Há 39 anos, por esta hora, eu estava no Campo Santana, em Lisboa, numa manifestação à porta do Patriarcado que tinha ali a sua sede, de apoio aos trabalhadores da Rádio Renascença. Não era a primeira vez que o fazia: antes do 25 de Abril, participara em vários protestos contra o cardeal Cerejeira, por atitudes que ele tomava, ou omitia, nas relações entre a Igreja portuguesa e o governo em tempos de ditadura. Tipicamente, acabávamos sempre refugiados no átrio ou, pelo menos, protegidos pelo gradeamento que, no passeio, rodeava a porta principal – reacção instantânea quando se aproximavam os tradicionais Volkswagen creme nívea da PSP.
Mas, em 18 de Junho de 1975, os ventos eram já bem diferentes e foram outros que se refugiaram dentro da sede patriarcal. Passo a explicar, mas muito resumidamente, porque foi longo e complexo o chamado «caso da Rádio Renascença».
Quando a Revolução aconteceu, a Rádio Renascença (RR) era uma das três grandes estações de radiodifusão, a par da Emissora Nacional e do Rádio Clube Português, com um ambiente relativamente livre dentro dos limites existentes e não foi por acaso que sobre ela incidiu a escolha para a transmissão de Grândola como senha para os militares avançarem. Mas, curiosamente, foi lá que teve lugar a primeira greve em serviços de informação, logo no dia 30 de Abril, por uma profunda divergência entre jornalistas e directores a propósito da cobertura da chegada a Portugal de Mário Soares e de Cunhal. A estação esteve parada cerca de 19 horas, os trabalhadores ocuparam o espaço e o conselho de gerência acabou por abandonar o local. Este foi apenas o primeiro capítulo de uma atribulada história que duraria até Dezembro de 1975, data em que a gestão da estação foi definitivamente devolvida à Igreja.
Pelo meio, o tal episódio de 18 de Junho de 1975. Durante mais uma crise interna, sindicatos
representativos de vários sectores – jornalistas, revisores de imprensa, tipógrafos e telecomunicações – convocaram uma manifestação a ter lugar junto do Patriarcado. E teria sido apenas mais um evento, entre muitos semelhantes que aconteciam quotidianamente, não se tivesse dado o caso de ter havido uma convocatória para uma contramanifestação, feita por muitos padres, a pedido do conselho de gerência da RR (texto na imagem, aqui ao lado).
representativos de vários sectores – jornalistas, revisores de imprensa, tipógrafos e telecomunicações – convocaram uma manifestação a ter lugar junto do Patriarcado. E teria sido apenas mais um evento, entre muitos semelhantes que aconteciam quotidianamente, não se tivesse dado o caso de ter havido uma convocatória para uma contramanifestação, feita por muitos padres, a pedido do conselho de gerência da RR (texto na imagem, aqui ao lado).
Estava lançado o rastilho para um confronto que teve tiros para o ar dados pela PSP e pela Polícia Militar, muitas pedradas e cerca de 40 feridos, com os manifestantes pró-Patriarcado refugiados no interior do edifício e evacuados já de madrugada em camiões militares.
Antes, durante e depois, foram divergentes os apoios recebidos por cada um dos lados. A UDP foi a primeira organização política a apelar para a participação na manifestação de apoio aos trabalhadores, acompanhada, entre outros, pelo MES, LCI, LUAR, PRP/BR, CMLP, ORPCML, Associação de ex-Presos Políticos Antifascistas, várias comissões de trabalhadores (com realce para a dos TLP), e organizações católicas como a JOC e Cristãos pelo Socialismo. Contra a manifestação, embora com diferentes nuances, declararam-se o PS, o PPD, o CDS, o PDC e o PCP.
Estranho? Olhem que não, olhem que não!
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