27.4.23

Saber muito para aprender

 


«O gosto de dividir tudo em dois é bom de mais para deixar aos simplificadores. Dizia Robert Benchley no ano em que nasceu a Amália: “Existem neste mundo duas classes de pessoas: aquelas que estão constantemente a dividir as pessoas em duas classes, e aquelas que não fazem isso”.

Há dois tempos nesta vida: o tempo em que aprendemos com os mais velhos e o tempo em que aprendemos com os mais novos.

Claro que, quando somos crianças, também aprendemos muito com as outras crianças, mas aquilo que se aprende — aquilo que os adultos não nos querem ensinar, como a arte de fazer fisgas — não tende a sobreviver para além da meninice.

Há um nítido período de transição — aí aos 14 anos — em que deixamos de aprender exclusivamente com os mais velhos e começamos a aprender com as pessoas mais ou menos da nossa idade. Ora, isto é muito mais agradável.

Lembro-me do horrível que é aprender com os mais velhos: só porque sabem tudo, têm a mania que sabem tudo.

Ensinam com aquele cansaço de sabichão, fartos de repetir sempre as mesmas cantilenas, e sabendo de antemão que poucos vão reter — e tresler — aquilo que disseram.

A progressão natural é simples: dos mais velhos aos da mesma idade, e dos da mesma idade aos mais novos.

Ainda é mais desagradável aprender com os mais novos, porque também têm a mania que sabem tudo — só que nós, sendo mais velhos e tendo mais experiência, temos a certeza absoluta que não sabem.

Muitos velhos recusam-se a aprender com os jovens porque eles sabem necessariamente pouco. Não interessa. O que interessa é que o pouco que sabem é bom e, mais importante ainda, o pouco que sabem é precisamente aquilo que não sabemos.

Nem temos outra maneira de saber. É que para saber o que os jovens sabem é preciso ser jovem (ter o espírito aberto, estar à procura de coisas novas e boas): ou seja, é preciso saber pouco.

Já para aprender com os jovens é preciso ser velho — e saber muito.

É muito triste não aproveitar.»

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