«De S. Bento surge uma dramatização que o país não está a sentir. António Costa desdobra-se em reuniões, o presidente da República chama o primeiro-ministro a Belém, e o dia termina com um Conselho de Ministros extraordinário, onde é decretada a requisição civil. Quem chegue a Portugal vindo de outra parte achará que aconteceu uma catástrofe. É falso. São apenas dois setores, o dos motoristas de transporte de matérias perigosas e o dos de transporte de mercadorias, que convocaram uma greve: para grande parte dos portugueses, apesar da dramatização, ainda não fez estragos.
O primeiro-ministro, legitimamente, argumenta ser graças às medidas preventivas do Governo que a paralisação não está a imobilizar o país. António Costa conseguiu, perante a quase indiferença da oposição, desvirtuar uma greve, transformar uma forma de luta dos trabalhadores, a reivindicar melhores condições salariais, num ato sem qualquer impacto. O que diz em relação à greve é impreciso. Quando afirma querer uma greve "respeitando os direitos de quem a faz, mas também os direitos de quem a podendo fazer, quer trabalhar, os deveres de quem estando sujeito aos serviços mínimos os está a cumprir e sobretudo os direitos de todos os portugueses, que têm também os seus direitos assegurados", sabe, como é natural, que tal harmonia é inviável. Como pode uma greve deixar as duas partes satisfeitas?
Este protesto, por enquanto sem efeitos negativos para os portugueses, é a demonstração de como um Executivo socialista, apoiado pelos partidos de esquerda, esvazia uma greve, sem sequer recorrer a alterações legislativas. O Governo, como é óbvio, não podia ficar de braços cruzados à espera do que viesse a acontecer, sobretudo tendo a memória da última paralisação - mas chamar os militares e as polícias para prover os postos de abastecimento de combustível será no mínimo desproporcionado.
Fica o precedente. De um Governo socialista devemos, a partir de agora, esperar que as greves não causem impacto na vida das pessoas. Ficaremos à espera de ver os médicos ou os enfermeiros a deixar os doentes sem consultas ou cirurgias - e aí confirmaremos quais são as prioridades.»
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