Esta varanda existiu no aeroporto de Lisboa, durante muitos anos, e esta fotografia veio ilustrar algumas das memórias mais nítidas que guardo de algumas actividades de resistência, em tempos de Salazar e de Caetano. Ao vê-la, não identifico com precisão os antigos locais de chegadas e de partidas, mas recordo imediatamente um esquema de vigilância que utilizei muitas vezes.
É sabido que, quem chegava, via frequentemente as malas vasculhadas, não só nem tanto pela alfândega normal, em busca de perfumes ou de jóias, mas mais pelos agentes da PIDE, que procuravam livros proibidos e, sobretudo, cartas ou outros documentos politicamente suspeitos. Como estes não podiam ser enviados por correio normal porque não passavam nas malhas dos censores instalados nos CTT da época, eram levados e trazidos por quem viajava. E porque eu o fazia frequentemente por razões profissionais, fui «pombo-correio» activíssimo sobretudo nos últimos anos da ditadura, de e para o estrangeiro.
O mais seguro era transportar a informação em microfilmes (esses grandes percursores das nossas pens…), facilmente alojáveis em frascos de medicamentos e tão pouco usados que a PIDE não os procurava. Mais difícil era a papelada…
O meu esquema mais seguro, mas do qual não podia abusar exageradamente e a que só recorria em casos mais perigosos, era pedir a um amigo, alto funcionário da TAP com livre-trânsito permanente, que me fosse esperar à saída do avião. No percurso de autocarro para a aerogare, no meio de uma galhofa improvisada, passava-lhe os papeis para os bolsos do casaco.
Para o resto, era arriscar. E é aí que entra a varanda. Era importante, não só por minha causa mas pela segurança dos destinatários da minha «mercadoria», que se soubesse rapidamente se eu tinha chegado a bom porto, ou seja, se não tinha sido presa por me terem apreendido algo. (E seria mesmo presa porque não trazia propriamente histórias de encantar, nem planos para festas infantis…) Pedia portanto quase sempre a alguém que me fosse esperar e visse… da varanda, se eu tinha passado.
Ninguém pedia nem dava explicações, nem era necessário. Era grande a rede de cumplicidades.
Ninguém pedia nem dava explicações, nem era necessário. Era grande a rede de cumplicidades.
Passei sempre. Tive sorte.
(A imagem vem daqui, claro.)
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1 comments:
Como curiosidade não-política, refiro que coube a mim fechar este vão, como engenheiro projectista da ANA. Já não era preciso para vigilâncias...
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