«Um dos mais célebres governadores de Nova Iorque, Mário Cuomo, era conhecido pelos seus discursos atraentes e vigorosos. Foi ele que, um dia, disse a quem o queria ouvir: "Faz-se campanha com a poesia, mas governa-se com a prosa."
Há quem não esteja de acordo com esta sensata tese. Por exemplo, Arménio Carlos, o líder da sempre irrequieta CGTP, já mostrou que prefere sempre a prosa à poesia. Mesmo que o Governo seja mais dialogante. Às vezes duvida-se mesmo se não prefere executivos que possa combater com ferro e fogo do que aqueles que tentem, em momento de prosa cerrada, trazer alguma poesia para a vida política, económica e social. O Governo de António Costa sabe, também, que alguma da poesia que partilhou durante a campanha eleitoral e que sustenta um acordo à esquerda no Parlamento terá de chocar com a prosa dos números frios das Finanças. O PSD de Passos Coelho, nesse aspecto, é como a CGTP: prefere sempre a prosa, seja no Governo ou na oposição. Não há ali a mais ténue tentação poética, talvez porque isso não faça parte da cultura da elite partidária que agora ali ocupa o poder.
A Moody's, que costuma ser defensora de uma prosa seca e ríspida, cedeu por momentos à poesia e consegue dar um aval ao OE de António Costa e Mário Centeno, permitindo alguma acalmia nas turbulências internacionais. O elogio, sendo uma surpresa poética, calou os arautos do papão dos "mercados", que estavam à espera de prosa digna de um taco de basebol. Mas este país continua a não ter tempo para a necessária poesia: o Novo Banco, filho pródigo dessa "resolução" que destruiu o BES e criou um vácuo, arrasou com uma prosa fina como uma lâmina: mil empregos serão eliminados sem apelo nem agravo. Não admira que Ricardo Salgado pergunte: e eu é que era Nero? Portugal navega entre estas duas margens, procurando um porto de abrigo onde possa suspirar um pouco e oxigenar os pulmões. Para que, um dia destes, possa ler um pouco da melhor poesia portuguesa. E bem precisa disso.»
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