Do texto de apoio à manifestação de amanhã.
«Em 1971, para encerrar o meu primeiro disco, Os Sobreviventes, escrevi uma canção com uma das letras mais curtas:
"Aprende a nadar, companheiro, que a maré se vai levantar, que a liberdade está a passar por aqui. Maré alta maré alta maré alta". Às vezes o menos é mais.
Estávamos então em pleno marcelismo, e digo-o com letra pequena porque era uma versão já semi-inerte do fascismo. E no entanto, havia ainda uma polícia política, agora com três letrinhas apenas, DGS, que se dedicava às mesmas nobres actividades da PIDE sua mãe. Vigiar, prender, torturar, nada de novo. Havia uma guerra colonial que se arrastava pelos campos minados de África, campos imensos sem fim à vista nem esperança de solução. E muitos mortos e feridos e enlouquecidos. Havia censura de peneira fina, e havia a emigração dos pobres, uma peneira de furos largos a deixar fugir o melhor de nós. (...)
Passados todos estes anos, sabemos como o país está em maré intencionalmente esvaziada e sangrada, e assim estará nos tempos mais próximos, aconteça o que acontecer.
Mas não interiorizemos o medo escuro nem o conformismo pardo. O presente tem «o acesso bloqueado»? Cabe a nós encontrarmos novas chaves, novos atalhos, novas formas activas de o usufruir. Queremos as nossas vidas, sim, por difícil que seja habitá-las neste presente sombrio.
O solo que pisamos é livre, e desde há muito terreno libertado. Defendamo-lo.
A liberdade está a passar por aqui.»
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