«Numa das versões cinematográficas de "Batman" somos confrontados com uma metáfora destes dias de múltiplas crises com que chocamos frontalmente. No meio do caos, os cidadãos do bem, que pagam impostos, fogem.
E fazem-no num barco rumo ao que é habitual nestes casos: o desconhecido. Por mera casualidade, ou não, essa travessia cruza-se com outra: a dos presos de Gotham, que não pagam impostos, e que também fogem para nenhures. O Joker, manobrador do destino de todos, colocou em cada barco suficientes explosivos para os destruir. Mas os que vão em cada um dos barcos podem salvar-se: cada um dos grupos tem um dispositivo que permite accionar as bombas colocadas no outro barco e assim salvar-se. O dilema é mortal. Tal como aquele em que se encontra agora a Europa, terra de emigrantes que vê agora chegarem às suas costas centenas de milhares de refugiados que só querem fugir da sua terra em chamas e que também querem refúgio num lugar de sonho que viram na televisão e na internet.
A Europa da crise é o paraíso para quem vive no meio de uma desgraça maior. A resposta dos governos europeus é, como sempre, confusa e contraditória. Todos sabem que é impossível acolher centenas de milhares de refugiados e todos têm medo das consequências políticas e eleitorais das suas decisões. Alguns, mais atentos, lembrarão que esta tragédia sem fim é o resultado do falhanço das políticas dos Estados Unidos e da Europa no Médio Oriente e que sem se resolver a implosão do Estado na Líbia e a guerra na Síria esta vaga não terá fim.
Sem uma nova política, sensata e séria, para a região, será impossível começar a fazer sarar esta ferida que alastrou até aos confins da África. A Europa não pode continuar a ter uma política de respostas tontas e tardias depois de tantos erros que vai cometendo. E depois chorar com lágrimas de crocodilo porque se depara com fotos nas capas dos jornais. O dilema que Joker colocou aos que viviam em Gotham está defronte de todos nós.»
Fernando Sobral
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