Emilio Silva Barrera é presidente da Asociación para la Recuperación de la Memoria Histórica e foi um dos seus fundadores. Há cerca de nove anos, encontrou as ossadas do avô, militante da Izquierda Republicana, assassinado pelos falangistas em 1936.
Conheci-o em Coimbra, há poucos dias, por ocasião de um colóquio organizado pelo CES. Expôs então muito do que sabemos pela leitura da imprensa espanhola, mas que toma outra consistência quando relatado por um protagonista activo numa verdadeira epopeia que se passa bem perto de nós: os espanhóis estão a desenterrar os seus antepassados – pais, agora já quase sempre avós -, no meio de controvérsias e dificuldades sem fim. Num verdadeiro drama, não só para os familiares directamente envolvidos como para as actuais populações dos locais afectados.
Neste livro, o autor conta-nos detalhadamente a sua história pessoal: os esforços para localizar o corpo do avô, a descoberta de uma fossa onde este se encontrava com mais doze republicanos – num cruzamento de estradas, debaixo de uma nogueira -, mil e uma peripécias para que fossem desenterrados e identificados. (Para se ter uma ideia da dimensão das dificuldades encontradas na identificação dos cadáveres, registe-se que, só na província de Léon, estavam então abertos cerca de 12.000 processos, individuais ou colectivos.)
São também descritas todas as acções que levaram à criação da Associação a que agora preside, a sua expansão em Espanha, a internacionalização da causa, os apoios que envolveram a própria ONU, os campos de trabalho com dezenas de voluntários que se organizaram para a concretização das tarefas – numa «grande fossa chamada Espanha».
Toda esta problemática deve ser enquadrada no complexo processo da Transição espanhola para a democracia - «transición inconclusa» -, muito bem resumido no último capítulo do livro. Depois de alguns passos tímidos nos primeiros anos, e de um reforço de esperança em 1979 quando os partidos de esquerda tomaram pela primeira vez conta de muitas autarquias, o medo e o espectro da Guerra Civil regressaram a toda a Espanha com o ataque de Antonio Tejero ao Congresso, em Fevereiro de 1981. E foi preciso esperar por 2002 para que o referido Congresso condenasse expressamente o franquismo – por unanimidade, no dia 20 de Novembro, no 27º aniversário da morte do ditador.
Desde então, muito caminho foi percorrido e são conhecidos os episódios mais recentes e as polémicas provocadas pela intervenção do juiz Balthazar Garzón e alguns outros. A Espanha cuida dos seus mortos e procura ouvir as últimas testemunhas vivas – que têm o direito de sairem do esquecimento e de encontrarem o seu lugar na memória colectiva.
Emilio Siva, Las fosas de Franco, Crónica de un desagravio, Temas de hoy, 2005, seg. ed., 208 pág.
(Também em Caminhos da Memória)
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