10.5.18

Histórias do fim



«O coro das carpideiras, o direito à indignação dos enganados e os suspiros de tenor dos que se consideram apenas envergonhados, não devem distrair da tarefa principal que é a identificação dos dispositivos e dos factores que geram e encobrem a compra e venda de decisões políticas. É uma tarefa necessária, para que não tenha de se ficar à espera até chegar ao ponto em que será a incompetência dos protagonistas, a sua imprudência ou o seu desplante, o que vai revelar como se serviram do poder que lhes foi atribuído, iluminando então o corpo dos interesses que estava encoberto pelas sombras das ideologias. A compra e venda de decisões políticas não é de direita ou de esquerda, é a política no mercado.

Mas é uma tarefa obrigatória na política portuguesa, porque o que se encontra hoje é o que já se conhecia de outros períodos no passado, em processos que se repetem até chegarem à configuração do fim-de-regime. Foi assim com o liberalismo de 1820 e da Constituição de 1822, da perda do Brasil e da venda dos bens da Igreja, que depois, esgotadas as receitas das vendas, evoluiu até ao fontismo das obras públicas financiadas com dívida, que conduziu à bancarrota de 1891, à subordinação aos credores externos e ao fim do regime da monarquia. Foi assim com a República de 1910, que termina logo a seguir à prisão de Alves dos Reis, em Dezembro de 1925, explorando a propriedade do partido do regime, o partido de Afonso Costa, aquele que tinha de estar sempre no poder. Foi assim com a República do Estado Novo, que caiu nos abismos da descolonização e da nacionalização dos centros empresariais, para ficar dependente do destino que lhe for permitido pela União Europeia e pelo Banco Central Europeu. Volta a ser assim com a democracia pluralista estruturada pela Constituição de 1976 e organizada por um sistema partidário que reproduz o padrão dos partidos-de-regime, aqueles que abrem os escritórios de compra e venda de decisões políticas.

Só não viu quem quis continuar iludido. O caminho provável do PS é o caminho do regime, o fim de um será o fim do outro. Para renascerem logo a seguir, como se fossem novos. Não se esquece nada e não se aprende nada.»

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