19.11.10

Notícias de uma Cimeira (7)


A propósito da notícia que caiu a meio da tarde de ontem, segundo a qual «trinta e cinco [pessoas], na sua maioria de nacionalidade finlandesa, foram interceptados num autocarro, com destino a Lisboa, na posse de “material com mensagens anti-NATO”», e dos detalhes entretanto conhecidos, como o facto de alguns vestirem roupa preta, dispenso-me de comentar e remeto para o que a Fernanda Câncio escreveu.

A ler na íntegra, mas também «tenho para mim, até porque é público, que as cenas mesmo a sério, daquelas tipo atocha, twin towers e metro de londres, não costumam ser feitas por malta que viaja de autocarro em grupo com tshirts e chega no dia anterior aos acontecimentos».
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7 comments:

Manuel Vilarinho Pires disse...

Boa noite, Joana,
Dir-lhes-ia o mesmo que te disse a ti: "O protesto tem todo o sentido, mas, se não se esgotarem previamente todos os instrumentos que o sistema coloca à disposição dos prejudicados, nomeadamente na justiça, tem o seu quê de conformista e passageiro. Uma sentença acerta no coração e é para sempre.".
Valorizam-se talvez em demasia as diversas formas de protesto, das mais clássicas (como partir montras) às mais modernas (como escrever em redes sociais), ignorando as formais, que o próprio sistema disponibiliza, e que serão talvez mais eficazes, como o recurso aos tribunais.
Porque é que o grupo de cidadãos finladeses não coloca uma acção em tribunal contra o Estado português por ter impedido a sua entrada em Portugal com base em fundamentos provavelmente ilegais, como a roupa preta ou o "material com mensagens" anti-NATO"?
Será que não corriam o risco de, em caso de sucesso, serem muito mais eficazes do que com os cartazes e roupas pretas?

Joana Lopes disse...

Até pode ser que os ditos finlandeses, ou os movimentos a que eventualmente pertençam, façam isso. Correndo o risco óbvio de serem os bisnetos a terem conhecimento da sentença, é claro.

Mas discordo disto: «O protesto tem todo o sentido, mas, se não se esgotarem previamente todos os instrumentos que o sistema coloca à disposição dos prejudicados.» Há direito ao protesto sem recorrer primeiro (ou depois) a tribunais.
Aliás, em Portugal, o protesto mais urgente a fazer é CONTRA os tribunais... Ou pô-los em tribunal?

Manuel Vilarinho Pires disse...

Joana,
A justiça pode ser lenta, ineficaz, frustrante e até, ou sobretudo, injusta.
Mas se não se recorre a ela quando se está dentro da razão, está-se a optar inapelavelmente pela injustiça.
E isso é conformismo. Claro que se tem o direito de ser conformista. Mas é melhor, ou pelo menos dá muito mais gozo, não ser.
Digo eu, se calhar por mau feitio...

Joana Lopes disse...

«Mas se não se recorre a ela quando se está dentro da razão, está-se a optar inapelavelmente pela injustiça.»
Manel, Falta-te um premissa no silogismo para chegares à conclusão. Por exemplo, entre outras possíveis: «Ou se não se denuncia a existência
de uma injustiça».

Manuel Vilarinho Pires disse...

A este ritmo não sei se conseguimos fechar esta discussão em solo europeu...
Deixar cometer a injustiça, não tentando fazer nada para tentar evitá-la, e depois denunciá-la, é optar pela concretização da injustiça, mesmo discordando dela e não calando o desacordo. Isto no plano da metáfora e do silogismo...
No plano prático, a preferência pela denúncia debate-se com outro problema: a eficácia da denúncia. Suponho que deves ter alguma noção que a denúncia sensibiliza essencialmente, ou talvez mesmo exclusivamente, as pessoas que já estão à partida sensibilizadas para aquilo que é denunciado. Acaba por resultar em falar para dentro de um grupo fechado de pessoas já convencidas à partida daquilo que se diz. Ou seja, corre o risco de não ter nenhuma consequência.
O recurso à via judicial tem custos em tempo, em maçada e em dinheiro, e contém o risco de não dar em nada. Mas, se resultar, tem consequências reais, públicas e permanentes.
Pelo que me parece conformismo ficar-se pelo protesto sem, ao menos, tentar esta via.

Se quisermos eternizar esta troca de ideias, o que a mim não me chateia nada, tenho ainda sugestões adicionais: é tentar perceber se a opção sistemática por não recorrer à justiça (quando ela pode ser útil) é ditada à partida pela opção de não recorrer ao sistema, ou se por descrédito na eficácia da justiça e, neste caso, se o descrédito é mesmo fundamentado, ou se é uma interiorização de auto-censura, outra forma de conformismo que reduz as nossas exigências relativamente a ela e só favorece o infractor?

Joana Lopes disse...

Manel,
Não tenho tempo nem disposição para escalpelizar isto tudo, nem aqui nem, muito menos, do outro lado do Atlântico...
Digo-te apenas que tenho experiências muito recentes, da eficácia da denúncia.

Mas... «be my guest» para as causas em que estejamos de acordo e em que queiras recorrer à justiça - apanharei a boleia.

Manuel Vilarinho Pires disse...

... e em que eu, e tu, sendo partes prejudicadas, possamos ter a possibilidade de recorrer em conjunto à justiça para nos vermos ressarcidos dos nossos prejuízos. Contarei contigo!
Mas repara que não estou a condenar genericamente a denúncia, ou o protesto, ou aqueles a que tu tenhas aderido recentemente e possam ter tido resultados satisfatórios. Estou é a dizer que prescindir da possibilidade de recorrer à justiça, se ela puder previsivelmente contribuir para resolver o problema, nem que seja penalizando os infactores, é conformista...

Deixa-me dar-te um exemplo, longe de nós no espaço e no tempo, impossível de accionar por pessoas como nós, mas que se calhar nos é muito mais próximo do que possa parecer.
Lembras-te certamente do miúdo palestiniano e do pai que foram filmados há uns anos, apanhados entre fogos cruzados, tentando abrigar-se dos tiros do exército israelita por trás de uns baldes de lixo, pedindo socorro por telemóvel, e que acabou com o homicídio do miúdo e ferimentos no pai, por soldados israelitas.
Estás indubitavelmente convicta de que, se alguém tivesse apresentado queixa por homicídio num tribunal israelita, o crime não teria sido investigado e, eventualmente, resultado na condenação do homicida? Eu não estou...
Assim, o mundo todo assistiu à denúncia nos telejornais, mas o homicida safou-se, anónimo...