«Há muito tempo, antes desta nova era do terrorismo, Joseph Conrad assistiu a outra. Vivia-se na grande idade da globalização, antes da Primeira Guerra Mundial.
Em "O Agente Secreto", Conrad via o presente e previa o futuro: em Londres um homem andava com uma bomba colada ao corpo e tinha um alvo, o Observatório de Greenwich, o meridiano global. Não havia lugar mais simbólico para um ataque. O homem, conhecido como "O Professor", explicava que a simplicidade era a grande vantagem que possuía sobre os seus oponentes. O que vimos agora em Bruxelas, como antes noutros locais, é a sofisticação de um caso real: o atentado terrorista feito por Émile Henry em 1894 contra o Café Terminus em França. São ataques simples carregados de simbolismo: contra alvos indiscriminados e perto do coração da União Europeia.
O terrorismo do Estado Islâmico sabe o que quer: alvos simbólicos e publicidade total. Em Bruxelas garantem isso. E mostram, mais uma vez, a debilidade da Europa, que se vai arrastando desde erros estratégicos na forma como viu a questão da Primavera Árabe e a queda dos ditadores nas fronteiras do Mediterrâneo, na forma como continua a não fazer investimentos estruturantes na Argélia, em Marrocos ou na Tunísia, na hipocrisia com que encara a guerra civil síria ou o colapso do poder na Líbia, na vergonhosa falta de política sobre os refugiados ou na sua própria fraqueza em termos de segurança. Isto para já não falar da forma irresponsável como deixou criar, nas cidades de Bruxelas e Paris (sobretudo), territórios livres onde se formam e recrutam terroristas que não têm amor à vida ou a valores de diálogo ou compreensão.
O fim lógico do radicalismo é o terrorismo. O que aconteceu era previsível. A Europa deixou chocar o ovo da serpente do terrorismo global, onde nada nem ninguém está a salvo. Não pode argumentar espanto. A forma negligente como tem actuado nas margens do Mediterrâneo colocou a Europa à beira de um abismo. Conrad avisou há um século. Mas os líderes europeus não conhecem a História.»
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