@Paulete Matos
Da crónica de José Manuel Pureza, no DN de hoje:
«Ao longo de séculos, foi graças à sua germinação, defesa e refrescamento nas ruas e nas praças que a democracia assumiu depois os seus rostos institucionais. O parlamentar, por exemplo. Uma história da democracia que não faça jus a essa centralidade da rua na construção continuada da democracia é o primeiro passo para a sua desvitalização. Mais até: os discursos que cultivam uma suposta inimizade entre a rua e a democracia representativa são, de facto, pouco amigos da democracia. Venham de onde vierem.
Em Portugal, são essencialmente dois esses discursos que ensaiam uma contraposição entre a democracia representativa e a rua. O primeiro é o que glorifica a rua para anatematizar os representantes. É o terreno cultivado pelos populismos vários, que adormece a cidadania e a sua mobilização transformadora num desdém indiferenciado pelos "políticos", todos amalgamados na mesma narrativa de desqualificação pessoal e programática que, em última análise, tem a própria democracia representativa como alvo. (…)
O segundo discurso é o que glorifica a rua árabe, como antes glorificou a rua polaca ou moscovita, ao mesmo tempo que lança anátemas sobre a rua lisboeta, madrilena ou nova-iorquina, argumentando que enquanto aquelas lutaram corajosamente pela democracia estas não são mais que manifestações inconsequentes de subculturas juvenis. Em última análise, para quem perfilha este discurso, a rua que, em democracia, clama por mais democracia é antidemocrática. É, pois, um discurso de alta intensidade ideológica que assume com soberba a democracia como modelo cristalizado, de uma vez por todas, que, juntamente com mercado e Ocidente constituirão faces inseparáveis do mesmo universo de referências.»
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1 comments:
Infelizmente, o texto não produziu suficiente ponto.
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