Baptista Bastos, hoje, no DN.
«As peripécias da revolução portuguesa sempre tiveram características incomuns. A via original para o socialismo foi um estribilho mais do que um conceito. Até hoje ninguém conseguiu descobrir qual a natureza dessa originalidade. Era uma época em que se bebia em excesso e quase tudo era permitido ou aceito com benigna complacência. Zeca Afonso comentava, irónico, que o álcool era, afinal, a via original para o nosso socialismo. O PREC constituiu mais do que um acrónimo: foi um modo de se tentar ludibriar a História e uma maneira, um pouco louca, um pouco ingénua de se viver a vida. Até então, as coisas eram direitinhas, brunidas, organizadas em esquadrias. Falava-se baixinho, escrevia-se baixinho, amava-se baixinho.
Julgávamos ter estilhaçado o que fora medonha punição, e que éramos os donos do nosso destino. Foi quando uma marcha de José Mário Branco nos reenviou para a realidade: "Qual é a tua, ó meu / andares a dizer quem manda aqui sou eu?!" Todas as festas acabam em melancolia. A nossa fechou em carácter fúnebre. E nunca parou de assim ser, com breves intervalos cómicos. Abstenho-me de os mencionar, por evidentes. Os protagonistas foram promovidos.
De tropeção em tropeção, chegámos a isto. (…)
Tanto o PS quanto o PSD ou a tal coligação, antevista mas já vista, têm liquidado a nossa força e tripudiado sobre a nossa soberania. Não estão interessados nessas minudências. E nós vamo-los aceitando, com a benevolência indolente, que parece ser a marca de um mau fado e de uma inevitabilidade.»
...
3 comments:
Pena que BB ao dizer umas verdades bem ditas, resuma as culpas a uma coisa abstrata: dois partidos políticos sem nome.
Por isso continuamos na mesma há tantos anos.
A culpa tambem é de quem escreve em Portugal, e de quem lê.
Sem nome?
O facto de terem nome não deixam de ser uma coisa abstrata.
É o que pretendo dizer.
E tudo que é abstrato, não se pode apertar o pescoço.
E os escritores e leitores precisam de apertar o pescoço a algo de concreto.
Enviar um comentário