8.6.11

Para não dizerem que não falo do Bloco

@Paulete Matos

Não foram poucas as insistências para que opinasse sobre a derrota do passado Domingo, mas o motivo pelo qual não o fiz ainda é tão simples que até dói: só hoje me apeteceu.

Já li dezenas de textos sobre o assunto e percebo perfeitamente que, sobretudo os mais afectados – dirigentes e militantes -, sintam necessidade e urgência de interpretar, de lançar apelos ou, muito simplesmente, de desabafar. Mas assusta-me um pouco o espectáculo, mais ou menos generalizado, de ver enumerar e atribuir até pesos específicos a cada uma das hipotéticas causas do fracasso, como se decisivo fosse, para o futuro que interessa, medir agora se foi mais gravoso apresentar uma moção de censura ou menos castigador ter apoiado Alegre. (Para já não falar de alguns apressadíssimos, e nada inocentes, pedidos de rolamento de cabeças.)

É sem dúvida fundamental que tenham lugar muitas discussões internas, mas, no meu modestíssimo entendimento de eleitora de bancada, seria desejável que acontecessem sem pressa nem tentação de encontrar soluções milagrosas, «chave-na-mão», pura e simplesmente porque elas não existem.

No Domingo á tarde, enquanto esperava pelo início da maratona eleitoral, li um texto que Boaventura Sousa Santos publicou, no último número da Visão (*), e tive-o sempre presente à medida que os resultados iam caindo e se verificava a débacle quantitativa do Bloco e a não reeleição de alguns dos seus melhores deputados.

Espero sinceramente que o partido em que voto há muito tempo saiba gerir esta sua crise, mas estou convencida de que terá tanto mais sucesso quanto melhor conseguir vê-la com um olhar «limpo» e a partir de fora. O país em que nasceu, há doze anos, já não é o mesmo, os europeus estão a deixar de ser os cidadãos bem-comportados que se espera que sejam, os partidos e os seus representantes nos Parlamentos continuam fundamentais e indispensáveis, mas têm de interiorizar que «o papel das instituições é regular as expectativas dos cidadãos de modo a evitar que o abismo entre esse desejo [de uma sociedade democrática] e a sua realização não seja tão grande que a frustração atinja níveis perturbadores. E devem também interiorizar que, cada vez mais, «é legítimo e democrático actuar à margem delas, pacificamente, nas ruas e nas praças», porque «estamos a entrar num período pós-institucional».

No nosso actual espectro partidário, acredito profundamente que é o Bloco que tem, no seu ADN, mais características que lhe permitirão não ficar à margem desta nova e difícil realidade e que este é o momento para uma viragem decisiva neste sentido. Se a fizer, está salvo – o resto virá por acréscimo e será talvez mais fácil do que agora possa parecer.

Não é suficiente estar no Facebook e ter apoiado a Manifestação do 12 de Março, é necessário mergulhar mais no cerne do que está em causa, o que pode parecer simples mas está longe de o ser. E, no entanto, talvez seja esta a hora para recordar que «os momentos mais criativos da democracia raramente ocorreram nas salas dos parlamentos. Ocorreram nas ruas, onde os cidadãos revoltados forçaram as mudanças de regime ou a ampliação das agendas políticas».

(*) A pensar nas eleições. (As citações que faço são deste texto.)
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3 comments:

Dédé disse...

AS MÁS COMPANHIAS...Cá para mim ainda têm é sorte, em conseguir aguentar 288 mil votos.

David da Bernarda disse...

E a abstenção?

Não deixa de ser curioso que o tema da abstenção não seja analisado por todos os que se debruçam sobre as eleições. Tanto mais que a abstenção não baixa mesmo com os apelos patéticos de Cavaco Silva e restantes dirigentes partidários. Nem quando todos dramatizaram o destino do país, ou mesmo quando a direita desejava a maioria absoluta e a esquerda sonhava não perder...

Os argumentos ridículos dos críticos da abstenção, mas ditos a sério, vão dos eleitores mortos (ignorando que os cadernos eleitorais já foram submetidos a limpezas periódicas...) até ao argumento da praia, estava sol...Em último caso os abstencionistas, que não estão ainda mortos são «irresponsáveis», «alienados», «apáticos» e não sei quantas coisas mais. Ou como disse o PR Cavaco, «depois não podem criticar». Um dia, no entanto, teremos a solução: voto obrigatório e chicote!

Há conhecidos estudos de especialistas, como Pedro Magalhães e André Freire, sobre o tema que podem ser lidos. Mas a questão política permanece: porque é que quase metade (mas abstenção real poderia ser um terço que não deixava de ser relevante) dos eleitores decide não votar, contra tudo e contra todos (Presidentes da República, Partidos, Padres, Comunicação social etc.). Tanto mais que todos os estudos apontam que a abstenção é em bem superior entre os mais jovens...
Ou recordando, porque é que em 1975a abstenção foi de cerca de 8% e agora é de 40% ?

Joana Lopes disse...

1975 foi um caso excepcional: primeiras eleições em liberdade, ainda em festa, em pleno PREC.

A abstenção é gravíssima e não é exclusiva de Portugal: veja-se os EUA... Mas estou de acordo que merece um estudo por parte de quem de direito.