«Algures no céu, Bud Spencer pode olhar para baixo e chegar à conclusão que entre os "western spaghetti" de Trinitá e a política moderna há mais semelhanças do que contrastes.
Trinitá, pistoleiro conhecido como "a mão direita do Diabo", viajava pelo deserto numa padiola arrastada pelo cavalo. Bambino, "a mão esquerda do Diabo", usava-a para sovar os que roubavam o pão aos pobres ou abusavam da virtude das senhoras e das crianças. Eram justos e a justiça era feita pelas próprias mãos. E todos nos divertíamos com isso. Hoje a política assemelha-se a um filme de humor sem piada. A sensatez dissolveu-se, a justiça eclipsou-se, a ética evaporou-se.
A novela sobre as "sanções" aos párias destes dias na União Europeia (Portugal e Espanha) é tão interminável (e intragável) como algumas que passam nas televisões nacionais. A CE passa a bola para o Ecofin e este irá decidir algo que depois a CE, a seu tempo, transformará em penalidade. Só que se Portugal, no tempo de Passos Coelho, era um aluno modelo que tudo aceitava como uma bênção, agora António Costa é mais duro de roer. Tem alguns amigos na Europa que não o desejam ver cair.
Não é por acaso que o presidente dos socialistas no Parlamento Europeu, Gianni Pittella, escreveu a Juncker pedindo "compreensão" com Portugal (esquecendo-se na carta de mencionar Espanha do conservador Rajoy). Exemplo de outras linhas de clivagem na UE que vão fervendo em lume brando. Se a acção da UE face aos países ibéricos mostra a clivagem que, com a saída do Reino Unido, crescerá entre Norte e Sul, em Portugal os momentos "western spaghetti" não param. Na CGD, 2.500 trabalhadores são destilados enquanto a administração da Caixa engorda e a chamada comissão de inquérito vai fornecer um momento "Casa dos Segredos" ao país. Nada dali sairá: PS, PSD e CDS são irmãos de sangue na forma como tornaram a CGD num condomínio privado de interesses partidários. Todos têm telhados de cristal. Tal como a UE. Nenhum resistiria a uma chapada de Bud Spencer.»
Fernando Sobral
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