Excertos do artigo de opinião de Miguel Sousa Tavares, no Expresso de 21.02.2015:
«Wolfgang Schäuble é uma personagem condenada à história. Da sua cadeira de rodas, ele não vê de perto os milhares, milhões, de mutilados que a receita da troika causou em países como Portugal e a Grécia. Ele não está no aeroporto de Atenas ou no de Lisboa a ver partir para o exílio toda uma geração de jovens a quem o seu país não tem futuro para dar (mas cujos engenheiros, formados com o dinheiro dos contribuintes portugueses, a chancelerina Merkel, de visita a Portugal, declarou aceitar, "generosamente", receber na Alemanha). E quando o ministro alemão, numa operação mútua de marketing, se reúne com a nossa sorridente ministra das Finanças e proclama que o exemplo português é a prova de que a receita da troika funciona, omite dizer que ela nos custou 6,5% do PIB, 400.000 novos desempregados e 300.000 emigrantes, que nos fez vender em saldos e para estrangeiros todas as empresas estratégicas em que tanto havíamos investido ao longo de décadas e que, no final de todo esse brilhante ‘ajustamento’, a dívida pública passou de 90% para 130% do PIB. E também não conta aos contribuintes alemães que o grosso do empréstimo à Grécia serviu para salvar o investimento da banca alemã na venda de submarinos e outros luxos aos gregos, e quanto é que a Alemanha facturou já nos juros dos empréstimos a Portugal ou à Grécia. (...) A atitude actual da Alemanha em relação à Grécia — e que, para vergonha de todos, é a política da UE, socialistas incluídos — não é ditada por qualquer pensamento racional, mas apenas por um desejo mesquinho de punição e humilhação. Que não é digna da Alemanha e que prenuncia o fim da ideia de Europa, mais tarde ou mais cedo. (...)
A Grécia não votou apenas pelo fim da austeridade que os arruinou de vez, votou também, e mesmo que ingenuamente, pelo resgate de alguma noção mínima de dignidade nacional e por uma consequência mínima da vontade dos povos, expressa em eleições democráticas — que são a matriz da construção europeia. E, indirectamente, votou também para que a Europa saísse do colete de forças intelectual imposto pelos mercados e pela ditadura dos economistas académicos e começasse a discutir política.»
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