Entrevista
a Rosário Gama, publicada hoje na p.8 do primeiro caderno do Expresso.
Tudo começou
em outubro, quando um pequeno grupo de reformados, indignado com o Governo,
decidiu criar uma associação. Anunciaram na net uma primeira reunião, em
Coimbra, e marcaram sala para 150 pessoas. Apareceram 500. Hoje, a APRe! tem
núcleos em todo o país e conta com mais de três mil associados. A direção é
eleita este mês. Rosário Gama, ex-diretora da escola pública com melhores
resultados nos rankings, é o rosto da
associação.
Chamaram APRe! ao
vosso movimento. Os reformados estão mesmo irritados? A designação
tem precisamente esse sentido. Queremos mostrar indignação perante o ataque do
Governo a este grupo social. Achámos que essa expressão, que ainda por cima
coincide com a sigla das palavras Aposentados, Pensionistas e Reformados, era
ideal para transmitir o que sentimos. Apre! Basta!
Que ataque é esse? Fomos o
grupo escolhido para o massacre fiscal. Vamos ser altamente penalizados, não só
com os novos escalões de IRS, que afetam as pensões a partir de 500 e poucos
euros, mas também com a sobretaxa de 3,5% e com a contribuição extraordinária
de solidariedade, que é exclusiva para os aposentados. É uma violência.
Os reformados não
devem participar no esforço pedido a todos os portugueses? Devem. Mas
não podem ser saqueados.
O Governo afirma que
há muitos reformados que não descontaram para a reforma que estão a receber. É verdade.
Mas são os políticos. Muitos fizeram carreiras pequeníssimas na Assembleia da
República e nas autarquias e de facto não descontaram o suficiente para o que
recebem. Mas a esmagadora maioria dos reformados teve carreiras longas. E 90%
das reformas são inferiores a 500 euros. Por isso, o primeiro-ministro não
conhece a realidade ou está a deitar poeira para os olhos dos portugueses.
Os reformados não se
sentiam bem representados? Achámos que
não havia nenhuma associação que o fizesse devidamente. Os sindicatos voltam-se
sobretudo para a defesa dos direitos das pessoas no ativo. Há 2,7 milhões de
reformados. Precisam de uma voz ativa. O movimento integra gente de todas as
tendências e de todas as profissões. Surgimos há pouco tempo e já temos mais de
três mil associados. Em média, inscrevem-se 20 pessoas por dia.
Diz que cortar nas
pensões afeta todas as gerações. Como? Quando se
fala em reformados, as pessoas imaginam gente de 80 e tal anos. Mas há muitos a
partir dos 58, 59 anos. Ainda são bastante novos, têm casas para pagar e vários
compromissos que assumiram em função do que sempre lhes foi dito que iam
receber quando se reformassem. Somos uma geração ensanduichada. Por um lado
temos os filhos, já com as suas famílias constituídas e a precisarem da nossa
ajuda e, por outro, ainda temos pais a cargo, a quem damos apoio. O corte das
reformas vem travar muito o apoio dado aos filhos e aos netos.
Não podem fazer
greve. Como pretendem fazer-se ouvir? Somos uma
associação de pressão. Fomos recebidos por todos os grupos parlamentares à
exceção do PSD, que não quis. Entregámos uma petição com 13500 (*) assinaturas que em breve será discutida no
plenário. E vamos agir junto dos tribunais. Queremos ser ouvidos enquanto
parceiros sociais.
Acha que movimentos
cívicos como este vão ganhar força? Não tenho
dúvida. E penso que a Constituição devia permitir que pudessem concorrer à
Assembleia da República. Estou muito preocupada com o desânimo dos portugueses
relativamente aos políticos. A culpa é deles, porque não param de surgir novos
chicos-espertos nos governos e nos partidos. O Estado trata as pessoas como
utentes, não como cidadãos.
(*) E não
3500, como noticia o Expresso.
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