«Quando esta prosa for publicada, o debate entre António Costa e Pedro Passos Coelho acabou. Como destes debates se espera que sejam combates de boxe, haverá um vencedor e um vencido. Já terei comentado a actuação. Mudará o combate o meu voto? Claro que não. Porque se trata disso, actuação, uma sabatina em que o mais treinado ou o mais expedito em palavras, o mais media trained, pode dar cabo do outro. O que isso me diz sobre o mérito da governação é nada. Quando mais mediatizamos a democracia mais ela se esvazia de gente competente que não tem talento mediático. O tempo dos grandes comícios acabou com o tempo das grandes revoluções. Os discursos e as atitudes são uma cuidadosa encenação de actores com um argumento escrito por profissionais. Nada é espontâneo ou natural. As vozes são afinadas pelo timbre da tecnologia. As frases são moduladas para o sound bite e o hashtag. A gravata é escolhida pelos assessores. A entrada em cena é filmada como se dois gladiadores entrassem no Coliseu rodeados do séquito de funcionários e conselheiros. Até os jornalistas são espectáculo. O espectáculo é anunciado semanas antes para que a multidão tenha o seu circo. E os media a sua audiência. Por trás ficaram a personalidade e a verdade. Toda a gente tem uma verdade, mesmo quando somos obrigados a viver num mundo de artifício. A verdade é o contrário das aparências. Por isso escrevo isto antes do debate.»
Clara Ferreira Alves, Expresso, 12.09.2015
.
0 comments:
Enviar um comentário