27.7.14

Como estamos, os portugueses



«– Insatisfeitos, pessimistas e sem esperança. 96% acham que a situação económica do país é má. Repito, 96%, um número daqueles que se costumam chamar “albaneses”. Só que neste caso é bem português. Ou seja, quase todos os portugueses descrêem do “milagre” económico que, com cada menos convicção, Passos Coelho, Portas e Pires de Lima propagam por todo o lado. Não lêem a imprensa económica, não lêem os blogues governamentais, não lêem os comentadores do Observador, não acreditam no PSD e no CDS, mesmo quando deles fazem parte. Nenhum país da Europa tem estes resultados, nem a Grécia. (...)

– Muito preocupados com o futuro. São gente sábia e razoável e realista e pensam na sua maioria que o “pior está para vir”. Os europeus, pelo contrário, acham que o pior já passou. Os franceses, os cipriotas, os eslovenos, os italianos e os gregos também acham que o pior está para vir, mas acham menos do que os portugueses. Nenhum povo da Europa tem tanto medo do futuro como os portugueses. (...)

– Não acreditam em nada, nem em ninguém. Nem nos políticos, nem na política. Quase que já não acreditam na democracia. Não têm qualquer confiança no actual Governo. 85%, repito, 85%, não têm confiança no Governo. Outro número “albanês”, mas bem português, acima de todos os outros na Europa. (...)

– Cansados de um imenso cansaço, cansados de um desesperante cansaço. Vão para férias, mas não vão ter férias. Podem mergulhar no mar, mas quando se encostam à toalha para secar, a sua cabeça não descansa. (Como é que vou pagar o carro em Setembro? Como é que vou pagar a prestação da casa? Já não posso mais receber aqueles avisos da Autoridade Tributária a explicar por um número infindo de artigos que o meu salário vai ser penhorado. Como é que vou sobreviver com a conta bancária confiscada para pagar o IRS? Como é que vou dizer à minha mulher que saio todos os dias de manhã como se fosse para o emprego, mas há um mês que fui despedido? Será que no meu serviço serei passado para a mobilidade especial? Vou ter de mudar de casa, por que não posso pagar a nova renda que o senhorio me pediu. A nossa filha entrou na universidade, mas onde é que vou arranjar o dinheiro para as propinas? Como é que vou de novo abrir o café, quando devo dinheiro a todos os fornecedores? E como vou continuar a ter o meu empregado de sempre na oficina quando ninguém paga nada? Apetece-me fugir. Fugir.)»

José Pacheco Pereira, no Público de ontem. 
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