17.2.08

Utopias























A propósito do uso do véu na Turquia, da sharia e do arcebispo da Cantuária, das desventuras de Ayaan Hirsi Ali, dos bispos e dos partidos em Espanha, de certas posições do papa e de uns tantos ouros motivos, muito se tem falado, nos últimos dias, de laicidade e laicismo, fanatismo e tolerância, multiculturalismo e integração.

Que o problema religioso, e tudo o que com ele se relaciona, é hoje crucial como poucas vezes o terá sido na história da humanidade, e que é difícil prever o que se segue, parece indiscutível.

Mas, de um modo geral, o que se está a fazer, é defender, alternadamente, determinadas opiniões ou as suas contrárias, por motivos puramente político-tácticos. Posições avulsas que vão mudando conforme os ventos. E, em paralelo, ouvem-se afirmações piedosas quanto às benfeitorias das religiões e das igrejas para a paz no mundo e para o entendimento entre as civilizações, frequentemente proferidas por responsáveis que se dizem ateus empedernidos.

Ora estou convencida de que nada disto resolve o que quer que seja e cada vez se me impõe com maior limpidez a evidência de que o mundo viveria melhor sem religiões, que estas trouxeram – e trarão – à humanidade muito mais guerras e outros danos do que benefícios. O que, aliás, está à vista. Não sei se chego a esperar, mas desejaria certamente, que a humanidade viesse a avançar na História com esta convicção como pano de fundo. Porque acredito que só assim poderia acontecer um verdadeiro progresso na convivência entre os povos a nível global.

Isto está longe de implicar atitudes de guerra aberta, intolerância ou discriminação – muito pelo contrário. Pode-se deixar que uma jovem ande de lenço na cabeça, mas tentar explicar-lhe que, ideologicamente, está errada e que está a alienar-se. A minha empregada é testemunha de Jeová e não me canso de tentar convencê-la de que está a ser enganada. Não se deve impedir que os portugueses rastejem em Fátima, mas deveria ser explicado nas televisões, nos jornais, em toda a parte, a indignidade do que estão a fazer. Uma sociedade civil laica pode/deve fazer isto tudo e a Europa tem particulares responsabilidades neste domínio, tanto para com os que por cá nasceram como para com os imigrantes.

Estou, em pleno, no domínio da utopia? Certamente. Mas é ela que comanda a vida.

7 comments:

Anónimo disse...

Com os ultimos "rebondissements" et os grandes discursos de Sarkosy sobre a religião estou perfeitamente de acordo com a tua "utopia" mas é necessario e urgente que todos venham a ser "utopicos". Não é com leis que vamos convencer ao contrario isolamos mais e assim nascem os "extremismos"
Um abraço
Rosa Maria

Anónimo disse...

Antes de mais, penso que o fenómeno religioso permanece ainda por explicar, ao menos no que respeita as suas origens e raízes mais profundas. Por outro lado parece-me que a sensibiliade e a disponibilidade para a religião continua a fazer ainda parte das estruturas do homem, no seu actual estádio de desenvolvimento. E, por último, duvido que o uso voluntarista da razão, no actual estado de coisas, por si só consiga alguma eficácia no sentido de as alterar substanciamente.

O acto de fé transcende a razão e, pior do que isso: ri-se dela.

Mas, mesmo assim, vale a pena ir fazendo o que se pode.

nelson anjos

Joana Lopes disse...

Rosa e Nelson,
Assinaria por baixo no que dizem.
Por isso disse que era utopia - mas só assim consigo posicionar-me mentalmente.

F. Penim Redondo disse...

Concordo plenamente contigo Joana.

A fé, qualquer que ela seja, ao introduzir entidades ou verdades indiscutíveis, acima e para além das regras da convivência civil, constitui uma ameaça à sociedade humana.

Pode-se perfeitamente respeitar as crenças dos nossos concidadãos sem nunca omitir que as religiões são fontes de equívocos e de violências.

Fingir que se considera o fenómeno religioso uma coisa positiva e desejável é, em muitos casos, ceder ao oportunismo para evitar ser injustamente acusado de intolerância religiosa.

Joana Lopes disse...

Boa, Fernando, há muito tempo que não estávamos de acordo aqui pelas caixas de comentários...

Mas realmente eu ando a «passar-me» com estes (pseudo) respeitadores das liberdades religiosas.

Anónimo disse...

Tentar explicar, tentar explicar, tentar explicar...
Isso é de facto utopia. Mais, é uma inutilidade contraproducente. É como querer convencer os aficionados de que as touradas e os touros de morte são imorais.
Há que dar tempo ao tempo, e há costumes e crenças que podem durar séculos.

Joana Lopes disse...

Certamente que tudo isto dura (e já durou) muitos séculos. Mas deixar passar o tempo, por si só, não basta: tem mesmo servido para o avanço de todos os fundamentalismos.