«Os portugueses gostaram muito da “geringonça”, mas o PS já não gosta do BE como terá gostado. Os dois partidos das contas certas fizeram um acordo há quatro anos do qual não constava aquilo de que discordavam, mas sim aquilo que os unia. Desta feita, não há como esconder o que os separa. António Costa decidiu governar sem acordos formais, ignorou a proposta de compromisso dos bloquistas e recusou-se a aceitar qualquer acordo escrito, porque não quis ficar refém da agenda de um só partido, e muito menos da agenda do Bloco.
O que terá impedido um compromisso entre as duas partes foi a discordância quanto a uma nova e sensível vaga de reversões em matéria de legislação laboral (herdada dos anos da troika) e que o PS traçou como linha vermelha. Quando o BE fala de lei laboral, o PS fala de aumento dos rendimentos. Quando o BE fala em Parlamento, o PS fala em sede de Concertação Social. Convenhamos, o PS nunca arriscaria ficar sozinho com o BE no mesmo quarto.
CDU, Verdes, PAN e Livre não foram tão longe como o BE e ficaram-se pelas promessas de diálogo permanente ao longo da legislatura e muita água benta. O PSD de Rui Rio fez um compasso de espera, tentou perceber que modelo de governação o PS iria escolher e não se pode dizer que o desfecho seja desfavorável ao principal partido da oposição. Na ausência de acordos escritos ou verbais, o PSD de Rio sai reforçado deste cenário como candidato ao papel de fiel da balança.
Na noite eleitoral, o líder social-democrata disse que iria esperar que os acordos à esquerda não inviabilizassem as reformas estruturais de que tanto fala. De facto, nada inviabiliza acordos pontuais entre PS e PSD. Mas o PSD de quem não está com Rio não vai querer um arremedo de “geringonça” ao centro-direita.
Na verdade, o futuro governo vai ser construído medida a medida, ora com um lado da bancada, ora com o outro. Mas a governação também pode ser obtida à custa de abstenções, nuns casos do PSD, noutros do BE ou da CDU.
O futuro governo não viverá em união de facto e não será baseado em qualquer compromisso. O governo tanto pode ter aliados pontuais como toda a oposição em bloco. António Costa venceu estas eleições e preferiu não reeditar o método. Fim de ciclo. A partir daqui todas as “geometrias variáveis” são possíveis, à esquerda e a direita. Estabilidade é uma palavra que vai reentrar no nosso léxico.»
.
0 comments:
Enviar um comentário