19.10.14

Dois anos sem Manuel António Pina



Manuel António Pina morreu em 19 de Outubro de 2012 e a memória do que representou, com tudo o que lhe devemos, mantém-se intacta e enorme. Os seus livros cá ficaram, mas nunca mais lemos as suas preciosas crónicas diárias. Na situação em que nos encontramos, e numa altura em que o leque de comentadores na nossa imprensa de referência se fecha e deixa cada vez mais a desejar (na minha modesta opinião, claro), MAP faz-nos muita, muita falta.

Em jeito de homenagem, releia-se uma grande entrevista de Nuno Ramos de Almeida, publicada exactamente oito meses antes do fim de MAP: «A vontade que tenho era pôr um cinturão de bombas e rebentar com essa malta toda».

E, também, o que julgo ter sido a última crónica que publicou no JN:

Coisas sólidas e verdadeiras (01.08.2012)

O leitor que, à semelhança do de O'Neill, me pede a crónica que já traz engatilhada perdoar-me-á que, por uma vez, me deite no divã: estou farto de política! Eu sei que tudo é política, que, como diz Szymborska, "mesmo caminhando contra o vento/ dás passos políticos/ sobre solo político". Mas estou farto de Passos Coelho, de Seguro, de Portas, de todos eles, da 'troika', do défice, da crise, de editoriais, de analistas!

Por isso, decidi hoje falar de algo realmente importante: nasceram três melros na trepadeira do muro do meu quintal. Já suspeitávamos que alguma coisa estivesse para acontecer pois os gatos ficavam horas na marquise olhando lá para fora, atentos à inusitada actividade junto do muro e fugindo em correria para o interior da casa sempre que o melro macho, sentindo as crias ameaçadas, descia sobre eles em voo picado.

Agora os nossos novos vizinhos já voam. Fico a vê-los ir e vir, procurando laboriosamente comida, os olhos negros e brilhantes pesquisando o vasto mundo do quintal ou, se calha de sentirem que os observamos, fitando-nos com curiosidade, a cabeça ligeiramente de lado, como se se perguntassem: "E estes, quem serão?" Em breve nos abandonarão e procurarão outro território para a sua jovem e vibrante existência. E eu tenho uma certeza: não, nem tudo é política; a política é só uma ínfima parte, a menos sólida e menos veemente, daquilo a que chamamos impropriamente vida. 

Finalmente, reserve-se algum tempo deste Domingo para ver, ou rever, este excelente filme de Ricardo Espírito Santo:


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