica (817)




«"Um dia havemos de saber o que cada um sabia sobre esta história de Tancos", disse, um dia antes da demissão de Azeredo, e tão sibilino como o seu ex-ministro, o PM no debate quinzenal. Talvez venhamos a saber, talvez não. Mas já sabemos isto: da desonra o Exército não se livra. E da suspeita de que, como todos antes de si, não sabe como pôr as Forças Armadas e as forças ocultas que nela medram na ordem, o governo não se safa.»
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Em dia de balanços quanto a ministros



Chovem comentários sobre quem sai e quem entra e eu também tenho direito ao meu.

Foi durante o mandato de Luís Castro Mendes na pasta da Cultura que se desfez o nó górdio quanto ao futuro da Fortaleza de Peniche. Integrada numa lista de monumentos históricos a concessionar a privados, dela foi rapidamente retirada e consagrada para preservação da memória histórica (por aprovação na AR, em Abril de 2017). .

O processo avançou, foi aberto concurso para a concretização do Museu Nacional da Resistência e da Liberdade, atribuídas verbas e prometida a sua abertura ao público em 27.04.2019, por altura do 45º aniversário da Revolução, mesmo que a obra ainda esteja em progresso. .

Peniche é para mim um lugar muito especial. Por razões familiares, que não interessam aqui, mas também porque há cerca de uma década, quando eu pertencia à direcção do movimento NAM! (Não Apaguem a Memória!), foi dura a luta para que não avançasse o compromisso de governos com o grupo Pestana, para o espaço ser ocupado com mais uma pousada e não da forma que agora está em concretização. Não posso dizer que perdemos ou ganhámos uma batalha, tudo de saldou então, por motivos vários, com um adiamento «sine die». Felizmente. .

E não tenho a mínima dúvida de que o agora ex-Ministro da Cultura teve um papel decisivo no desfecho das decisões de 2017.
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O défice zero como fetiche



«Muito se tem discutido nestes dias sobre o facto de a proposta de Orçamento de Estado (OE) para 2019 ficar aquém do objectivo do défice zero. Há quem defenda que o governo podia e devia ir mais longe do que défice de 0,2% do PIB, fazendo do último OE da legislatura o primeiro desde a instauração de democracia em que as despesas públicas não seriam superiores às receitas. Na cabeça de muita gente qualquer exercício orçamental que implique saldos negativos é sinal de despesismo e só o défice zero é uma política responsável. Esta noção parece muito intuitiva - mas é errada.

Ao contrário do que o senso comum sugere, os Estados podem registar défices orçamentais todos os anos sem com isso porem em causa a sustentabilidade das contas públicas. Para o perceber é preciso abandonarmos a tendência para vermos o Estado como se fosse uma pessoa comum.

Em princípio, um indivíduo que tenha de pagar uma dívida num determinado prazo só conseguirá fazê-lo se gastar menos do que os rendimentos que obtém em cada período. De outra forma a dívida mantém-se ou agrava-se.

Mas um Estado e um indivíduo não são a mesma coisa. Há duas diferenças fundamentais que os distinguem e que são relevantes neste contexto.

Primeiro, ao contrário dos indivíduos, os Estados não têm um tempo de vida limitado à partida. Precisamente porque não vivem para sempre, exige-se aos indivíduos que paguem tudo o que devem antes de morrerem. Os Estados, porque não morrem, apenas precisam de ir pagando as dívidas que contraíram no passado, mesmo que para o efeito tenham de contrair nova dívida.

Em segundo lugar, não é expectável que os rendimentos de um indivíduo aumentem eternamente (na verdade, é habitual reduzirem-se quando as pessoas se reformam). Por contraste, os rendimentos do Estado tendem a aumentar continuamente graças ao crescimento da actividade económica e dos preços (que se verifica em quase todos os anos), pelo que ao longo do tempo se torna mais simples aos Estados pagarem as dívidas que contraíram no passado.

Estes argumentos ajudam a perceber por que que motivo a generalidade dos Estados registou défices orçamentais anuais ao longo da história, sem que tal tenha implicado necessariamente um crescimento explosivo das dívidas públicas em percentagem do PIB. Assim se explica também que a União Europeia tenha estabelecido como regra que os défices orçamentais dos Estados Membros podem atingir até 3% do PIB em certos anos e que o saldo possa manter-se ligeiramente negativo ao longo do ciclo económico (0,5% do PIB no médio prazo).

Por outras palavras, ao contrário do que sugere o senso comum, os Estados podem gastar mais do que recebem em cada ano, sem que isso seja um problema para as economias.

Para que as contas públicas se mantenham sustentáveis é obviamente necessário respeitar certos limites, os quais dependem fundamentalmente das seguintes variáveis: a diferença entre as receitas e as despesas (excluindo juros), o nível da taxa de juro da dívida pública, o nível de rendimento do país e a taxa de crescimento anual da actividade económica e dos preços.

Na situação actual é perfeitamente possível que o Estado português incorra em défices orçamentais ao mesmo tempo que reduz a dívida pública todos os anos. Por exemplo, usando as projecções do FMI para o período 2018-2020 (as menos optimistas entre as principais instituições internacionais), o Estado português vai manter défices que variam entre 0,7% e 0,2% no triénio e ainda assim a dívida pública cairá dos cerca de 126% do PIB registados em 2017 para cerca de 115% em 2020.

