«Há dias li na Time um artigo sobre niksen, que, diz a revista norte-americana, é uma nova tendência holandesa que advoga que fazer nada faz bem ao corpo e à mente, diminui o stresse a ansiedade e reforça o sistema imunitário. Eh pá, a sério? Quem diria?
A única novidade é ter virado “nova tendência”, para mais holandesa, e ter ganho um nome que, como o hyggee o lykke dinamarquês, o lagom sueco ou o sisu finlandês, nos é estranho, vem do norte da Europa, dá pequenos livros bonitos e a receita para a felicidade: tempo, paz e sossego.
Os nórdicos têm mau tempo (meteorológico), mas a organização social e laboral que alcançaram permite-lhes uma gestão mais humana e proveitosa do tempo (cronológico).
A sul, onde o dolce far niente é aspiração antiga, o tempo (do dia e da vida) é quase todo dedicado ao trabalho. Queremos ter tempos vazios para fazer nada, nicles, népia, mas não há meio. Talvez depois dos 66 e é com sorte.
Paul Lafargue, genro de Karl Marx, escreveu em 1880 O Direito à Preguiça, em que defendia que as máquinas e a evolução tecnológica resultantes da Revolução Industrial deveriam ser usadas para libertar o homem do trabalho embrutecedor. Nesse pequeno livro, em que glorifica o dolce far niente como tempo de elevação e evolução intelectual e deplora o tempo exagerado dedicado ao trabalho, apresenta como um dos argumentos para a sua tese a maior saúde física e mental e até beleza daqueles que pela sua condição social (nobreza e aristocracia) podiam dedicar-se à ociosidade. Precursor do niksen, já falava das vantagens para a saúde de não fazer nada.
Olhamos para a inteligência artificial como uma ameaça aos postos de trabalho dos humanos, mas se quem manda quisesse (é claro que não quer) poderia apenas libertar-nos mais para fazermos nada. Ou fazermos o que quisermos com o tempo vazio.»
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