29.10.19

Mais justiça fiscal no próximo Orçamento



«Dados recentes da Autoridade Tributária dizem-nos que estão identificados, em Portugal, 309 contribuintes com "elevada capacidade patrimonial", ou seja, que auferem mais de 5 milhões de euros anuais e/ou detêm património superior a 25 milhões de euros.

Há anos que diferentes relatórios internacionais nos dizem que, na realidade, este grupo de "super-ricos" é muito superior, cerca de 1000. O problema, também já admitido pelo antigo diretor da Autoridade Tributária, Azevedo Pereira, está na sua identificação pelo Fisco. Um recente estudo da Comissão Europeia estima que, em média, entre 2001 e 2016, o equivalente a 26% do PIB português tenha sido colocado em offshores. Isso ajuda-nos a compreender esta realidade.

A não identificação destes contribuintes prejudica as contas do Estado e priva o país de receitas essenciais ao financiamento dos serviços públicos. Mas, para além deste problema, há outro que é revelado pelos dados já conhecidos: os 309 contribuintes identificados pagam, em média, 5% de IRS.

Há várias explicações para este fenómeno: i) a facilidade com que estes contribuintes podem aceder a esquemas de planeamento ou mesmo fraude fiscal (através de offshores, por exemplo); ii) a concentração de riqueza em património tributado fora do IRS a taxas inferiores às aplicadas aos rendimentos do trabalho; iii) o facto de também os rendimentos provenientes do património - dividendos, juros ou rendas - pagarem taxas de IRS inferiores às aplicadas aos salários.

Um exemplo: num destes anos cada sócio da Deloitte recebeu mais de 1 milhão de euros em dividendos de Angola. Se fosse salário, a taxa seria de 48%, correspondente ao escalão superior do IRS, mas como são dividendos a taxa única aplicável é 28%. Trata-se de uma clara injustiça fiscal que pode ser corrigida com uma medida simples, o chamado englobamento: todos os rendimentos, venham eles de ações ou rendas, são taxados de forma progressiva de acordo com os escalões de IRS. Quem ganha menos paga menos, quem ganha mais paga o que é justo.

Há anos que o Bloco defende o englobamento obrigatório de todos os rendimentos para efeitos de IRS. Este ano, pela primeira vez, o PS abriu a porta a essa possibilidade, ainda que de forma muito genérica, no Programa de Governo agora apresentado. A eficácia da medida, assim como o seu contributo para mais justiça fiscal, dependerá da forma como for desenhada e aplicada. Esta será uma das prioridades do Bloco de Esquerda no debate orçamental que se avizinha.»

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