«Ninguém tinha dúvidas de que Jon Snow regressaria do mundo dos mortos. "A Guerra dos Tronos" dissolvia-se num mundo de lutas sem sentido se Snow não estivesse lá para se recordar do passado. Durão Barroso não é Jon Snow.
Não regressa dos desaparecidos em combate. E, claro, não é tão importante como Snow para a história das civilizações que lutam pelo poder. Foi um efémero primeiro-ministro. Presume-se que dirigiu a Europa. Há quem acredite que sonhou poder vir a ser Presidente da República. Seja como for, ao longo de três décadas na política, poderia ter sido um acumulador de energia e conhecimento. Nada disso, lamentavelmente, transpira da sua entrevista ao Expresso. Dela sobra fel para Jorge Sampaio e desamor para com George W. Bush.
O que se esperaria de Durão Barroso (falar do seu legado, abrir janelas para os portugueses perceberem melhor a sinistra política europeia face a Portugal e aos países da periferia) redunda numa mão-cheia de nada e noutra de coisa nenhuma. Num tempo em que as dúvidas são cada vez maiores sobre o futuro da Europa e as razões da nossa permanência num euro que é uma camisa-de-forças, Durão não tem muito mais para dizer do que sugerir que saiu da política, mas que não deixou por isso de ser um político. É pouco. É pobre. Sobretudo de quem tentou ser um competente general de Bruxelas nas províncias colonizadas. Conhecedor dos meandros das grandes decisões políticas e económicas, especialmente de quando Portugal foi colocado na trincheira da frente para dar o corpo às balas quando a batalha das dívidas soberanas poderia trucidar Espanha e Itália, Durão é económico com as palavras. Poucos portugueses estiveram tão no centro do poder real de Bruxelas para que nos prive de meios para delinearmos melhor uma estratégia para o futuro. A menos que Durão prefira hoje o cosmopolitismo de Bruxelas (ou de Washington) à periferia de Lisboa. Pode ser o caso e é um direito que lhe assiste. Mas, após a entrevista, fica-se com a noção de que Durão nunca poderia ser Jon Snow.»
Fernando Sobral
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