20.6.18

O Orçamento Fred Astaire



«O OE para 2019 vai inspirar-se em Fred Astaire. Vai ser um número de sapateado único. Pena não estarmos em Hollywood, para que isso se torne um filme para audiências globais. E seja só uma comédia triste apenas visível nos estúdios de São Bento. E, fora, numas greves que se vão suceder para que se pense que algo vai mudar com isso. Este vai ser o Orçamento Fred Astaire ou, como se dizia no tempo dos meus pais, "Fred às tiras". Vai ser um OE de todas as conciliações, seguindo os ensinamentos do dançarino: "No meu trabalho visto-me para o papel. Em casa, visto-me para mim próprio." Aqui todos se vão aperaltar para a imagem que querem dar antes das eleições: o PS, de sentido de Estado, o PCP e o BE de militantes dos seus grupos eleitorais, o PSD e o CDS de críticos por necessidade. O OE em Portugal é o bolo dos noivos e de todos os que se fazem convidados para as suas fatias. Sempre foi. Ele é a fonte de todas as felicidades. Especialmente quando a sempre esmagadora carga fiscal que acorrenta os portugueses tem espaço para ter mãos largas. Neste tempo, entre a austeridade para a maioria e o dinheiro para quem se move bem, o OE é de conciliação possível.

Não era o que deveria ser. O OE deveria ser como Fred Astaire, ou as personagens que interpretou: devia representar o português ideal, ambicioso, tenaz, que dava aos cidadãos uma razão para acreditar que não deviam estar contentes com a sua situação e que deveriam lutar para que tudo mudasse. O problema é que cada OE que surge traz-nos a sensação de que vamos num comboio que deixou de ter via férrea por baixo e que continuamos a balançar-nos para termos a sensação de que continuamos a mover-nos. As eleições vão ser no próximo ano. E todos os partidos vão ter de arranjar, neste OE, um crédito, positivo ou negativo, para convencerem os eleitores e sacudirem a sua apatia. Vai ser negociado às tiras. Para cada sabor. Fred Astaire haveria de fazer um sapateado em sua honra.»

Fernando Sobral
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