Ausente do outro lado do mundo, não estive no lançamento do livro de Miguel Cardina, mas chamo a atenção para a entrevista que deu à Angelus Novus.
A última pergunta e a respectiva resposta:
P. Existe uma “esquerda radical” hoje? Dito de outra forma: o Bloco de Esquerda é o “herdeiro natural” do legado (ou legados) da esquerda radical? E, admitindo que a resposta é positiva, o que significa isso?
R. Várias perguntas com diferentes respostas. Vamos por partes: existe hoje uma esquerda radical que ainda pensa e age de acordo com os cânones da esquerda radical das décadas de 1960 e 1970. Tem pequenas expressões organizativas, mas é sobretudo uma maneira de ver o mundo e a política que também conflui com modos de activismo presentes no Bloco de Esquerda. Mais complicada é a questão de saber se o Bloco de Esquerda é o “herdeiro natural” desse legado. Eu diria que é e não é. Por um lado, o BE tem uma parte da sua origem associada a partidos de extrema-esquerda, de matriz trotskista e maoísta, que decidem operar uma espécie de salto qualitativo que lhes permitisse sair do gueto no qual pareciam estar condenar a ficar. Mais: muitas das suas bandeiras de luta, que em última análise remetem para um entendimento da opressão – e da emancipação – como realidade plural, tiveram a sua génese ou reconfiguração no radicalismo dos anos sessenta e setenta. Por outro lado, é hoje evidente que as melhores e mais qualificadas intervenções do BE são feitas a partir do Parlamento, para onde canalizam boa parte das suas energias. Este aspecto, bem como uma postura mais dialogante para com os restantes partidos de esquerda, são, em certa medida, uma novidade que não se encontra no radicalismo daqueles anos.
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2 comments:
Fui ver a entrevista e não fiquei entusiasmado.
Perguntam-lhe, por exemplo, sobre a francofilia da nossa esquerda radical, e ele responde que sim, mas que há especificidades, como a guerra colonial.
Ora a questão da francofilia é precisamente algo que penso (eu e o JPP) distinguir culturalmente de forma clara a esquerda radical daquele tempo da do PCP. As bases, pelo menos, eram pela primeira vez muito mais de influência cultural anglófila que francófila: era a geração que vinha do POP, dos Beatles, e que tinha na oposição à guerra do Vietnam o grande exemplo.
Quando o MRPP ganhou força por cá, por exemplo, já "La gauche proletarienne" estava a desaparecer, e não me parece que esta tenha servido de modelo àquele, apesar das afinidades de estilo...
Caro Pinto de Sá,
Talvez haja que distinguir aí os então mais jovens dos um pouco mais velhos, quando chegou o 25 de A.
Eu, que me situo entre os segundos, vivi rodeada de francófilos, fossem da dita esquerda radical ou não, apesar da beatlomania e da oposição à guerra do Vietnam.
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