26.1.11

Que Cavaco agradeça a vitória ao Largo do Rato


Entre culpas e desculpas pelos resultados de Domingo passado, ainda não vi ninguém dizer o que para mim é uma evidência: o maior responsável pelo prolongamento da estadia do dr. Cavaco em Belém é o Partido Socialista. E não porque se atrasou no apoio a Alegre, ou por não se ter empenhado suficientemente durante a campanha eleitoral, ainda menos por ter apoiado a mesma pessoa que o Bloco já tinha escolhido. O PS só se pode queixar de si próprio por ter desprezado a questão presidencial nos últimos dez anos: nos primeiros cinco por não ter pensado na substituição de Sampaio durante o seu último mandato, nos segundos por não se preocupar com o que viria a ser esta mais do que facilitada vitória de Cavaco.

Em 2006, inventou uma solução coxa e requentada com Soares – e foi o que se viu… -, este ano acabou por apoiar alguém que manifestamente não queria e está agora a tentar colar os cacos de uma rotunda derrota. É sabido que estratégias a longo prazo não fazem parte da religião praticada no Largo do Rato, mas não parece desculpável que um partido com o peso do PS cometa duas vezes o mesmo erro.

Teria sido certamente possível identificar um português com mais de 35 anos (e menos de 70, se possível…), dentro ou fora do partido, que desde há dois ou três anos fosse «aparecendo» como o candidato incontornável. É o que se faz em todo o mundo e, mesmo que não se vendam presidentes como sabonetes, propõem-se e impõem-se. No caso concreto, até podia ser alguém com um posicionamento ideológico semelhante ao de Manuel Alegre (mas sem um passado partidário tão complicado), e nem teria sido extraordinariamente difícil, julgo, chegar a um consenso que fizesse com que Alegre não insistisse uma segunda vez. E certamente que ninguém tinha inventado Fernando Nobre…

Teria esse hipotético candidato vencido Cavaco, apesar do desgaste actual do PS? Nunca se saberá (é o encanto da História Virtual ou a tal hipótese de a minha avó poder ter sido uma trotinete se tivesse tido rodas…), mas a fraquíssima figura que tinha pela frente, a relativa pouca consideração de que esta goza mesmo à direita e os resultados de Domingo passado fazem crer que, pelo menos, passaria certamente à segunda volta onde muito provavelmente venceria.

Last but not the least: no panorama existente, Manuel Alegre fez mal em avançar, o Bloco devia ter ficado na sombra, etc., etc., etc.? Não, de modo algum. «Valeu a pena lutar», como muito bem diz Rui Tavares no Público de hoje. Apesar do PS. Não foi desta, mas um dia a esquerda convergirá e não há nenhuma razão que a impeça de sair vencedora.

P.S. – Só para que não se pense que isto é justificação a posteriori de derrota mal digerida. Escrevi há um ano (29/1/2010): «Como se o PS não fosse o único culpado da situação que criou: desde 2006, teve mais do que tempo para preparar o caminho a um outro candidato, se não queria ver-se «obrigado» a apoiar hoje Manuel Alegre. Talvez não o tenha feito porque, até há meia dúzia de meses, se sentisse confortável com Cavaco. Mas agora que a situação parece ter mudado e que Alegre se adiantou – e bem, do seu ponto de vista – decidam-se: ou partem para uma campanha pela positiva, sem "mas" nem "apesares de", ou fazem uma triste figura, provocam provavelmente uma monumental abstenção e dão talvez uma preciosa ajuda ao que dizem querer evitar: que o doutor Cavaco fique mais cinco anos em Belém.»
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4 comments:

Jorge Conceição disse...

Se a tese do "post" de José Albergaria no blogue "Mainsteet" (e parcialmente transcrito no "Água Lisa"), com o título «O Senador Dixit», assentar numa correcta observação do perfil de Sócrates, então a estratégia traçada resultou plenamente e o grande vencedor das duas últimas eleições presidenciais foi mesmo o actual Primeiro Ministro...

Joana Lopes disse...

Eu li isso, Jorge, e até concordo talvez até certo ponto. Penso mesmo, como escrevi no P.S. que transcrevo, que, até certa altura, o PS viveu muito bem com Cavaco em Belém. Agora não sei.

Além disso, pensei num PS como um todo que sobreviverá a Sócrates que, talvez mais cedo do que se pensa, irá à vida.

Anónimo disse...

Eu creio que ele irá agradecer a todos no dia 9 de Março quando tomar posse.

Já revi o discurso de domingo e realmente ele foi um pouco ríspido para com alguns dos derrotados, mas isso só aconteceu porque o Cavaco não é um político mas sim um analista que nunca lidou bem com os truques, com a linguagem e estilo circense de quase todos os políticos da nossa praça.

Rogério G.V. Pereira disse...

"Além disso, pensei num PS como um todo que sobreviverá a Sócrates que, talvez mais cedo do que se pensa, irá à vida..."

Quem? Sócrates ou este PS?