O dr. Cavaco pediu aos portugueses para passarem férias cá dentro, e não no estrangeiro, para não contribuírem para o aumento da dívida externa do país. De finanças percebe ele, e eu não, mas ainda pedirei a alguém que me explique em que exacta medida contribuí para o referido aumento da dívida, com a minha recente ida ao Butão. Mas adiante.
Se eu tivesse poder para aconselhar o que quer que fosse a quem quer que seja, faria exactamente o oposto: diria a todos os que gostam, e ainda podem (atenção: sei que já não é o caso para uma esmagadora maioria), que viajassem já, para o mais longe possível e que tentassem perceber melhor o mundo e este país visto de fora, porque isso os ajudaria certamente a pensarem de maneira diferente e a vislumbrarem, talvez, como se aprende a abrir saídas em becos.
Mas isto deve soar como chinês aos ouvidos do nosso PR, ele que, na Índia, só comeu arroz e pão porque não gosta de picante, que deu uns trocos à mulher, mas não o cartão de crédito, para ela fazer compras em Istambul e que trepou a uns coqueiros em S. Tomé, certamente para se lembrar da grande epopeia da sua vida, que foi o tempo de tropa em Moçambique. Quem lhe tira a casinha em Montechoro, ou lá onde é, tira-lhe tudo, nesse Algarve onde não ponho os pés rigorosamente há doze anos e onde só penso regressar por algum imperativo absolutamente categórico.
Mas claro que não são preferências ou longitudes que estão em causa, mas sim o princípio da história e a mentalidade que esta revela: assim que ouvi o apelo do nosso primeiro magistrado da nação, imaginei imediatamente o comandante do Titanic, em pleno naufrágio, a pedir aos passageiros que não gritassem para não ficarem roucos.
P.S. - Jornal de Negócios: «Se os portugueses trocassem as viagens ao estrangeiro por turismo cá dentro, ajudariam a reduzir o défice externo em 17,5%. Mas se os estrangeiros os imitassem, e deixassem de vir a Portugal, o mesmo défice subiria 27,2%.»
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11 comments:
Se me dissessem há 18 anos quando eu pedi nacionalidade portuguesa que um dia isto ia dar nisto...
E que nacionalidade tinha antes, já agora?
Também já estou há que tempos à espera da resposta, Blondewithaphd.
Satisfaça lá a minha curiosidade.
Joana, perdoe-me a maldade de reforçar o q diz com uma citação do Papa: "agora vemos que o puro pragmatismo económico, que prescinde da realidade do homem – que é um ser ético - não termina positivamente, mas cria problemas insolúveis."
(daqui: http://www.bentoxviportugal.pt/documentos_ver.asp?noticiaid=875 - absurdamente transcrito em português do Brasil)
Como é que se diz? Felizes os ignorantes porque deles será o reino de qualquer coisa. Bem, suponho que o reino dos ignorantes, certo?? Não há pachorra!Mas estes politicos só sabem dizer palermices?Daahhh
Mesmo assim o presidente, com todo o seu deficit apontado, consegue ser o menos indiferenciado, por entre a horda de políticos novoriquistas que nos desgovernam a começar pelo primeiro ministro: Cavaco pode ser um bimbo mas não tem tiques de novo rico e sabe fazer contas. Arvorar-se em novo rico é a atitude mais desasjustada, muito mais bimba no séc XXI e nefasta para o país. Quando o "vá para fora cá dentro" surgiu em pleno Cavaquismo no início da década de 90, eu dirigi-me para os Açores 3 anos seguidos, ilhas que ainda não conhecia. No ano anterior tinha estado no Tibete e no último verão da década de 80 passei-o no Alaska e no Yukon. Nesses idos anos apercebi-me quão pretensioso é, para lá do prazer e do autoconhecimento, ir procurar verdades para Portugal para muito longe daqui. Já lá vai um tempo e não pretendo mudar de nacionalidade, por causa de uma horda de bimbos passageira que nos desgoverna e ainda culpa por isso.
Mario Braga
Caro Mário Braga,
Não tenho qualquer tipo de simpatia por Cavaco, nem pelo que ele fez por este país como PM.
Eu não pretendi dizer que se vá buscar lá fora receitas para Portugal, mas sim que faz bem às cabeças saírem daqui para uma melhor percepção da realidade.
Concordo em absoluto consigo, Joana, quanto ao efeito depurador para as mentalidades que as viagens proporcionam. Também não acho Cavaco nada inspirador e quando chefiava o governo também tinha por ele um grande ódio de estimação.
Como um certo colunista escreveu a semana passada, era necessário surgir um Churchill na actual fase que vivemos. A tal figura que transmitiu confiança enquanto todos os outros a perdiam e que compreendeu os sinais, fez um retrato real da situação e não tentou iludir. Surgirá mais tarde ou mais cedo.
Por ente as brumas...
Mario Braga
Ó Joana, eu suponho que o pedido de que te expliquem como é que as férias de portugueses no estrangeiro contribuem para o aumento da dívida externa portuguesa é apenas um exercício de ironia, ou estou enganado?
Se não fosse, eu prestar-me-ia com todo o gosto a dar uma explicação simples...
Mas, quer seja, quer não seja, posso dizer que a proposta tem sentido, tanto económico (porque pode incrementar a procura interna, e numa indústria que é de mão-de-obra intensiva) como financeiro (porque pode melhorar a balança de pagamentos).
Relativamenta ao P.S., é fácil perceber que se os portugueses substituirem férias no estrangeiro por férias em Portugal estes efeitos positivos se podem obter, quer os estrangeiros continuem a vir cá, o que seria óptimo para a indústria de turismo portuguesa, quer eles também prefiram passar férias mos seus países, o que seria péssimo para a indústria de turismo portuguesa. Mas menos péssimo se fosse compensado por um incremento das férias de portugueses em Portugal.
Manel,
Claro que era ironia 8quanto à primeira parte do que dizes).
Tudo o que dizes é certíssimo, sem que deixe de considerar mesquinha a recomendação de Cavaco (comparação com o Titanic) e paroquial. Detesto este tipo de mentalidade...
Joana,
Antes de proferires a sentença ao homem, não te esqueças de uma coisa (e perdoa-me a ligeireza de um leigo em filosofia...): a (boa) ciência económica não é normativa (não pretende mostrar como as coisas deviam ser), mas positiva (pretende mostrar como elas são).
O Cavaco não está a ser mesquinho nem paroquial, está a dizer que essa opção pode fazer diferença na nossa economia e nas nossas finanças. Isto não é bom nem mau, é simplesmente factual. E não limita a liberdade de escolha de cada um, apenas acrescenta um factor que cada um pode ou não integrar nos seus critérios de escolha.
Não está a fazer demagogia, e de demagogia sabe ele bem...
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