31.7.17

Elogio da inutilidade



«Conta-se que, um dia, José Estaline, o pai dos povos como era então conhecido, ao saber que o seu filho Yakov tinha falhado a sua tentativa de suicídio, disse: "É tão inútil que nem sequer sabe matar-se."

A frase definia o autor. Mas, com esse delírio pouco paternal, ficamos a saber algo mais sobre a inutilidade. No meio desta montanha-russa de desgraças em que se transformou o nosso Verão, fica-se com uma ideia mais clara sobre a inutilidade de muitas das estruturas que compõem o nosso Estado. Veja-se só o que disse há dias o secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) sobre o roubo de armas em Tancos. Segundo Júlio Pereira, soube do furto pelo Serviço de Informações de Segurança (o SIS) que, por sua vez, tomou conhecimento do caso através da comunicação social. Ou seja, na manhã de 29 de Junho, os analistas do SIS viram a televisão e leram os jornais e, espantados, decidiram enviar, calcula-se num relatório sigiloso só para as altas esferas da comunidade de serviços de inteligência indígena, a notícia das armas que tinham desaparecido em Tancos. Alguém do SIS terá então informado o chefe do SIRP, por certo através de um telefone encriptado, do sucedido.

Poderia ser pior. O SIS poderia ter descoberto que tinha ocorrido um golpe de Estado em Portugal através dos jornais da manhã. Pelos vistos, a culpa foi do exército que não informou o SIS para este poder informar o SIRP e para que este pudesse dar conhecimento ao ministro da Defesa de que tinham sido surripiadas armas de Tancos. Se o SIS é um serviço de informações, temos razões para ficar descansados: a inutilidade é gloriosa. Podia ser mais humilhante. Em vez de saber o que se passava pela imprensa, o SIS poderia saber o que se tinha passado através das redes sociais. Ou de um telefonema de um amigo. É por isso, face a esta displicência e inutilidade, que se pode confiar plenamente em alguns serviços que orgulhosamente fazem parte do nosso sistema de segurança. Se alargarmos esta inutilidade a outros serviços, percebemos melhor o estado real do país.»

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