Este texto de José Maria Castro Caldas, publicado pela IAC, fica aqui na íntegra – por motivos que julgo serem absolutamente óbvios...
O Chipre está falido porque a sua banca sobre-dimensionada estoirou, em parte devido ao impacto da reestruturação grega no seu sistema bancário.
Reunidos na sexta-feira, os ministros das finanças da zona euro esperaram pelo encerramento dos mercados para aprovar o plano de resgate ao Chipre (ver nota do Ecofin).
Esse plano contém uma cláusula inesperada e sem precedentes na UE: uma taxa de 6,75% sobre o valor dos depósitos até 100 000 euros (supostamente garantidos pelo Estado em todas as eventualidades, incluindo a falência do banco) e de 9,9% para depósitos acima de 100 000 euros. Em troca os depositantes «confiscados» receberiam ações dos bancos. Os bancos estarão fechados pelo menos no fim-de-semana e na segunda-feira. Nesse período as contas serão purgadas do valor da taxa.
Os depósitos acima de 100 000 incluem muitas contas de cidadãos russos habituados a recorrer Chipre como lavandaria. Diz-se que o parlamento alemão jamais aprovaria um «resgate» à banca cipriota que deixasse incólumes os seus clientes russos.
O que há de extraordinário aqui não é o confisco das contas gordas, russas ou não, nem a relutância alemã em salvar bancos-lavandaria. Extraordinário é o confisco aos pequenos aforradores cipriotas. Neste ponto a responsabilidade parece ser do novo governo conservador cipriota. Este governo teria preferido distribuir o mal pelas aldeias, em vez de o situar acima do limite garantido de 100 000, para preservar o «prestígio» de Chipre como porto de abrigo de piratas financeiros. Mesmo assim será interessante saber até que ponto os credores dos bancos cipriotas, inclusive os credores alemães, irão também sofrer perdas.
É cedo para ter certezas quanto à perigosidade dos demónios que esta decisão da EU libertou. Fico-me por citações de duas notícias de jornal. A primeira do grego Ekathimerini, a segunda do britânico The Economist.
Lê-se no Ekathimerini:
«A notícia do acordo foi recebida com choque em Chipre, já que o recém-eleito Presidente Nikos Anastasiades e os seus conselheiros económicos haviam dito ser contra a ideia de uma taxa sobre os depósitos.
Anastasiades reunirá o governo e encontrar-se-á com lideres políticos rivais no Sábado à tarde e dirigir-se-á à nação no domingo.
O candidato presidencial Giorgos Lillikas apelou a um referendo acerca da aceitação ou rejeição pelos cipriotas da taxa sobre os depósitos. À falta do referendo exigiu a convocação imediata de nova eleição presidencial.
Lillikas disse também que estava em conversações com economistas acerca da criação de um plano para o abandono do euro por parte de Chipre e o regresso à libra cipriota.
O secretário geral do Partido Comunista de Chipre (AKEL), Andros Kyprianou, disse que o seu partido está a considerar aconselhar Anastasiades a convocar um referendo ou retirar Chipre da zona euro.
Desde a manhã de sábado, os cipriotas formaram filas nos bancos para retirar dinheiro e algumas caixas multibanco ficaram sem notas para entregar aos clientes.»
Lê-se em The Economist:
«Os lideres da eurozona falarão do negócio como algo que reflete as circunstâncias únicas que rodeiam Chipre, exatamente como fizeram com a reestruturação da dívida Grega no ano passado. Mas se o leitor for um depositante num país periférico que parece precisar de mais dinheiro da eurozona, qual seria o seu cálculo? Que nunca seria tratado como as pessoas em Chipre, ou que havia sido estabelecido um precedente refletindo a exigência consistente dos países credores de uma repartição do peso do fardo? A probabilidade de grandes e desestabilizadores movimentos de dinheiro (para notas e moedas, senão para outros bancos) foi desencadeada.»
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