Tendo por referência as várias projecções existentes para as variáveis relevantes, seria na verdade possível manter um défice orçamental de 0,5% (acima dos 0,2% previstos, mas um mínimo histórico em qualquer caso) e ainda assim reduzir a dívida pública em percentagem do PIB nos próximos anos, de acordo com as metas europeias para a redução do rácio da dívida.

Défices próximos de zero, no momento presente, significam que os pagamentos que o Estado tem em atraso face aos seus fornecedores (entre eles muitas PME) não serão saldados, que o investimento público ficará aquém do desejável e que a normalização das relações entre o Estado e quem para ele trabalha ficará novamente adiada. É no mínimo discutível que estas sejam as melhores opções de gestão orçamental.

Aqueles que defendem que as despesas públicas em 2019 deveriam estar alinhadas com as receitas vão ao encontro do senso comum, mas isso não significa que sejam guiados pelo bom senso. A preocupação com a sustentabilidade das finanças públicas é muito sensata e bem-vinda. Já a obsessão com o défice zero (ou próximo disso) é, na maioria dos casos, pouco mais de que um fetiche.»

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14.10.18

E a idiotice não paga impostos




A lógica é esta: tenham cuidado com o BE e com o PCP para «que a direita não se deixe "contaminar" pelas ideias de extrema-direita que estão a progredir na Europa e no mundo.»
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Novo Ministro da Defesa?



E não sou eu?
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Querida EMEL



E às 3:51 da madrugada de hoje, a EMEL acordou-me com um longo sms que começava como se vê na imagem. (Às 12:00 de hoje, ainda havia quem estivesse a recebê-lo.)

Além disso: desde quando é que a EMEL foi nomeada porta-voz da Protecção Civil?

P.S. - Entretanto, a Protecção Civil já esclareceu que nada pediu à EMEL.
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Há um perigo no Brasil e não fechamos os olhos



«A primeira volta das eleições presidenciais brasileiras confirmou o avanço da estratégia do choque e pavor: quase metade dos eleitores deu o seu voto a Jair Bolsonaro, que tem feito carreira pedindo o assassinato de dezenas de milhares de pessoas, sugerindo a esterilização das mulheres pobres e desprezando os valores essenciais da liberdade e democracia. A desagregação do sistema político brasileiro, em particular desde a impugnação da presidente Dilma Rousseff, a quem, aliás, não foi imputado qualquer crime mas apenas irregularidades de gestão orçamental, está a ser acentuada por esta vertigem de ódio personificada por Bolsonaro. Numa sociedade tão marcada pela desigualdade social e por divisões profundas, a política do ódio ganhou espaço e conseguiu apoios vastos, entre associações empresariais, dirigentes dos partidos tradicionais, e várias igrejas, envolvendo mesmo intervenções partidarizadas de juízes. Assim, um fascista pode ganhar as eleições numa das maiores democracias do mundo, ameaçando as regras básicas da vida social. Quando a sinistra memória de Pinochet ou de Videla ainda está tão presente, este clamor por uma ditadura militar não pode ser ignorado.

Há mais de 200 anos, Goya pintou um drama a que deu o título de “O sono da razão produz os monstros”. Foi sempre assim, mas por vezes leu-se nesta constatação a rendição perante a inevitabilidade. Pela nossa parte, não aceitamos soluções irracionais nem o silêncio cobarde perante as tragédias anunciadas. É por isso que, considerando os nossos pontos de vista distintos, nos juntamos hoje para um apelo fundamental contra a ameaça monstruosa no Brasil, que afecta todos os povos, em particular na América Latina, mas também noutros continentes.

De facto, a peste antidemocrática está a espalhar-se. Assistimos com preocupação à separação de crianças dos seus pais e a depoimentos judiciais de meninos e meninas de dois e três anos em casos de expulsão de imigrantes nos Estados Unidos. Notamos a normalização da violação dos direitos humanos no tratamento em vários países europeus de refugiados de guerras e de imigrantes que fogem da fome. Indigna-nos a conivência de um grande partido europeu com a campanha de desmantelamento da independência do sistema judiciário e da liberdade de imprensa na Hungria. Lemos com indignação o reconhecimento pelo presidente das Filipinas da sua actuação em assassinatos extrajudiciais. Que o Brasil possa vir a ser um novo campo para a discriminação das diferenças, o desprezo pelas mulheres ou a vertigem da violência é também motivo para preocupação, e sobretudo para uma escolha que ninguém deve ignorar: pela nossa parte, tomamos posição contra a indignidade.

Notamos ainda que muitos responsáveis políticos que apelaram à rejeição da extrema-direita quando a segunda volta das eleições presidenciais francesas opunha Jean-Marie Le Pen e Chirac ou, depois, Marine Le Pen e Macron, se calam agora perante uma opção tão clara, se não ainda mais gritante. Pelo nosso lado, não nos deixamos condicionar por calculismos mesquinhos. A democracia e a liberdade são indivisíveis. Os democratas e a democracia brasileira contam com a nossa integral solidariedade e empenho.» 

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