Quando hoje tanto se fala de Cecília Supico Pinto, por ocasião de uma biografia que acaba de ser lançada, é fácil deixar que se banalize o que não foi banal. Talvez valha a pena recordar, para além de tudo o que já foi dito sobre o Movimento Nacional Feminino, o modo verdadeiramente surrealista com que esta senhora actuava.
Deixar os próprios falar é por vezes mais elucidativo do que mil comentários. Eis, por exemplo, como ela descreveu, muito mais tarde, uma ida a Luanda, quando a guerra em Angola durava já há três anos:
«No dia 2 de Maio de 1964 fui para Angola. Havia uma festa das Forças Armadas em Luanda e eu fui daqui com um avião cheio de flores em que havia desde o raminho de rosmaninho às orquídeas mais bonitas. Cheguei, com a Renata Cunha e Costa, e fomos para a festa de homenagem às Forças Armadas.
Ficámos na rua, junto ao povo todo. Havia uma tribuna enorme, com as personalidades mais importantes, o governador-geral, o cardeal de Luanda, os secretários provinciais. De repente, ouvi pelo microfone: "Agora vai falar a presidente do Movimento Nacional Feminino, senhora dona Cecília Supico Pinto." Fiquei aflita: "Ai meu Deus do Céu, vou falar de quê?" Dei a minha carteira à Renata, pus as mãos na saia para não ter problemas com o vento, cheguei ao microfone, olhei para aquela gente toda e disse: "São para Deus as minhas primeiras palavras, a quem agradeço, com toda a alma e coração, ser mulher, ser cristã, ser portuguesa. Trouxe flores de todos nós para todos vós."»
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